'Competência a Embraer tem de sobra':
empresa brasileira pode aproveitar vácuo da Boeing?
Acentuada nos últimos
meses, a crise da Boeing abre uma brecha de oportunidade para que outras
empresas abocanhem parte do mercado de aviação civil, atualmente dominado pelo
duopólio da norte-americana e do conglomerado europeu Airbus.
Deflagrada por uma
porta que caiu durante o voo em janeiro deste ano, o momento atual de crise na
Boeing representa um ponto baixo na história recente da empresa de aviação
norte-americana, que vê já há alguns anos surgirem dúvidas quanto à qualidade
dos seus aviões.
"Até muito
recentemente a Boeing era sinônimo de avião", lembra Mauricio Pontes,
gestor de crises e CEO da C5i Consultoria em Gestão de Crises. "Foi ela
que desenvolveu o modelo que potencializou e possibilitou as viagens
transoceânicas com o 707."
Os primeiro sinais de
problemas apareceram em 2013, quando os modelos 787 começaram a ter problemas
elétricos por conta das suas baterias. Depois, em 2018 e em 2019, dois
acidentes envolvendo o 737 Max e o sistema de estabilização de voo MCAS
ocorreram na Indonésia e na Etiópia, ceifando 346 vidas.
Segundo Enio Beal Jr,
piloto de aviação executiva e analista do Canal Proa Certa, os detalhes de
operação das aeronaves com o MCAS não foram repassados apropriadamente aos
pilotos.
"Fizeram um
produto que, em tese, exigiria um treinamento maior dos pilotos, mas isso teria
um custo maior. Então a decisão foi incorporar o sistema sem que todos os
detalhes fossem repassados aos tripulantes."
Para Pontes, a raiz
dos problemas na empresa pode ser traçado para a fusão da Boeing com sua
principal concorrente nos Estados Unidos, a Douglas, "que tinha uma
cultura totalmente diferente".
"E as
pessoas-chave da Douglas assumiram as posições-chave que seriam de se esperar
que fossem da Boeing, que era a dona do negócio."
"A partir desse
momento, você começa a ter um foco muito grande na lucratividade, um foco muito
grande no acionista, um foco muito grande na rentabilidade, com cortes de
custos, mas sem prejuízo da inovação."
Com o tempo, isso
tornou as decisões da empresa menos operacionais e mais financeiras, destacou.
"Você começa a ter uma perda no controle de qualidade que era estado da
arte [...], é o que ouvimos de funcionários 'whistleblowers' [denunciantes]."
Beal sublinha que o
principal setor afetado foi o de controle de qualidade, muito por conta de uma
confluência de fatores, como a decisão da Administração Federal de Aviação dos
EUA (FAA, na sigla em inglês) de conceder à Boeing uma autorização para que ela
própria se fiscalizasse, "em boa parte porque nem a FAA tinha condições
fazer isso", sublinhou Beal, "o que acabou levando por um caminho não
muito correto".
Depois dos acidentes
aéreos, destaca Beal, a empresa se deparou com uma "maré de azar".
"Como, por exemplo, perder uma roda numa decolagem", disse, "que
não tem nada a ver com a produção do avião em si".
"Soluções
equivocadas foram encontradas para problemas econômicos e, juntamente com uma
supervisão mal feita — a transferência de responsabilidade da FAA para a Boeing
—, tudo isso ocasionou esses problemas que estamos vendo agora",
diagnosticou o especialista.
Segundo Pontes, a
Boeing não soube dar resposta para esses problemas que foram aparecendo.
"O gerenciamento de crise foi muito pouco sensato, foi muito lento. Se não
fosse a empresa que é, não teria sobrevivido."
"O nome da
Boeing, apesar de ter resistido um pouco, começou a entrar numa espiral
negativa."
• Embraer pode tirar vantagem desse
momento?
Atualmente, o mercado
de aviação civil é dominado por duas empresas, a estadunidense Boeing e a
europeia Airbus. Apesar de criarem diversos modelos de aeronaves, cada uma tem
um domínio sobre um mercado próprio da aviação.
A norte-americana é
uma grande produtora de aviões wide-body, ou de fuselagem larga, capaz de levar
até 500 passageiros por vez. Já a europeia possui um domínio maior no setor de
aeronaves narrow-body, ou fuselagem estreita, que transporta por volta de 200
passageiros.
