Leonardo Attuch: Prisão de Collor prepara o
terreno para Bolsonaro
A prisão do ex-presidente Fernando Collor de
Mello na madrugada desta sexta-feira marca um divisor de águas na história
política do Brasil. Trata-se de uma consequência direta da decisão do ministro
Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que rejeitou os últimos
recursos da defesa e determinou o imediato cumprimento da pena de oito anos e
dez meses em regime fechado, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em
esquema envolvendo a BR Distribuidora.
Collor foi preso por volta das 4h da manhã,
em Maceió, quando se deslocava para Brasília com o objetivo de se apresentar
espontaneamente à Justiça. Ainda assim, acabou sendo custodiado pela Polícia
Federal e permanece na Superintendência da corporação na capital alagoana. Seu
último recurso havia sido rejeitado na noite anterior, e o STF iniciou já nesta
sexta-feira o julgamento virtual que avaliará se mantém ou revoga a ordem de
prisão.
Do ponto de vista jurídico, a decisão de
Moraes é natural. Collor foi condenado em última instância e já não dispunha de
mecanismos para postergar o cumprimento da pena. Além disso, as provas de sua
culpa eram abundantes, fartamente documentadas nos autos. O que impressiona é
que, mesmo com uma trajetória política marcada pela desonra – tendo sido o
primeiro presidente da Nova República a sofrer impeachment por corrupção –
Collor ainda era tratado com certa reverência por parte da elite política e
empresarial brasileira.
Esse tratamento diferenciado, que por décadas
garantiu a impunidade de figuras de alto escalão, começa a ruir. E esse
precedente, que já atinge Collor, se estende inevitavelmente a Jair Bolsonaro,
que também coleciona provas esmagadoras contra si por envolvimento direto na
tentativa de golpe de estado em 8 de janeiro de 2023. Bolsonaro foi apontado
por diversos investigados como instigador e articulador dos atos golpistas,
além de ter se cercado de militares e civis empenhados em reverter pela força o
resultado das eleições presidenciais de 2022, vencidas pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva.
A prisão de Collor e o destino já traçado de
Bolsonaro revelam muito sobre a natureza da elite dominante no Brasil, definida
pelo sociólogo Jessé Souza como a “elite do atraso”. Trata-se de uma classe
dirigente que, em vez de abraçar projetos de soberania nacional e
desenvolvimento com inclusão social, como os representados por Lula e Dilma
Rousseff, prefere apostar em figuras desqualificadas, caricaturas políticas
moldadas para servir ao atraso, à dependência e ao saque dos bens públicos.
Esses representantes da elite do atraso são
escolhidos não por suas qualidades morais ou intelectuais, mas pela submissão
aos interesses de uma minoria rentista, predadora e antinacional. Enquanto
líderes como Lula e Dilma buscaram fortalecer a indústria nacional, expandir
direitos sociais e projetar o Brasil no cenário internacional como um ator
soberano, Collor e Bolsonaro foram, cada um a seu modo, instrumentos de
regressão. Collor abriu indiscriminadamente a economia e desmantelou setores
estratégicos do Estado. Bolsonaro governou para os setores mais retrógrados do
capital financeiro, perseguiu adversários, incentivou a destruição ambiental e
flertou com o autoritarismo.
A prisão de Collor, portanto, é mais do que
um gesto de justiça tardia. É o prenúncio de uma nova etapa da vida
institucional brasileira, onde a impunidade das elites começa a ser confrontada
com a força do Direito. E essa nova etapa, se levada a sério, não poderá se
furtar ao enfrentamento do caso Bolsonaro.
Punir quem comete crimes – seja ele
ex-presidente, general ou empresário – é condição essencial para a reconstrução
do pacto democrático brasileiro. E, mais do que isso, é o único caminho para
romper com o ciclo vicioso em que a elite do atraso perpetua o
subdesenvolvimento do Brasil, pela via da corrupção e da mediocridade. Se
Collor, símbolo do retrocesso dos anos 1990, está atrás das grades, Bolsonaro,
ícone da barbárie recente, também deverá prestar contas à Justiça.
O Brasil precisa virar essa página. E, para
isso, não basta apenas prender os Collor e os Bolsonaro de hoje. É necessário
também construir um novo projeto nacional, comprometido com a democracia,
ética, a soberania e o progresso social.
