Preso e sem herdeiros políticos: qual o peso
político da família de Collor atualmente?
A decretação da prisão do ex-presidente
Fernando Collor de Mello pegou de surpresa a maioria dos analistas políticos na
noite de quinta-feira (24/4), mas para quem conhece a política de Alagoas, a
decisão do ministro Alexandre de Moraes não chegou a ser uma surpresa.
"A prisão enterra de vez uma trajetória
de vida e política de sucessos surpreendentes e derrocadas tão surpreendentes
quanto", diz à BBC News Brasil professora de Ciência Política Luciana
Santana, professora da Universidade Federal de Alagoas.
Na avaliação dela, trinta e cinco anos depois
de um integrante da família Collor de Mello chegar à Presidência da República,
o clã alagoano chega a 2025 com seu principal integrante preso, praticamente
nenhuma influência na política local e sem sucessores imediatos para o futuro.
Doutora em Ciência Política, Santana
acompanha há décadas a política local e nacional e avalia que a prisão de
Collor representa o "fim simbólico" da força política de um dos clãs
mais tradicionais da política brasileira.
Fernando Collor de Mello foi preso na
sexta-feira (25/4) por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) após ser
condenado por corrupção passiva em um processo por ter supostamente recebido R$
20 milhões em propinas pagas para viabilizar direcionar contratos da BR
Distribuidora com a UTC Engenharia para a construção de bases de distribuição
de combustíveis.
O caso remonta às investigações conduzidas
pela Operação Lava Jato.
Collor teria contado com a ajuda dos
empresários Luis Pereira Duarte de Amorim e Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni
Ramos.
"A vantagem foi dada em troca de apoio
político para indicação e manutenção de diretores da estatal", informa o
STF, sobre as bases da decisão.
Sua defesa nega o envolvimento de Collor com
o caso e recorreu diversas vezes contra a prisão do ex-presidente. Em nota, a
defesa do ex-presidente negou que os recursos apresentados até então tenham
tido o objetivo de atrasar a sua prisão.
"Quanto ao caráter protelatório do
recurso, a defesa demonstrou que a maioria dos membros da Corte reconhece seu
manifesto cabimento [...] De qualquer forma, o ex-Presidente Fernando Collor
irá se apresentar para cumprimento da decisão determinada pelo Ministro
Alexandre de Moraes, sem prejuízo das medidas judiciais previstas".
Collor foi preso hoje pela Polícia Federal,
em Maceió, no aeroporto da cidade, por volta das 4h. Ele chegou a ser levado
para a sede da Superintendência da Polícia Federal em Alagoas, mas depois
transferido para um presídio federal.
• Ascensões
e quedas
Fernando Collor de Mello é o nome mais
conhecido da família Mello, que foi uma das mais poderosas do Estado de
Alagoas.
Seu pai, Arnon Affonso de Farias Mello, foi
governador de Alagoas nos anos 1950 e também foi senador na década seguinte. Em
1963, seu pai ficou nacionalmente conhecido após matar com um tiro o senador
pelo Acre José Kairala, após um tiroteio dentro do Senado Federal por conta de
uma desavença política.
Ao longo das décadas, Arnon de Mello montou
um grupo de comunicação em Alagoas com jornais, rádios e uma emissora de TV.
Nos anos 1970, Fernando Collor de Mello dá início à sua trajetória, elegendo-se
prefeito de Maceió, em 1979, deputado federal em 1983 e governador de Alagoas
em 1987.
Em 1989, ele disputa e vence as eleições à
Presidência da República, vencendo, no segundo turno, o então candidato Luiz
Inácio Lula da Silva (PT). Seu governo foi marcado por crises econômicas que
levaram ao confisco da poupança e a escândalos de corrupção que levaram ao seu
impeachment, em 1992.
Absolvido pelo STF nos anos seguintes, ele
voltou à política nos anos 2000. Foi eleito senador em 2006 e reeleito em 2014.
Mas a partir de 2014, o que parecia uma
trajetória ascendente na política começou a dar demonstrações de desgaste.
Primeiro vieram as menções ao seu nome feita
por delatores da Operação Lava Jato e o início da investigação que resultou em
sua condenação.
Ao mesmo tempo, Collor viu sua relação ficar
estremecida com outro clã poderoso de Alagoas, a família do senador Renan
Calheiros e de seu filho, o ministro dos Transportes Renan Filho, que também
governou Alagoas. O movimento foi visto como uma espécie de "traição"
porque a família Calheiros teria dado apoio a Collor em 2006, quando ele voltou
a disputar eleições.
"O grupo de Collor, com suas empresas de
comunicação, passou a atacar insistentemente o grupo de Renan Calheiros,
principalmente durante os mandatos de Renan Filho. Isso foi criando um
isolamento de Collor em relação aos outros grupos políticos do Estado",
afirma Luciana Santana.
Em 2018, já distante dos Calheiros e do outro
clã proeminente do Estado, os Lira, do deputado federal Arthur Lira (PP-AL),
Collor tentou disputar o governo de Alagoas, mas desistiu a 20 dias das
eleições.
Naquele ano, Collor ainda tentou emplacar um
de seus filhos, Fernando James, nas eleições para deputado federal, mas seu
herdeiro não foi eleito.
