quarta-feira, 4 de setembro de 2024

81% dos adolescentes brasileiros têm fatores de risco para doenças crônicas

A maioria dos adolescentes brasileiros (81,3%) tem dois ou mais fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis, como problemas cardiovasculares e diabetes. Isso é o que revela um estudo recente da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), publicado no periódico BMC Pediatrics, que avaliou o estilo de vida dos jovens considerando hábitos alimentares, atividade física, tabagismo, entre outros.

Os autores do estudo usaram dados do principal inquérito nacional de vigilância de fatores de risco em escolares, a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE), que contou com a participação de 121.580 adolescentes com idades entre 13 e 17 anos, de escolas públicas e privadas em todo o país. Os jovens responderam a questionários com perguntas sobre sete variáveis: consumo de frutas e vegetais, ingestão regular de refrigerantes, doces e álcool, prática de exercícios, sedentarismo e tabagismo.

O principal fator de risco detectado foi a falta de atividade física, já que 71,5% dos entrevistados se exercitam pouco. Além disso, mais da metade (58%) não ingere a quantidade adequada de frutas e verduras, e um terço (32,9%) consome doces como balas e chocolates em excesso. A pesquisa também observou que 17,2% abusam de refrigerantes e 28,1% do álcool. Uma minoria (6,2%) é fumante.

Não houve diferença entre alunos de escolas públicas e privadas. Os resultados foram um pouco melhores nas zonas rurais; já a região Sudeste é onde os jovens mais apresentaram dois ou mais fatores de risco. “A gente esperava um cenário ruim, mas não tanto”, diz a enfermeira Alanna Gomes da Silva, primeira autora do estudo e residente pós-doutoral na Escola de Enfermagem da UFMG. “Sabe-se que o estilo de vida está entre as principais causas dessas doenças e apenas 3,9% dos jovens não têm fatores de risco, enquanto 9% apresentam todos os sete”, comenta Silva.

“Os resultados não surpreendem, mas assustam”, avalia o cardiologista pediátrico Gustavo Foronda, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Isso é o que temos visto nos últimos anos, principalmente nos grandes centros urbanos, com crianças e jovens apresentando uma qualidade de vida cada vez pior. Tanto que os adolescentes de hoje são mais doentes do que os de 40 ou 50 anos atrás.”

Há vários motivos por trás da mudança de hábitos. “A violência urbana, por exemplo, impacta a atividade física, já que as crianças deixam de brincar na rua, em praças ou parques, e passam a depender de atividades orientadas, como aulas de esporte, ou ser sócias de clubes, e isso não é acessível a todos”, afirma o médico do Einstein.

O uso de eletrônicos, como celulares, tablets e videogames, é tolerado pelos pais como uma forma de distração e de deixar as crianças mais tranquilas. Já a facilidade de acesso a produtos ultraprocessados acaba prejudicando a qualidade alimentar. “Hoje é mais fácil montar um lanche com salgadinhos e suco de caixinha, por exemplo”, observa Foronda.

O problema é que costuma haver uma associação desses hábitos ruins – uma criança que já é sedentária pode passar horas no videogame beliscando guloseimas, por exemplo. Tudo isso impacta, inclusive, a socialização e a saúde mental.

Esse estilo de vida pouco saudável aumenta a possibilidade de doenças numa faixa etária mais precoce.  “Observamos um crescimento no número de crianças com sobrepeso, com hipertensão e colesterol alto”, relata o cardiologista pediátrico. “Mas nossa maior preocupação é porque um adolescente com todos esses fatores de risco leva a um adulto com mais fatores de risco para doenças cardiovasculares, obesidade, síndrome metabólica e até certos tipos de câncer, já que o risco dessas doenças aumenta muito quando todos esses fatores já estão presentes na infância e adolescência.”

Hoje, sabe-se que a longevidade está associada a cinco pilares relacionados ao estilo de vida: sono adequado, alimentação saudável, atividade física regular, controle do estresse e socialização. “Esses números nos preocupam demais porque nenhum desses pilares está sendo cumprido desde a infância para que esses adolescentes sejam adultos saudáveis. Infelizmente, as pessoas também não estão entendendo a importância desses cuidados”, lamenta o médico.

Para Alanna Gomes da Silva, faltam medidas voltadas para esse público. “É preciso promover ações que envolvam a escola, os pais e toda a sociedade e incluam questões como a merenda escolar, o acesso ao consumo de frutas e hortaliças que, às vezes, é dificultado por questões socioeconômicas”, diz. A pesquisadora alerta que é preciso estimular a atividade física tanto na escola quanto no lazer, com maior controle do uso de telas pelos pais e responsáveis.

