sábado, 21 de setembro de 2024

Ramzy Baroud: ‘Os verdadeiros objetivos de Israel em Gaza e por que eles fracassarão’

Nunca em sua história de guerra e ocupação militar Israel foi tão incapaz de desenvolver um plano coerente para o seu futuro e o futuro de suas vítimas.

Até mesmo uma rápida olhada nas manchetes da mídia internacional revela a profundidade do dilema israelense. Enquanto Tel Aviv continua a realizar uma guerra genocida contra o povo palestino em Gaza, parece não ter ideia do que fazer além de simplesmente destruir a Faixa e seu povo.

Até mesmo o ministro da Defesa do país, Yoav Gallant, que em breve poderá ser procurado oficialmente pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), indicou em várias ocasiões que Israel não tem nenhum plano pós-guerra em Gaza.

“Desde outubro, tenho levantado essa questão de forma consistente no Gabinete e não recebi nenhuma resposta”, disse Gallant na linguagem mais clara possível em maio passado.

Outros sugerem que Netanyahu e seu governo de extrema direita podem ter um plano, mas, na linguagem do Washington Post, é um “plano inviável” ou, de acordo com a Vox, “não é plano algum”.

O plano “inviável” de Netanyahu, ou “nenhum plano”, é inconsistente com os desejos do governo dos EUA.

É verdade que tanto Israel quanto os EUA estão de pleno acordo com relação à guerra em si. Mesmo depois que Washington finalmente começou a mudar sua posição de querer que a guerra continuasse, para pedir a Netanyahu que concluísse sua tarefa sangrenta, as armas americanas continuaram a fluir no mesmo ritmo.

Os norte-americanos, no entanto, não estão convencidos de que destruir o Hamas, desmilitarizar totalmente Gaza, assumir o controle da fronteira entre Gaza e o Egito, fechar a agência de refugiados UNRWA e a “desradicalização” da população palestina sitiada seja a abordagem correta.

Mas o próprio Netanyahu já devia saber disso, se não no início da guerra, pelo menos quase um ano depois do genocídio. Seu exército exausto continuou passando de uma fase para outra, declarando “vitórias táticas”, sem atingir um único objetivo estratégico em Gaza.

A estimativa mais otimista do exército israelense é que sua guerra, que praticamente destruiu toda a Faixa de Gaza, resultou em um impasse. Uma leitura mais sóbria da guerra, de acordo com o ex-primeiro-ministro israelense, general Ehud Barak, é que Israel deve encerrá-la antes de “afundar em seu abismo moral”.

No entanto, planos mais delirantes, relativos tanto à Faixa de Gaza quanto à Cisjordânia, continuam a vazar para a mídia.

O primeiro grande vazamento foi uma gravação de um discurso do extremista e muito influente ministro israelense do gabinete de Netanyahu, Bezalel Smotrich.

“Estou dizendo, é mega-dramático. Essas mudanças alteram o DNA de um sistema”, disse Smotrich a um grupo de colonos judeus israelenses em junho passado, de acordo com o New York Times.

O “programa cuidadosamente orquestrado” do ministro depende da transferência da autoridade da Cisjordânia do exército de ocupação para um grupo de civis sob a liderança do próprio Smotrich. O objetivo é tomar mais terras palestinas, expandir os assentamentos ilegais e impedir qualquer continuidade possível de um Estado palestino viável.

Na verdade, o plano já está em andamento. Em 29 de maio, Israel nomeou Hillel Roth, um aliado próximo de Smotrich, como delegado da Administração Civil da Cisjordânia.

O plano para Gaza é outro episódio de crueldade, mas também de ilusão. Ele foi revelado em um artigo do editor do jornal israelense Haaretz, em 9 de setembro.

Aluf Benn escreveu que o plano de Netanyahu também consiste na contratação de um “governador de Gaza” israelense, o general de brigada Elad Goren, que se tornou o “chefe do esforço humanitário-civil” na Faixa em 28 de agosto

Usando uma combinação de táticas, incluindo fome, pressão militar e outras semelhantes, Netanyahu quer levar a população do norte de Gaza para o sul, em preparação para anexar formalmente a região e trazer de volta os colonos judeus.

Esses não são os únicos planos que vazaram ou, às vezes, foram comunicados abertamente por autoridades israelenses.

No início da guerra, ideias como a limpeza étnica da população de Gaza no Sinai foram defendidas abertamente por autoridades israelenses e também foram o principal tópico de discussão nos noticiários noturnos israelenses.

Algumas autoridades israelenses falaram em ocupar totalmente Gaza, enquanto outras, como o Ministro do Patrimônio de Israel, Amichai Eliyahu, cogitaram a ideia de lançar uma bomba nuclear.

O plano de evacuar totalmente Gaza não funcionou simplesmente porque os palestinos não quiseram sair, e o Egito rejeitou a própria insinuação de que a limpeza étnica dos habitantes de Gaza era uma opção. Além disso, o despovoamento total do norte de Gaza também não funcionou, em parte porque Israel estava massacrando civis tanto no norte quanto no sul em taxas comparáveis.

