França, 55 anos
depois de maio 68
Na
terça-feira, dia 28 de março, aconteceu a décima jornada nacional de luta na
França. Em mais de duzentas cidades centenas de milhares saíram, mais uma vez,
obstinadamente, às ruas. A greve dos garis, os trabalhadores da limpeza urbana
de Paris, foi interrompida, mas nas refinarias a greve se generaliza, e a falta
de combustível se agrava. A mobilização estudantil, tanto na presença nas
manifestações como no número de escolas bloqueadas, mais de 500, um em cada
cinco liceus.
A
força da resistência é liderada pelos sindicatos e organizações de esquerda,
com um aumento da simpatia pela França Insubmissa de Jean Luc Mélenchon, e
lembra o impulso popular de maio de 68, mas sem a potência da greve geral por
tempo indeterminado, ou seja, a determinação revolucionária de lutar para
vencer, o que faz imensa diferença. Outra gigantesca diferença é a influência
crescente da extrema direita de Marine Le Pen. Ainda assim, o impasse
permanece, mas é o governo Elisabeth Borne que está na defensiva, apesar de ter
sobrevivido na semana passada ao voto de censura na Assembleia Nacional.
O
movimento contra a reforma da previdência já não se resume a uma luta contra o
aumento da idade mínima de 62 para 64 anos. O que está em disputa é se os
direitos sociais dos trabalhadores serão sacrificados, enquanto a França, a
maior potência militar da União Europeia, acossada pela pressão dos EUA na
OTAN, aprova um orçamento que prioriza o rearmamento, em função da nova
conjuntura precipitada pela guerra na Ucrânia.
O
desenlace da luta continua em aberto. É possível vencer. Mas será necessário,
para derrotar Emmanuel Macron, ir além de jornadas de rua de protestos. O
desafio é a greve geral. Mas ainda prevalece insegurança na classe trabalhadora,
após muitos anos de derrotas parciais acumuladas. Reconstruir uma ampla unidade
nas massas trabalhadoras e recuperar a confiança em suas próprias forças é a
chave para ousar vencer.
Evidentemente,
uma vitória de Emmanuel Macron e, em consequência, uma desmoralização social,
facilitaria o caminho para a conquista do poder pela extrema direita. Diante do
enfraquecimento da centro-direita de Macron o desafio estratégico está
colocado: governo de esquerda ou fascistas, Mélenchon ou Le Pen?
O
destino de Emmanuel Macron parece sombrio. O ajuste deveria ter sido feito em
2020, e só foi adiado em função da emergência da precipitação da pandemia da
covid-19. Pressionado pela maioria da burguesia a fazer o ajuste,
imediatamente, um ano depois de sua reeleição, mergulhou o regime da Quinta
República ao recorrer ao decreto, ameaçado de perder a votação na Assembleia
Nacional.
Em
maio de 1968, cinquenta e cinco anos atrás, a França foi o palco de um fenômeno
novo na Europa do pós-guerra: uma greve geral política apesar das direções dos
sindicatos e contra as direções do PS e do PCF, ou seja, um processo,
essencialmente, espontâneo, de rebelião operária-popular antiautoritária. Foi
argumentado à exaustão que as massas não queriam fazer na Paris de 1968, uma
Petrogrado de 1917. No maio francês, como de resto em todos os processos
revolucionários da história, as massas não se lançaram à luta com um plano
pré-concebido de como gostariam que a sociedade deveria ser. Os estudantes e
trabalhadores franceses sabiam, porém, que queriam derrubar De Gaulle. Derrubar
o governo é o ato central de toda revolução moderna.
Como
explicar a explosão social na França em maio de 1968? A hora da crise econômica
que revelou o fim do crescimento dos trinta anos “gloriosos” ainda não tinha chegado.
E a derrota na terrível guerra da Argélia tinha ficado para trás. Os primeiros
atos de grandes dramas históricos parecem, frequentemente, triviais. A luta de
classes na Europa assumia uma forma previsível e, relativamente, estável, após
a derrota da greve geral de quatro semanas na Bélgica em 1961. Mesmo na França,
depois do fim da guerra da Argélia, seguia um ritmo contido: lutas,
essencialmente, defensivas, e protestos de dimensões modestas, que reagrupavam
pequenas vanguardas.
Não
obstante, bastaram algumas prisões depois de um ato em solidariedade com a
resistência no Vietnam para que o estopim de uma avalanche fosse deflagrado. Na
sequência, pouco mais do que uma centena de estudantes da Universidade de
Paris-X, em Nanterre, na periferia de Paris, ocupou a sala do Conselho de
Universidade. O movimento estudantil estava engajado em uma campanha contra a
reforma do ensino superior. Mas, não eram indiferentes à espetacular
repercussão da Ofensiva do Tet que conseguiu hastear a bandeira vietcongue no
teto da embaixada americana em Saigon.
A
ocupação se estendeu para a Sorbonne, e o reacionarismo e a soberba do governo
de Charles De Gaulle – uma mistura sempre explosiva – o levou a cometer a
provocação de lançar a polícia sobre o Quartier Latin (o Bairro Latino de
Paris, no coração da capital). Não conseguiram, apesar de uma apocalíptica
batalha campal, desalojar a massa de estudantes que se defendiam em
improvisadas barricadas. O espírito das jornadas revolucionárias de 1848 e de
1871 parecia ter ressuscitado. Um novo movimento estudantil saiu às ruas em
1968 e, surpreendentemente, suas bandeiras eram vermelhas.
