Leonardo
Attuch: O laranjão amarelou
O
laranjão, também conhecido como Donald Trump, não conseguiu sustentar sua
guerra comercial nem mesmo por uma semana. Na linguagem popular, o laranjão
instalado na Casa Branca amarelou. Arregou, miou, perdeu.
Depois
de anunciar tarifas de 125% sobre produtos chineses, com pompa e fúria
nacionalista, Trump voltou atrás e isentou exatamente os itens mais relevantes
da lista: celulares, laptops, chips e componentes eletrônicos — ou seja, tudo o
que move a economia digital dos Estados Unidos. A medida escancarou o fracasso
da estratégia trumpista e revelou, mais uma vez, a distância entre o discurso
do valentão e a prática de governo.
O
recuo, feito de forma envergonhada durante a madrugada por meio de um
comunicado da alfândega americana, foi um alívio para gigantes como Apple, Dell
e Nvidia. Mas também foi um vexame político. Como explicar ao eleitorado que a
“mão firme” contra a China virou um afago nos interesses do Vale do Silício?
Que a prometida reconstrução industrial sucumbiu à realidade do consumo e da
inflação?
Trump
tentou posar de estadista que colocaria a América em primeiro lugar, mas o que
entregou foi um festival de improvisações e retrocessos. Suas idas e vindas
tornaram-se rotina, e seu estilo errático transforma qualquer tentativa de
política consistente em um jogo de cena. Não é à toa que, com menos de 90 dias
de mandato, Trump já é visto por muitos como um pato manco — um presidente
esvaziado, sem rumo e sem autoridade real para conduzir os destinos da ainda
maior potência do planeta, embora haja controvérsias.
O
vexame se amplia quando se observa a reação firme chinesa: tarifa retaliatória
de 125%, instabilidade nos mercados e um sinal claro de que o mundo não está
disposto a se curvar ao ego inflado do inquilino da Casa Branca. O ouro
disparou, os juros longos subiram e o dólar derreteu – uma combinação que
reflete a crescente desconfiança dos agentes econômicos diante de um governo
que mais parece uma roleta russa.
Em vez
de liderar os Estados Unidos rumo a uma nova era de protagonismo industrial,
Trump os empurra para o isolamento, a instabilidade e a irrelevância
estratégica. O laranjão pode ter gritado, ameaçado e batido no peito. Mas, como
sempre, quando percebeu o tamanho do estrago, deu meia-volta e fugiu – aliás,
como costumam fazer seus imitadores no Brasil e na América Latina. O fato
incontestável é que Trump amarelou e ainda não recebeu uma ligação de Xi
Jinping.
¨
A teoria do valentão. Por Washington Araújo
Intimidação
para dominar os mais frágeis, explorando suas vantagens físicas e psicológicas
para consolidar poder. Esse comportamento, embora geralmente associado à
infância, transcende os limites do pátio escolar e ecoa em dinâmicas políticas
e econômicas globais. A Teoria do Valentão, que tento formular neste artigo,
explica como a intimidação e o abuso de poder se perpetuam de forma insidiosa,
tanto em relações interpessoais quanto no cenário internacional.
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Minha experiência com o bullying
Esse
tema encontra eco em minha experiência pessoal. Nos anos de adolescência, no
Colégio Nossa Senhora das Vitórias, em Açu, enfrentei os desafios que muitos
fragilizados enfrentam. Magro e franzino, frequentemente era o alvo nos jogos
de voleibol. Os saques mais fortes e as pancadas mais agressivas vinham
diretamente a mim, vindos de um colega substancialmente maior, cujas dimensões
físicas triplicavam as minhas e cuja altura me superava em cerca de 20
centímetros.
Diante
disso, tive de escolher: enfrentar ou abandonar. Escolhi permanecer, resistindo
às humilhações e me colocando como contraponto à dinâmica do valentão. Essa
vivência revelou muito sobre como o poder é exercido e como a resistência
silenciosa pode moldar dignidade.