• Alerta
Vermelho: entorno de Bolsonaro acende alerta após prisão de Collor
A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou na última quinta-feira (24) a
prisão imediata do ex-presidente e ex-senador Fernando Collor, aumentou a
preocupação entre aliados de Jair Bolsonaro. Segundo informações do O Globo, o
gesto é interpretado como um sinal claro de que o ministro pretende dar
celeridade às investigações sobre a tentativa de golpe de Estado e adotar uma
linha dura contra recursos considerados meramente protelatórios.
Collor foi condenado em maio de 2023 a oito
anos e dez meses de prisão em regime fechado, por envolvimento em um esquema de
corrupção na BR Distribuidora, revelado pela Operação Lava-Jato. Após a
rejeição dos primeiros embargos de declaração pelo plenário do STF em novembro
do ano passado, Moraes negou os segundos recursos em decisão monocrática e
determinou o cumprimento imediato da pena. A decisão ainda será referendada
pelos demais ministros em sessão extraordinária do plenário virtual nesta
sexta-feira (25).Na avaliação do ministro, "o caráter procrastinatório do
recurso pode e deve ser reconhecido monocraticamente pelo ministro relator, o
qual tem competência também para determinar a certificação do trânsito em
julgado e o imediato cumprimento da pena".
A atuação de Moraes tem provocado tensão no
entorno de Bolsonaro, especialmente porque a defesa do ex-presidente considera
fundamentais os recursos que ainda serão apresentados nos processos em que ele
é investigado por participar de uma trama para impedir a posse de Luiz Inácio
Lula da Silva. A expectativa é que a Primeira Turma do STF julgue os primeiros
embargos até dezembro, o que abriria caminho para que, usando o mesmo
entendimento aplicado no caso de Collor, Moraes rejeite novos recursos e decrete
a prisão de Bolsonaro antes do recesso de fim de ano.
Em maio de 2023, o STF considerou que
Fernando Collor, com o apoio dos empresários Luis Pereira Duarte de Amorim e
Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos, recebeu R$ 20 milhões em propina para
facilitar contratos da BR Distribuidora com a UTC Engenharia. O acerto teria
envolvido, ainda, apoio político para nomeações e manutenção de diretores da
estatal.Apesar de o plenário da Corte ter negado o primeiro recurso de Collor
ainda em 2023, um pedido de destaque do ministro André Mendonça transferiu a
análise do plenário virtual para o físico, o que acabou adiando a execução da
pena. Com o novo entendimento firmado por Moraes, essa estratégia perde
força.Nos bastidores do STF, ministros reconhecem que o julgamento da tentativa
de golpe — considerado um dos processos mais sensíveis da história recente da
Corte — deve ter desfecho antes do fim de 2025.
A
decisão envolvendo Collor sinaliza que recursos que apenas retardem a conclusão
dos processos não terão espaço. Essa postura preocupa a defesa de Bolsonaro,
que teme que o ministro esteja disposto a acelerar a responsabilização penal
dos envolvidos.Para setores do Congresso, o endurecimento das decisões do STF
também tem impacto político: ao agir com rapidez, Moraes reforça a autoridade
da Corte diante de casos que abalam a institucionalidade democrática, além de
reduzir margens para manobras jurídicas.Assim como Collor, Bolsonaro poderá
enfrentar a mesma estratégia jurídica, com menor espaço para recursos e
possibilidade de execução imediata da pena caso seja condenado.
• Anistia:
silêncio de Tarcísio gera desconfiança sobre 2026. Por Rachel Vargas
Nomes da esquerda que acompanham os
movimentos em torno do PL da anistia avaliam que o silêncio do governador de
São Paulo, Tarcísio de Freitas, sobre o adiamento da votação do requerimento de
urgência tem uma razão pontual: as eleições gerais de 2026. Para essas
lideranças, Tarcísio seria o maior beneficiado com o adiamento ou, até mesmo,
com o engavetamento da matéria. Isso porque, embora não admita ser candidato à
Presidência da República, a provável ausência de Jair Bolsonaro na corrida
eleitoral colocaria Tarcísio automaticamente no páreo, uma vez que é visto como
o mais competitivo nome da direita atualmente.
O silêncio do governador também gerou ruídos
no entorno de Jair Bolsonaro. O incômodo se deu pela ausência de uma
manifestação pública de Tarcísio após o presidente da Câmara, Hugo Motta,
decidir segurar a votação do requerimento de urgência, até que haja um texto
consensual sobre a matéria. Tarcísio e Hugo são do mesmo partido.
Bolsonaro está inelegível por conta da
reunião com embaixadores, onde apresentou dados falsos sobre o sistema
eleitoral brasileiro, mas essas lideranças acreditam que uma eventual anistia
aos envolvidos nas atos de 8 de janeiro poderia ser usado em futuras ações para
tentar reverter a condenação do ex-presidente.