Quando
a repressão mostrou a verdadeira cara do governo De Gaulle – e, sem máscara, o
que se viu foi estarrecedor –, os estudantes foram para as portas das fábricas
pedir o apoio do proletariado. Empolgaram a França e deixaram o mundo
estupefato. Incendiaram o ânimo da maioria popular com sua imaginação política.
Subverteram Paris. Os muros da cidade, que foi a capital cultural da
civilização burguesa, foram cobertos com pichações, ao mesmo tempo,
irreverentes e rebeldes, satíricas e amotinadas, como: as mercadorias são o
ópio do povo, a revolução o êxtase da história; Sejam realistas, exijam o
impossível! (Soyez réalistes, demandez l’impossible!); Deixemos o medo do
vermelho aos animais com cornos! (Laissonz la peur du rouge aux bêtes à
cornes!) Corra camarada, o velho mundo está atrás de ti! (Cours camarade, le
vieuz monde est derriére toi!); Os muros têm orelhas, vossas orelhas têm muros!
(Les murs ont des oreilles, vos oreilles ont des murs!); O respeito se perde,
não vão procurá-lo! (Le respect se perd, n’allez pas le rechercher!).
Poucos
dias depois, algo em torno de um milhão de pessoas desfilaram pelas ruas de
Paris em solidariedade com os estudantes e contra o governo. Foi um terremoto
político que anunciava que um tsunami estava por chegar: o país entrou em greve
geral por tempo indeterminado, portanto, greve geral política, porém acéfala,
sem uma proposta de saída política para a crise.
O
movimento não levantava sequer uma proposta clara de deposição do governo. O
Partido Comunista francês era um dos mais poderosos do mundo. Sua hegemonia na
classe trabalhadora organizada era quase monolítica. E a direção do Partido
Comunista estava comprometida com os acordos de Yalta e Potsdam e a divisão de
áreas de influência. Qualquer expectativa de regeneração do aparelho
estalinista foi enterrada em maio de 1968 em Paris. Ficou uma lição histórica
irrefutável. Aparelhos burocráticos, mesmo quando implantados na classe
operária, são irrecuperáveis.
Não
por acaso, no auge do processo, Charles De Gaulle fugiu para uma base aérea
militar francesa em Baden-Baden na Alemanha. Os historiadores tradicionalmente
dividem o curso de maio de 1968 em três fases, um “período estudantil” de 3 a
13 de maio; um “período social” de 13 a 27 de maio (data dos acordos de
Grenelle, negociados entre Pompidou, o primeiro-ministro e os líderes
sindicais, mas rejeitados na base), e um “período político” de 27 de maio a 30
de junho (data das eleições legislativas).
Ao
voltar de Baden-Baden, Charles De Gaulle retomou a iniciativa decretando a
dissolução da Assembleia Nacional e convocando eleições. Uma maré gaullista
reacionária, expressando a reação da França profunda pequeno-burguesa contra a
Paris vermelha, garante uma vitória do regime nas eleições antecipadas de 30 de
junho. As greves cessam, gradualmente, durante junho, e a Sorbonne em Paris, é
evacuada pela polícia.
Não
estamos em 1968, Macron não é de De Gaulle, a classe trabalhadora francesa vem
de um longo período de acumulação lenta, mas ininterrupta de perda de direitos,
e a principal força político-social de oposição é a extrema direita.
Mas
como não nos empolgarmos com centenas de milhares desfilando em Paris, com o
apoio de dezenas de milhões, cantando a Internacional e levantando as bandeiras
vermelhas?
Itália suspende uso do ChatGPT no país e
abre investigação após suspeita de vazamento de dados
Convocatórias
para suspender novos lançamentos do ChatGPT e investigar seu criador, a OpenAI,
sobre uma série de riscos de privacidade, segurança cibernética e desinformação
estão crescendo em todo o mundo.
A
Agência de Proteção de Dados da Itália determinou nesta sexta-feira (31) a
suspensão provisória do ChatGPT até que o modelo de linguagem se enquadre na
lei de proteção de dados da União Europeia, segundo o Politico.
A
agência italiana disse que a empresa carece de base legal que justifique
"a recolha e armazenamento em massa de dados pessoais [...] para 'treinar'
os algoritmos" do ChatGPT, acrescentando que a OpenAI também processa
dados de forma imprecisa.
Ao
longo da semana, Elon Musk e dezenas de especialistas em Inteligência
Artificial (IA) pediram uma pausa nas atualizações do ChatGPT. O grupo de
defesa do consumidor BEUC também ontem (30) que as autoridades nacionais e da
União Europeia, incluindo vigilantes de proteção de dados, investiguem a
ferramenta.
A
ferramenta também sofreu uma violação de dados e expôs conversas de usuários e
informações de pagamento de seus usuários na semana passada, disse a autoridade
italiana.
Além
disso, a agêncua afirmou que a OpenAI não verifica a idade dos usuários e expõe
"menores a respostas absolutamente inadequadas em comparação com seu grau
de desenvolvimento e autoconsciência".
A
OpenAI não tem escritório na zona da UE, mas seu representante no Espaço
Econômico Europeu (EEA) tem 20 dias para comunicar como planeja tornar o
ChatGPT compatível com as regras de privacidade do bloco ou enfrentar uma
penalidade de até 4% de sua receita global.
Fonte:
Por Valério Arcary, em A Terra é Redonda
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