Por
que é melhor evitar produtos de higiene infantil que contêm perfume
Estudos científicos já comprovaram que o
cheirinho de bebês recém-nascidos produz grande quantidade do hormônio
dopamina, causando o mesmo efeito de recompensa e satisfação que ocorre com a
comida, tabaco ou drogas, no caso de pessoas viciadas nas substâncias. Mas se
esse aroma é tão bom, por qual razão as empresas de cosméticos e de artigos de
higiene insistem em desenvolver produtos com fragrância destinados a esse
público?
A
resposta está na questão cultural que, principalmente no Brasil, tem relação
muito forte com a utilização de perfumes. Mas, ao fomentar essa tradição, os
pais podem acabar expondo desnecessariamente os filhos a elementos causadores
de efeitos colaterais como alergias e dermatites, entre outras consequências
nocivas para a saúde.
Um
estudo desenvolvido por pesquisadoras do Departamento de Pediatria da
Universidade Federal do Paraná (UFPR) analisou 398 rótulos de cosméticos
infantis do mercado brasileiro buscando a presença de perfume ou fragrância
entre os ingredientes. A conclusão, publicada em artigo no Jornal de Pediatria,
mostra que mais de 70% dos rótulos apresentavam as substâncias, que apareceram
em 90% dos xampus e em 79% dos lenços umedecidos.
Além
desses produtos, foram analisadas embalagens de sabonetes líquidos, sabonetes
em barra, condicionadores, hidratantes, cremes para prevenção de assaduras,
protetores solares e repelentes, todos indicados para uso infantil.
• Norma não obriga indústria a detalhar
composição do “parfum”
O
perfume, na maioria das vezes descrito como “parfum”, é uma mistura de
substâncias não reveladas pelo fabricante — pois esta não é uma exigência da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) —, que pode conter
ingredientes com potencial para ocasionar danos a quem o utiliza.
A
dermatite de contato é uma das doenças que pode ser causada pelo uso dessas
substâncias. “Os ingredientes que compõem os perfumes são muito variados, mas
muitos deles estão evidentemente associados à dermatite de contato na criança e
no adulto e esta é uma doença que tende a ser pior quanto mais precoce for o
contato”, revela Marjorie Uber, primeira autora do artigo, à Ciência UFPR.
A
professora Vânia Oliveira de Carvalho, que também coordena o curso de
especialização em dermatologia pediátrica da UFPR, explica que as crianças têm
uma pele mais fina e com uma barreira cutânea menos efetiva, o que facilita a
penetração de substâncias que causam sensibilização.
“Por
este motivo, crianças devem ter menos contato com substâncias com potencial
sensibilizante”.
Estatísticas
mostram que os casos de dermatite de contato alérgica, antigamente raros em
crianças, aumentaram em número de diagnósticos nas últimas décadas e que a
sensibilização está ocorrendo principalmente ao longo dos três primeiros anos
de vida.
Por
isso, a recomendação das especialistas é evitar cosméticos com fragrância
sintética como uma atitude que deve perdurar por toda a vida, não apenas na
infância.
“Não
existe uma idade em que eles se tornem mais seguros, sobretudo pelo fato de o
seu uso ser frequente, por anos, e os efeitos nocivos podem ocorrer após anos
de absorção cutânea destes ingredientes”, afirma Marjorie.
Dessa
forma, os responsáveis por crianças devem usar o bom senso para escolher os
produtos de higiene, seguindo a recomendação de não deixar de lado produtos
importantes à saúde, como repelentes (que podem ser usados a partir dos três
meses de vida) e protetores solares (a partir dos seis meses).
“A
questão é que assim: dentre um pool de lenços umedecidos, por exemplo, há
produtos sem fragrância com mesmo valor de outros com. Mas as pessoas
simplesmente não se atentam a isso”, avalia Marjorie.
• Aos pais, resta prestar atenção aos
rótulos e cortar produtos desnecessários
Outra importante
orientação é ler os rótulos dos produtos antes de adquiri-los e evitar artigos
que apresentem “parfum” na descrição, pois não é possível saber quais
substâncias de fato estão na fórmula.
“Alguns
ingredientes de fragrância, como ‘Linalool’ e ‘Limonene’, são adicionados às
formulações para conferir cheiro agradável. Isso pode enganar o consumidor,
pois são ingredientes específicos e, nestes casos, eles estarão descritos deste
modo e não como ‘parfum’”, acrescenta a pesquisadora.
Cosméticos
descritos como sendo de origem natural ou contendo óleos essenciais também
devem ser analisados criticamente. “Podem apresentar os mesmos riscos para a
saúde do que produtos sintéticos”, aconselha Kerstin Taniguchi Abagge, também
professora de Pediatria na UFPR.
Ela
ressalta que buscar informações de fontes confiáveis é a principal forma de se
resguardar.
“Sites
como o da Sociedade Brasileira de Pediatria trazem vários documentos
científicos para os profissionais da saúde e para os pais. Mas, obviamente, as
indústrias estão atentas a isso, mudando a formulação dos seus produtos,
utilizando menos corantes, surfactantes menos agressivos, menos perfumes e
menor quantidade de substâncias irritantes”.
• Para as pediatras, regulamentação
deveria ser mais rigorosa
As
pesquisadoras reivindicam a obrigatoriedade da descrição de todos os
ingredientes e concentrações que compõem o termo “parfum”, além de uma
regulamentação mais rígida, exigindo estudos que provem a ausência de risco
carcinogênico ou efeito hormonal antes da liberação de um ingrediente cosmético
para uso infantil.
Avaliam
que as regulamentações sobre cosméticos infantis costumam diferir das
regulamentações para adultos e, apesar de serem baseadas em conhecimentos
científicos atuais, esses estudos ainda são limitados no que diz respeito aos
efeitos dos ingredientes cosméticos.
“São
necessários estudos que demonstrem, de forma categórica, quais são os efeitos
efetivos dessas substâncias na saúde do ser humano, especificamente das
crianças. Respostas a perguntas que envolvam quais concentrações, qual o tempo
de exposição preciso para que esses efeitos aconteçam, se a exposição a longo
prazo é prejudicial e quais seriam os efeitos cumulativos são importantes para
a regulamentação desses produtos”, avalia Kerstin, que também enxerga como
primordial a conscientização da população em relação ao uso indiscriminado de
produtos de higiene e cosméticos nessa faixa etária.
Fonte:
Por Jéssica Tokarski – Ciência UFPR/eCycle

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