domingo, 4 de junho de 2023

“Abismo para negros”, diz especialista sobre acesso à educação

O acesso à educação ainda é um indicador de disparidade racial no Brasil. Segundo levantamento da ONG Todos Pela Educação, a presença de jovens negros no ensino médio em 2022 ficou no mesmo patamar das matrículas de jovens brancos em 2012. Ou seja, uma década de atraso separa os 2 grupos quando o tema é ingresso no ensino médio.

A pesquisa foi realizada com base em números do IBGE, de 2012 a 2022. A análise considera adolescentes de 15 a 17 anos que frequentam ou já concluíram esta etapa de ensino, bem como os jovens de até 19 anos que já finalizaram essa fase.

Em 2012, 73% dos adolescentes brancos estavam nas salas de aula, enquanto negros somavam apenas 52,8%. Já em 2022, 82% dos jovens brancos estão matriculados no ensino médio e a porcentagem de negros ficou levemente abaixo (72,3%) do patamar alcançado pelos brancos há 10 anos.

A presença de pardos também aumentou. Se em 2012 57,4% deles tinham acesso à educação, passados 10 anos, presença foi a 73,5%.

CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO

O levantamento ainda traz um panorama sobre as desistências – alunos que começaram o ensino médio, mas, por alguma razão, não concluíram. Atualmente, 61% dos negros concluem o ensino médio. Entre os brancos, o número é de 75%.

Segundo os dados, nos últimos 10 anos, o índice de conclusão entre jovens negros quase dobrou – antes era 32%. Contudo, o índice ainda está abaixo do nível atingido pelos brancos em 2012 (62%).

Apesar do avanço, os números ainda precisam de atenção. Segundo Jackson Almeida, analista de Diversidade, Equidade e Inclusão da Todos Pela Educação, “é preciso formar continuadamente professores, gestores e servidores de secretarias para que eles possam potencializar ações na perspectiva de políticas pedagógicas, de articulações, para que cheguem na sala de aula conteúdos de combate ao racismo estrutural”.

No panorama, incluindo alunos de todas as raças, a ONG ressalta que o Brasil avançou no acesso e na conclusão do ensino médio desde 2012. Naquele ano, 63,5% dos alunos (de 15 e 17 anos) estavam matriculados ou já haviam concluído os estudos. Em 2022, eram 76,7%. Já entre os jovens de 19 anos, 50,4% haviam terminado a etapa em 2012. O número subiu para 67,3% em 2022.

<<<< LEIA A NOTA TÉCNICA

•        DESIGUALDADES ÉTNICO-RACIAIS NAS MATRÍCULAS E NA CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO

DESTAQUES

O Estado brasileiro, até hoje, não deu conta de acabar com as desigualdades étnico-raciais que perpassam a Educação Básica. Desde o acesso até a conclusão na idade esperada, meninos e meninas pretos e pardos têm as suas trajetórias escolares afetadas pelo racismo estrutural e institucional que reproduz e/ou aprofunda o cenário.

Para promover o debate acerca do tema e contribuir com a construção de propostas para a equidade na Educação Básica, esta nota técnica apresenta análises das desigualdades étnico-raciais sobre dois indicadores:

(i)      o percentual de matrículas de jovens de 15 a 17 anos no Ensino Médio ; e

(ii)      o percentual de jovens brasileiros de 19 anos que já concluíram o Ensino Médio.

Os dados utilizados são da Pnad-Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, no período entre 2012 e 2022. As principais conclusões que podem ser observadas a partir da análise descritiva dos dados são:

  Avançamos na última década com diminuição das desigualdades: em ambos os indicadores analisados, observa-se um aumento das porcentagens para jovens de todas as raças/cores entre os anos de 2012 e 2022, com destaque para o crescimento entre os pretos, que foi de 19 pontos percentuais (p.p.) na taxa de matrículas e 29 p.p. na conclusão do Ensino Médio. Já os pardos, apresentaram um crescimento de 16 p.p. e 20 p.p., respectivamente.

