Crise na Venezuela: Da eleição ao mandado
de prisão contra o opositor Edmundo González
A Justiça da Venezuela
emitiu um mandado de prisão contra o candidato de oposição Edmundo González,
nesta segunda-feira (2). O documento foi expedido a pedido do Ministério
Público, que o acusa de faltar em depoimentos para investigação.
O MP venezuelano disse
que pediu a prisão de González após o oposicionista ignorar três intimações. O
órgão é aliado do presidente Nicolás Maduro e controlado por chavistas. A
prisão de González não ocorreu até a última atualização desta reportagem.
O pedido do MP é mais
um episódio da crise na Venezuela após as eleições no país, em 28 de julho. O
Conselho Nacional Eleitoral (CNE) declarou Maduro vencedor do pleito, mas o
resultado, divulgado sem a publicação das atas eleitorais, é questionado pela oposição
e pela comunidade internacional.
A oposição diz que
González foi o vencedor da eleição.
<<<<< Entenda
a cronologia da crise no país:
• 28 de julho: Eleição na Venezuela. A
votação foi marcada por forte tensão.
• 28 de julho: CNE denunciou ataque hacker
que derrubou site da autoridade eleitoral e supostamente impediu a publicação
das atas eleitorais.
• 29 de julho: Na madrugada, o presidente
Nicolás Maduro e o candidato de oposição, Edmundo González, se declararam
vencedores da eleição.
• 29 de julho: CNE declarou Maduro
vencedor da eleição com 51,2% dos votos, contra 44% de Edmundo González, com
cerca de 80% das urnas apuradas. O resultado foi contestado por líderes
mundiais -- não houve publicação das atas.
• 29 de julho: Oposição contestou
resultado do CNE e disse ter como provar vitória de Edmundo González na
eleição.
• 29 de julho: Após divulgação de
resultado do CNE, protestos contra o governo Maduro começaram a acontecer na Venezuela.
• 30 de julho: Maduro ordenou
posicionamento das Forças Armadas nas ruas da Venezuela para coibir protestos
contra o governo.
• 30 de julho: Oposição publicou site com
apuração própria da eleição a partir de cerca de 80% das atas eleitorais,
obtidas nas seções eleitorais de todo o país.
• 31 de julho: Maduro disse que María
Corina Machado, líder da oposição, e González "têm que estar atrás das
grades" e que "a Justiça vai chegar" para eles.
• 31 de julho: Centro Carter, órgão
internacional que observa eleições, disse que "pleito na Venezuela não
pode ser considerado democrático".
• 1º de agosto: EUA disseram que Edmundo
González foi o vencedor da eleição. O país foi seguido por outros, como Uruguai
e Argentina, no dia seguinte.
• 2 de agosto: Tribunal Supremo de Justiça
convocou todos os candidatos presidenciais para audiência de assinatura de
aceite do resultado divulgado pelo CNE. Edmundo González não compareceu.
• 2 de agosto: CNE reiterou vitória de
Maduro e atualizou os números, mas ainda sem mostrar as atas: 51,95% dos votos
para Maduro, contra 41,18% para González, com 96,87% das atas apuradas.
• 5 de agosto: Edmundo González proclamou
a si mesmo presidente eleito, com base na apuração com as atas obtidas pela
oposição.
• 7 de agosto: MP abriu investigação
criminal contra oposição por divulgação de site com contagem paralela das atas
eleitorais.
• 10 de agosto: Suprema Corte iniciou
auditoria dos resultados da eleição e disse que decisões do tribunal serão
"inapeláveis".
• 22 de agosto: TSJ declarou Maduro
vencedor após suposta auditoria das atas eleitorais do CNE e proibiu a
divulgação das atas.
• 23 de agosto: EUA, UE e mais dez países
rejeitaram a decisão do TSJ venezuelano de declarar vitória de Maduro.
• 23 de agosto: Grupo de ex-líderes da
América Latina e Espanha chamaram decisão do Supremo da Venezuela de
"golpe de Estado".
• 23 de agosto: Ministério Público da
Venezuela anunciou que convocará González para depor na investigação criminal
realizada pelo órgão no âmbito da publicação do site com as atas.
• 26 de agosto: CNE acatou decisão do TSJ
e reafirmou vitória de Maduro.
• 26 de agosto: Diretor do CNE denunciou
"falta de transparência e de veracidade" na eleição.
• 29 de agosto: MP ameaçou González com
prisão caso ele falte à terceira convocação para depoimento.
• 29 de agosto: Diante da não publicação
das atas eleitorais um mês após a eleição, a União Europeia não reconheceu a
"legitimidade democrática" da reeleição de Maduro.
• 2 de setembro: Justiça acatou pedido do
MP e emitiu mandado de prisão contra González.
<><> Mandado
de prisão contra González
González é investigado
por crimes como usurpação de funções da autoridade eleitoral, falsificação de
documentos oficiais, incitação de atividades ilegais e sabotagem de sistemas.
O procurador-geral da
Venezuela, Tarek Saab, chegou a afirmar que o depoimento de González seria
sobre a publicação de atas impressas das urnas eleitorais em um site.
O opositor já havia
sido advertido pelo Ministério Público sobre a possibilidade de um mandado de
prisão contra ele caso não comparecesse ao depoimento.
