quinta-feira, 3 de abril de 2025

Twitter Files Brazil: X indenizou advogado exposto no vazamento coordenado por Elon Musk

O X, empresa de Elon Musk, teve que pagar indenização por danos morais no valor de mais de R$ 500 mil a um ex-funcionário pelo vazamento de seus emails. É o que demonstram documentos relativos ao processo que foi aberto na 85ª Vara do Trabalho de São Paulo, obtidos pela Agência Pública. A demanda foi resolvida através de um acordo, assinado em 24 de junho de 2024, que reconhece a violação aos direitos do ex-conselheiro legal sênior da empresa no Brasil.   

O advogado Rafael Batista trabalhou durante dois anos e meio no X – à época, Twitter –, mas deixou o posto em janeiro de 2022, meses antes da compra da rede social por Musk, que ocorreu em outubro daquele ano. 

Em 3 de abril de 2024, 24 emails, sendo muitos de autoria de Batista, foram publicados no X pelo ativista norte-americano Michael Shellenberger em um fio que atingiu mais de 30 milhões de visualizações. Reportagens com base nesse mesmo email foram publicadas em vários sites brasileiros. 

Batista foi o principal nome do Twitter Files Brazil, uma versão brasileira do vazamento de emails internos do Twitter coordenado por Musk quando comprou o Twitter. Ao publicar os 24 emails, Shellenberger alegou que eles comprovaram que Alexandre de Moraes e “outros funcionários do governo” ameaçaram “processar criminalmente o advogado do Twitter” – o que era mentira. A alegação foi desmentida por jornais e agências de checagem, e o próprio Shellenberger teve que voltar atrás. 

<><> Por que isso importa?

  • O Twitter Files Brazil foi uma ação coordenada que envolveu Elon Musk e membros da extrema direita do Brasil e EUA para atacar o Supremo Tribunal Federal e tentar descredibilizar o ministro Alexandre de Moraes.

Segundo os documentos do processo trabalhista analisados pela Pública, o ex-conselheiro legal alegou que a empresa vazou os emails de maneira “potencialmente proposital” para “colocar em xeque a atuação do Judiciário brasileiro”, o que poderia manchar sua reputação profissional. 

“A esse respeito, cumpre destacar que dezenas de e-mails enviados pelo requerente entre os anos de 2020 e 2021 (durante a vigência do contrato de trabalho) serviram de base para construção de narrativa equivocada, que não condiz com a realidade vivida à época pelo requerente e seus colegas de trabalho.” 

O processo nota que ou a empresa vazou os dados do ex-empregado ou falhou ao protegê-los. Além disso, segundo os documentos, Batista teve seus dados pessoais expostos, ao contrário do que ocorreu com outros funcionários, que tiveram seus nomes tarjados nos emails do Twitter Files Brazil.

Como resultado da exposição, Batista teve um agravamento do quadro de depressão e transtorno de ansiedade, segundo os documentos.

A demanda tramitou sob segredo de justiça, a pedido dos advogados de Batista. Mas a tramitação foi rápida: em apenas dois meses, a X Brasil Internet Ltda. havia concordado em pagar a indenização. 

A Pública procurou Batista, que não respondeu aos questionamentos da reportagem, mas confirmou que houve “composição entre as partes com finalidade indenizatória”. “Em respeito à confidencialidade do processo, não poderei me manifestar sobre o conteúdo discutido nos autos, tampouco sobre os valores ou demais detalhes do acordo celebrado”, escreveu em nota. 

A Pública procurou também o X através da sua representante legal Rachel Villa, em email informado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), mas não recebeu resposta até o fechamento desta reportagem. Procurou também a Public Policy Manager Gabriela Salomão, em email disponibilizado por ela durante palestra recente em evento do Partido Liberal (PL), mas igualmente não houve resposta. Finalmente, entrou em contato com o advogado que representou a empresa no processo, sem resposta. O espaço continua aberto.

  • O que diz o processo 

Segundo os documentos analisados pela Pública, o X violou pelo menos duas cláusulas do acordo de rescisão contratual de Batista quando ele saiu do trabalho. Nele, a empresa se comprometia a manter sigilo sobre informações do ex-funcionário. Além disso, o X deveria prover assistência legal gratuita em causas judiciais relacionadas à sua atuação na empresa – o que não foi feito no caso do Twitter Files Brazil. 

