No meio da
confusão, o Congresso voltará a debater os temas de interesse nacional
Fisiologismo,
nepotismo e patrimonialismo, cuja mais perfeita tradução é o chamado “orçamento
secreto”, fazem parte da pequena política que move o dia a dia do Congresso: as
disputas parlamentares por viagens e apartamentos; as articulações de
interesses privados, em detrimento das políticas públicas, nos seus corredores;
as intrigas de bastidor em disputas por verbas e cargos no governo; a perversa
subsunção dos partidos pelas suas bancadas.
Nesta
semana, tudo isso está em segundo plano, quiçá pelos próximos meses também,
porque os grandes interesses da sociedade voltaram à pauta. Por exemplo, a
Câmara, terça-feira. aprovou o pedido de urgência para a votação do projeto de
lei das fake news, que regula a atuação das chamadas big techs no Brasil.
A
matéria será votada diretamente no plenário da Câmara, na próxima semana,
depois de três anos de tramitação do projeto originário do Senado nas comissões
técnicas.
Essa
é a primeira agenda estratégica para a democracia brasileira em pauta no
Congresso. Um exemplo do que é a grande política trata da fundação e
conservação do Estado, da manutenção de determinadas estruturas
econômico-sociais ou sua destruição.
O
conceito de hegemonia do pensador italiano Antonio Gramsci é bastante
reconhecido, porque descreve como o Estado usa, nas sociedades ocidentais, seus
aparatos ideológicos para conservar o poder: a religião, a escola, os meios de
comunicação etc. No seu conceito de hegemonia, porém, o pleno exercício do poder
político está associado à liderança moral da sociedade.
Numa
leitura reacionária dessa abordagem, por essa razão, a extrema direita vê a
ciência, a educação e a cultura como ameaças, atua no sentido de neutralizar o
papel de cientistas, intelectuais e artistas na construção de uma sociedade
democrática, do desenvolvimento sustentável, do acervo técnico-científico e da
identidade cultural do país. Mesmo que para isso seja necessário recorrer à
força.
O
jornalista e cientista político da Universidade de São Paulo (USP) Oliveiros S.
Ferreira, já falecido, escreveu um livro sobre o conceito de hegemonia no qual
se remete à Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), que conflagrou a Europa.
Nela,
um pequeno grupo de 45 cavaleiros húngaros, com suas armaduras, durante seis
meses aterrorizou o condado de Flandres, a região flamenca da Bélgica. Repete
uma indagação de Gramsci sobre esse episódio: como o conseguiram? Como e por
que o grande número, mais forte, se submete ao pequeno?
Ideólogo
do pensamento conservador no Brasil, Oliveiros Ferreira foi um estudioso do
protagonismo dos militares na história republicana e crítico do castilhismo
golpista.
Num
artigo para o Estadão em 1988, intitulado “O reconhecimento da derrota”, ele
resgata uma carta do general Góes Monteiro ao jurista liberal Sobral Pinto, na
qual o então ministro da Guerra, em abril de 1945 — ou seja, pouco antes do fim
do Estado Novo —, reconhece a derrota do “partido fardado” diante de uma nação
“que não compreendia e que nunca poderia compreender”. Segundo ele, porque
trouxera da Escola Militar “um modelo de tirania esclarecida”.
“Eu
reclamava poder, ordem, disciplina e ardor para, em 10 anos pelo menos, como
recorda V.Exa., preparar a nova elite e poder modificar as condições de
ignorância e miséria das massas, responsáveis pelo aviltamento da prática
constitucional”, lamentava o general do Estado Novo.
O
ex-presidente Bolsonaro tentou mobilizar seus cavaleiros húngaros três vezes,
no 7 de Setembro de 2019, no dia da diplomação do presidente Lula da Silva e no
8 de janeiro. Em nenhuma delas conseguiu que as Forças Armadas vestissem as
armaduras.
A
propósito, é bom lembrar que 8 de janeiro foi o resultado do uso das redes
sociais como instrumento de mobilização para a tomada do poder, com uso
generalizado de fake news e emprego de violência na ocupação dos palácios dos
Poderes da República.
Esse
episódio serviu para desconstruir uma visão política glamourosa e idílica das
redes sociais e da internet como ferramentas avançadas e absolutas da
participação no jogo democrático. Pelo contrário, a utilização perversa de
algoritmos tem servido para embaralhar a consciência cívica e enfraquecer a
democracia, além de fomentar a violência, inclusive entre crianças e
adolescentes. É preciso mais compromisso das big techs com a ordem democrática
e a construção de um ambiente social mais saudável.
Governo Lula negocia acordo e tenta
evitar “racha” entre aliados para controlar CPMI
Preocupado
com o risco de um racha entre aliados na CPMI dos Atos Golpistas, o governo
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai buscar negociar um acordo na escolha do
presidente e do relator da comissão – que foi criada nesta quarta-feira (26) e
pode ser instalada na próxima quarta-feira (3).
Os
dois postos são disputados por apoiadores de Lula na Câmara e no Senado,
colocando em campos opostos os grupos do presidente da Câmara, Arthur Lira
(PP-AL), e do senador Renan Calheiros (MDB-AL).
