Mario Sabino: “Um povo corrompido não pode tolerar um governo que não
seja corrupto”
Os brasileiros não estão nem aí para o problema da
corrupção. Mas não é porque você ignora o problema que o problema deixa de
existir. Ao contrário, ele tende a aumentar ao ser ignorado, o que é ótimo só
para o corrupto, apesar de dizerem que certa dose de corrupção faz bem, é até
vitamina para o crescimento econômico, patati patatá.
A Petrobras, por exemplo, foco do maior escândalo
de corrupção da história brasileira e quiçá mundial, voltará a ter políticos e
sindicalistas em cargos de direção. Reabre-se a avenida para a gatunagem, de
onde se concluí que o único remédio para impedir que a empresa seja o parque de
diversões dos corruptos seria privatizar completamente a joça toda — o que não
vai acontecer nunca.
Com o desmonte da Lava Jato, denunciar corrupção
virou coisa de gente messiânica, chata e até golpista. O discurso de que a
operação foi ação orquestrada para aniquilar Lula e o PT colou tanto, parabéns
aos spin doctors, que passou a ser repetido sem qualquer sombra de vergonha em
salas de aula. Militantes disfarçados de professores ensinam essa mentira aos
alunos ignaros como se fosse dado histórico indiscutível.
Posso ter perdido algo, mas aqui nas adjacências
não vi ninguém dar muita bola para o relatório sobre o Brasil do Grupo de Trabalho Antissuborno da OCDE, divulgado há coisa de dez dias. É uma tomografia dos retrocessos
operados nas diversas instâncias do poder para desmanchar o que foi feito em
prol da transparência e da honestidade no trato da coisa pública. Entre os
retrocessos, o fim da prisão em segunda instância, o desmonte das
forças-tarefas e a anulação dos acordos de leniência.
Em outras freguesias, os suspeitos de costume
destacaram a referência rápida à politização da Lava Jato, dando a entender que
a operação havia sido condenada até o último grau pelos autores do relatório.
Menos rápida, na verdade, é a referência às
retaliações que procuradores da Lava Jato sofreram no TCU, aquele monumento à
independência funcional, por terem ousado combater a corrupção nas altas
esferas. Ao longo do relatório, a verdade documentada com números é que a
operação aparece como responsável por ter elevado ao grau de excelência o
combate à corrupção dentro e fora do país.
O Grupo de Trabalho Antissuborno da OCDE também
aborda como a autocensura entrou para o cotidiano do jornalismo investigativo
brasileiro, em consequência dos ataques bolsonaristas (mas não só dos
bolsonaristas, presume-se) e do fim da Lava Jato:
“Embora
exista liberdade de imprensa no Brasil (mais em nível nacional do que
regional), os repetidos ataques contra a mídia nos últimos anos tiveram um
efeito inibidor sobre o profissão. Na opinião (de jornalistas), esses ataques,
combinados com a incerteza geral sobre o compromisso do Brasil no combate à
corrupção após o desmantelamento das forças-tarefas da Lava Jato, contribuíram
para um aumento do nível de autocensura na profissão.”
Eu já disse, sem qualquer originalidade, que a autocensura
é a pior forma de censura. Exemplo: estava para
comentar o que o relatório da OCDE registra sobre a atuação de um ministro de
corte superior, mas, diante da liberdade de imprensa em vigor, decidi
autocensurar-me.
Os brasileiros não estão nem aí para o problema da
corrupção. Aquilo que se viu entre 2015 e 2018 foi momento singular do qual não
haverá plural. Compreendo perfeitamente: “um povo corrompido não pode tolerar
um governo que não seja corrupto”. A máxima é do Marquês de Maricá, aquele
pândego. Máxima de um país mínimo (não estou, não, roubando o título do livro
de certo jornalista, porque fui eu a sugerir o título a ele). O brasileiro é
bom companheiro, ninguém pode negar.
Ø Mesmo com todas denúncias, as estranhas homenagens a Bolsonaro pelo
País reforçam estratégia de polarização
Rodeado de aliados, o ex-presidente Jair Bolsonaro
(PL) recebe uma placa com a inscrição "Título de Cidadão Honorário".