Com o temor de prisão,
González faltou às convocações do MP, assim como o fez quando o Tribunal
Supremo de Justiça convocou todos os candidatos da eleição para assinarem um
documento reconhecendo o resultado divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral
(CNE).
O CNE deu a vitória a
Maduro sem apresentar as atas eleitorais. Tanto a Suprema Corte quanto o
Conselho Eleitoral são alinhados ao governo Maduro.
O presidente Nicolás
Maduro ameaça González e Corina Machado de prisão desde a eleição, dizendo que
os opositores "têm que estar atrás das grades". A última foi quanto
ele usou uma analogia com "ganchos" ao candidato opositor ao discursar
durante evento na quarta-feira (28):
"O que
aconteceria se o citam e não vai na primeira vez? O que acontece se não for na
segunda? E na terceira? Gancho. O juiz está obrigado a aplicar a lei. Um
cidadão que respeite a democracia, a República, a Constituição e as leis jamais
pode se recusar a uma convocação judicial", disse.
A comunidade
internacional vem denunciando repressão contra opositores na Venezuela, além de
afirmar que houve falta de transparência nas eleições presidenciais.
A líder opositora
María Corina Machado antecipou que "obviamente não irá comparecer".
"Do que estamos falando?", questionou em uma coletiva de imprensa com
a mídia espanhola.
<><> Corina
Machado na mira do MP
O Conselho Nacional
Eleitoral afirmou que González ficou em 2º lugar nas eleições presidenciais,
sendo derrotado por Nicolás Maduro. Entretanto, a oposição garante que González
venceu por ampla vantagem com base nos dados das atas eleitorais.
Após o resultado das
eleições, milhares de pessoas foram às ruas para protestar contra o resultado.
Em agosto, o
procurador-geral Tarek Saab acusou a opositora María Corina Machado de ser
responsável por arquitetar protestos que terminaram em mais de 20 mortes no
país após as eleições presidenciais.
O procurador-geral
afirmou que abriu uma investigação contra Corina Machado e outras pessoas da
oposição, classificados por ele como membros da "extrema direita".
Segundo Saab, as
manifestações que aconteceram após o dia 28 de julho foram ações planejadas.
Milhares de pessoas foram às ruas protestar contra Nicolás Maduro, que foi
proclamado reeleito para um terceiro mandato presidencial pelas autoridades
eleitorais.
Para o
procurador-geral da Venezuela, o país vive uma "guerra híbrida" com
uma tentativa de golpe de Estado. Saab afirmou que existe uma escalada de
pressões patrocinada pelos Estados Unidos desde 2017 para derrubar Maduro do
poder.
"Hoje, os
venezuelanos a responsabilizam [María Corina Machado] por todas essas mortes,
que foram assassinados em situações que não podem ser classificadas como
protestos."
Ao ser questionado se
Corina Machado poderia ser acusada por homicídio, Saab afirmou que "a
qualquer momento, qualquer um deles poderá ser responsabilizado como autor
intelectual de todos esses acontecimentos".
¨
Agência de notícias da Venezuela usa
apresentadores feitos com IA para evitar perseguição do governo
Um dos mais novos
âncoras televisivo venezuelanos senta em um banquinho, usando uma camisa de
flanela e calça social enquanto lê as manchetes do dia. Ele é conhecido como
"El Pana", gíria venezuelana para "amigo". Só tem um
detalhe: ele não é real.
El Pana, e a sua
colega, a "La Chama," ou "a garota", foram gerados
utilizando inteligência artificial, ainda que eles tenham aparência, falem e se
mexam realisticamente. Veja no vídeo acima.
Eles foram criados
como parte da iniciativa "Operação Retuíte" pela organização
Connectas, sediada na Colômbia.
O objetivo é publicar
notícias de dezenas de veículos de imprensa independentes venezuelanos e
proteger repórteres num momento de perseguição do governo contra jornalistas e
manifestantes.
"Decidimos usar
inteligência artificial para ser o ‘rosto’ da informação que estamos
publicando”, disse o diretor do projeto, Carlos Huertas, em entrevista.
Ao menos 10
jornalistas foram presos desde meados de junho e oito seguem na prisão sob
acusações que incluem terrorismo, de acordo com Repórteres Sem Fronteiras.
"Usar
inteligência artificial aqui é quase uma mistura entre tecnologia e
jornalismo”, disse Huertas, explicando que o projeto pretende “driblar o
aumento da perseguição” do governo já que não haveria ninguém para ser preso.
A oposição no país e
grupos de defesas de direitos humanos disseram que prisões recentes de
manifestantes, figuras oposicionistas e jornalistas são parte de estratégia do
governo. O regime busca calar, por vezes com violência, o conflito relacionado
à eleição presidencial.
O ministro das
Comunicações venezuelano não respondeu aos pedidos de comentário sobre a
iniciativa de jornalismo com IA. Nenhuma autoridade do país respondeu aos
repetidos pedidos de comentário da Reuters sobre a prisão de jornalistas nas
últimas semanas.
Tanto a oposição
quanto o presidente Nicolás Maduro alegam ter vencido a eleição de 28 de julho.
Maduro, no cargo desde
2013, tem o apoio do Tribunal Supremo e da autoridade eleitoral, que não
publicou as atas completas da eleição com a justificativa de que sofreu um
ataque digital.
Protestos desde a
eleição provocaram 27 mortes e 2,4 mil prisões ou detenções de figuras
oposicionistas e manifestantes.
Fonte: g1/Reuters
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