domingo, 4 de junho de 2023

Equívocos do governo na relação com o União Brasil estão custando caro. Lula quer consertar

Rui Costa colocou seus interesses paroquiais acima dos do governo na montagem do Ministério e vetou Elmar Nascimento nas Comunicações. O veto revelou-se um equívoco político. Outros dois caciques seguiram o caminho de Rui Costa e o desastre completou-se

Antes da posse, em dezembro passado, em meio às articulações para a montagem do governo Lula, vazou, do CCBB, o Centro Cultural do Banco do Brasil, que o deputado Elmar Nascimento, da Bahia, líder do União Brasil na Câmara, seria o ministro das Comunicações.

Era uma escolha natural, se a intenção de Lula era ter o União Brasil em sua base de apoio. Nascimento é o maior líder do partido na Câmara e sua influência ultrapassa os limites do UB, estendendo-se por uma larga porção de deputados de centro-direita. Depois de Arthur Lira, talvez seja o parlamentar mais influente na Casa, ao lado do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), hoje líder da Maioria.

Seu nome, porém, foi fuzilado numa operação comandada pelo então futuro chefe da Casa Civil, Rui Costa. “O PT da Bahia vetou o nome de Elmar Nascimento”, leu-se nas reportagens à época. Mas o veto partiu diretamente de Costa, que comanda o partido na Bahia com mão de ferro; petistas que abrem qualquer divergência com o ex-governador são lançados numa espécie de exílio político em pleno território baiano.

Com o veto, o escolhido para ministro das Comunicações acabou sendo Juscelino Filho (UB-MA), um deputado inexpressivo, sem qualquer relevância em seu partido e cuja indicação abriu um conflito mantido meio às sombras mas que é cada dia mais acirrado entre Rui Costa e Flávio Dino -o agora ministro da Justiça ficou inconformado com a nomeação de um desafeto seu, ainda mais sem qualquer contribuição ao governo, em vez de Elmar Nascimento.

Como futuro chefe da Casa Civil, Rui Costa deveria ter colocado o interesse do país e do governo Lula acima de tudo. Mas em vez disso, colocou sua paróquia.

A partir daí, todo o arranjo com o União Brasil saiu dos eixos. Sem a colaboração de Elmar Nascimento, que ficou furioso, o futuro governo socorreu-se do senador Davi Alcolumbre, do União Brasil do Amapá. Ele, de fato, tem influência no Senado. Mas peso zero na Câmara. Participou da articulação para levar Juscelino Filho e realizou uma segunda operação que desagradou todo o partido e ampliou o desastre. Inventou o nome do então governador do Amapá, Waldez Goés, para ser o segundo representante do UB no governo.

Um desastre, de fato. Goés é filiado ao PDT e não ao UB. Quando seu nome foi anunciado, garantiu-se que ele se transferiria ao União Brasil. Logo após a posse, em 5 de janeiro, Goés declarou, entretanto, que se não filiaria ao partido. Um erro primário do governo nascente. Obviamente que o União Brasil não se sente representado pelo ex-governador que, na verdade, representa unicamente Alcolumbre, pelas relações que ambos mantêm no Amapá. Uma escolha paroquial, portanto. 

Para completar a catástrofe política, o terceiro nome do União Brasil guindado ao Ministério foi o da deputada Daniela Carneiro. Para compor um governo que tem agenda feminista, Daniela mudou seu nome político. Até o ano passado, ela tinha o nome de Daniela do Waguinho -assim mesmo, Daniela pertencente ao Waguinho. Ele, Wagner dos Santos Carneiro, que tem o nome político de Waguinho, é prefeito e cacique político em Belford Roxo, no Rio de Janeiro. Ambos têm uma história de envolvimento com milícias, fartamente documentada.

O casal Waguinho tem  uma sopa de letrinhas partidárias em sua trajetória. Ele passou pelo PSDB (2003-07), PRTB (2007-13), MDB (2013-21) e PSL (2021-22). Ela, pelo PSC (2003-11), PRTB (2011-13), PR (2013-18) e MDB (2018-22). Em 2022, ambos ingressaram no União Brasil, num arranjo paroquial, que acabou servindo a um projeto nacional.

