domingo, 29 de outubro de 2023

CGU apurará contrato milionário da Saúde com empresa de 1 funcionário

A Controladoria-Geral da União (CGU) informou que vai apurar um contrato de R$ 285,8 milhões, com dispensa de licitação, firmado pelo Ministério da Saúde com uma microempresa com apenas um funcionário registrado, ao menos até março. O acordo, assinado em abril, foi para fornecimento de 293,5 mil frascos de imunoglobulina humana. O caso foi relevado pelo Metrópoles em setembro.

Em despacho assinado no último dia 23, o ministro da CGU, Vinícius de Carvalho, informou que irá incluir a análise do contrato na programação da controladoria para avaliação no último trimestre deste ano. A decisão se deu após pedido de auditoria feito pelo deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), com base na reportagem do Metrópoles.

 “Entendemos ser necessário que a CGU realize auditoria para avaliar se a referida dispensa de licitação ocorreu em conformidade com a legislação e os princípios da administração pública”, pediu o deputado em ofício encaminhado no dia 26 de setembro.

O ministro explicou ao parlamentar que a controladoria atua conforme um plano operacional anual, que “contém as ações a serem executadas no exercício, planejadas em função da análise de relevância, materialidade, criticidade e riscos dos objetos a serem avaliados considerando ainda a” capacidade operacional do órgão. Como não há trabalhos em andamento que tenham como foco o referido contrato, o ministro decidiu incluir uma auditoria na programação.

O Ministério da Saúde firmou o contrato sem licitação com a Auramedi, na condição de representante da chinesa Nanjing Pharmacare. A sede da Auramedi é uma casa em um centro empresarial de Aparecida de Goiânia, região metropolitana da capital. O Metrópoles esteve lá na última sexta-feira (22/9), em horário comercial, mas o local estava fechado.

Imunoglobulina é um medicamento hemoderivado, ou seja, produzido a partir do sangue, usado para melhorar a imunidade de pacientes acometidos por uma série de doenças, como a síndrome de Guillain-Barré. A sua falta no Sistema Único de Saúde (SUS) coloca em risco a vida de pessoas que dependem do remédio.

A empresa e o único sócio, Fábio Granieri de Oliveira, são réus por improbidade administrativa em uma ação popular no Tribunal de Justiça do Pará.

A denúncia, recebida pelo Judiciário, aponta suspeita de fraude em uma contratação, também com dispensa de licitação, durante a pandemia da Covid-19 no município de Parauapebas. Apesar disso, a companhia não tem restrições para participar de licitações ou firmar contratos com o Poder Público.

Em setembro, Fábio enviou uma nota à reportagem dizendo que as informações veiculadas “a respeito da Nanjing Pharmacare” são equivocadas.

O Ministério da Saúde, por sua vez, informou que a compra emergencial visa evitar o desabastecimento de imunoglobulina e que a aquisição seguiu regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que trata de critérios para importação em caráter de excepcionalidade.

O ministério frisou, ainda, que a aquisição emergencial ocorreu após recomendação de fevereiro deste ano do TCU, até que a situação excepcional de indisponibilidade no mercado nacional fosse resolvida.

A pasta também pontuou que vinha recebendo os medicamentos da empresa, conforme o cronograma, e que a empresa estava regular no momento da contratação.

•        Preso na Operação Vampiro fechou R$ 647 mi em contratos sob Bolsonaro

A empresa Panamerican Medical Supply, que tem como um dos sócios Marcelo Pupkin Pitta, firmou dois contratos volumosos, no total de R$ 647,2 milhões, com o Ministério da Saúde, em 2021 e 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os contratos, para fornecimento de imunoglobulina humana, ocorreram após licitação feita em 2021 e somavam inicialmente R$ 517,8 milhões, mas tiveram o incremento de dois aditivos.

Marcelo Pitta é figura conhecida no mercado farmacêutico, e já foi preso no âmbito da Operação Vampiro, em 2004 e em 2007. As investigações apuraram suspeita de fraude em licitação no Ministério da Saúde, justamente em compras de medicamentos hemoderivados, incluindo imunoglobulina. A ação fraudulenta teria começado ainda na década de 1990, e a investigação chegou a envolver o senador Humberto Costa, ministro da Saúde na época, mas ele foi absolvido.

Do valor dos dois contratos assinados em 2021 e 2022 pela Panamerican, ao menos R$ 597,5 milhões já foi pago, segundo Portal da Transparência, sendo que 73,1% foi desembolsado no ano passado, entre março e setembro, e o restante neste ano, já no governo Lula.

Os contratos são relativos a 625 mil frascos de imunoglobulina, incluindo as quantias previstas nos dois aditivos firmados em agosto do ano passado. Todos os medicamentos foram entregues entre fevereiro de 2022 e abril deste ano. A maior parte, 500 mil, foi importada até dezembro de 2022.

Imunoglobulina é um medicamento hemoderivado, ou seja, produzido a partir do sangue, usado para melhorar a imunidade de pacientes acometidos por uma série de doenças, como a síndrome de Guillain-Barré.

