A
situação enfrentada pela tribo guarani-kaiowá,
no Mato Grosso do Sul, tem mobilizado a população brasileira, diante da
omissão do Estado, a quem cabe a tutela e pela decisão da Justiça Federal, cuja
ação tem gerado o aumento da violência contra a vida desse povo, além de
ignorar os direitos de sua sobrevivência..
Mesmo
sem muita divulgação de parte da imprensa, por não dá audiência e nem
vender jornal, talvez, se o ocorrido fosse o contrário, aí sim estariam bradando,
chamando-os de invasores e outros adjetivos ainda mais pejorativos, como fazem
contra os Sem Terras, este povo vem enfrentando uma luta, que já dura anos, contra as
investidas de latifundiários do agronegócio, de multinacionais e dos
pistoleiros contratados pelos fazendeiros, sem contar com o mínimo apoio dos
governos federal ou estadual.
A
difícil situação que os guarani-kaiowá têm enfrentado, não é muito diferente do
que podemos assistir em outras regiões
brasileira, ou seja, um processo organizado e calculado de expropriação
territorial, que tem como único objetivo, apropriar-se dos recursos naturais existentes,
sem respeitar os básicos direitos das populações ali já instaladas, violando-os
sem o mínimo pudor, e que é pior, muitas vezes, com o apoio do
judiciário, quando não do próprio governo.
Quando nossas autoridades irão compreender que, quando o Brasil foi “descoberto”
quem recepcionou os portugueses foram os índios? Que eles estão aqui a
mais de 1.600 anos, e que não deveriam permitir que o “homem branco” os desrespeitassem? Será que o governo
federal não entende que o que os índios querem não é toda a extensão de terra a que teriam direito
e sim, uma quantidade de terra que seja suficiente para eles se estabelecerem e
poderem se desenvolverem e crescerem, além de produzir o necessário para a sua
sobrevivência hoje e futura e cujas áreas sejam agricultáveis e próximas aos
rios, como o era antes do descobrimento?
Que
os nossos índios querem é ter um tratamento de humanos e que sejam
estabelecidos programas sociais voltados para a causa indígena, além de que seja
combatida a corrupção e os desvios de
recursos pela Funai.
Hoje
o que se vê é que mesmo nas áreas já demarcadas o atendimento é feito de forma
precária. São escolas caindo aos pedaços, com uma grade curricular
que busca aculturar os povos e prefeitos de diversas cidades demitindo
professores indígenas sem consultar às comunidades, substituindo por brancos para seus postos. Na
saúde, as denúncias de desvios e ineficiência são uma constante. Na área de
habitação, casas são construídas com verba federal, entregues cheias de
defeitos e com acabamento precário, sem que a Funai assuma a mínima responsabilidade
pela sua fiscalização.
O que impressiona na causa da tribo
guarani-kaiowá é, a dimensão que o problema assumiu e o grau de acirramento dos
conflitos. Quem trabalha ou estuda as causas indígenas, sabe que no Mato Grosso
do Sul, depois da Amazônia é onde está localizada a segunda maior população
indígena do País, com 73.295 pessoas. São
grupos indígenas que por falta de demarcação de suas terras vivem distribuídas
por mais de 30 terras indígenas e 31 acampamentos à beira de estradas ou em
pequenas porções de terra dentro de fazendas.
Relatórios de diversas entidades
nacionais e internacionais a respeito da situação dos guarani-kaiowá, apontam
como um dos maiores desafios atuais do governo brasileiro na área dos direitos
humanos.
É do conhecimento dos envolvidos com a
causa indígena, que um dos fatores que tem contribuído para o agravamento da
situação no Mato Grosso do Sul e particularmente dos guarani-kaiowás é o grande
poder político das elites, acentuado na conjuntura atual, onde o agronegócio se
tornou um dos pilares da política econômica.
O que se vê na região é um mar de
soja, cana-de-açúcar e pastagens para o gado bovino, explorados por grandes
empresas nacionais e multinacionais, todos eles implantados sobre as terras
reivindicadas pelos nativos, cujas terras outrora, fora uma região de grande
biodiversidade, com matas ricas em madeiras nobres, como a peroba, o cedro e a
aroeira.
Este poder econômico e político
hoje fortemente associado ao capital
transnacional e maior financiador do agronegócio, tem demonstrado sua força e
protelado ao máximo o processo de demarcação das terras na região.
O que se tem visto de forma clara é
que desde que o movimento indígena Aty Guasu passou a organizar ocupações de
terra como estratégia para pressionar o Estado brasileiro a agir na região, o
governo federal através da Funai tem atuado de forma pontual, procurando apenas
minimizar o problema, sem buscar uma solução estrutural definitiva para os conflitos.
