sexta-feira, 28 de abril de 2023

Bancada evangélica tenta mudar PL das Fake News por im(p)unidade em 'liberdade religiosa'

A bancada evangélica na Câmara dos Deputados quer inserir no projeto de lei das Fake News uma garantia de que conteúdos postados por esses religiosos e seus fiéis não sejam derrubados por plataformas por serem considerados ofensivos à população LGBTQIA+.

Lideranças evangélicas se reuniram nesta quarta-feira (26) com o relator do projeto, Orlando Silva (PC do B-SP), para negociar uma maneira de inserir o dispositivo no texto.

Ao mesmo tempo, articulam com a oposição uma manobra para barrar essa proposta e colocar em seu lugar uma outra, do deputado Mendonça Filho (União Brasil-PE), protocolada na última terça (25) e que é vista como mais alinhada aos interesses da bancada.

Elas avaliam que a ausência de menção à liberdade religiosa no texto traz risco grave à divulgação de suas crenças em redes sociais, ao tornar as plataformas "corresponsáveis" por postagens de usuários e ao abrir brecha para que elas retirem do ar conteúdo considerado intolerante por algum segmento social.

Reservadamente, deputados da bancada evangélica citam, por exemplo, trechos do livro Gênesis, da Bíblia, que mencionam a criação do homem e da mulher e falam que eles devem se reproduzir.

O discurso costuma ser usado por líderes religiosos --não só evangélicos-- para rejeitar a possibilidade de relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo.

O temor dos parlamentares é que manifestações em redes sociais citando trechos e afirmações da Bíblia possam ser denunciados e retirados do ar pelas plataformas, diante do temor da aplicação de sanções previstas no projeto relatado por Orlando Silva.

Na última versão do texto, há apenas uma menção genérica à questão religiosa.

"As vedações e condicionantes previstos nesta Lei não implicarão restrição ao livre desenvolvimento da personalidade individual, à livre expressão e à manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural, nos termos dos arts. 5º e 220 da Constituição Federal", afirma o relatório.

O documento, no entanto, ainda não está em sua versão final e irá sofrer alterações antes que seja colocado no plenário.

O segmento levanta dúvidas também sobre a atuação da entidade autônoma de regulação, que, avalia, poderia barrar conteúdos religiosos.

Se não tiver o pleito acatado pelo relator, a bancada articula para que o projeto seja rejeitado na terça-feira (2), quando está prevista a votação do mérito em plenário.

Partidos como o Republicanos, ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, avaliam se posicionar contra o texto, desidratando boa parte dos votos que permitiram a aprovação da urgência na última terça (25). Dos 238 votos favoráveis ao requerimento, 28 vieram da legenda.

A bancada evangélica é historicamente contrária à criminalização da homofobia e barrou todas as ações neste sentido no Congresso. A equiparação do ato ao crime de racismo só ocorreu por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

No lugar do projeto relatado por Orlando Silva, a bancada quer votar o texto do deputado Mendonça Filho (União Brasil-PE), protocolado na última terça como alternativa à proposta apoiada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O projeto cria o marco das plataformas digitais para garantir liberdade, responsabilidade e transparência na internet, além de assegurar direitos dos usuários na internet, "incluindo proteção integral e prioritária das crianças e adolescentes."

O texto, também apoiado pela oposição, explicita que as vedações e condicionantes não implicarão "qualquer restrição à liberdade de religião ou de crença, sendo garantido que todos os usuários tenham assegurada sua liberdade para expressar suas crenças religiosas".

A proposta de Mendonça Filho traz como fundamento a "proteção dos direitos fundamentais de liberdade de manifestação do pensamento, de expressão, de imprensa, privacidade e acesso à informação", em linha com a narrativa de deputados da oposição, que afirmam que o parecer de Orlando Silva caminha no sentido de restringir esses pontos -algo que o relator nega.

Na sessão em que foi aprovada a urgência, Orlando Silva defendeu a necessidade de uma regra para garantir a liberdade de expressão de todos na internet. "A liberdade de expressão está fortalecida com a definição de um processo em que o próprio usuário poderá contestar quando se sentir prejudicado."

Para assegurar a votação do texto de Mendonça Filho, deputados da oposição pretendem apresentar um requerimento para que o projeto do parlamentar da União Brasil seja votado preferencialmente em relação ao de Orlando Silva.

Além de rejeitar um projeto que consideram ruim, a intenção é imprimir uma derrota ao governo Lula, que ainda tenta consolidar uma base no Congresso.

