sábado, 21 de dezembro de 2024

‘Reconciliação’ entre forças armadas e sociedade argentina: a casta de fanáticos de Milei

Em solenidade para entrega de medalhas no Colégio Militar de Buenos Aires no último dia 17, o presidente argentino Javier Milei voltou a falar como o ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) de péssima memória, esforçando-se para esconder crimes de Estado além de contradizer completamente sua própria marca retórica, desde a campanha presidencial no ano passado.

Embora a Argentina seja, nas palavras de ninguém menos que Noam Chomsky, “modelo regional” na condenação de ex-ditadores militares, ainda faltam ser encontrados e devidamente punidos muitos criminosos de Estado, tanto quanto netos raptados, por estes mesmos criminosos, de seus pais “desaparecidos” e assassinados pelas ideias progressistas que possuíam.

·        Quais vidas valem mais? Exceção à direita

Trata-se aqui de mais uma tentativa de se evadir a justiça – sempre quando certos setores estão envolvidos -, com aspecto pacífico. Contudo, não se requer graduação em leis nem grande conhecimento na área de direitos humanos, para se ter ciência de que sem justiça não pode haver paz. Para isso mesmo, a justiça foi desenvolvida e diante dela, não deve existir exceções – o que ocorre em ditaduras. Ou quais vidas valem mais?

O célebre jurista argentino Nicolás Avellaneda (1837-1885) foi sábio ao observar que “o povo que esquece seu passado está condenado a vivê-lo novamente”. O Brasil é patético exemplo disso.

Pois onde está, aqui e sempre em casos como este dentro e fora da Argentina, o declarado, profundo amor dos ideólogos de direita pela família e pela vida, e a bem (mal e porcamente) conhecida “fúria” por promoção de justiça contra criminosos? Quais vidas valem mais? Era tudo mais um grande engodo, então? Neste caso, por que e defendendo os interesses de quem?

Ou o que mais é necessário esperar acontecer, até quando manteremos certas “papas” na língua ao abordar esse tipo de ideologia que traz em suas raízes ódio, discriminação e violência? Aos que ainda tinham alguma dúvida, Milei trata de evidenciar isso (de novo).

·        Por quem dobram os sinos?

Precários sinos de direita que novamente se fazem bem claros, golpeando agressivamente a Argentina nestes dias. Reabrindo feridas, intensificando o choro de vítimas e familiares de vítimas de terror de Estado dos mais cruéis que a história humana teve conhecimento.

Milei reforça neste caso marca de seu estridente governo para certos discursos, e dos ideólogos de direita em todos os cantos do planeta: ressentimento e deleite sobre os manjares do Estado.

A histeria de direita é incapaz de perdoar seus “inimigos” por meras diferenças no campo das ideias. Na Argentina, que viveu a ditadura militares mais sanguinária da América Latina, região mais violenta do mundo, esses “inimigos”, na maioria jovens universitários, professores, jornalistas e escritores, foram torturados e mortos das maneiras mais cruéis.

Muitos deles, sedados com pés e mãos amarrados com arame, acabaram jogados vivos e seminus pelos militares do alto dos aviões ao mar ou ao Rio da Prata a fim de se tentar ser mais eficiente nos crimes de lesa-humanidade, ocultando assim a barbárie mais covarde.

Filhos destas vítimas que tiveram mais sorte, foram sumariamente sequestradas e, ainda bebês, levadas aos familiares dos ditadores militares. Falsamente apresentados como se fossem seus. Assemelha-se a algo como um romance macabro tudo isto, não?

Tudo aquilo, enquanto lá embaixo o massacre passeava livre e soberano sob ordens dos milicos, do alto-empresariado e das cúpulas "religiosas". Bem dissimulado por toda a Argentina interrompendo sonhos, levando famílias inteiras ao indizível desespero e destruição, material e psicológica.

Mas fizeram com que a verdade viesse à tona o implacável tempo – e as ondas do mar trazendo corpos de volta. Expondo o caráter “pró-liberdade” e “família”, enfim, todo o propalado senso de justiça da ditadura militar.

Sempre que os mares da história agem neste sentido, a covardia da casta dominante e dominadora não se constrange em usar e abusar do cinismo para, então, falar em “reconciliação”. Tudo o que passam a desejar, então, é "paz". Sob entusiásticos aplausos de seus seguidores que condenam nos outros, o que aprovam para si.