 

•                                  Uso de tablets na infância pode causar explosões de raiva, diz estudo

Praticamente todos os pais de crianças pequenas já experimentaram explosões de raiva e frustração de seus filhos, seja na hora de acordar, dormir ou comer um sanduíche sem a casca. De acordo com um novo estudo, publicado na segunda-feira (12), há uma possível razão para a frequência desses surtos: o uso de tablets.

O novo estudo, publicado na revista JAMA Pediatrics, mostra que o uso de tablets por crianças de 3,5 anos foi associado a um maior número de expressões de raiva e frustração um ano depois. Além disso, crianças que eram mais propensas a raiva e frustração aos 4,5 anos tinham mais chances de ter maior uso de tablets um ano depois (aos 5,5 anos).

O uso de tablets na primeira infância “pode contribuir para um ciclo” de problemas na regulação emocional, segundo os autores do estudo.Para entender mais sobre o assunto, a CNN conversou com a especialista em bem-estar, Leana Wen. Ela é médica de emergência e professora associada adjunta da Universidade George Washington e, anteriormente, serviu como comissária de saúde de Baltimore. Além disso, ela é mãe de duas crianças pequenas.

LEIA A ENTREVISTA:

<><> A maioria dos pais já experimentou uma crise de birra dos filhos pequenos depois que tiramos o tablet deles. O que esse estudo descobriu?

Leana Wen: Este estudo foi uma pesquisa com 315 pais de crianças em idade pré-escolar da Nova Escócia, Canadá. Os mesmos pais participaram do estudo quando seus filhos tinham 3,5 anos (em 2020), 4,5 anos (em 2021) e 5,5 anos (2022). Eles relataram o uso de tablets por seus filhos e, em seguida, avaliaram as expressões de raiva das crianças usando um questionário padrão chamado Children’s Behavior Questionnaire.

Os pesquisadores encontraram uma associação entre o uso de tablets aos 3,5 anos e um aumento na raiva e frustração aos 4,5 anos. Eles observaram que a associação entre o uso de tablets e a raiva era bidirecional, pois crianças cujos pais notaram um nível mais alto de raiva e frustração aos 4,5 anos também tinham maior uso de tablets aos 5,5 anos. Isso significa que os efeitos podem ir nos dois sentidos.

É importante considerar que este estudo ocorreu durante os anos de pico da pandemia de Covid-19. Os pesquisadores notaram esse contexto e o fato de que a pandemia introduziu mais estresse e interrupções na rotina. Ainda assim, a associação bidirecional entre o uso de tablets e a expressão de raiva e frustração foi significativa e deve servir como um alerta para os pais estarem cientes do tempo de tela.

<><> Você se surpreendeu com os resultados deste estudo?

Wen: De forma alguma. Já houve outros estudos que chegaram a resultados semelhantes.

Um artigo publicado neste ano lança alguma luz sobre o motivo pelo qual o uso de tablets pode estar relacionado a explosões de raiva. Os pesquisadores descobriram que, entre crianças de 2 a 5 anos, aquelas cujos pais frequentemente usavam tecnologia para gerenciar suas emoções negativas eram mais propensas a mostrar uma má gestão da raiva e frustração um ano depois.

Essas crianças também eram menos capazes de decidir por uma resposta deliberada em vez de uma reação automática.

Um dos motivos é que as crianças precisam aprender a lidar com suas próprias emoções negativas. Elas precisam passar por esse processo como parte do seu desenvolvimento infantil, auxiliadas pelos pais, cuidadores e professores.

Se, em vez disso, elas são dadas a um tablet, computador ou smartphone na tentativa de acalmá-las, elas não aprenderão a gerenciar essas emoções por conta própria. Isso pode resultar em problemas mais tarde na infância e na vida adulta, incluindo a gestão da raiva.

<><> Isso significa que os pais devem evitar completamente os tablets para seus filhos?

Wen: Não necessariamente. Existem alguns aplicativos que podem ajudar no aprendizado, e muitas escolas usam tablets em seu currículo de ensino. Acho que o novo estudo da JAMA Pediatrics, assim como outras pesquisas, ilustra que tablets, smartphones e outros eletrônicos não devem ser usados como chupetas. Eles não devem ser dados às crianças quando elas estão chorando e chateadas para tentar acalmá-las.

Eles também não devem ser usados como uma babá que substitui a interação de um adulto com a criança. As crianças aprendem através do engajamento social ativo com outras pessoas, e um grande problema com as telas — seja jogando aplicativos ou assistindo a filmes ou programas de TV — é que elas substituem a interação face a face com outras crianças e adultos.

<><> Você tem dois filhos pequenos. Qual é a sua política sobre o uso de tablets?