Dessa forma, ainda que
sejam competidoras, as empresas acabam dividindo o mercado e dificultando com
que novas empresas entrem.
É o caso da Embraer,
destaca Beal, que opera em outro nicho da aviação justamente para "não
brigar nessa seara". Em vez disso, a empresa brasileira produz aviões com
porte mais regional.
Em média, as aeronaves
E-Jets da companhia transportam cerca de 100 passageiros, diz Pontes. "A
Embraer é muito bem sucedida no seu modelo de negócio, explorando distâncias
mais curtas, com jatos confortáveis e extremamente confiáveis."
Isso não quer dizer
que a empresa não tenha capacidade para atuar nesses outros segmentos.
"Competência, capacidade a Embraer tem de sobra. Seja para estrutura, seja
para integrar sistemas, seja para desenvolver tecnologias", disse.
"É só ver o
KC-390", afirma o analista de aviação. O transportador militar é um
"avião de fuselagem muito mais larga".
"O nicho da
Embraer é outro", disse. "É uma decisão estratégica da empresa e que,
apesar dela ter condições de fazer esse tipo de avião, ela opta por não entrar
nessa briga."
• Cooperação com a Rússia e a China
Ainda assim, o cenário
da aviação global pode ver algumas mudanças a partir desse momento titubeante
da Boeing, afirma Elton Fernandes, professor titular dos programas de
engenharia de produção e engenharia de transportes do Instituto Alberto Luiz
Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe) da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A Embraer não é a
única gigante do setor capaz de perfurar essa bolha da aviação. Tanto a Rússia
quanto a China desenvolvem, através de empresas estatais, seus próprios modelos
de aeronave para diminuir sua dependência de empresas norte-americanas e europeias.
É o caso, por exemplo
do C919 da chinesa Comac e o MC-21 da russa United Aircraft Corporation. Ambas
as empresas ainda desenvolviam em conjunto o Craic CR929, mas devido às sanções
contra a Rússia, a China acabou por tocar o projeto sozinha.
Essas empresas
poderiam se beneficiar de uma parceria com a Embraer. "Todas elas possuem
suas expertise tecnológica e comerciais", diz Fernandes, mas o diferencial
da brasileira é que ela "negocia no mundo todo".
"Os governos e as
empresas ainda não perceberam a importância de elas fazerem parceria para poder
competir com a Boeing e a Airbus."
Há mercados crescentes
na África, na Ásia e na América Latina que poderiam absorver essa produção,
destacou o professor. "A indústria de aeronaves está com a visão ainda
muito curta e nacionalista."
• Israelense Elbit Systems ganha licitação
bilionária de obuseiros do Exército
A empresa israelense
Elbit Systems, com seu modelo Atmos, foi a vencedora da licitação de compra de
obuseiros autopropulsados sobre rodas do Exército Brasileiro.
Dentro do programa
Obtenção da Capacidade Operacional Plena (OCOP), do Exército, a compra será
financiada com recursos do Novo PAC e terá um valor estimado em US$ 180 milhões
(R$ 900 milhões), mais uma margem de 15% a 20% para treinamento de pessoal.
É esperado que a Elbit
Systems assine o contrato para entrega do lote de amostra em 7 de maio, no
salão de honra da Chefia de Material do Comando Logístico, em Brasília.
O EB divulgou não só o
resultado, como a classificação de cada um dos quatro finalistas. Foram
julgados aspectos técnicos, comerciais, de suporte logístico inicial/integrado
e offset. As empresas participantes receberam do Exército suas notas em cada
uma das áreas analisadas.
<<<< As
posições foram:
1.Atmos - Elbit
Systems
2.Zuzana 2 -
Konstrukta/Excalibur
3.Caesar - Nexter/KNDS
4.SH-15 - Norinco
Durante o processo de
licitação, o EB já havia afirmado que as atuais divergências entre o governo
federal e o governo israelense não influenciariam na sua decisão. No entanto,
nos últimos dias, deputados do PT, PDT, Psol e PCdoB têm pressionado pela anulação
de todos os contratos de defesa com Israel, incluindo o da compra de obuseiros.
Fonte: Sputnik Brasil
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