Contudo, existe um caminho grande a percorrer. Hoje, os indicadores para os jovens pretos e pardos são os mesmos que os brancos possuíam há uma década: para pretos e pardos, a taxa de matrículas no Ensino Médio entre jovens de 15 a 17 anos e a parcela de jovens de 19 anos que já haviam completado o Ensino Médio, em 2022, alcançaram as porcentagens vistas entre jovens brancos há 10 anos, em 2012. Ou seja, enquanto 72,3% dos jovens pretos e 73,5% dos pardos hoje estão no Ensino. Foram utilizados os dados da Pnad-Contínua do 2o trimestre de cada ano. 1 Indicador chamado de “taxa líquida de matrículas”. 3 Médio, 73% dos brancos estavam matriculados em 2012. Já em relação ao encerramento da etapa, 61% dos jovens pretos e 62,4% dos pardos de 19 anos a tinham concluído em 2022, porcentagem próxima a que brancos alcançaram em 2012: 62%;

A desigualdade não diz respeito às capacidades de pessoas negras 3 . Os números revelam o resultado de um ciclo de exclusão desse grupo sub-representado que, no contexto educacional, também é determinado por décadas de ausência de uma Educação para equidade das relações étnico-raciais.

ANÁLISE DE DADOS Percentual de jovens de 15 a 17 anos matriculados no Ensino Médio (Taxa líquida de matrículas)

No gráfico, é possível comparar a porcentagem de jovens de 15 a 17 anos que estão cursando ou já concluíram o Ensino Médio, ou seja, a taxa líquida de matrículas da etapa, de acordo com a sua raça/cor declarada nos anos de 2012 e 2022;

Observa-se um crescimento nessa taxa em todas as raças/cores, com destaque para pretos, que tiveram um aumento de 19 p.p., seguidos por pardos, com 16 p.p., e brancos, que chegaram a 9 p.p. de crescimento;

Esse aumento contribuiu para a diminuição das desigualdades. Se em 2012 as diferenças entre as taxas de brancos e pretos e brancos e pardos eram, respectivamente, 20 p.p. e 16 p.p., em 2022 essas disparidades caíram para 10 p.p. entre brancos e pretos e 9 p.p. entre brancos e pardos.

Contudo, o cenário ainda é muito marcado pela desigualdade. É importante notar que as taxas atingidas por jovens pretos e pardos em 2022 são próximas àquelas dos jovens brancos vistas uma década atrás, em 2012.

Por fim, vale destacar que o país ainda está distante de garantir que todos os seus jovens de 15 a 17 anos estejam cursando a etapa adequada para a sua idade: na média geral, 77% dos nossos jovens dessa faixa etária estavam no Ensino Médio em 2022. 

O indicador também contempla aqueles jovens de 15 a 17 anos que já completaram a etapa. Soma das populações pretas e pardas.

<< Conclusão do Ensino Médio

No gráfico, é possível comparar a porcentagem de jovens de até 19 anos que concluíram o Ensino Médio de acordo com a sua raça/cor declarada nos anos de 2012 e 2022;

Na década analisada, observa-se o crescimento na taxa de conclusão em todas as raças/cores, com destaque para os pretos, que tiveram um aumento de 29 p.p., seguidos pelos pardos, com 20 p.p., e os brancos, que chegaram a 13 p.p. de crescimento;

Esse aumento contribuiu para a diminuição das desigualdades. Se em 2012 as diferenças entre as taxas de brancos e pretos e brancos e pardos eram, 5 respectivamente, 30 p.p. e 19 p.p., em 2022 essas disparidades caíram para 14 p.p. entre brancos e pretos e 13 p.p. entre brancos e pardos.

Contudo, a desigualdade ainda existe e é preponderante. Assim como na taxa líquida de matrículas, o percentual de jovens pretos e pardos que concluíram o Ensino Médio aos 19 anos em 2022 era o mesmo observado para jovens brancos em 2012.

Além disso, o Brasil como um todo ainda está distante de garantir que todos os seus jovens concluam a Educação Básica na idade esperada: nem 70% dos nossos jovens alcançam essa marca em 2022.

 

       Cerca de 20% das redes municipais não oferecem nenhum ensino de tecnologia

 

Cerca de 20% das redes de ensino municipais não oferecem nenhum ensino sobre tecnologia e computação no Ensino Fundamental, contrariando as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Os dados são do estudo Tecnologias Digitais nas escolas municipais do Brasil, desenvolvido pela Fundação Telefônica Vivo, pelo Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb) e pela União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), com alertas sobre as desigualdades na educação pública.

No caso dos anos iniciais do Ensino Fundamental, que correspondem ao 1º, 2º, 3º, 4º e 5º anos, 21% das redes municipais de ensino não englobam a tecnologia e a computação no programa pedagógico. Nos anos finais - do 6º ao 9º ano - o cenário é similar em 17% das redes de ensino. Ou seja, a tecnologia não aparece nesses currículos nem de forma transversal, nem como um componente curricular ou como uma competência trabalhada.

Essa presença diminui ainda mais ao olhar para as redes de ensino das regiões de baixa renda. A desigualdade é expressiva nos anos iniciais do Ensino Fundamental, em que 30% das redes não englobam ensino de tecnologia e computação no currículo.