• Os
marcianos golpistas, o pneu cívico e agora a caneta infectada. Por Moisés
Mendes
O Rio Grande do Sul teve alguns dos
principais líderes do negacionismo deflagrado logo no início da pandemia de
Covid. O médico e deputado Osmar Terra é o mais famoso deles, como defensor da
teoria da imunidade de rebanho que iria conter o surto. Sem a necessidade de
vacinas.
Pois se dissemina agora no Rio Grande do Sul,
pelos mesmos que não temiam contágios na pandemia, a suspeita de que a caneta
da oficial de Justiça que levou a intimação a Bolsonaro pudesse estar
contaminada.
O fato irradiador da hipótese foi essa
declaração do deputado federal Coronel Zucco, em entrevista na quinta-feira à
Band News: “Mandar um oficial de Justiça, não sei qual era a qualidade das
máscaras, não sei o que tinha naquela caneta, material que não está
esterilizado…”
E assim ficou a frase, solta em reticências.
Mas Zucco complementou: “São possibilidades que acabam prejudicando”. As
possibilidades seriam as suspeitas sobre a máscara e a caneta, e os prejuízos
seriam a recaída de Bolsonaro. O que tinha naquela caneta?
A partir daí, tem-se mais um ingrediente ao
roteiro que é escrito dentro de uma UTI. Estagiários de marketing político e
veteranos de todos as formas de vender alguma coisa convergem e também se
desentendem sobre o que acontece no espaço de tratamento intensivo ocupado por
Bolsonaro dentro de um hospital em Brasília.
E o que acontece é o aparentemente
impossível, o imponderável, o improvável, o inacreditável. Um ex-presidente em
estado grave vende capacetes em lives, confraterniza com visitas, ataca o
Supremo, recebe uma oficial de Justiça e tem uma recaída. E logo depois um
deputado sugere que uma caneta e uma máscara estão sob suspeita.
No conjunto de abordagens sobre o que se
passa na UTI, já especularam sobre o óbvio, com platitudes diversas, a partir
do mais elementar do marketing das bizarrices: Bolsonaro precisa ser exposto a
qualquer custo.
É o que temos. Um ex-presidente que dá
publicidade ao seu drama pessoal, como se esse fosse o drama de metade do país,
da forma mais escatológica possível. Funciona?
O estagiário e os veteranos de marketing se
juntam a chutadores sobre o que pode acontecer. Se o Datafolha fizer uma
daquelas pesquisas terrivelmente estranhas, podemos até ficar sabendo que o
povo aprova a série de horrores na UTI de Bolsonaro. E que a fidelização a ele
se mantém ou pode até ter aumentado.
E agora temos a máscara e a caneta, que se
juntam aos celulares erguidos para os céus em busca de marcianos que apoiassem
o golpe, ao Hino cantado em torno de um pneu e a tudo que se viu desde a
pandemia. Temos a máscara e a caneta suspeitas, que passam a ocupar a mesma
prateleira dos chips espiões enfiados em vacinas.
E talvez essa exposição de absurdos continue
funcionando. Não só para o contingente da raiz bolsonarista, mas também para os
da antiga direita, que que alargaram essa base desde 2018.
Enganam-se os que acreditam que somente
pessoas mais expostas às fake news e consideradas ignorantes possam estar
ajudando a disseminar as suspeitas sobre a máscara e a caneta da servidora da
Justiça.
Estamos diante do prolongamento do que
poderia, depois da derrota na eleição e do fracasso do golpe, ter perdido
força. A área da saúde, que mais propicia a disseminação desse tipo de
informação, tem na UTI de Brasília um criadouro de novas suspeitas e conspirações.
Zucco não é um deputado qualquer, é o
candidato de Bolsonaro e de toda a extrema direita ao governo do Rio Grande do
Sul e aparece na liderança em algumas pesquisas.
Foi ele quem tirou do jogo pelo governo
gaúcho o hiperbolsonarista Onyx Lorenzoni, o primeiro parlamentar a apostar em
Bolsonaro em 2018 e que por isso ocupou vários ministérios. Onyx não evoluiu na
sua radicalidade antilulista, e Zucco é agora a versão atualizada do
bolsonarismo no Estado.
A máscara e a caneta vão entrar na campanha.
Aguardem os próximos lançamentos desse Estado que se apresenta, pelo que diz
seu hino, como modelo a toda Terra. O Rio Grande do Sul é altamente contagioso.
Fonte: Brasil 247

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