Em uma articulação de um dos maiores caciques do PT fluminense, o ex-presidente da Assembleia Legislativa André Ceciliano, agora braço direito de Alexandre Padilha na SRI, o casal Waguinho apoiou Lula no segundo turno, em 2022. Veja a foto que, em 11 de outubro, simbolizou a aliança.

Lula caiu num conto do vigário. O apoio foi embalado numa promessa de grande votação para o candidato do PT no segundo turno das eleições em Belford Roxo com ampla repercussão na Baixada Fluminense. Pois Lula levou uma sova de Bolsonaro nas urnas no segundo turno. Bolsonaro teve 60% dos votos na cidade, Lula pouco menos de 40%. Chega a ser tragicômico: no primeiro turno, Bolsonaro teve menos votos que no segundo -54%.

Mesmo com o conto do vigário, Daniela, agora Carneiro, acabou sendo conduzida ao Ministério do Turismo. Não como representante do UB, mas apadrinhada por Ceciliano.  

Ou seja, a rigor, apesar de o União Brasil ter propalados três ministros no governo Lula, na verdade não tem nenhum.

Para completar, a dupla Juscelino Filho-Daniela Carneiro tem sido uma usina de crises sucessivas com um desempenho ministerial medíocre. 

Não tenho qualquer simpatia ou afinidade com o União Brasil, mas exigir “fidelidade” do partido ao governo é algo injusto e nada razoável. 

Tanto que nesta quarta-feira (31), no auge da crise da MP da Esplanada, Lula chamou Elmar Nascimento para uma conversa e confessou ter sido um grande equívoco o veto ao nome dele para o Ministério. Há na bancada do PT quem defenda a correção do monumental erro político com um novo convite para o líder do União Brasil. Mas muita água e mágoa já passaram debaixo da ponte, não se sabe se o arranjo seria possível agora.

Os interesses dos caciques Rui Costa, Alcolumbre e Ceciliano conduziram o governo Lula a uma sucessão patética de erros primários no jogo político. O mais grave foi o primeiro, do agora chefe da Casa Civil. Ali começou o desacerto -e foi cometido exatamente por quem deveria cuidar dos do governo Lula acima de tudo, em vez de se dedicar ao jogo paroquial.

O prejuízo para o governo foi brutal. O UB tem a terceira maior bancada na Câmara, com 59 parlamentares, menor apenas que a do PL (99) e a do PT (68) e é uma das colunas do Centrão. Se a relação tivesse percorrido outro caminho, a história do governo Lula na Câmara teria sido bem diferente nesses cinco meses.

De qualquer forma, Lula tem diante de si a possibilidade de arregaçar as mangas e consertar o desastre.

Veremos os próximos lances.

 

Ø  Lula comenta obstáculos no Legislativo: 'é um esforço governar'

 

O  presidente da República,  Luiz Inácio Lula da Silva (PT), discusou durante um evento nesta sexta-feira (02), na Universidade Federal do ABC (UFABC), na cidade de São Bernardo do Campo (SP). Durante a fala,  Lula  relatou as dificuldades que tem sofrido perante o Congresso Nacional , especialmente na aprovação de medidas de interesse do governo federal.

"É um esforço governar. Não é só ganhar a eleição… Tem que conversar com quem não gosta da gente, com quem não vota na gente", disse o  presidente Lula . A fala se refere aos impasses que o governo tem sofrido pelo Legislativo.

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Na  Câmara , o  presidente  da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que é um dos líderes do chamado Centrão, teria estipulado algumas condições que pudessem travar algumas pautas importantes. Dentre elas, estava a aprovação da Medida Provisória (MP) que reorganiza a Esplanada dos Ministérios.

O  presidente da Câmara teria exigido que o Ministério da Saúde, Comunicação, Turismo e Integração Nacional  tivessem aliados designados para as pastas.

Outro ponto foram as críticas de Lula  à política monetária do Banco Central. O  presidente disse: "Gasto é a gente pagar 13,75% de juros para o sistema financeiro deste país", se referindo à manutenção da taxa de jurus básicos, que segue no maior número já visto desde 2016. Roberto Campos Neto, presidente do BC, é o principal alvo.