A ação trabalhista argumenta que Batista ficou nacionalmente conhecido pelo vazamento operado “de maneira absolutamente lesiva”, uma vez que “suas mensagens foram utilizadas para construir uma narrativa falsa, voltada a manchar a imagem do Poder Judiciário brasileiro”. Nota, ainda, que as postagens relacionadas ao seu nome ficarão online por período indeterminado. 

Além disso, o vazamento “reviveu, de maneira absolutamente desleal, situação altamente traumatizante ocorrida durante a relação de emprego”. 

Trata-se de uma investigação criminal aberta pelo Gaeco, grupo que investiga organizações criminosas no Ministério Público de São Paulo, contra o próprio Batista em 2021, pela negativa do Twitter em entregar dados de um usuário supostamente ligado ao PCC.  

“Não há nos e-mails qualquer imputação do requerente a um risco institucional à democracia, ou mesmo à quebra de parcialidade e perseguição de determinado grupo político. Além do mais, como reiterado em diversas oportunidades, o requerente não tem condições de atestar, atualmente, a higidez das mensagens”, diz a demanda.   

  • O papel de Elon Musk 

Um dos pontos centrais do processo trabalhista é o fato de que grande parte dos emails tratava justamente da investigação feita pelo Gaeco, e não pelo STF. As investigações “sem conexão direta com a narrativa de fatos ocorridos no STF ou no TSE, que sustentariam as alegações de ameaça à democracia” representariam um uso dos emails “de maneira objetivamente equivocada”.

O processo ainda reforça o papel de Musk ao disseminar as mensagens. Reitera, por exemplo, que Musk retuitou em 8 de abril de 2024 uma matéria em inglês do site Not the Bee que afirmava que o governo brasileiro sob Lula fez pressões sobre a rede de Musk “para censurar seus próprios cidadãos em direta violação à Constituição”. Musk acrescentou que a reportagem seria “precisa”. 

Segundo o processo trabalhista, “o impulsionamento foi agravado, ainda, por uma clara tentativa de embate entre o dono do X e o Poder Judiciário brasileiro, inclusive com ameaças diretas de encerramento das operações no Brasil e descumprimento de ordens judiciais”. 

Pela visibilidade alcançada pelos posts de Shellenberger e Musk, o ex-funcionário alega na petição ter sido alvo de achaques na rede social – há um exemplo, inclusive, de uma postagem dizendo “esse Rafael Batista será encontrado suicidado com 10 tiros na nuca”. O advogado teve que passar por acompanhamento de profissionais da área médica. 

“A própria empregadora impulsionou, dolosa e ostensivamente, as mensagens divulgadas a partir do vazamento, inclusive confirmando a veracidade das comunicações”.  

A divulgação dos chamados “Twitter Files Brazil” motivou subsequentes ataques de Musk à democracia brasileira, altamente reproduzidos pelo campo bolsonarista.  

Após os ataques do bilionário, Moraes o incluiu no inquérito das fake news. A seguir, Jair Bolsonaro divulgou um vídeo de encontro com o bilionário e afirmou que “Elon Musk é o mito da nossa liberdade”.

 

¨      Os polêmicos cheques de US$ 1 milhão que Elon Musk distribui a eleitores antes de votação em Estado americano

O bilionário Elon Musk distribuiu cheques de US$ 1 milhão (cerca de R$ 5,8 milhões) a eleitores de Wisconsin, nos Estados Unidos, depois que a Suprema Corte do Estado se recusou a intervir.

Musk anunciou o prêmio no início da semana passada, às vésperas da acirrada eleição para a Suprema Corte de Wisconsin, que será realizada nesta terça-feira (1/4). Nos EUA, esses cargos na Justiça são apontados em eleições.

O procurador-geral de Wisconsin, o democrata Josh Kaul, havia entrado com um processo para impedir a distribuição, argumentando que Musk estava violando uma lei estadual que proíbe dar presentes em troca de votos.

A disputa, que pode transferir o controle da Suprema Corte do Estado para os republicanos, se tornou um ponto de tensão — e a eleição judicial mais cara da história americana.

Em um comício na noite de domingo (30/3), Musk disse que "queremos apenas que os juízes sejam juízes", antes de entregar dois cheques de US$ 1 milhão a eleitores que haviam assinado uma petição para impedir juízes "ativistas".