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Psique do valentão: um olhar psicanalítico
Sigmund
Freud definiu que o valentão opera sob o domínio do id, a parte impulsiva e
primitiva da mente, buscando satisfação imediata. Além disso, a incapacidade de
equilíbrio entre o ego (a racionalidade) e o superego (as normas sociais)
transforma essas inclinações em comportamentos destrutivos.
Lacan
complementa afirmando que o valentão projeta suas inseguranças no outro,
utilizando a violência como reflexo de suas deficiências internas. Já Carl Jung
conecta o comportamento do agressor à "sombra", o arquétipo que
armazena os aspectos rejeitados da psique. O medo de encarar suas próprias
vulnerabilidades faz com que o valentão intensifique suas ações opressoras como
um mecanismo de fuga emocional.
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Um valentão no jogo de poder global
No
âmbito internacional, os Estados Unidos, particularmente sob o governo de
Donald Trump, incorporaram esse papel de valentão global. Por meio de políticas
protecionistas, tarifas exorbitantes e sanções econômicas, o governo americano
impôs sua vontade sobre outros países, muitas vezes desconsiderando os impactos
globais. A guerra comercial com a China é um exemplo claro dessa dinâmica.
Em
2018, Trump iniciou com tarifas de 25% sobre produtos chineses. Essa
percentagem evoluiu ao longo dos anos, alcançando 145% em 2025, uma das taxas
mais agressivas na história recente. A resposta da China veio rapidamente:
Pequim aumentou suas tarifas sobre produtos americanos para 125%, além de impor
restrições a produtos estratégicos como sorgo, baterias de lítio e carne de
frango. Xi Jinping, presidente chinês, condenou essa postura como
"bullying comercial" e afirmou que a China possui ferramentas prontas
para resistir até o fim.
Essa
batalha tarifária ocorre entre dois colossos econômicos e militares. Os Estados
Unidos, com um PIB superior a US$ 27 trilhões e o maior orçamento militar do
mundo, de US$ 900 bilhões, enfrentam uma China economicamente menor, com PIB de
US$ 18,4 trilhões, mas altamente resiliente e equipada com o segundo maior
exército do mundo e crescente sofisticação tecnológica.
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Mexer com pequenos e oposição com iguais
Enquanto
os EUA impõem severidade diante do Vietnã — com sua economia de apenas US$ 470
bilhões e uma renda per capita de US$ 4 mil —, as dinâmicas contra a China são
mais equilibradas. Pequenas economias, como o Vietnã, têm pouca margem para
retaliar contra uma potência econômica como os EUA. Já a China demonstra sua
capacidade de resistir ao bullying comercial, abrindo novos mercados e
fortalecendo iniciativas internas.
Outros países
também sofrem. O México, com um PIB de US$ 1,3 trilhão e cujo comércio com os
EUA compõe cerca de 75% de suas exportações, foi severamente afetado por
tarifas impostas sobre commodities como aço. O Canadá, por sua vez, com um PIB
de US$ 2,5 trilhões, viu sua relação comercial histórica com os EUA estremecer
após medidas unilaterais que buscavam restringir sua venda de matérias-primas
centrais como alumínio.
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Groenlândia, Panamá e… a Europa
A
ambição imperialista, disfarçada de estratégia comercial, ficou evidente em
ações como a tentativa de Trump de adquirir a Groenlândia, rica em minerais e
com relevância geopolítica crescente no Ártico. Já o interesse pelo controle
estratégico do Canal do Panamá ilustra outra faceta do bullying americano, onde
as infraestruturas globais são vistas como extensões de sua influência
unilateral.
A União
Europeia também foi alvo das políticas agressivas de Trump. Como principal
parceiro histórico dos EUA, a Europa viu tarifas prejudiciais serem
implementadas, colocando em risco setores estratégicos como a indústria
automotiva alemã. Líderes europeus, como Ursula von der Leyen, criticaram
veementemente a postura protecionista, reforçando que o unilateralismo
americano estava minando as estruturas de governança global. Bruxelas, em
alinhamento com Pequim, começou a reorganizar políticas comerciais para
resistir às ações americanas, amparada por seu PIB conjunto de cerca de US$ 16
trilhões.
