3 fatores que podem estar por trás da
decisão de Musk e X de cumprir determinações de Moraes
A rede social X
decidiu cumprir todas as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o
novo advogado apontado para representar a empresa processualmente.
"A empresa
decidiu cumprir com todas as determinações judiciais", disse à BBC News
Brasil o criminalista Sérgio Rosenthal.
"Isso será
esclarecido, ainda, ao ministro. E, inicialmente, o importante é regularizar a
situação da empresa no Brasil", acrescentou.
Isso representa
mudança de postura da empresa após uma longa disputa com o STF que culminou no
bloqueio da plataforma do bilionário Elon Musk no país.
O X retirou do ar
contas que o ministro Alexandre de Moraes determinou que fossem suspensas, que
já não estão disponíveis no Brasil nesta quinta-feira (19/9).
Por uma decisão do
ministro do STF, a rede social teve seu funcionando suspenso no país em 31 de
agosto.
Mas a plataforma
voltou a funcionar na quarta (18/9) após uma mudança técnica que teria
"driblado" os bloqueios impostos pelos provedores de telefonia e
internet do Brasil.
Após a reviravolta, a
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) afirmou "a conduta da rede X
demonstra intenção deliberada de descumprir a ordem do STF".
Alexandre de Moraes
também multou a plataforma em R$ 5 milhões por dia pelo que classificou como
uma "dolosa, ilícita e persistente recalcitrância" em desobedecer às
determinações.
Em nota, porém, o X
afirmou que restauração foi involuntária e tentou mostrar espírito de
colaboração. "Continuamos os esforços para trabalhar com o governo
brasileiro para que ela retorne o mais breve possível para o povo
brasileiro", disse a plataforma na quarta.
A suspensão da
plataforma no Brasil no fim de agosto foi determinada pela Justiça após o X
anunciar que não acataria uma decisão anterior da Corte, que determinava o
bloqueio de determinadas contas que, segundo inquérito brasileiro, disseminavam
fake news e discurso de ódio.
Além disso, a empresa
fechou seu escritório e deixou de nomear um representante legal no país. As
leis brasileiras exigem que um representante legal seja indicado.
Elon Musk chegou a
acusar Moraes de ser "um juiz falso e não eleito" e afirmou que a
decisão do STF fere o direito à liberdade de expressão.
Mas as últimas
informações parecem indicar uma mudança de tom. Afinal, o que pode ter levado a
essa alteração posição do X e de Musk?
Especialistas
consultados pela BBC News Brasil apontam três motivos que podem estar por trás
disso.
• Esgotamento de recursos
O advogado
constitucionalista Felipe Autran Dourado, da Autran Dourado Advocacia e
Consultoria, afirma que, do ponto de vista jurídico, todos os recursos
disponíveis para que a plataforma seguisse em sua recusa de cumprir as ordens
judiciais foram esgotados.
"Todos os
recursos fora a cooperação foram esgotados", disse. "Não se trata
mais de uma decisão individual do ministro Alexandre de Moraes, mas do STF por
meio de sua primeira turma", diz.
"Essa questão
chegou a um ponto em que se o X não tomar a atitude de cooperar, o bloqueio vai
continuar de forma definitiva", argumenta Dourado.
A decisão de manter a
suspensão determinada por Moraes foi confirmada pela primeira turma do tribunal
por unanimidade no início do mês.
Nos seus votos no
plenário virtual, os ministros justificaram por que concordam com a decisão de
Moraes de bloquear o X.
"A liberdade de
expressão é um direito fundamental que está umbilicalmente ligado ao dever de
responsabilidade. O primeiro não vive sem o segundo, e vice-versa, em recíproca
limitação aos contornos de um e de outro", disse o ministro Flávio Dino em
seu voto.
"Com a imperativa
moldura da soberania, não é possível a uma empresa atuar no território de um
país e pretender impor a sua visão sobre quais regras devem ser válidas ou
aplicadas."
Para Bruna Santos, da
Digital Action, uma organização global que advoga por melhores padrões digitais
dos governos e das Big Tech, a recente disputa em torno da volta ao ar da
plataforma também pode ter feito o X recuar.
O retorno da rede foi
possível graças a uma mudança técnica que teria "driblado" os
bloqueios impostos pelos provedores de telefonia e internet do Brasil.