·         Lula sobre negociações com o Congresso: "Tem que falar com quem não gosta da gente"

Em meio a um mês marcado por derrotas no Congresso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou nesta sexta-feira, 2, a importância de "conversar com quem não gosta" dele para alcançar uma melhor governabilidade e, assim, conseguir emplacar vitórias na Câmara e no Senado. 

As declarações do presidente ocorreram durante evento de inauguração de instalações na Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Bernardo do Campo, São Paulo.

"Então, é preciso que vocês saibam o esforço que é para governar. É importante que vocês saibam que não é só ganhar uma eleição. Você ganha uma eleição e, depois, você precisa passar o tempo inteiro conversando para ver se você consegue aprovar alguma coisa. Ontem [quinta-feira], a gente corria o risco de não ter aprovado o sistema de organização do governo. E aí, você não tem que procurar amigo. Você tem que conversar com quem não gosta da gente. Você tem que conversar com quem não votou na gente", disse Lula.

Em outra parte do discurso, Lula disse que não conseguirá "recuperar o país" sozinho e que é preciso que seus apoiadores entendam o jogo político de correlação de "forças no Congresso Nacional"

"A esquerda toda tem, no máximo, 136 votos [de deputados]. Isso se ninguém faltar. Ou seja, nós, para votarmos uma coisa simples, precisamos de 257 votos. Então, de 136, façam a conta aí e vejam quantos faltam. E, para aprovar uma emenda constitucional, é maior ainda o número de deputados que nós precisamos", completou.

Nos últimos dias, o governo tem enfrentado derrotas no Congresso, como foi o caso da votação da medida provisória (MP) da reorganização dos ministérios de Lula. Nessa votação, as pastas do Meio Ambiente e Povos Indígenas tiveram suas atribuições reduzidas. O texto só foi aprovado no último dia do prazo estabelecido.

·         'A esquerda tem, no máximo, 136 votos; para votarmos algo simples, precisamos de 257', diz Lula

Na esteira de derrotas na Câmara, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu nesta sexta-feira, 2, a dificuldade do governo no Legislativo. Durante discurso na Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Bernardo do Campo, na Grande SP, o presidente disse que a esquerda não tem votos suficientes até mesmo para aprovar projetos de lei ordinários.

"É importante vocês saberem a correlação de forças no Congresso Nacional. A esquerda toda tem, no máximo, 136 votos, isso se ninguém faltar. Para votar uma coisa simples, precisa de 257" afirmou o chefe do Executivo, acrescentando que para aprovar emendas constitucionais a necessidade de votos na Câmara é ainda maior.

A uma plateia formada, em grande parte por apoiadores, Lula disse que governar demanda esforço e negociações com quem não apoia o governo. "Você ganha a eleição e depois precisa passar o tempo inteiro conversando para ver se você consegue aprovar uma coisa."

Em relação à reestruturação dos ministérios, Lula frisou que foi necessário conversar com "quem a gente não gosta" porque o governo corria o risco de a organização da Esplanada, estabelecida em medida provisória, não ser aprovada. Apesar das dificuldades, ele assegurou que, aos 77 anos, está "muito mais otimista".

·         Fake news

O presidente voltou a criticar também a disseminação de fake news nas redes sociais pela extrema-direita e convocou a população a fazer uma "guerra do bem contra o mal".

"É uma guerra que temos que fazer, a guerra do bem contra o mal. Não é guerra de direita contra esquerda, é guerra das pessoas do bem contra pessoas do mal", disse o petista. Lula reconheceu, no entanto, que o bolsonarismo tem vencido a guerra nas redes sociais. "A quantidade de mentiras que o bolsonarismo conta todo dia na rede digital é uma coisa maluca", constatou.

Dizendo que não imaginava que o fascismo pudesse voltar ao Brasil, ele voltou a criticar o governo de Jair Bolsonaro (PL), que comparou a uma "praga de gafanhotos que destruiu tudo o que a gente construiu", e disse que vai reconstruir o País. "Quero provar, mais uma vez, que um torneiro mecânico, sem diploma universitário, pode consertar outra vez esse País". Lula ainda reclamou da elite brasileira que, segundo ele, "nunca desejou que a gente estudasse".

 

Fonte: Fórum/iG/Agencia Estado

 

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