Kaul havia tentado argumentar que a doação era uma tentativa ilegal de comprar votos. Os advogados de Musk, em resposta, alegaram que Kaul estava "reprimindo o discurso político de Musk, e cerceando seus direitos da Primeira Emenda".

Os advogados de Musk acrescentaram que os pagamentos eram "destinados a gerar um movimento de base em oposição a juízes ativistas, e não a advogar especificamente a favor ou contra qualquer candidato".

Depois que dois tribunais de instâncias inferiores deram razão a Musk, Kaul fez um apelo de última hora à Suprema Corte do Estado para impedir os pagamentos. Mas o tribunal se recusou, por unanimidade, a ouvir o caso.

Musk e o presidente americano, Donald Trump, apoiam um candidato conservador, o juiz do condado de Waukesha, Brad Schimel, na esperança de mudar o controle do tribunal de tendência liberal.

O juiz Schimel está concorrendo com a juíza do condado de Dane, Susan Crawford, que tem o apoio dos juízes liberais da Suprema Corte do Estado.

Os advogados do bilionário do setor de tecnologia também argumentaram que os juízes que endossaram publicamente a juíza Crawford na disputa pela Suprema Corte deveriam ser impedidos de decidir sobre o assunto, alegando que se trata de uma questão de parcialidade.

A disputa pela Suprema Corte de Wisconsin está sendo vista por analistas políticos como uma espécie de referendo sobre o segundo mandato de Trump, apenas alguns meses após sua posse.

Também precede casos importantes que vão chegar ao tribunal sobre direito ao aborto, divisão de distritos eleitorais e regras de votação que podem afetar as eleições de meio de mandato de 2026.

O próprio Musk considerou a eleição como uma chance de impedir a redistribuição dos distritos eleitorais que poderia favorecer os democratas no Congresso.

Ele doou US$ 14 milhões para a campanha do juiz Schimel, no que está se revelando ser a corrida eleitoral judicial mais cara da história do país, com US$ 81 milhões em gastos no total.

Apesar do apoio, o juiz Schimel pareceu se distanciar de Musk nos últimos dias, dizendo ao jornal Milwaukee Journal Sentinel na sexta-feira que não tinha planos de comparecer ao comício em que Elon Musk distribuiu os cheques.

"Não tenho ideia do que ele está fazendo. Não tenho ideia do que seja este comício", afirmou o juiz Schimel ao jornal.

Esta não é a primeira vez que Musk anunciou um prêmio para os eleitores. No ano passado, ele também ofereceu sortear US$ 1 milhão por dia em dinheiro aos eleitores de Wisconsin e de seis outros Estados decisivos para a eleição presidencial de novembro, se eles assinassem uma petição de apoio aos direitos da Primeira e Segunda Emendas.

Mais tarde, um juiz da Pensilvânia decidiu que a distribuição era legal, argumentando que os promotores não conseguiram provar que se tratava de uma loteria ilegal.

Musk se tornou um dos aliados mais próximos do presidente Donald Trump, tendo financiado sua campanha presidencial de 2024 com centenas de milhões de dólares. Ele agora chefia o controverso Departamento de Eficiência Governamental (Doge, na sigla em inglês), encarregado de cortar os gastos do governo federal, que já promoveu demissões em massa de funcionários públicos.

O homem mais rico do mundo, que é CEO da Tesla e da SpaceX, também interveio na política no exterior, fazendo uma aparição em vídeo em um comício do partido de direita radical Alternativa para Alemanha (AfD) antes da eleição parlamentar no país. E lançou ataques online contra políticos britânicos, incluindo o primeiro-ministro, Keir Starmer, e foi acusado de incitar violentos protestos anti-imigração que abalaram o Reino Unido no ano passado.

Após essas polêmicas, e depois do controverso gesto de Musk com o braço levantado após a posse de Trump em 20 de janeiro — que muitos interpretaram como uma saudação fascista —, imagens de carros e concessionárias da Tesla vandalizados com pichações contra o homem mais rico do mundo têm circulado nas redes sociais.

Houve protestos do lado de fora de dezenas de concessionárias da Tesla, não apenas nos EUA, mas também no Canadá, no Reino Unido, na Alemanha e em Portugal.

Além disso, vários proprietários de Tesla decidiram se desfazer de seus veículos devido ao crescente perfil politizado de Musk, conforme depoimentos publicados na imprensa europeia e americana.

 

Fonte: Por Natalia Viana, da Agencia Pública/BBC News

 

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