Segundo a Associação
Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), o X passou a
usar endereços de IP vinculados a servidores da Cloudflare — ma empresa que
fornece serviços e pode atuar como um intermediário entre o servidor de um site
e o usuário —, e não mais a uma infraestrutura própria.
Ao fazer isso, o
bloqueio anteriormente feito pelas operadoras brasileiras passou a não surtir
mais efeito.
A rede social disse
que a mudança foi feita porque a infraestrutura para fornecer o serviço na
América Latina ficou inacessível para sua equipe após o bloqueio no Brasil.
Segundo a companhia, a
alteração causou uma "restauração involuntária e temporária do serviço
para usuários brasileiros".
Mas a resposta de
Moraes e da Anatel à violação do bloqueio pode ter pressionado o X, diz Bruna
Santos.
"Se de fato for
comprovada uma mudança de posição, eu diria que questão da reorganização dos
IPs possa ter escalonado ainda mais a situação a ponto do X dar uns passos para
trás", afirma.
• Pressão de investidores
Ainda segundo a
especialista da Digital Action, pode ter havido pressão por parte dos
investidores do X e de outras empresas ligadas a Musk por uma resolução do
conflito.
"A plataforma
ainda depende em algum nível de investidores e, claro, de sua imagem
pública", afirma.
Musk comprou o Twitter
em 2022 por US$ 44 bilhões. Segundo a revista Forbes, ele possui cerca de 74%
da empresa, agora chamada X.
"E tudo o que vem
acontecendo também não fez muito bem para a imagem da plataforma, que teve
também um êxodo considerável de anunciantes", completa Bruna dos Santos.
Uma pesquisa publicada
no início de setembro pela empresa dados Kantar, com base em entrevistas feitas
com 18.000 consumidores e 1.000 profissionais de marketing ao redor do mundo,
indicou que 26% dos profissionais da área estão planejando cortar gastos com
anúncios no X em 2025.
Segundo a análise,
esse recuo estaria ocorrendo em decorrência de preocupações sobre a associação
das marcas com conteúdos extremistas.
Felipe Autran Dourado
lembra ainda que outra empresa associada à Musk no Brasil, a Starlink, foi
afetada pelas decisões judiciais do STF.
A empresa do setor de
internet via satélite teve suas contas bancárias e ativos financeiros
bloqueados para pagamento de multas devidas pelo X à Justiça.
Temores de que as
atividades da Starlink no Brasil poderiam ser suspensas pelo STF também
circularam depois que a empresa não cumpriu em um primeiro momento as ordens
para impedir que seus clientes pudessem acessar a rede social de Musk a partir
das suas conexões via satélite.
A Starlink
posteriormente anunciou que estava cumprindo as ordens e a possibilidade de
suspensão do serviço de internet da empresa foi dissipada. Mas o mero receio de
que a companhia pudesse ser tirada do ar no Brasil deixou clientes e
especialistas preocupados.
Em pouco mais de dois
anos de operação, a empresa se transformou em líder no setor de internet via
satélite no país. Neste período, passou a ser fornecedora de importantes órgãos
públicos do governo federal como o Exército, a Marinha, os ministérios da Saúde
e Educação além da gigante Petrobras.
"O X e a Starlink
são duas empresas diferentes, apesar de Musk ser sócio de ambas", diz
Dourado. "Mas a Starlink está sendo prejudicada também e ali Musk tem que
responder ainda mais aos acionistas do que no caso do X."
• Críticas internacionais
Ao mesmo tempo, os
especialistas apontam as duras críticas recebidas por Musk e pelo X no Brasil e
no exterior como um fator que pode ter desmotivado a empresa a seguir com a
mesma posição.
"Talvez Musk
estivesse apostando em um apoio internacional à sua campanha que nunca
aconteceu", sugere o advogado Felipe Autran Dourado.
"Tivemos reações
mistas à decisão do STF de bloquear o X, mas a grande maioria de apoio à
Justiça brasileira ou condenação das ameaças de Musk à democracia do Brasil e
outras nações."
Para Bruna Santos, a
carta aberta assinada por pesquisadores de diversos países em apoio ao Brasil é
um sinal dessa falta de apoio político de Musk no país e no exterior.
