O apetite voraz por energia dos data
centers
O avanço da internet e
a digitalização da vida cotidiana transformaram profundamente a forma como
vivemos, trabalhamos e nos conectamos. Desde a virada dos anos 2000, quando os
smartphones se tornaram onipresentes, o número de usuários de internet aumentou
vertiginosamente. A pandemia de covid-19 intensificou essa tendência, forçando
até mesmo os mais reticentes a adaptarem-se ao mundo virtual. Com essa
crescente dependência das tecnologias digitais, as infraestruturas por trás
desses serviços, como os data centers, tornaram-se indispensáveis.
Os data centers são
instalações físicas que abrigam servidores, sistemas de armazenamento e outros
equipamentos essenciais para o processamento, armazenamento e distribuição de
dados. Sendo o coração da internet, eles precisam estar disponíveis 24 horas por
dia, sete dias por semana, garantindo que possamos assistir a vídeos, realizar
transações on-line, ou acessar conteúdos como este aqui.
Contudo, a manutenção
dessa infraestrutura robusta não vem sem um custo. Um dos mais evidentes é o
consumo de energia, que já se aproxima de 2% do total global e, segundo
projeções da Agência Internacional de Energia, pode atingir entre 3% e 4% até o
final da década. Para termos uma ideia da magnitude desse impacto energético,
em 2014, antes da intensificação do uso digital devido à pandemia, 1,8% do
consumo de eletricidade dos EUA foi atribuído aos data centers, um valor
aproximadamente equivalente ao consumo de eletricidade no estado de Nova
Jersey.
Atualmente, os Estados
Unidos e a China lideram o número de data centers, com gigantes como Amazon,
Microsoft e Google entre os principais proprietários e usuários dessa
infraestrutura. No Brasil, Campinas desponta como o maior mercado de data
centers, com destaque também para outras cidades como Barueri, Rio de Janeiro,
Fortaleza e Porto Alegre.
O aumento dessas
infraestruturas, no entanto, acarreta desafios ambientais e energéticos,
particularmente em regiões onde o impacto já é uma preocupação crescente. Um
exemplo é a Irlanda, onde a Agência Internacional de Energia afirma que o uso
de eletricidade pelos data centers triplicou desde 2015, representando 18% do
consumo total de energia do país em 2022. Na Dinamarca, o crescimento do uso de
energia pelos data centers pode alcançar 15% do consumo total até 2030.
A atratividade desses
países para a instalação de data centers agora se tornou uma preocupação. Em
resposta, a União Europeia possui uma série de políticas e regulamentos que
afetam o setor dos data centers, inclusive para avaliar a sustentabilidade dessas
infraestruturas, exigindo que os operadores relatem indicadores de desempenho
energético. Na China, o governo estabeleceu metas para a eficácia média de uso
de energia (power usage effectiveness – PUE, sigla em inglês) dos data centers.
Grandes cidades como Pequim e Xangai agora exigem que novos projetos atendam a
requisitos mínimos de PUE, buscando limitar o impacto ambiental desse setor em
rápido crescimento.
A localização dos data
centers pode ter impactos significativos em diversas áreas, como a do uso de
água para refrigeração, a sobrecarga na rede elétrica e a criação de empregos
locais, que, embora importantes, não exigem intensa mão de obra. Entre as estratégias
para a eficiência energética dos data centers destacam-se reduzir o uso de
ventiladores nos servidores, melhoraria dos sistemas de refrigeração e a
utilização de cabos supercondutores, que conduzem eletricidade sem desperdício.
Além disso, práticas menos complexas, como desligar portas de rede quando não
estão em uso e investir em energias renováveis, ajudam a economizar energia.
Neste sentido, o
Brasil, que já possui uma vantagem por ter uma grande oferta de energia
renovável, está se posicionando para atrair mais data centers para o país. Um
estudo do governo, junto com o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa
de Pesquisa Energética (EPE), mapeou soluções para essa demanda crescente. No
mapeamento realizado pelo governo brasileiro, há tendência de melhora em três
fatores em que reformas feitas pelo poder público devem ser consolidadas ou
expandidas: fornecimento e custo da energia, facilidade de fazer negócios e
mercado de trabalho (mão de obra e leis trabalhistas).
No meu entendimento, a
digitalização e, consequentemente, o aumento dos data centers são uma tendência
global que parece irreversível, especialmente porque a sociedade possui um
ambiente favorável à aceitação – por vezes até acrítica – da expansão das tecnologias
digitais. Nesta expansão, o debate sobre o consumo de energia dos data centers
está em andamento.
Diversas questões
poderiam se colocar perante este cenário, tais como: quem será priorizado em
momentos de escassez de energia, como aconteceu recentemente em São Paulo? Em
um cenário em que dependemos fortemente do digital, em um país como o Brasil,
onde o acesso à energia ainda não é universal, o licenciamento de novos data
centers estará atrelado à responsabilidade das empresas em promover a redução
da pobreza energética em suas áreas de influência?
Fonte: Por Elaine
Santos, no Correio da Cidadania
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