A
presidência da CPMI ficará com um deputado. Os mais cotados são Arthur Maia
(União Brasil-BA) e o líder do PP na Câmara, André Fufuca (PP-MA).
Já
a relatoria, também importante, deve ficar nas mãos de um senador. E aqui, o
mais cotado para assumir o posto é Renan Calheiros, rival de Lira na política
alagoana.
Uma
saída negociada para evitar esse embate seria indicar outro senador do MDB –
por exemplo, o líder do partido no Senado, Eduardo Braga (AM).
Segundo
articuladores políticos de Lula, o Planalto tenta traçar uma estratégia para
evitar que esses dois grupos, hoje próximos do governo, criem um racha na CPMI
antes mesmo do início dos trabalhos.
O
problema, até o momento, é que o Senado não aceita que o grupo de Arthur Lira
estabeleça um “veto” ao nome de Renan Calheiros.
Por
outro lado, o governo considera vital que presidente e relator da CPMI
trabalhem afinados, em conjunto. O medo é que as divergências levem a alianças
pontuais entre membros do “grupo de Lira” e da oposição.
A
instalação da CPMI deve acontecer na próxima semana, depois que os líderes
partidários indicarem os 32 membros da comissão. Antes mesmo da primeira
sessão, porém, governistas e oposição já definiram seus objetivos.
Os
governistas vão focar no enfraquecimento do ex-presidente Jair Bolsonaro. Já a
oposição vai mirar no ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
Gonçalves Dias e no ministro da Justiça, Flavio Dino.
O
governo não queria a CPMI, mas agora diz que vai até o fim – principalmente
depois de encaminhar a formação de uma maioria na comissão. Já os
oposicionistas querem ganhar no discurso, ou seja, na base do grito, para
desgastar o presidente Lula. A estratégia é focar no fato de os atos golpistas
terem ocorrido já com Lula no governo, e bater na tecla de que a
responsabilidade pela existência dos atos de vandalismo é do governo atual.
PL ameaça não indicar nomes à CPMI dos
atos golpistas, mas é conversa fiada
Uma
manobra regimental do governo para conseguir mais uma indicação à Comissão
Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas de 8 de janeiro gerou
insatisfação nos parlamentares da oposição. O requerimento de instalação da
CPMI foi lido nesta quarta-feira (26/4) pelo presidente do Congresso, Rodrigo
Pacheco (PSD-MG). Ao todo, 30 parlamentares — 15de cada Casa — vão compor a CPI
mista, além do presidente e do relator.
Na
noite de terça-feira (25), o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do
governo no Congresso, saiu do Bloco Parlamentar Democracia (MDB, União Brasil,
Podemos, PDT, PSDB), que tinha 30 senadores, e foi para o Bloco Parlamentar da
Resistência Democrática (PT, PSD, PSB e agora Rede), de 28 integrantes. Com a
alteração, ambas formações suprapartidárias passaram a ter 29 parlamentares.
Agora,
o Bloco de MDB e União segue tendo o direito de indicar seis senadores, mas a
ala de PT e PSD, que antes tinham o direito de indicar cinco senadores, passa a
poder indicar seis integrantes. A distribuição das vagas em comissões dentro do
Congresso é feita pela proporcionalidade de blocos e partidos. Com a formação
atual, o governo deve ter 12 parlamentares em sua base.
Além
da maioria, o governo ainda articula para ter aliados na relatoria e na
presidência da CPMI. Na Câmara os nomes cotados são André Fufuca (PP-MA) e
Arthur Maia (PP-BA). No Senado, Renan Calheiros (MDB-AL) é o favorito para
assumir a mesa e o correligionário Eduardo Braga (MDB-AM) também é cotado.
Além
de dar mais uma vaga ao governo, a manobra de Randolfe acabou tirando uma vaga
do Bloco Parlamentar Vanguarda (PL e Novo). Com isso, o bloco terá apenas duas
indicações e não mais as três iniciais. A outra indicação ficará com o Bloco
Parlamentar Aliança, formado por PP e Republicanos. A medida foi criticada pelo
líder da oposição no Senado Federal, Rogério Marinho (PL-RN), que fez uma
questão de ordem a Rodrigo Pacheco.
“Ocorre,
Sr. Presidente, que, dentro da especificidade da norma e da hierarquia, existe
uma norma de 2006 que rege inclusive a CMO que determina que essa formação deve
se dar em função da composição dos blocos e partidos na segunda quinzena do mês
de fevereiro. Chamo a atenção do nosso consultor para isso. Dessa forma, nós
teremos 13 membros. Teríamos então 3 indicados, e não apenas 2”, disse.
Após
a declaração em plenário, Marinho disse em entrevista coletiva que o PL não
indicará membros à CPMI até que a questão de ordem seja respondida.
A
posição de Marinho foi vista como um indicativo de arrependimento da oposição
em ter pressionado tanto pela CPMI do 8 de janeiro. Esse foi o entendimento de
integrantes de parlamentares da base aliada do governo e do Centrão.
O
senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo no Senado, manteve o argumento
da base governista de que a oposição vai dar um “tiro no pé” ou “se arrepender”
de ter insistido para a convocação da CPMI para apurar os atos golpistas.
Fonte:
Correio Braziliense/GloboNews
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