Ministros do STM homenageiam bolsonaristas
que atacam o Judiciário
O Supremo Tribunal
Militar (STM) condecorou com suas mais altas honrarias uma série de autoridades
por terem “prestado reconhecidos serviços ou demonstrado excepcional apreço” à
Justiça Militar, no último dia 10 de abril. Entre os homenageados estão figuras
bolsonaristas que regularmente atacam o Supremo Tribunal Federal (STF) – esfera
máxima do Poder Judiciário, ao qual a Justiça Militar está subordinada, a exemplo do pastor Silas Malafaia e do
comentarista Guilherme Fiúza.
A lista de
homenageados é definida em novembro do ano anterior por ministros do STM e,
eventualmente, em reuniões extraordinárias do conselho da Ordem do Mérito
Judiciário Militar. Ou seja, as honrarias foram definidas já durante o governo
Lula e incluem dez parlamentares do Congresso, sendo três deles da base do
governo e sete do centrão ou da oposição.
Um dos homenageados
pelo STM foi o líder máximo da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, pastor
Silas Malafaia, visto no evento portando
a insígnia de “distinção” da Justiça Militar abraçado ao ministro do STM e
general quatro estrelas do Exército Lourival Carvalho Silva, indicado
pelo governo Bolsonaro
à corte militar.
Crítico contumaz do
Judiciário, Malafaia já desferiu uma série de ataques públicos
contra integrantes do STF, como, por exemplo, quando chamou o ministro
Alexandre de Moraes de “ditador desgraçado”.
O pastor esteve ao
lado de Jair Bolsonaro (PL) em alguns de seus ataques mais inflamados contra o
STF, como no dia 7 de setembro de 2021 na avenida Paulista, em São Paulo,
quando Malafaia convocou fiéis para a marcha bolsonarista e subiu no mesmo caminhão de som do ex-presidente. Na mais recente manifestação do tipo,
novamente na capital paulista, em fevereiro passado, Malafaia repetiu a
dose, criticando mais uma vez a Corte.
O comunicador
bolsonarista Guilherme Fiúza foi outro dos agraciados com a insígnia de
“distinção” pela Justiça Militar. Comentarista em programas de rádio e internet
de veículos alinhados à extrema direita, Fiúza já chamou ministros do STF de “hipócritas”, dizendo à época da pandemia que “tem um autoritarismo na Corte” e que o “Judiciário se desmoraliza sozinho”. Logo após o fatídico 8 de Janeiro, o comunicador
foi alvo de decisão judicial que bloqueou seus perfis em redes sociais por
alegação de que estaria divulgando discursos antidemocráticos.
·
Honrarias são para pessoas com atributos
morais e éticos, segundo o STM
Segundo o regulamento da Ordem do Mérito Judiciário Militar, que define
condições para a concessão das honrarias, “os agraciados deverão ter atributos
de condutas moral, ética, pessoal e profissional idôneas, compatíveis com os
valores cultuados pela JMU [Justiça Militar da União]”.
Em outras palavras, a
condecoração no último dia 10 mostra que os ministros do STM enxergam tais qualidades
também em outros homenageados no evento que celebrou o 216o aniversário da Justiça
Militar.
A insígnia de “alta
distinção”, por exemplo, geralmente se destina a figuras da política e do
Judiciário. Uma das escolhidas para recebê-la neste ano foi a senadora e
ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos do governo Bolsonaro Damares
Alves (PL), que votou a favor de um projeto de lei que limita os poderes do STF.
Além disso, a
ex-ministra mantinha em seu gabinete um dos suspeitos de tentar explodir uma
bomba nas proximidades do aeroporto de Brasília em 2022 e uma pastora do “300 do Brasil”. A tentativa de
explosão foi parte da trama golpista que culminou no fatídico 8 de janeiro de
2023, e estavam no acampamento extremista “300 do Brasil” os autores dos disparos de rojões e fogos
de artifício contra a sede do Supremo em 2020.
A insígnia de “alta
distinção” foi concedida também ao governador de Santa Catarina, Jorginho
Mello (PL), e à deputada federal Bia Kicis (PL), dois ferrenhos bolsonaristas.
Kicis acumula críticas
ao STF, ao qual já atribuiu um suposto “ativismo vil” no início de seu primeiro mandato, em 2019. Além disso, em
2021, a deputada criticou o Judiciário por supostamente pressionar deputados contra um projeto de
lei para a adoção do voto impresso nas eleições federais do ano seguinte.