Os contratos firmados no governo Bolsonaro foram com a chinesa Nanjing Pharmacare, e a Panamerican consta nos documentos como representante nacional da empresa.

•        Imbróglio

O pregão que gerou os contratos foi alvo de imbróglio após decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que o suspendeu. A ação se deu após representação de uma empresa questionando sua desclassificação do processo depois de o ministério ter alegado que o produto oferecido não atenderia às exigências previstas no termo de referência.

A suspensão foi revertida por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou as compras do contrato com a Panamerican firmado na época, entendendo que havia risco de desabastecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). O acordo em questão era para a compra de 300 mil frascos do medicamento.

•        Os processos contra Pitta

Na ação penal desencadeada pela Operação Vampiro, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu, em 2020, pela impossibilidade de punir Marcelo Pitta em relação aos crimes de associação criminosa e fraude em licitação. O processo envolve outras pessoas e ainda tramita, mas está sob segredo de Justiça.

Existe também um processo de improbidade administrativa, sobre a denúncia de fraude em concorrências internacionais, com conluio de empresários e pagamento de propina a membros da comissão de licitação do Ministério, que também tramita no TRF1.

A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) aponta, dentre outros elementos, que escutas telefônicas feitas pela PF identificaram que Pitta e outros empresários fizeram um acordo de divisão do mercado de hemoderivados, especificamente em relação às concorrências internacionais apuradas pela ação.

O MPF, então, pede condenação com ressarcimento ao erário no valor de R$ 27,5 milhões, de forma voluntária (ou seja, paga por todos os envolvidos).

Marcelo pede que a ação seja julgada improcedente apontando problema com as provas de interceptação telefônica. Segundo ele, as transcrições foram feitas de forma equivocada pelos policiais federais responsáveis. O caso ainda tramita.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), corre outra ação envolvendo Pitta, dessa vez sem relação com a Operação Vampiro. Há um recurso do MPF contra uma decisão do TRF da 3ª região, que entendeu que a Justiça Federal era incompetente no caso e anulou a ação que condenava o empresário e outros envolvidos em primeira instância. O MPF entrou com recurso defendendo que o caso é de competência da Justiça Federal, e aguarda decisão.

A ação, de 1998, também é de improbidade administrativa, relativa à época em que Pitta era diretor de uma fundação ligada a um hemocentro, em São Paulo. A investigação foi iniciada pela Procuradoria da República de São Paulo, que apontou, dentre outros pontos, o uso de recursos públicos para despesas sem processo licitatório e venda de plasma.

•        Nanjing Pharmacare

Nesta terça-feira (26), o Metrópoles mostrou que, em março, a empresa goiana Auramedi Farmacêutica firmou um contrato com dispensa de licitação no valor de R$ 285,8 milhões com o Ministério da Saúde, também para fornecimento de imunoglobulina, na condição de representante nacional da chinesa Nanjing Pharmacare.

A Auramedi tem apenas um funcionário registrado, ao menos até março, capital social de R$ 1,3 milhão e tem como único sócio Fábio Granieri de Oliveira. A reportagem esteve na sede da empresa na última sexta-feira (22/9), em horário comercial, mas não havia ninguém no local.

No processo de tomada de preços que a Auramedi acabou selecionada, a Panamerican também se apresentou como representante da Nanjing no Brasil.

A Panamerican chegou a pedir a impugnação do processo de dispensa de licitação em questão, solicitando melhoria do termo de referência. Apesar do pedido de impugnação, o que mostra ciência da existência do processo, a empresa não enviou proposta.

•        Relações

No processo licitatório de 2021 que rendeu dois contratos à Panamerican, chama a atenção outra empresa que venceu parte do pregão e firmou dois contratos menores, de R$ 74,5 milhões. A empresa também é de Aparecida de Goiânia, assim como a Auramedi, e é ré em uma ação de improbidade administrativa que Fábio Granieri também é réu.

A ação popular corre no Tribunal de Justiça do Pará. Um dos elementos no processo é o fato de Fábio ter participado da tomada de preço solicitada pela prefeitura como representante da Auramedi, mas também ter assinado como representante dessa outra empresa, que era sua concorrente.

•        O outro lado

A Panamerican não tem restrição para ser contratada pela administração pública, conforme Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), usado para consulta pelo governo.

A reportagem procurou a empresa, mas ela não respondeu. Na segunda-feira (25/9), um funcionário afirmou que não iriam responder. O Metrópoles também busca contato com advogados de defesa de Marcelo. O espaço segue aberto para manifestação.

O Ministério da Saúde não respondeu a respeito dos contratos firmados com a Panamerican.

Fábio Granieri, da Auramedi, se limitou a dizer que “é surpreendente que informações equivocadas estejam sendo veiculadas a respeito da Nanjing Pharmacare” e que são “desprovidas de fundamentação fática”.

•        Outro contrato

O Ministério da Saúde contratou uma empresa com dispensa de licitação para fornecer 90 mil frascos de imunoglobulina humana, a R$ 87 milhões, mas ainda não recebeu nenhuma unidade do medicamento. O contrato foi firmado em abril, com previsão de entrega de cinco parcelas até o próximo dia 30 de setembro.