·        Incoerência entre discurso e prática. Linha bem definida nos abusos do Estado

O que está por detrás deste tipo de "pacificação" sem justiça é, invariavelmente, a intensificação ou o retorno da dominação. Temer e Bolsonaro no Brasil são dois exemplos mais recentes disso; Menem na própria Argentina, foi outro.

A maior bandeira de Milei na campanha eleitoral de 2023 foi varrer do Estado argentino o que ele chama de “casta”, incrustada no poder segundo ele; nada mais nocivo à sociedade, pelo que não raras vezes exalta-se nos já acalorados discursos, levando ao delírio massas de indivíduos longe de apresentar grandes engenharias intelectuais, estando Elon Musk e Donald Trump entre os mais ilustres representantes da mediocridade.

Pois como a tragicomédia não tem limites para alguns, exatamente a manutenção desta casta tem sido regra no governo de Milei. Precisamente isto, motivo de certas divisões nos altos escalões de sua administração "libertária".

Repetindo no Colégio Militar contradições descaradamente insistentes ao longo do ano que completa na Casa Rosada, Milei reforça o já grande poder da casta argentina além de evidenciar, uma vez mais, a verdadeira, inequívoca essência dos setores reacionários mundo afora, reverberando-os perfeitamente em solo argentino nestes sombrios dias: garantia de liberdade irrestrita, sim, para os seus. Aos “inimigos”, todo o rigor da lei.

Não sem razão esta casta de ideólogos fanáticos e oportunistas, marcados pelo monólogo mais "animado", depende raivosamente da ausência de pensamento e questionamento.

 

¨      Milei: “Meu desprezo pelo Estado é infinito”

Javier Milei tem “desprezo infinito” pelo Estado. Isto foi afirmado numa entrevista que concedeu ao The Economist, que o traz na capa. A publicação britânica define-o como “uma toupeira” que veio destruir o Estado por dentro, como o próprio Milei disse em declarações anteriores. Milei pensa que qualquer restrição à livre iniciativa é o caminho mais rápido “para o socialismo”, o mesmo que a economia neoclássica que orienta as políticas da maioria dos países. “Tudo o que puder fazer para eliminar a interferência do Estado, farei”, disse o presidente argentino.

Milei gosta de se apresentar como o “grande desregulamentador”. Criou um ministério especialmente para isso, que colocou nas mãos de um ex-presidente do Banco Central, Federico Sturzenegger. O jornal inglês diz que a eliminação de milhares de regulamentações que considera desnecessárias deveria ser um bom exemplo para os Estados Unidos e para o novo governo de Donald Trump, de quem Milei se declara admirador. “Todos os dias desregulamentamos e ainda temos 3.200 reformas estruturais pendentes”, disse Milei na entrevista. O argentino garante que Elon Musk, que conheceu recentemente em Mar-a-Lago, está disposto a seguir o seu exemplo como parte do futuro governo republicano.

As dificuldades da extrema-direita em aprovar leis no Congresso obrigaram-no a negociar com aqueles que considera parte da “casta”, políticos que não apoiam as suas ideias e que são frequentemente descritos pelo presidente como “ratos” ou “esquerdistas de merda”. Milei admite que, apesar de seu estilo explosivo, “aprendeu muito sobre como fazer política”. Como parte desse aprendizado, autorizou seu chefe da Casa Civil, Guillermo Francos, a negociar com deputados e senadores da oposição a aprovação de uma lei de incentivo ao investimento. Milei agora diz ao The Economist que não tem mais inimigos na política argentina, mas sim rivais que "explicitamente querem que o país tenha um desempenho ruim".

The Economist considera estas mudanças como puro pragmatismo político. E dá como exemplo a mudança de atitude de Milei em relação à China. Durante a campanha de 2023, o argentino disse que não estava disposto a “negociar com assassinos”. Agora, a China é “um parceiro fabuloso”, que “não pede nada. Ele só quer negociar com calma”, disse Milei na entrevista. O mesmo aconteceu com o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, a quem Milei repetidamente chamou de “um comunista corrupto”. “Não vou ser amigo do Lula, mas tenho uma responsabilidade institucional”, disse agora.

A publicação não poupa elogios à política de ajuste de Milei e à sua decisão de encolher o Estado. No entanto, alerta que o seu “fanatismo” pode desviá-lo do objetivo final, que é resolver a situação econômica. Questionado sobre o temor de que isso avance no sistema de freios e contrapesos da democracia na Argentina, Milei respondeu que não se desvia “nem um milímetro das regras acordadas na Constituição”. Um dos projetos que mais questiona a extrema-direita é a sua ameaça de nomear dois novos membros para o Supremo Tribunal por decreto, um deles acusado de manipular casos para beneficiar políticos e empresários amigos.