Aumentam, assim, as
fileiras de bolsonaristas homenageados nos últimos anos. Em 2021, na época da
pandemia, o STM deu honrarias para
Anderson Torres, Eduardo Pazuello, Paulo Guedes, Ricardo Salles e outros do
alto escalão do governo Bolsonaro.
A Pública perguntou
à Justiça Militar os motivos para homenagear pessoas que notadamente atacam o
Poder Judiciário. Em resposta, o STM disse apenas que “os nomes citados atendem
aos requisitos necessários às indicações para a Ordem do Mérito Judiciário
Militar”.
Em 2024, o STM
homenageou também membros da cúpula do atual governo, como o vice-presidente da
República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços,
Geraldo Alckmin (PSB), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre
Padilha (PT), além dos ministros da Educação, Camilo Santana (PT), e do
Trabalho, Luiz Marinho (PT).
Também receberam as
honrarias o deputado federal e ex-presidente da Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) da Câmara Rui Falcão (PT), além dos ministros indicados pelo
presidente Lula (PT) ao STF Cristiano Zanin e Flávio Dino.
·
Honrarias, política e os planos da Justiça
Militar
As condecorações da
Justiça Militar foram entregues em um momento importante politicamente para o
STM. A Corte trabalha pela aprovação de projetos de lei no Congresso – como um
que aumenta seus poderes judiciais e outro que lhe concederia assentos no Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), como já reportado pela Pública.
Há, inclusive, pessoas
ligadas ao CNJ entre as homenageadas com a Ordem do Mérito do Judiciário
Militar: a ex-conselheira Salise Monteiro Sanchonete, desembargadora federal do
Tribunal Regional Federal da 4a Região indicada ao conselho
pelo governo Bolsonaro,
e o assessor jurídico Leonardo Peter da Silva, chefe de gabinete do conselheiro do CNJ Marcello Terto e professor no Instituto de Educação
Superior de Brasília.
Para o advogado
Cláudio Lino, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Análise de
Legislações Militares (Ibalm), a entrega das honrarias é uma forma de a Justiça
Militar se aproximar de autoridades jurídicas e políticas para avançar com seus
objetivos.
“Através dessas
solenidades, ministros do STM conseguem se aproximar de seus objetivos
políticos, além de agradar autoridades do próprio Judiciário e da política”,
disse o diretor do Ibalm à Pública, alegando ainda que “não é salutar essa
aproximação da Justiça Militar com a Justiça Civil”.
Ø Lula contém o ímpeto para evitar novos enfrentamentos e
tensões
O megafone de um
presidente é uma das ferramentas mais poderosas da política. Um governante
habilidoso talvez consiga incluir na ordem do dia qualquer assunto que
considere importante. Às vezes, ele aproveita para distrair o eleitor ou lançar
fumaça sobre um tema inconveniente. Quando fala o que não deve, o dano também
pode ser grande.
Lula ensaiou uma
calibragem na conversa desta terça (23) com jornalistas. Depois de reclamar de
reportagens que reproduzem suas declarações, o presidente tentou fugir de bolas
divididas e evitou dar combustível para disputas políticas. “É preciso que a gente
pense o que vai falar, porque tudo o que você falar pode virar uma manchete”,
refletiu.
O contraste ficou
claro quando Lula se referiu a dois desafetos. O primeiro foi o chefe do Banco
Central. Roberto Campos Neto perdeu a alcunha de “esse cidadão”, e a política
de juros recebeu uma crítica suave para os padrões do petista. O presidente recorreu
apenas a uma ironia leve ao insinuar que conta os meses para a troca de comando
do BC.
O petista também
recolheu as armas quando surgiu o assunto Lava Jato. Lula, que no ano passado
confessou seu desejo de uma vendeta contra Sergio Moro, agora se recusou a
comentar o processo de cassação do ex-juiz ou as ações contra magistrados no
Conselho Nacional de Justiça, “para ninguém dizer que eu estou querendo fazer
interferência”.
O cálculo de Lula
envolveu ainda panos quentes numa disputa com um Congresso permanentemente
indócil. O petista fingiu que só tinha motivos para agradecer aos parlamentares
e fez pouco-caso da derrubada iminente de seus vetos.
Para completar o jogo,
não quis pronunciar o nome de Jair Bolsonaro ou agitar o fantasma do
ex-presidente.
O efeito negativo de
declarações polêmicas de Lula costuma ser superestimado. Ainda assim,
auxiliares do presidente acreditam que a repercussão de alguns desses episódios
tiveram peso sobre sua queda de popularidade em determinados nichos do
eleitorado.
Fonte: Por Caio de
Freitas Paes, da Agencia Pública/FolhaPress
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