Ele ergue o objeto e é aplaudido. Essa cena já ocorreu pelo menos quatro vezes
neste ano e deve se repetir nos próximos meses. Isso porque deputados estaduais
e vereadores têm aprovado homenagens ao ex-chefe do Executivo em todo o País, o
que, segundo analistas, ajuda a manter a polarização.
Levantamento do Estadão mostra que Assembleias
Legislativas e Câmaras Municipais aprovaram oito títulos em homenagem a
Bolsonaro nos últimos 12 meses. Há outras sete condecorações em tramitação.
"A visita do ex-presidente a uma cidade cria comoção e os políticos
associados ao nome de Bolsonaro têm maior probabilidade de serem eleitos",
disse o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola
de Sociologia e Política de São Paulo. "Ele ainda é um importante
instrumento político para candidaturas ao Legislativo."
Ao colar sua imagem na de Bolsonaro, políticos
ganhariam projeção para se contrapor a potenciais candidatos de esquerda,
eventualmente apoiados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além disso,
na avaliação do também cientista político Rafael Cortez, sócio da Tendências
Consultoria, a estratégia de entrega de homenagens está associada a uma
tentativa de perpetuar o sentimento de rejeição ao PT na sociedade. "A
política brasileira ainda pode ser explicada por essa polarização."
Cortez afirmou ainda que Bolsonaro está empenhado
em se manter como principal expoente do antipetismo, utilizando as redes
sociais não só para criticar o governo, mas para mostrar engajamento em eventos
políticos, como as homenagens nas Assembleias e nas Câmaras Municipais.
·
Berço
Marcada para o dia 30 de novembro, a próxima
entrega de um título a Bolsonaro será em São Bernardo do Campo (SP), berço
político de Lula. A proposta de homenagem partiu do vereador Paulo Eduardo
Lopes (PL), o Paulo Chuchu. "A direita nunca teve candidato próprio à
prefeitura, mas agora temos uma direita nova, que está apresentando",
disse.
Esses eventos também contribuem para preservar o
capital político de Bolsonaro e mantê-lo relevante no cenário nacional, diante
da inelegibilidade imposta pela Justiça Eleitoral. Em agosto, ele recebeu três
títulos, em Minas, Goiás e Barretos (SP). "Bolsonaro vai influenciar as
eleições do ano que vem", disse a prefeita de Barretos, Paula Lemos (DEM).
Com pé
na política, Jair Renan cola em acusado de chefiar ato golpista
O filho de Jair Bolsonaro, Jair Renan Bolsonaro,
vem participando de eventos políticos com o empresário Emílio Dalçóquio,
investigado no Supremo Tribunal Federal por liderar atos golpistas que
bloquearam as rodovias de Santa Catarina após a vitória de Lula.
Um dos herdeiros da transportadora que leva o
sobrenome da família, Dalçóquio também fazia parte do grupo no WhatsApp de
empresários bolsonaristas que, como contou a coluna, servia para o
compartilhamento de anseios golpistas, ataques ao STF e mensagens mentirosas
sobre as urnas eletrônicas.
A dupla Dalçóquio e Jair Renan visitou, nos últimos
meses, as sedes de órgãos de segurança de Santa Catarina e eventos como o
acampamento Farroupilha e o aniversário do Corpo de Bombeiros. Os dois também
fizeram uma viagem pelo estado a bordo de um caminhão para “conhecer a
realidade” de caminhoneiros.
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Jair Renan vem sendo preparado pelo pai e aliados,
como Dalçóquio e o senador Jorge Seif, para ser candidato à Câmara dos
Vereadores de Balneário de Camboriú, em Santa Catarina.
Ex-secretário
da Abin e braço direito de Ramagem vira coordenador na Polícia Federal
O secretário-executivo do Ministério da Justiça e
Segurança Pública, Ricardo Cappelli, oficializou a nomeação de um ex-secretário
da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) do ex-presidente Jair Bolsonaro
(PL), para um cargo de coordenação na Polícia Federal (PF). O delegado Carlos
Afonso Gonçalves Gomes Coelho será coordenador do Comando de Aviação
Operacional, setor ligado à diretoria-executiva da corporação. A nomeação foi
publicada no Diário Oficial da União em 11 de outubro.