Os novos planos de Israel não conseguirão alcançar o que os planos originais não conseguiram, simplesmente porque Israel continua a enfrentar o mesmo obstáculo: a firmeza do povo palestino.

Entretanto, muito ainda pode ser aprendido com a natureza dos esquemas israelenses, antigos e novos, principalmente o fato de que Israel considera o povo palestino como inimigo.

Essa conclusão não é obtida apenas por meio de declarações de altos funcionários israelenses, incluindo o próprio presidente Isaac Herzog, quando ele disse que “uma nação inteira lá fora (…) é responsável”.

Quase todos os esquemas israelenses parecem envolver a morte de palestinos em grande número, a fome ou o deslocamento em massa.

Isso significa que a guerra israelense sempre foi uma guerra contra o povo palestino. Os próprios palestinos sabem disso. Será que o resto do mundo já não deveria saber disso?

•        ONU ordena saída de tropas israelenses de Gaza e Cisjordânia

A Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou nesta quarta-feira (18/09) uma resolução para exigir o fim da ocupação de Israel nos territórios palestinos(Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, e a Faixa de Gaza) , com uma maioria de 124 votos a favor, 14 contra e 43 abstenções.

Foi necessária uma maioria de dois terços para apoiar a resolução, que não é vinculativa, como todas as resoluções da Assembleia, mas que é de certa forma histórica, pois foi apresentada pela primeira vez pelos palestinos, que, apesar de não terem um Estado pleno, ganharam algumas competências nos últimos meses.

O texto da resolução segue o parecer histórico emitido em julho pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), mais alto tribunal da ONU, que a pedido da Assembleia Geral analisou a ocupação dos territórios palestinos desde 1967 e considerou que "a continuação da presença" israelense nesses territórios "é ilegal" e que Israel tem "obrigação de pôr fim a isso [...] o mais rápido possível".

Enquanto os países muçulmanos e africanos votaram quase em bloco a favor da resolução, a União Europeia mostrou novamente sua desunião com votos a favor (entre eles Espanha e França), contrários (Hungria e República Tcheca) e várias abstenções (Alemanha, Itália, Holanda, Suécia e Polônia).

Israel e Estados Unidos mais uma vez mostraram sua sólida aliança em votações consideradas críticas para o governo israelense, tendo ao seu lado Argentina, Paraguai e vários países das ilhas do Pacífico, que sempre votam com os americanos.

<><> Prazo de 12 meses para fim da ocupação

A resolução "pede a Israel que ponha fim, sem demora, à sua presença ilegal nos Territórios Palestinos Ocupados, incluindo Jerusalém Oriental (...) e a fazê-lo no prazo máximo de 12 meses após a adoção da resolução".

O texto também exige que Israel devolva as terras confiscadas dos palestinos, permita o retorno das pessoas deslocadas pelos assentamentos e faça reparações aos afetados, além de pedir que a comunidade internacional não reconheça as consequências territoriais, legais e demográficas da ocupação das terras palestinas.

Também pede que os Estados-membros tomem medidas para impedir as importações procedentes dos assentamentos e o fornecimento de armas a Israel se houver motivos "razoáveis" para acreditar que elas poderiam ser usadas nos territórios palestinos. Também propõe sanções contra os envolvidos na "manutenção da presença ilegal de Israel" nos territórios palestinos.

<><> Linguagem dura

No entanto, a linguagem da resolução, desta vez muito dura com Israel, não convenceu vários países, como Canadá, Austrália, Índia, Suíça e muitos europeus, que optaram por se abster.

Como resultado, a deliberação adotada teve menos consenso do que a que foi votada em maio na mesma Assembleia em favor da adesão plena de um Estado palestino à ONU: 143 países a apoiaram e apenas nove votaram contra.

Nesta terça-feira, ao apresentar a nova resolução, o embaixador palestino na ONU, Riad Mansour, disse que "nenhuma potência ocupante deve infringir os direitos inalienáveis" dos palestinos.

"A justiça é o único caminho para a paz. Respeitem o direito internacional e não o sacrifiquem por cálculos políticos frios", acrescentou.

Logo em seguida, o embaixador israelense na ONU, Danny Danon, tomou a palavra, referindo-se a esse momento histórico como "um circo onde o terror é aplaudido".

"Qualquer um que vote a favor está colaborando com a violência e insultando o próprio funcionamento desta instituição (...) Eles estão tentando isolar e destruir Israel, essa resolução atrasa a esperança de paz na região", disse Danon.

A embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield, afirmou que rejeitava "resoluções unilaterais" sobre o conflito israelense-palestino porque são "irrealistas" e considerou que "a paz só virá por meio de negociações entre os dois lados" rumo a uma solução de dois Estados.

Esse é o caminho que os EUA vêm tentando implementar há meses, sem sucesso, por meio de um cessar-fogo prévio na guerra entre Israel e o grupo islâmico Hamas na Faixa de Gaza.