The Economist critica que Milei está “cada vez mais envolvido em guerras culturais, tal como os seus aliados no estrangeiro. Ele denuncia a ‘ideologia transgênero’, o aborto e as mudanças climáticas, que ele nega serem causadas pelo homem”. Segundo alerta publicação: “como a economia argentina continua a equilibrar-se no fio da navalha, qualquer distração é um perigo”.

 

¨      Sob Trump migrantes do México temem que o “sonho americano” possa se tornar um pesadelo

Desde a vitória eleitoral de Donald Trump em novembro, o futuro dos migrantes em trânsito pelo México se tornou mais incerto do que nunca. O novo presidente prometeu expulsar milhões de imigrantes indocumentados após sua posse em 20 de janeiro.

 “Nada além de mentiras!”, exclamou Vidal Berroteran, um venezuelano de 21 anos, ignorando a retórica anti-imigrante de Donald Trump. Encostado em um vagão de trem abandonado, Vidal examina os trilhos da ferrovia que se estendem à sua frente. Um trem de carga passará por esta área desolada 60 km ao norte da Cidade do México em algumas horas. Ele terá que se agarrar às escadas enquanto ele passa em alta velocidade, viajando no teto para chegar ao norte do México e cruzar a fronteira dos EUA ilegalmente.

Seu sonho americano está no fim desses trilhos, e Vidal se recusa a acreditar que Donald Trump pode impedi-lo de alcançá-lo. No entanto, esta é a promessa que Trump reiterou repetidamente durante sua campanha: livrar os Estados Unidos dos “vermes” que “envenenam o sangue” dos americanos.

<><> Uma corrida contra o tempo

Trump prometeu realizar a maior deportação da história, mirando todos os indivíduos sem documentos — quase 11 milhões de pessoas. Vidal, no entanto, continua cético. “Ele não pode deportar todos os migrantes. São os migrantes que fazem os trabalhos que os americanos não querem fazer — construção, agricultura, todo o trabalho duro”, ele argumentou.

Economistas concordam que deportações em massa podem perturbar a economia americana ao estagnar o crescimento e impulsionar a inflação. Isso fornece um vislumbre de esperança para Vidal e milhões como ele.

Muitos migrantes estão agora em uma corrida contra o tempo, esperando chegar aos EUA e solicitar asilo antes da posse de Trump em 20-01-2025. Na Cidade do México, a Casa Tochan, um abrigo para migrantes, tem visto sua população diminuir diariamente desde a vitória de Trump.

“Naquele dia, o abrigo inteiro ficou em silêncio”, lembrou Adriana Hernandez, uma coordenadora de abrigo. “Na manhã seguinte, um grupo de dez pessoas partiu para o norte, planejando cruzar a fronteira ilegalmente e pedir asilo”. O abrigo, que normalmente abriga até 120 moradores, agora está com metade da capacidade. “Os migrantes não querem mais ficar em abrigos da cidade. Eles estão indo direto para a fronteira, dispostos a cruzar a qualquer custo”.

<><> A desinformação desperta o medo

Hernandez atribuiu muito desse movimento à desinformação. “Muitos acreditam que o aplicativo CBP One [CBP, Customs and Border Protection] será descontinuado em breve, ou que ninguém mais poderá entrar nos Estados Unidos. É por isso que eles estão saindo”, ela explicou.

O CBP One é a única maneira legal de entrar nos Estados Unidos. Os migrantes se registram ao chegar ao México e devem esperar que o aplicativo agende um horário com as autoridades de imigração dos EUA. Esses horários oferecem uma chance de entrar nos Estados Unidos legalmente.

“Mas os rumores são desenfreados aqui. As pessoas dizem que aqueles com nomeações CBP One são presos e encarcerados na fronteira. Outros alegam que um antigo morador deste abrigo foi condenado a dez anos de prisão por tentar cruzar ilegalmente. Essas histórias causam imensa ansiedade”, acrescentou Hernandez.

<><> Tensões crescentes no México

O medo não se limita à Cidade do México. No sul do México, pelo menos cinco caravanas de migrantes se formaram desde a vitória de Trump. As autoridades de imigração mexicanas dispersam a maioria antes de chegar à fronteira, mas os migrantes permanecem inabaláveis.

A presidente mexicana Claudia Sheinbaum garantiu à nação que o México estava preparado para reintegrar cidadãos mexicanos que foram expulsos dos Estados Unidos. No entanto, ela não esclareceu o destino dos migrantes de outros países.