A partir de então, ele faz uma guinada
política em direção a outra força política, o então presidente Jair Bolsonaro
(PL).
"Iremos às urnas para reeleger o
presidente Bolsonaro. Esse é o momento de buscarmos os indecisos, reforçar as
nossas bandeiras e escolher a melhor opção para o bem do Brasil", chegou a
postar Collor durante as eleições de 2022. .
Os dois passaram a participar de eventos
políticos juntos e Collor tenta, em 2022, disputar o governo de Alagoas mais
uma vez, mas fica em terceiro lugar e não consegue ir ao segundo turno.
"Em 2022, foi a consolidação da tragédia
política de Collor. Ele não disputa a reeleição ao Senado, tenta a eleição para
governador e vai muito mal. Ele se alia a Jair Bolsonaro, mas fica isolado no
âmbito regional", diz Luciana Santana.
Em maio de 2023, oito anos após seu processo
ter iniciado no STF, Collor foi condenado por corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.
No ano seguinte, ele ainda tentou um último lance
político ao apoiar o sobrinho, Fernando Affonso Lyra de Mello, na disputa pela
prefeitura de Maceió.
O apoio chamou atenção porque o sobrinho é
filho de Pedro Collor de Mello, o irmão do ex-presidente que revelou a suposta
participação de Fernando Collor no esquema de corrupção orquestrado por PC
Farias entre os anos 1980 e 1990.
Apesar da reunião familiar em torno de seu
sobrinho, Lyra de Mello foi eleito e Collor ficou, mais uma vez, sem um
sucessor político.
• Derrotas
econômicas
No campo econômico, Fernando Collor de Mello
também vem enfrentando sucessivas crises. As empresas da família, outrora
dominantes no campo da comunicação em Alagoas, enfrentam um processo de
recuperação judicial com dívidas milionárias.
Segundo reportagem do portal UOL, as empresas
do grupo entraram em recuperação judicial em 2019 com uma dívida estimada em R$
64 milhões. O grupo inclui rádios, uma emissora de TV, entre outras empresas.
Em 2022, uma assembleia de credores aprovou o
plano da empresa para evitar a falência.
Parte da dívida já foi repactuada. De acordo
com o portal da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, as duas maiores dívidas
federais das empresas vinculadas a Collor somam pelo menos R$ 32,3 milhões.
A BBC News Brasil procurou a defesa do
ex-presidente, mas até o momento, nenhuma resposta foi enviada.
Com base nos dados divulgados por Collor à
Justiça Eleitoral, sua fortuna saiu de R$ 20 milhões, em 2018, para R$ 6
milhões, em 2022. Em 2018, por exemplo, sua declaração incluía carros
importados como modelos da BMW, Range Rover e Toyota, alguns deles custando até
R$ 943 mil.
Em sua declaração de bens mais recente,
Collor elencou uma mansão avaliada em R$ 4 milhões localizada em Campos do
Jordão. O imóvel, porém, foi penhorado pela Justiça para garantir o pagamento
de dívidas trabalhistas em 2024.
Esses valores, porém, podem não indicar o
total dos bens do político, uma vez que ele não é obrigado a declarar à Justiça
Eleitoral a integralidade de seu patrimônio.
Em outra frente, a família Collor também
mantém uma disputa jurídica com a Rede Globo. Segundo reportagem do UOL, a
empresa da família Marinho tenta, desde 2023, o fim do contrato com as empresas
de Collor de Mello para retransmitir o sinal da TV Globo em Alagoas. O grupo
alagoano, no entanto, recorre e tenta manter o contrato.
• Desunião
e fim do clã?
Para Luciana Santana, além dos rumos dados
por Collor à trajetória política de seu clã, também pesa contra a família o
fato de ela ser supostamente marcada por divisões.
A principal delas foi a que existiu entre
Fernando e Pedro Collor. O rompimento entre os irmãos, iniciado durante o
escândalo do caso PC Farias, perdurou até a morte de Pedro, em 1994, vítima de
um câncer no cérebro.
Além disso, Santana ressalta que nenhum dos
cinco filhos de Collor, entre eles duas adolescentes de 19 anos, tem capital
político para sucedê-lo.
Segundo ela, o espaço deixado pela família
Collor de Mello foi, paulatinamente, preenchido pelo poder das famílias
Calheiros e Lira.
Os Calheiros, por exemplo, além de terem
Renan no Senado, também têm Renan Filho como um dos ministros mais próximos do
presidente Lula. Em 2022, a família apoiou a eleição de Paulo Dantas (MDB) ao
governo de Alagoas.
A família Lira, por outro lado, emplacou
Arthur Lira na presidência da Câmara entre 2021 e 2025 e ainda é considerado
por analistas como um dos políticos mais influentes da República. Seu pai, o
ex-senador Bernardo de Lira, comandava o município de Barra de São Miguel, no
interior de Alagoas, até janeiro deste ano, quando faleceu.
Diferentemente do que acontece como os
Calheiros e os Lira, Luciana Santana diz que é difícil imaginar uma retomada do
prestígio político da família Collor de Mello no curto prazo.
"Eu não vejo ninguém na família com esse
potencial [...] Temos, então, essa história marcada por sucessos
surpreendentes, mas vieram acompanhadas de derrocadas tão marcantes
quanto".
Fonte: BBC News Brasil

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