Como exemplo desta situação inusitada
é que, quando uma área é ocupada, somente a partir daí é que a Funai age, iniciando
o processo de identificação e delimitação, apenas daquela área, sem se
preocupar com as demais. Se não é um crime pelo menos uma alta
irresponsabilidade ou conveniência com as elitas locais..
O movimento guarani-kaiowá luta pela
recuperação das terras, não é de agora, ele surgiu na década 80, no bojo da
redemocratização, ao mesmo tempo em que se organizavam os setores populares de
todo o País.
Ao longo de sua luta, os
guarani-kaiowá tem assistido seu território ser invadido por milhares de
colonos, fazendeiros, empresas nacionais e até multinacionais, contando com incentivo oficial, tanto federal quanto estadual, sem que pudessem
reagir a espoliação que estavam sendo submetidos, sob pena de serem tachados pelos
órgão que se diziam indigenistas, de “comunistas” ou “subversivos, por estarem
impedindo o desenvolvimento do estado.
Apesar de alguns organismos acreditarem
que os casos de morte dos índios não estão relacionados com a disputa judicial,
coincidentemente, os problemas começaram a surgir, a partir do momento que os
recursos naturais das antigas áreas se esgotarma, há cerca de 30 anos. A partir daí, os
guarani-kaiowá vem enfrentando situações constrangedoras, como: conflitos entre
as famílias, suicídios dos jovens, desnutrição infantil, motivados pela falta de
terras, o que tem obrigados aos homens, saírem em busca de trabalho, muitas
vezes para longe da família, principalmente nas
usinas de cana-de-açúcar, cujas denúncias da precariedade das
condições trabalhistas, tem sido comum. Isto sem contar com a situação de
faltas de oportunidades para os jovens, levando-os ao desespero.
Hoje vivem confinados em pequenas
porções de terras insuficientes para as necessidades das comunidades, fruto de uma política perversa de demarcação praticada pela Funai, de
pequenos lotes, para não prejudicar o agronegócio.
A partir do instante que as
demarcações passaram a contemplar áreas maiores, os fazendeiros contaram com o
apoio do judiciário. Das três áreas homologadas no governo Lula, duas foi
barrada por liminares de ministros do Supremo Tribunal Federal. Uma em 2005,
suspensa por Nelson Jobim, e, em 2009, embargada por Gilmar Mendes. Com essas
decisões, os fazendeiros da região se sentiram fortalecidos, tornando as
disputas cada vez mais violentas.
Os assassinatos de lideranças ocorreram
e tem ocorrido sem que esferas policiais e jurídicas ajam contra os culpados. São crimes que tem alcançado repercussão
internacional, como o da morte de Marçal de Souza, em 1983, e de Marcos Verón
em 2003, lideranças de destaque no movimento. Entre 2005 e 2006, ganhou destaque
as mortes das crianças indígenas em decorrência da desnutrição infantil. Como
forma de combater o problema, o governo intensificou a distribuição de cestas
básicas. Porém, a solução definitiva, que é a demarcação de área que lhes dê
condições de sobreviverem, esta não é tomada.
Em 2007, a Funai assina com o
testemunho das lideranças indígenas, Compromisso de Ajuste de Conduta se
comprometendo resolver definitivamente a situação. Em julho de 2008, tem início
os trabalhos para identificar e delimitar as terras indígenas, divididas de
acordo com as bacias hidrográficas da região. Estamos chegando ao final de
2012, e os problemas persistem por omissão do governo, através da Funai.
Na época, fazendeiros e políticos do
estado difundiram a versão, desmentida pela Funai, de que as
terras a serem demarcadas poderiam chegar a 12 milhões de hectares, quase um
terço do Estado, quando na verdade não passava de 600.000.
Enquanto os políticos pressionavam o
governo federal, os fazendeiros buscavam impedir o trabalho das equipes da
Funai usando todo tipo de artifício jurídico. E assim tem sido a situação até
os dias atuais. O resultado da omissão tem sido uma série de conflitos
sangrentos, desde 2009. Sem uma ação mais contundente do poder público, certamente os problemas continuarão a ocorrer.
Cada vez mais fortalecidos, os
fazendeiros se rodearam de pistoleiros, que ameaçam diuturnamente os índios,
quando não os “requisitam” para exercerem o trabalho as escravo, enquanto as
mulheres são estupradas e ou transformadas em prostitutas para servirem aos
bandidos armados. Esta é a situação e o gverno, de quem se espera uma ação, continua omisso.