Em 2020, Coelho atuava como secretário de
Planejamento e Gestão na Abin; era uma espécie de braço direito de Alexandre
Ramagem, diretor da Abin durante o governo Bolsonaro. Antes disso, no início do
governo de Bolsonaro, o delegado trabalhou junto com Ramagem no Palácio do
Planalto, como assessor especial na Secretaria de Governo.
Como mostrou reportagem do Estadão, Coelho fazia
parte de um grupo de delegados da PF de confiança de Ramagem levados para a
Abin durante o governo Bolsonaro; esse grupo teria sido apontado por servidores
do órgão como responsável por orientar informalmente a defesa do senador Flávio
Bolsonaro (PL-RJ) no caso das rachadinhas.
À época, o ex-ministro da Secretaria-Geral da
Presidência de Bolsonaro, Gustavo Bebianno, morto em março de 2020, chegou a
acusar o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) de tentar implantar uma
espécie de "Abin paralela" no Planalto.
• Abin
de Ramagem teria espionado adversários de Bolsonaro
Na semana passada, uma investigação da PF revelou
que, sob o comando de Ramagem, a Abin teria espionado ilegalmente políticos,
jornalistas, advogados, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e
adversários do governo de Bolsonaro. O ex-diretor da agência é aliado de
primeira hora do ex-presidente e amigo pessoal da família Bolsonaro. Ele foi
eleito deputado federal pelo PL do Rio de Janeiro no ano passado.
Responsável por assinar a nomeação de Coelho no
Diário Oficial da União, Cappelli é braço direito do ministro da Justiça e
Segurança Pública, Flávio Dino. Ele é cotado para assumir a pasta caso Dino
seja indicado a uma vaga no STF. O secretário-executivo é um homem de confiança
do ministro e foi secretário de Estado quando Dino era governador do Maranhão.
Ø A pergunta que o Congresso quer fazer ao governo Lula sobre a Abin
Frustrados com o depoimento do diretor-geral
da Abin, membros da Comissão
Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional pretendem convocar outros integrantes do
governo Lula para questioná-los sobre o esquema de espionagem ilegal tocado
pela agência durante a gestão Jair Bolsonaro.
O principal ponto que os parlamentares querem
entender é o que levou o Planalto a autorizar, em 2023, a nomeação de Paulo
Fortunato como número 3 da Abin. No governo Bolsonaro, Fortunado foi o chefe do
setor de Operações de Inteligência da agência quando a ferramenta de espionagem
ilegal foi adquirida pelo órgão.
O passado polêmico do diretor precede a atual
gestão de Lula. Como mostrou a coluna, no segundo governo Lula, em 2008,
Fortunato chegou a ser afastado de um cargo de direção da Abin após envolvimento da agência em um esquema de escutas ilegais de
políticos e ministros do STF.
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Na semana passada, o diretor foi um dos alvos dos
mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia Federal para investigar o
esquema na Abin. Na casa dele, policiais encontraram 171 mil dólares. No mesmo
dia da operação, ele foi afastado da agência pelo STF. Dias depois, o Palácio
do Planalto o exonerou de vez da agência.
·
Frustação
Em depoimento sigiloso à comissão na quarta-feira
(25/10), Luiz Fernando Côrrea, atual diretor-geral da
Abin, se recusou a dar detalhes do esquema de espionagem, que usava um software
de geolocalização. Ele disse, por exemplo, não saber que jornalistas, políticos
e ministros do STF foram espionados.
Diante da falta de revelações, parlamentares do
colegiado aprovaram um requerimento pedindo acesso à sindicância sobre a
espionagem feita pela Abin e passaram a discutir a convocação de outros
integrantes do governo para apurar mais detalhes sobre o esquema.
Fonte: Metrópoles/Agencia Estado
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