Recurso do MPF busca garantir a demarcação
e a titulação de território quilombola em Sergipe
O Ministério Público
Federal (MPF) apresentou recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal
(STF) para que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e
a União promovam a demarcação e a titulação do território quilombola Pirangy, localizado
no município de Capela, em Sergipe. A comunidade aguarda há 17 anos o
procedimento de regularização da área. Para seguir para instância superior é
preciso que o recurso seja admitido pela vice-presidência do Tribunal Regional
Federal da 5ª Região (TRF5).
O processo é fruto de
ação civil pública ajuizada pelo MPF para que o Incra e a União finalizem o
processo administrativo que trata da identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação da área territorial reivindicada pela
comunidade quilombola Pirangy. Na ação, o MPF pediu que a Justiça determinasse
à autarquia a conclusão do procedimento no prazo de 24 meses, fixando-se multa
diária de R$ 1 mil por dia de descumprimento. Outros requerimentos foram para
que a União disponibilizasse verbas orçamentárias ao Incra para a realização da
titulação do território e que o Incra e a União pagassem indenização por danos
morais coletivos pela demora na regularização da área. A Justiça Federal em
Sergipe julgou os pedidos improcedentes.
• Demora
O MPF recorreu ao TRF5
sustentando que a tramitação do processo administrativo de regularização
fundiária no Incra ultrapassa em muito uma duração considerada razoável,
acarretando sérios prejuízos do ponto de vista de manutenção da cultura e usos
tradicionais da comunidade, além de dar ensejo a conflitos fundiários. Também
ressaltou que a autarquia não tem sequer previsão para a finalização do
procedimento de regularização da área.
A Segunda Turma do
TRF5 não acatou o recurso do MPF. De acordo com o acórdão, “muito embora o
lapso de tramitação do processo administrativo seja evidentemente prolongado,
não se pode afirmar que atualmente existe mora do Incra no desenvolvimento dos
trabalhos, havendo grande dificuldade, a bem da verdade, de se estabelecer um
prazo para a conclusão dos expedientes, até mesmo em vista a grande quantidade
de etapas a serem cumpridas”.
• Normas constitucionais
O procurador regional
da República Adílson Paulo Prudente do Amaral Filho, responsável pelo caso na
segunda instância, discorda dessa argumentação. Para ele, a decisão ofende
normas constitucionais. “O acórdão recorrido, ao deixar de responsabilizar a União
e o Incra, réus nesta demanda, pela conduta ilícita relacionada aos
procedimentos de regularização fundiária do quilombo em questão, contraria as
seguintes normas: artigo 5º, inciso XXXV; artigo 37, caput; artigo 216,
parágrafo 5º; e artigo 68 do ADCT”, frisa. Segundo ele, tais normas dispõem
sobre a garantia de duração razoável do processo administrativo, o princípio da
eficiência, o acesso à Justiça e a inafastabilidade do controle jurisdicional
para apreciar ameaça ou lesão a direito.
• Caiana dos Crioulos é a primeira
comunidade quilombola titulada pelo Incra na Paraíba
Aproximadamente 300
famílias da comunidade quilombola Caiana dos Crioulos, em Alagoa Grande e
Matinhas, municípios do Agreste paraibano, comemoraram a conquista dos Títulos
de Domínio (TD) dos três imóveis inseridos na área de 646 hectares do
território. Trata-se da primeira comunidade quilombola da Paraíba a receber o
título definitivo de suas terras.
Os documentos foram
entregues em solenidade realizada em 19 de setembro (quinta-feira), em
Alcântara (MA), pelas mãos do presidente da República, Luiz Inácio Lula da
Silva, durante ato de celebração da assinatura do Termo de Conciliação,
Compromissos e Reconhecimentos Recíprocos relativo ao Acordo de Alcântara. Na
ocasião, foram concedidos outros 18 títulos a comunidades quilombolas de todo o
Brasil, além de 11 decretos de interesse social.
O Título de Domínio de
terras quilombolas é coletivo, imprescritível e pró-indiviso concedido à
comunidade, em nome da sua associação legalmente constituída. É gratuito e não
pode ser vendido ou penhorado e, além da posse da terra, garante o acesso a políticas
públicas como educação, saúde e financiamentos por meio de créditos
específicos.
Atualmente, 36
processos para regularização fundiária de territórios quilombolas encontram-se
em andamento no Incra na Paraíba. De acordo com informações da Associação de
Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (Aacade), 49
comunidades remanescentes de quilombos no estado já possuem a Certidão de
Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.
• Tradição e resistência
Caiana dos Crioulos,
localizada a cerca de 130 quilômetros de João Pessoa, é uma das comunidades
remanescentes de quilombos mais conhecidas da Paraíba. O grupo ainda mantém bem
vivas as tradições herdadas de seus antepassados africanos e preserva vários traços
de sua cultura e história. Entre as manifestações artísticas, estão os grupos
de coco de roda e de ciranda, que se apresentam em eventos no estado e em
outros lugares do país.
O Relatório Técnico de
Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade foi publicado pelo Incra em
dezembro de 2015. Segundo o documento, a origem da Caiana dos Crioulos não é
concludente. Alguns autores afirmam que a população descenderia de ex-escravizados
que por lá se instalaram entre os séculos XVIII e XIX, rebelados quando do
desembarque de um navio negreiro aportado em Baía da Traição, no litoral norte
da Paraíba. Outros entendem que o agrupamento teria se originado pela chegada à
Alagoa Grande de sobreviventes do massacre do Quilombo dos Palmares, o que
justificaria a existência da localidade denominada Zumbi nas proximidades do
município.
Embora nenhuma destas
versões seja confirmada pelas pessoas da comunidade, porque a história de sua
origem não foi transmitida entre as gerações, é possível afirmar, a partir de
depoimentos dos mais velhos, que o grupo está estabelecido no local há mais de
150 anos.
As famílias do Caiana
dos Crioulos vivem, principalmente, de culturas de subsistência, como feijão,
fava, milho, mandioca, inhame, batata-doce, bem como da criação de animais e da
fruticultura.
Fonte: MPF-SE/Incra PB
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