sábado, 29 de abril de 2023

No meio da confusão, o Congresso voltará a debater os temas de interesse nacional

Fisiologismo, nepotismo e patrimonialismo, cuja mais perfeita tradução é o chamado “orçamento secreto”, fazem parte da pequena política que move o dia a dia do Congresso: as disputas parlamentares por viagens e apartamentos; as articulações de interesses privados, em detrimento das políticas públicas, nos seus corredores; as intrigas de bastidor em disputas por verbas e cargos no governo; a perversa subsunção dos partidos pelas suas bancadas.

Nesta semana, tudo isso está em segundo plano, quiçá pelos próximos meses também, porque os grandes interesses da sociedade voltaram à pauta. Por exemplo, a Câmara, terça-feira. aprovou o pedido de urgência para a votação do projeto de lei das fake news, que regula a atuação das chamadas big techs no Brasil.

A matéria será votada diretamente no plenário da Câmara, na próxima semana, depois de três anos de tramitação do projeto originário do Senado nas comissões técnicas.

Essa é a primeira agenda estratégica para a democracia brasileira em pauta no Congresso. Um exemplo do que é a grande política trata da fundação e conservação do Estado, da manutenção de determinadas estruturas econômico-sociais ou sua destruição.

O conceito de hegemonia do pensador italiano Antonio Gramsci é bastante reconhecido, porque descreve como o Estado usa, nas sociedades ocidentais, seus aparatos ideológicos para conservar o poder: a religião, a escola, os meios de comunicação etc. No seu conceito de hegemonia, porém, o pleno exercício do poder político está associado à liderança moral da sociedade.

Numa leitura reacionária dessa abordagem, por essa razão, a extrema direita vê a ciência, a educação e a cultura como ameaças, atua no sentido de neutralizar o papel de cientistas, intelectuais e artistas na construção de uma sociedade democrática, do desenvolvimento sustentável, do acervo técnico-científico e da identidade cultural do país. Mesmo que para isso seja necessário recorrer à força.

O jornalista e cientista político da Universidade de São Paulo (USP) Oliveiros S. Ferreira, já falecido, escreveu um livro sobre o conceito de hegemonia no qual se remete à Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), que conflagrou a Europa.

Nela, um pequeno grupo de 45 cavaleiros húngaros, com suas armaduras, durante seis meses aterrorizou o condado de Flandres, a região flamenca da Bélgica. Repete uma indagação de Gramsci sobre esse episódio: como o conseguiram? Como e por que o grande número, mais forte, se submete ao pequeno?

Ideólogo do pensamento conservador no Brasil, Oliveiros Ferreira foi um estudioso do protagonismo dos militares na história republicana e crítico do castilhismo golpista.

Num artigo para o Estadão em 1988, intitulado “O reconhecimento da derrota”, ele resgata uma carta do general Góes Monteiro ao jurista liberal Sobral Pinto, na qual o então ministro da Guerra, em abril de 1945 — ou seja, pouco antes do fim do Estado Novo —, reconhece a derrota do “partido fardado” diante de uma nação “que não compreendia e que nunca poderia compreender”. Segundo ele, porque trouxera da Escola Militar “um modelo de tirania esclarecida”.

“Eu reclamava poder, ordem, disciplina e ardor para, em 10 anos pelo menos, como recorda V.Exa., preparar a nova elite e poder modificar as condições de ignorância e miséria das massas, responsáveis pelo aviltamento da prática constitucional”, lamentava o general do Estado Novo.

O ex-presidente Bolsonaro tentou mobilizar seus cavaleiros húngaros três vezes, no 7 de Setembro de 2019, no dia da diplomação do presidente Lula da Silva e no 8 de janeiro. Em nenhuma delas conseguiu que as Forças Armadas vestissem as armaduras.

A propósito, é bom lembrar que 8 de janeiro foi o resultado do uso das redes sociais como instrumento de mobilização para a tomada do poder, com uso generalizado de fake news e emprego de violência na ocupação dos palácios dos Poderes da República.

Esse episódio serviu para desconstruir uma visão política glamourosa e idílica das redes sociais e da internet como ferramentas avançadas e absolutas da participação no jogo democrático. Pelo contrário, a utilização perversa de algoritmos tem servido para embaralhar a consciência cívica e enfraquecer a democracia, além de fomentar a violência, inclusive entre crianças e adolescentes. É preciso mais compromisso das big techs com a ordem democrática e a construção de um ambiente social mais saudável.

 

       Governo Lula negocia acordo e tenta evitar “racha” entre aliados para controlar CPMI

 

Preocupado com o risco de um racha entre aliados na CPMI dos Atos Golpistas, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai buscar negociar um acordo na escolha do presidente e do relator da comissão – que foi criada nesta quarta-feira (26) e pode ser instalada na próxima quarta-feira (3).

Os dois postos são disputados por apoiadores de Lula na Câmara e no Senado, colocando em campos opostos os grupos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do senador Renan Calheiros (MDB-AL).