Wen: Eu me esforço bastante para limitar o tempo de tela. Meus filhos, de 4 e quase 7 anos, podem assistir a uma hora de filme nos fins de semana. Durante a semana, o uso da tela é limitado a quando um deles tem uma exacerbação de asma e precisa usar a máquina de nebulização; permito que assistam a um programa por no máximo 10 minutos para concluir o tratamento respiratório.

Temos tablets que eu deixo que eles usem em ocasiões especiais. Por exemplo, acabamos de fazer um longo voo transatlântico para visitar a família do meu marido na África do Sul. As crianças puderam usar seus tablets durante o voo. Além disso, se elas estiverem na casa de um amigo e outras crianças estiverem brincando com um tablet, não proibiríamos que elas também brincassem. Claro, elas têm permissão para usar tablets na escola, se for necessário.

Ainda assim, entendo muito bem a tentação de dar tablets para as crianças. Minha caçula passou por um período de terríveis birras, e eu sabia que ela se acalmaria se eu colocasse um programa ou deixasse usar o tablet. Também é realmente difícil às vezes quando o cuidado infantil falha e meu marido ou eu precisamos de uma babá.

Em várias ocasiões, quando tive reuniões virtuais e nenhuma babá, tive que ceder e deixar as crianças assistirem a um filme enquanto eu participava da reunião. Tento fazer dessas situações a exceção, e não a regra, pois quero limitar os possíveis impactos do uso de tablets nos meus filhos.

<><> O novo estudo é sobre crianças pequenas. E quanto a crianças mais velhas — o que as pesquisas dizem sobre o uso de telas por elas, especialmente o tempo que passam nas redes sociais?

Wen: Há muitas pesquisas sobre esse tópico que culminaram no cirurgião-geral dos EUA, Vivek Murthy, emitindo um aviso alertando os pais sobre os perigos das redes sociais. No início deste ano, Murthy afirmou que gostaria de adicionar um aviso nos aplicativos de redes sociais, semelhante aos avisos em cigarros e bebidas alcoólicas.

Em um estudo, meninas que passaram duas horas ou mais nas redes sociais foram mais propensas a relatar depressão e automutilação em comparação com aquelas que usaram menos. Outro grande estudo envolvendo três conjuntos de dados descobriu que adolescentes que usaram redes sociais por cinco ou mais horas por dia tinham 171% mais chances de estarem infelizes em comparação com aqueles que usaram por menos de uma hora por dia.

Isso no contexto do uso quase universal das redes sociais, com até 95% dos jovens de 13 a 17 anos relatando o uso de redes sociais. Os adolescentes americanos relatam passar uma quantidade chocante de tempo — quase cinco horas por dia — no YouTube, TikTok, Instagram e outros aplicativos de redes sociais.

Existem vários problemas com esse nível de uso de redes sociais, um dos quais é o que esse tempo está substituindo. Crianças que estão grudadas em seus telefones e tablets por essa quantidade de tempo não estão participando de esportes e não estão tendo atividade física suficiente. Elas não estão interagindo na vida real umas com as outras. E não estão dormindo adequadamente. Todos esses fatores são prejudiciais ao bem-estar físico e mental.

<><> Que conselho você daria para os pais sobre o uso de telas?

Wen: Eu recomendaria quatro coisas: Primeiro, para aqueles que têm filhos ainda pequenos, adiem o uso de smartphones e redes sociais pelo maior tempo possível. Isso funciona melhor se você puder coordenar com outros pais, pois a pressão dos colegas é uma das grandes razões pelas quais as crianças começam.

Segundo, como mencionado antes, os pais devem tentar não recorrer às telas e tablets como uma maneira de parar as birras. Para crianças pequenas, as birras são uma parte normal do desenvolvimento. Pais que estão preocupados com a frequência ou duração das birras devem consultar seu pediatra.

Terceiro, para aqueles cujos filhos já têm smartphones e usam aplicativos de redes sociais, conversem com eles sobre o impacto das redes sociais sobre eles. Alguns podem reconhecer o potencial viciante de seus dispositivos e querer reduzir o uso por conta própria. Outros podem ser convencidos a reduzir o tempo nas telas em favor de outras atividades, como tempo presencial com amigos.

Quarto, estabeleçam limites. Isso deve incluir nada de telefones no quarto durante a noite e lugares que devem estar livres de dispositivos — como a sala de aula e a mesa de jantar. Os pais também devem seguir esses limites e dar um bom exemplo. Não é surpresa que estudos também tenham mostrado que pais que passam muito tempo grudados em seus dispositivos são mais propensos a ter filhos que também o fazem.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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