“Até o momento, não há registro de recebimento de insumos, e, em consequência, não foram realizados quaisquer pagamentos à empresa”, afirmou o ministério.

A empresa em questão é a Farma Medical, que assina o contrato na condição de representante nacional da Prime Pharma LLC, dos Emirados Árabes. Em nota, ela garante que os primeiros lotes estão disponibilizados desde o dia 13 de junho.

 “A importação do referido produto é de responsabilidade única e exclusiva do Ministério da Saúde”, disse. Conforme a Farma Medical, a disponibilização ocorreu 13 dias depois da autorização de excepcionalidade da importação emitida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A autorização era necessária porque o medicamento que estava sendo oferecido pela empresa não é registrado na agência.

O dono da empresa, Silvio de Azevedo Pereira Júnior, disse que 30 mil frascos foram efetivamente entregues ao ministério ainda em junho. A reportagem solicitou acesso a documentos que comprovassem, mas não houve a disponibilização.

A Farma Medical possui capital social de R$ 100 milhões e está presente em seis estados.

•        A dispensa

No final de fevereiro, o ministério abriu processo para a compra de 383,5 mil frascos de imunoglobulina com dispensa de licitação apontando urgência. No total, 20 empresas enviaram suas propostas, e a da Prime Pharma ficou entre as mais vantajosas.

Ao alegar urgência, a pasta afirmava que a primeira parcela de medicamento deveria ser entregue em abril, para não correr o risco de desabastecimento. No fim, a primeira parcela foi entregue somente em meados de junho pela empresa Auramedi Farmacêutica, que ganhou a maior parte da compra.

Imunoglobulina é um medicamento hemoderivado, ou seja, produzido a partir do sangue, usado para melhorar a imunidade de pacientes acometidos por uma série de doenças, como a síndrome de Guillain-Barré. A sua falta no Sistema Único de Saúde (SUS) coloca em risco a vida de pessoas que dependem do remédio.

•        Demora

Depois que o contrato foi firmado, no dia 14 de abril, o ministério precisaria pedir à Anvisa autorização para a importação em caráter excepcional. A pasta, então, solicitou a documentação à empresa brasileira e fez o pedido no dia 16 de maio. A agência só autorizou a importação no dia 29 daquele mês, o que impossibilitaria, de qualquer forma, que a primeira parcela fosse entregue dentro do prazo, que era dia 30.

Segundo documentos do ministério, somente no dia 20 de junho, o Departamento de Planejamento e Controle Logístico do ministério enviou ofício para a área de Assistência Farmacêutica informando a decisão da Anvisa, 10 dias antes do vencimento da segunda parcela.

Silvio Júnior, da Farma Medical, defendeu que a pasta tomou um tempo maior para aprovação dos documentos enviados por sua empresa do que o tempo dedicado em relação à sua concorrente, a Auramedi. “Não sei por que, mas tomou um tempo muito maior de aprovação”, pontuou.

•        Descumprimento de contrato

No dia 28 de julho, o ministério enviou uma notificação de descumprimento de contrato alegando que a primeira parcela ainda não havia sido entregue. No dia 22 de agosto, a pasta enviou outra cobrança, apontando atrasos nas três primeiras parcelas.

A Farma Medical admite atraso no cronograma de execução contratual, mas ressalta que isso ocorreu inicialmente “pelos próprios procedimentos pertinentes ao ministério, que na primeira data de entrega prevista em contrato não obtinha sequer autorização excepcional da Anvisa para importação”.

“Esta empresa não descumpriu com suas obrigações de representante nacional e nem os fornecedores diretos do Ministério da Saúde”, defendeu.

•        Nanjing

Com apenas um funcionário registrado ao menos até março e capital social de R$ 1,3 milhão, a goiana Auramedi conseguiu um contrato de R$ 285,8 milhões no âmbito desse mesmo processo de dispensa de licitação para fornecimento de 293,5 mil frascos de imunoglobulina. A empresa já entregou mais de 245 mil frascos, e falta apenas a última parcela.

A Auramedi diz representar nacionalmente a chinesa Nanjing Pharmacare. Como mostrou o Metrópoles na última terça-feira (26/9), a Nanjing também é representada no Brasil pela Panamerican Medical Supply, que tem como um dos sócios Marcelo Pupkin Pitta, empresário do ramo que já foi preso na Operação Vampiro, em 2004, e, de novo, em 2007.

As investigações apuraram suspeita de fraude em licitação no Ministério da Saúde, justamente em compras de medicamentos hemoderivados, incluindo imunoglobulina.

A Panamerican, inclusive, firmou dois contratos de R$ 647,2 milhões com o ministério no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2021 e 2022, para fornecimento de imunoglobulina na condição de representante da Nanjing.

Ao menos R$ 597,5 milhões já foi pago, segundo Portal da Transparência, sendo que 73,1% foi desembolsado no ano passado, entre março e setembro, e o restante neste ano, já no governo Lula. Todos os medicamentos previsto nos dois contratos já foram entregues.

 

Fonte: Metrópoles

 

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