Essa incerteza não detém Berroteran. De pé, ao lado dos trilhos da ferrovia, ele sonha em voz alta com a vida que imagina nos Estados Unidos, escolhendo a esperança em vez do medo.

 

¨      Ordem de Prisão e alerta migratório contra Evo Morales

Já havia sido emitida ordem de prisão a Morales em 16 de outubro, anulada posteriormente. “Hoje, foi apresentada à autoridade jurisdicional [de Tarija] a acusação formal por tráfico de pessoas com circunstâncias agravantes [pedofilia]. Nesse sentido, aguardaremos a audiência sobre as medidas cautelares fixadas pelo juiz. Está sendo solicitada a medida excepcional de prisão preventiva em regime aberto pelo prazo de seis meses”, declarou o procurador-geral do Estado, Roger Mariaca dia 16.

A promotora de Justiça de Tarija, Sandra Gutiérrez, afirmou que também foram apresentadas acusações e solicitada a prisão preventiva de Idelsa P. S, mãe da suposta vítima C.S.V.P, então menor de idade quem em 2016 teria sido engravidada por Morales quanto tinha 15 anos, enquanto seu pai já havia sido preso e enviado para a prisão em outubro.

A suposta relação sentimental entre Morales e a então menor teria tido início em 2015. Seus pais são acusados pela Justiça por ter utilizado a filha menor em troca de benefícios, pessoais e políticos.

Gutiérrez acrescentou foi ativada ainda alerta migratório contra Evo Morales e a mãe da suposta vítima, para impedi-los de deixar o país. Intimados a depor no MP tarijenho em 10 de outubro, Morales e Idelsa não compareceram.

Na realidade, segundo Gutiérrez já havia mandado de prisão ativos contra ambos antes da divulgação do dia 16. “Não tornei público antes, porque os relatórios apresentados pela Polícia através das suas diferentes unidades, indicavam que havia ameaças de diferentes tipos. Não queria ser cúmplice disso, pois respeitamos a vida e é isso que a Constituição Política do Estado estabelece. É por isso que não tornamos público o mandado de prisão contra Evo Morales e a senhora Idelsa Pozo”, disse a promotora.

Relatórios da Polícia Nacional e da Inteligência bolivianas indicam que não foi possível localizar o ex-presidente com o fim de prendê-lo no município de Villa Tunari nem em Lauca Ñ (Cochabamba), devido aos riscos técnicos e operacionais causados ​​pela falta de segurança e pela resistência organizada dos seguidores de Morales nas respectivas zonas.

Em outro boletim de ocorrência enviado pela Polícia de Cochabamba à Promotoria Departamental de Tarija, é mencionado que a execução da prisão de Morales foi impossível já que este não foi encontrado no endereço declarado. O que significa que o ex-presidente encontra-se, atualmente, foragido da Justiça de seu país.

Gutiérrez disse que, neste tempo todo de investigação iniciada em 26 de setembro deste ano, têm sido colhidas vastas provas que condenam o ex-presidente boliviano. Isto já havia sido declarado pelo ministro de Governo, Eduardo del Castillo no mês passado.

Embora a maior parte destas supostas provas estejam ainda mantidas em segredo de justiça, uma das que seriam essas provas segundo o MP, indicariam, segundo revelado em 30 de outubro, que a então menor de idade teria viajado de avião nacional e internacionalmente pelo menos 79 vezes entre 2015 e 2019 o que, de acordo com a acusação, está totalmente fora de contexto dada as origens humildes da família de C.S.V.P.

Hoje com 26 anos, C.S.V.P. encontra-se desaparecida com a filha E.S.N.V. de 8 anos logo que o caso tornou-se público. No dia 16 de outubro, circularam imagens registradas por câmeras públicas de segurança de Tarija que mostram suposta tentativa de sequestro de C. S. V. P. e de sua filha por uma Hillux branca. Considera-se que C.S.V.P. esteja foragida a fim de não depor.

Desafiado pelo governo a negar as acusações, Morales limita-se a dizer que é vítima de perseguição política. Na única abordagem mais direta relacionada a este caso, em entrevista coletiva perguntado por um jornalista boliviano se teria tido uma filha com a então menor de idade C.S.V.P., o ex-presidente não foi nada direto, mas um tanto sugestivo na resposta: “como já disse Lucho [presidente Luis Arce], com a família não se mete”.

 

Fonte: Por  Edu Montesanti, para IHU/La Croix International/El País

 

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