•        Por que isso é um problema?

Os dados do estudo revelam desigualdade significativa e que não pode ser negligenciada, destaca Liz Glaz, diretora-presidente da Fundação Telefônica Vivo, uma das organizações responsáveis pela pesquisa. Isso porque, ela explica, a tecnologia é uma facilitadora e potencializadora do processo de ensino.

Além disso, é preciso que os estudantes saiam da escola preparados para o "novo" mercado, sustentado na transformação digital. Outra razão para o ensino de tecnologia e computação está na inclusão, uma vez que amplia as possibilidade de recursos de acessibilidade.

Para que isso aconteça, é preciso que as tecnologias educacionais estejam presentes nas escolas e sejam implementadas com o que ela chama de "intencionalidade". Atualmente, quando presente o ensino de tecnologia e computação, ele é mais comum na forma 'transversal' às disciplinas, não como uma competência específica a ser trabalhada.

"Essa transversalidade pode também estar ‘escondendo’ o fato de não ter intencionalidade na oferta de tecnologia", destaca Lia.

O ponto de atenção se dá, principalmente, por não parecer existir uma estratégia de ensino quando o tema atravessa outras áreas do conhecimento. Na etapa qualitativa da pesquisa, por exemplo, uma das secretarias de Educação afirmou que o ensino de tecnologia ocorre de acordo com a necessidade da rede ou do professor.

Mas, segundo a BNCC, essa aplicação transversal deveria significar que a temática está presente em todas as áreas do conhecimento, e é destacada em diversas competências e habilidades, com objetos de aprendizagem variados.

•        É uma realidade em todas as regiões?

No geral, a pesquisa aponta que em todos os anos do Ensino Fundamentalo ensino de tecnologia e computação ocorre principalmente de forma transversal. Já com relação à temática ser trabalhada como competência ou habilidade em todos os componentes curriculares, o percentual não chega a 20% em nenhuma das regiões do Brasil.

Quanto à privação total da presença de tecnologias educacionais, a situação é mais crítica no Norte, onde 28% das redes municipais de ensino não incluem a temática no currículo de nenhuma forma nos anos iniciais, e 25% delas quando se trata dos anos finais. Porém, essa é a região em que as redes municipais se destacam como as que têm maior presença de equipes exclusivas dedicadas ao planejamento e implementação de tecnologias digitais.

<<<< Outros pontos de destaque

•        84% das secretarias municipais de Educação não possuem orçamento exclusivo para a área de tecnologia. No caso das capitais, o índice cai para 22%;

•        73% das redes municipais de ensino não possuem uma área ou equipe específica dedicada ao planejamento e à implementação de ações para uso de tecnologias digitais nas escolas;

•        55% das redes não contam com profissionais na estrutura organizacional da Prefeitura dedicados à garantia de oferta de equipamentos, serviços e formações voltadas ao uso de tecnologias digitais nas unidades de ensino.

<<<< E agora?

O estudo aponta que ainda são necessários muitos passos para que a tecnologia seja, efetivamente, um agente transformador dos processos de ensino e aprendizagem na educação pública nacional.

"O mais preocupante é que para algumas redes de ensino o caminho para chegar lá parece muito mais tortuoso do que para outras", ressalta Lia.

Para combater essas desigualdades e mudar o cenário, as próprias redes de ensino ouvidas elegeram três prioridades:

1.       Formações em tecnologia e computação para os professores da rede - 78%;

2.       Mais investimentos em infraestrutura de tecnologia na rede - 73%;

3.       A criação de componentes curriculares específicos para ensino de tecnologia e computação por parte das secretarias municipais de Educação - 41%.

Entre as medidas imediatas cabíveis, o estudo propõe o fortalecimento de regimes de colaboração entre estados e municípios para o compartilhamento de boas práticas, de modo que as redes que possuem melhor estrutura organizacional e técnica possam contribuir com aquelas que estão em situação mais desafiadora.

•        O estudo

A pesquisa Tecnologias Digitais nas escolas municipais do Brasil: cenário e recomendações, divulgado em maio, é fruto de uma parceria entre a Fundação Telefônica Vivo, o Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). O estudo conta ainda com apoio técnico do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede).

O levantamento aplicou questionários para uma mostra de 1.065 redes de ensino, representando as 5.568 existentes no País. Também foi realizada uma frente qualitativa com entrevistas com profissionais das secretarias de Educação e visitas a quatro municípios para conhecer as estruturas das escolas e das secretarias.

 

Fonte: Poder 360/Todos pela Educação

 

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