No documento divulgado
nesta semana, mais de 50 intelectuais de diversos países, entre eles Argentina,
França, EUA, Austrália, Reino Unido, Espanha, Suíça e Itália, convidam
"todos os que defendem valores democráticos" a apoiarem o Brasil.
Os que assinam a
carta, entre eles nomes internacionalmente importantes que atuam no campo das
pesquisas sobre tecnologia, economia e Big Techs, relatam situação de alerta
sobre a soberania digital brasileira.
"O caso
brasileiro tornou-se o principal front no conflito global em evolução entre as
corporações digitais e aqueles que buscam construir um cenário digital
democrático e centrado nas pessoas, focado no desenvolvimento social e
econômico", diz o texto.
• Lewandowski compara embate de Moraes com
Musk à ofensiva dos EUA contra TikTok
O ministro da Justiça,
Ricardo Lewandowski, comparou nesta sexta-feira (20) o enfrentamento entre o
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o bilionário
de extrema-direita Elon Musk, dono do X (antigo Twitter), com a postura dos
Estados Unidos em relação ao TikTok, da chinesa ByteDance. Durante um evento em
São Paulo, Lewandowski mencionou que Moraes estaria travando um embate
semelhante ao dos EUA, onde o TikTok é visto como uma potencial ameaça à
segurança nacional, supostamente servindo aos interesses estratégicos da China.
Segundo Lewandowski, o mesmo estaria acontecendo no Brasil, com Musk sendo
acusado de interferir na política interna para promover ideologias extremistas
de direita.
"Esse mesmo braço
de ferro que os Estados Unidos estão travando como o TikTok nós agora, no
Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes atesta, está travando com o X do
Elon Musk, que supostamente estaria a serviço de grupos de extrema direita, interferindo
na política interna de muitos países, para divulgar essa ideologia
extremista", disse o ministro. As declarações foram citadas pela Folha de
São Paulo.
Ele também destacou
que Musk não atua apenas no Brasil, mas em diversos países, adaptando suas
posturas conforme o ambiente político.
Lewandowski fez essas
declarações no seminário "Impactos Setoriais da Inteligência
Artificial", coordenado por ele na Universidade Santo Amaro (Unisa), em
São Paulo (SP), onde também discutiu os desafios impostos pela inteligência
artificial (IA) nas esferas sociais e econômicas e as possíveis regulações.
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Lewandowski sugere que X, de Elon Musk, pode estar a serviço de grupos de
extrema direita
O ministro da Justiça
e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, fez um alerta sobre o impacto das
plataformas digitais na política durante o seminário "Impactos Setoriais
da Inteligência Artificial", realizado em São Paulo pela Universidade Santo
Amaro (Unisa), nesta sexta-feira (20). De acordo com reportagem do jornal O
Globo, Lewandowski sugeriu que o X, de Elon Musk, estaria atuando como um
serviço para grupos de extrema direita, interferindo em processos políticos de
vários países.
Lewandowski comparou a
situação enfrentada pelo Brasil com o embate entre o governo dos Estados Unidos
e o TikTok, que está sob pressão para transferir seu controle a uma empresa
americana devido a questões de segurança nacional. “Esse mesmo braço de ferro
que os Estados Unidos estão trabalhando com o TikTok, nós agora estamos
trabalhando com o X, do Elon Musk, que estaria a serviço de grupos de extrema
direita”, afirmou o ministro.
O X foi bloqueado no
Brasil por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) em agosto, após ser
acusado de contribuir para a disseminação de conteúdo extremista. Segundo
Lewandowski, o controle das redes sociais sobre o que pode ou não ser divulgado
é uma questão "muito séria", com o potencial de desestabilizar
sistemas políticos ao redor do mundo.
Lewandowski enfatizou
os riscos das plataformas digitais, incluindo o uso de algoritmos para
manipular a informação, o que pode minar a democracia. “A democracia será
destruída certamente se for feita por meio da internet, por meio de robôs, por
meio de mensagens que são impulsionadas de forma artificial. Muitos entendem
que nós já vivemos uma algocracia [...], um regime onde os algoritmos
influenciam diretamente na vida pública”, finalizou o ministro.
Fonte: BBC News
Brasil/Brasil 247
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