A presidência da CPMI ficará com um deputado. Os mais cotados são Arthur Maia (União Brasil-BA) e o líder do PP na Câmara, André Fufuca (PP-MA).

Já a relatoria, também importante, deve ficar nas mãos de um senador. E aqui, o mais cotado para assumir o posto é Renan Calheiros, rival de Lira na política alagoana.

Uma saída negociada para evitar esse embate seria indicar outro senador do MDB – por exemplo, o líder do partido no Senado, Eduardo Braga (AM).

Segundo articuladores políticos de Lula, o Planalto tenta traçar uma estratégia para evitar que esses dois grupos, hoje próximos do governo, criem um racha na CPMI antes mesmo do início dos trabalhos.

O problema, até o momento, é que o Senado não aceita que o grupo de Arthur Lira estabeleça um “veto” ao nome de Renan Calheiros.

Por outro lado, o governo considera vital que presidente e relator da CPMI trabalhem afinados, em conjunto. O medo é que as divergências levem a alianças pontuais entre membros do “grupo de Lira” e da oposição.

A instalação da CPMI deve acontecer na próxima semana, depois que os líderes partidários indicarem os 32 membros da comissão. Antes mesmo da primeira sessão, porém, governistas e oposição já definiram seus objetivos.

Os governistas vão focar no enfraquecimento do ex-presidente Jair Bolsonaro. Já a oposição vai mirar no ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Gonçalves Dias e no ministro da Justiça, Flavio Dino.

O governo não queria a CPMI, mas agora diz que vai até o fim – principalmente depois de encaminhar a formação de uma maioria na comissão. Já os oposicionistas querem ganhar no discurso, ou seja, na base do grito, para desgastar o presidente Lula. A estratégia é focar no fato de os atos golpistas terem ocorrido já com Lula no governo, e bater na tecla de que a responsabilidade pela existência dos atos de vandalismo é do governo atual.

 

       PL ameaça não indicar nomes à CPMI dos atos golpistas, mas é conversa fiada

 

Uma manobra regimental do governo para conseguir mais uma indicação à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas de 8 de janeiro gerou insatisfação nos parlamentares da oposição. O requerimento de instalação da CPMI foi lido nesta quarta-feira (26/4) pelo presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ao todo, 30 parlamentares — 15de cada Casa — vão compor a CPI mista, além do presidente e do relator.

Na noite de terça-feira (25), o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do governo no Congresso, saiu do Bloco Parlamentar Democracia (MDB, União Brasil, Podemos, PDT, PSDB), que tinha 30 senadores, e foi para o Bloco Parlamentar da Resistência Democrática (PT, PSD, PSB e agora Rede), de 28 integrantes. Com a alteração, ambas formações suprapartidárias passaram a ter 29 parlamentares.

Agora, o Bloco de MDB e União segue tendo o direito de indicar seis senadores, mas a ala de PT e PSD, que antes tinham o direito de indicar cinco senadores, passa a poder indicar seis integrantes. A distribuição das vagas em comissões dentro do Congresso é feita pela proporcionalidade de blocos e partidos. Com a formação atual, o governo deve ter 12 parlamentares em sua base.

Além da maioria, o governo ainda articula para ter aliados na relatoria e na presidência da CPMI. Na Câmara os nomes cotados são André Fufuca (PP-MA) e Arthur Maia (PP-BA). No Senado, Renan Calheiros (MDB-AL) é o favorito para assumir a mesa e o correligionário Eduardo Braga (MDB-AM) também é cotado.

Além de dar mais uma vaga ao governo, a manobra de Randolfe acabou tirando uma vaga do Bloco Parlamentar Vanguarda (PL e Novo). Com isso, o bloco terá apenas duas indicações e não mais as três iniciais. A outra indicação ficará com o Bloco Parlamentar Aliança, formado por PP e Republicanos. A medida foi criticada pelo líder da oposição no Senado Federal, Rogério Marinho (PL-RN), que fez uma questão de ordem a Rodrigo Pacheco.

“Ocorre, Sr. Presidente, que, dentro da especificidade da norma e da hierarquia, existe uma norma de 2006 que rege inclusive a CMO que determina que essa formação deve se dar em função da composição dos blocos e partidos na segunda quinzena do mês de fevereiro. Chamo a atenção do nosso consultor para isso. Dessa forma, nós teremos 13 membros. Teríamos então 3 indicados, e não apenas 2”, disse.

Após a declaração em plenário, Marinho disse em entrevista coletiva que o PL não indicará membros à CPMI até que a questão de ordem seja respondida.

A posição de Marinho foi vista como um indicativo de arrependimento da oposição em ter pressionado tanto pela CPMI do 8 de janeiro. Esse foi o entendimento de integrantes de parlamentares da base aliada do governo e do Centrão.

O senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo no Senado, manteve o argumento da base governista de que a oposição vai dar um “tiro no pé” ou “se arrepender” de ter insistido para a convocação da CPMI para apurar os atos golpistas.

 

Fonte: Correio Braziliense/GloboNews

 

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