 

¨      Explosões de aparelhos de comunicação no Líbano acendem barril de pólvora na região, avalia analista

As explosões de aparelhos de comunicação no Líbano, orquestradas por Israel, que mataram dezenas de pessoas e deixaram milhares de feridos, de acordo com as autoridades libanesas, aumentaram a tensão na região do Oriente Médio.

Israel não assumiu a autoria dos ataques, mas, de acordo com matéria do jornal The New York Times divulgada nesta quinta-feira (19), o país do Oriente Médio criou uma empresa de fachada para produzir pagers explosivos que foram fornecidos ao Líbano. O movimento libanês Hezbollah já anunciou vingança.

O programa Mundioka, da Sputnik Brasil, entrevistou a especialista em ciências militares e pesquisadora do Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC) da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), Amanda Marini, para abordar o atual panorama do conflito. A ofensiva israelense foi um golpe, sobretudo, na moral do Hezbollah, comentou ela.

"Isso gerou um baque psicológico, tecnológico e de moral, mesmo do Hezbollah, que até mesmo os líderes estão falando. Pelo que está saindo na mídia, vinculado ao Hezbollah, é a primeira grande ação que feriu a moral de combate desde o dia 7 de outubro, quando começou o novo episódio do conflito israelo-palestino", disse a especialista.

Ela lembrou que a guerra de Gaza está preste a completar um ano e, nesses 12 meses, Israel intensificou as hostilidades na fronteira com o Líbano e os houthis do Iêmen no mar Vermelho.

Segundo Marini, o principal motivo do atual premiê israelense, Benjamin Netanyahu, com a escalada das tensões é manter uma sobrevida de seu governo que está por um fio, "porque, em guerra, não tem como você trocar o corpo político".

O fato de os atentados contra o Hezbollah com pagers terem atingido crianças e filhos de políticos libaneses torna ainda mais crítica a situação.

"Eles [Hezbollah] são um partido político, têm cadeiras no Parlamento, algumas pastas nos ministérios […] Tem questões de serviços sociais, promoção de políticas públicas, de saúde, educação, agricultura. Os vídeos, as imagens são muito fortes, porque como explodiu um aparelho que a gente geralmente fica na mão, acabou atingindo muitos olhos. Muitas pessoas acabaram ficando cegas em razão disso."

Para agravar a situação, ressaltou ela, o embaixador do Irã no Líbano, Mojibat Amani, está entre os feridos.

De acordo com a pesquisadora, o Hezbollah tem mais força de atuação, inclusive bélica que o próprio Estado libanês, devido há décadas de crises econômicas, políticas e sociais, que mais da metade da população se encontra na linha de pobreza, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU).

"E o Hezbollah faz parte da lógica do eixo de resistência, que é uma aliança informal, militar, ideológica, política, comandada pelo Irã, com grupos paramilitares na região do Oriente Médio. É um teatro de operações, é um xadrez geopolítico que não se encerra por si mesmo."

Ao resgatar o histórico de conflitos entre o Hezbollah e Israel, que surge a partir da invasão de Israel ao sul do Líbano nos anos de 1980, a especialista comentou que a ultima investida israelense levou a guerra para outro patamar, além incitar sentimentos de vingança e revolta de civis que antes eram contra a ofensiva bélica e agregando novos protagonistas ao conflito.

"Isso tudo mostra que como as nossas telecomunicações, como a internet, a cibernética, tornam-se cruciais quando se fala de segurança e defesa [...] não é mais apenas militares, questão de armamento, como objetos civis estão sendo usados para levar a mortes e com fins de objetivos políticos na guerra. Foi até uma das críticas que o secretário-geral da ONU, António Guterres, fez hoje, condenando esse uso de objetos civis como armas de guerra."

A resposta do Hezbollah pode acarretar a destruição ainda maior das estruturas e do Estado libanês, alertou a entrevistada, sobretudo porque as ações de Israel sempre têm o "aval" dos EUA e o Hezbollah tem o respaldo do Irã, que também está armando os houthis no Iêmen.

"A gente está vendo um barril de pólvora sendo criado em nossa frente na região do Levante, Síria, Líbano, Israel, Palestina [...] Está tudo emaranhado: Hezbollah tem relação com o Irã, o Irã tem relação com os houthis, o Hamas tem relação com o Hezbollah, está todo mundo muito junto e na hora que essa corda mesmo assim for puxada vai tudo explodir. Infelizmente, é o cenário que vejo: efeito dominó, você bate na primeira [peça] e vai tudo caindo", lamentou ela.

As crescentes tensões tem encorajado e fortalecido, inclusive, grupos extremistas que haviam perdido força, segundo ela, como Estado Islâmico, na Síria.

"Na Síria, principalmente no Nordeste do território sírio, o Estado Islâmico está voltando. A Síria até hoje vive em conflito armado até hoje está muito frágil e muitos deslocados ainda vão para o Líbano. Vejo o fator Estado Islâmico entrando para trazer mais caos", lamentou ela.

 

Fonte: A Nova Democracia/DW Brasil/Sputnik Brasil

 

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