Nesta quarta, o relator percorreu bancadas para negociar ajustes ao seu texto, em especial um dos pontos criticados, a criação de uma entidade autônoma de redes sociais.

A expectativa é que o parecer seja finalizado nesta quinta (27), para dar tempo de que ocorram as últimas negociações antes da votação do mérito.

O placar apertado da urgência, no entanto, faz com que parlamentares avaliem que a votação possa ser adiada, diante do risco de uma derrota do texto.

Lembram que alguns que votaram a favor da urgência não necessariamente aprovariam o mérito da proposta. Além disso, o quórum da votação foi considerado baixo -431 de 513 deputados-, elevando o perigo de surpresas negativas para o governo.

 

Ø  Veja os principais pontos do relatório sobre o projeto de combate às fake News

 

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) protocolou na noite da quinta-feira (27), na Câmara, seu parecer sobre o projeto de combate às fake news.

Em linhas gerais, o texto cria regras para criminalizar a divulgação de conteúdo falso e responsabilizar as redes por irregularidades cometidas em seus ambientes virtuais. A previsão na Câmara é votar o projeto na semana que vem.

<<<< Veja os principais pontos:

·         Responsabilidade das empresas

O texto afirma que os provedores serão responsáveis de forma solidária pela reparação dos danos causados por conteúdos gerados por terceiros cuja distribuição tenha sido realizada mediante pagamento ao provedor.

·         Transparência

O projeto de lei prevê também que o provedor e as plataformas devem requerer a identidade, por meio de apresentação de documento, de todos os anunciantes de publicidade de plataforma e de impulsionamento.

·         Remuneração de conteúdo jornalístico

Um dos pontos defendidos pelo relator é a remuneração da atividade jornalística pelas plataformas digitais. Ou seja, que as plataformas digitais paguem pelo uso de conteúdo produzido por empresas jornalísticas e profissionais do setor.

·         Liberdade de expressão

O relatório também deixa claro que a liberdade de expressão é direito fundamental dos usuários dos provedores e que as proibições presentes não lei não podem restringir:

  • o livre desenvolvimento da personalidade individual;
  • a livre expressão;
  • a manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural.

·         Representação no Brasil

O relator também estabelece que as redes sociais tenham representação no Brasil, para serem acionadas judicialmente e administrativamente, quando for o caso.

·         Crianças e adolescentes

Pelo texto, as redes devem tirar imediatamente do ar conteúdos que violem direitos de crianças e adolescentes.

·         Imunidade parlamentar

O relatório estende para o ambiente das redes sociais a imunidade parlamentar. Ou seja, deputados e senadores não podem ser punidos por expressar opinião.

·         Contas-robô

O relator propôs que o projeto criminalize a divulgação de conteúdos falsos por meio de contas automatizadas, as chamadas contas-robô.

·         Retirada de entidade fiscalizadora

O relator, no entanto, retirou do parecer a criação de uma entidade autônoma fiscalizadora, que funcionaria como uma espécie de agência reguladora.

Ele afirmou que a ideia não foi bem aceita dentro da Câmara, mas que vai buscar uma alternativa até a a semana que vem para constar no texto quem deverá fazer a fiscalização das regras.

·         O que dizem as redes

Em nota, a Meta, dona do Facebook, disse que não permite atividades fraudulentas, e que é preciso um debate amplo para garantir uma lei que melhore, e não piore a internet.

E em uma carta aberta, o Google disse que trabalha diariamente para enfrentar essas questões, mas que o projeto de lei pode trazer riscos à segurança dos usuários, e merece mais espaço de discussão e debate.

Na semana passada, um conjunto de associações que representam empresas de jornalismo divulgou um manifesto em que defendeu o PL das Fake News. Segundo as empresas, o projeto é necessário "diante dos efeitos dramáticos da desinformação e do discurso de ódio" na sociedade.

Afirmou ainda que a valorização do jornalismo profissional serve como "antídoto a essa epidemia social".

"Como já ocorre em outros países, a remuneração da atividade jornalística por plataformas de tecnologia pode ser um elemento decisivo para a formação de um ecossistema jornalístico amplo, diverso e saudável, capaz de se opor à difusão da desinformação e dos discursos de ódio. Tal ecossistema é essencial para a manutenção da própria democracia", afirmam as empresas no manifesto.

 

Fonte: FolhaPress/g1

 

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