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Bullying comercial e riscos globais
A
recorrência do termo bullying nas críticas globais reflete o
simbolismo das práticas americanas. Xi Jinping reafirmou recentemente que
"ameaças nunca funcionarão com a China". O bullying comercial,
afirmou ele, prejudica não apenas seus alvos diretos, mas também desestabiliza
cadeias globais de suprimento, em um momento crítico de recuperação econômica
pós-pandemia.
Assim
como as forças físicas dependem do equilíbrio e da resistência, as economias
globais respondem ao poder opressor criando contraforças. Países frequentemente
alvos de bullying comercial, como o México e a China, diversificam suas
parcerias comerciais e fortalecem suas lideranças internas. A dependência mútua
é evidente, destacando que a força unilateral não é sustentável no mundo atual.
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O verdadeiro significado do poder
Minha
vivência no Colégio Nossa Senhora das Vitórias reflete, em microescala, a
lógica do valentão: há uma força destrutiva na imposição de poder, mas sua
vitória é temporária diante da determinação e resiliência. Esta incipiente
Teoria do Valentão exemplifica as consequências de práticas agressivas, como as
tarifas e sanções dos EUA, cujos impactos reverberam globalmente.
Só por
meio do diálogo, da consulta e da cooperação será possível criar um sistema
onde a justiça prevaleça sobre o domínio — isto porque tudo o que aflige a
parte, aflige o todo.
O
futuro global exige que abandonemos práticas que reforçam desigualdades e
insegurança. Ao contrário da força bruta, líderes que constroem pontes e
promovem o diálogo serão essenciais para o desenvolvimento de um equilíbrio
estável em um mundo interdependente. Não custa nada visitar os livros de
história para vermos que os valentões entram neles pelas portas dos fundos,
quase sempre mencionados em notas de rodapé — enquanto os líderes servidores e
solidários emergem no palco da história.
¨
Para o imperialismo trumpista, só resta a força bruta.
Por Jair de Souza
Nos
últimos dias, o mundo entrou em polvorosa em razão da guerra tarifária
deflagrada pelo presidente de extrema direita dos Estados Unidos, Donald Trump,
contra todas as demais nações do planeta, mas que, no final, acabou sendo mesmo
uma agressão aberta e direta contra a China.
Se, num
primeiro momento, parecia que o extremista de direita que está no comando da
Casa Branca estava atirando a esmo, visando alvejar a todos os demais países,
independentemente de que fizessem ou não parte do grupo subordinado às
diretrizes estadunidenses, agora, o panorama vai se mostrando de modo mais
cristalino. Já está mais do que evidente que o propósito prioritário do ataque
era e é, especificamente, encurralar e inviabilizar o funcionamento normal da
economia do país que demonstrou haver aprendido melhor do que quaisquer outros
a nadar nas águas da globalização, pensada e gestada por representantes de
Washington com o objetivo primordial de ajudar os Estados Unidos a manterem sua
absoluta hegemonia internacional.
Entretanto,
hoje em dia, está evidente que a agilidade e a eficiência da economia chinesa
levaram o país asiático a superar por ampla margem sua contraparte
estadunidense. Assim, se nossa análise se circunscrevesse à realidade
estritamente econômica, ninguém vacilaria em afirmar que, a despeito de todos
os golpes tarifários desfechados pelo governo de Donald Trump, no final do
processo, a China sairia ainda mais fortalecida, e os Estados Unidos em
condições piores que as que se encontravam antes da deflagração de seu
belicismo tarifário.
Portanto,
nossa convicção neste caso se ampara no conhecimento da gritante superioridade
das estruturas econômicas da República Popular da China em comparação com o que
prevalece atualmente na potência norte-americana. Diante da pujança da economia
chinesa, os Estados Unidos se assemelham a um país atrasado e incapaz de sequer
imaginar que possam competir com alguma possibilidade de se saírem vitoriosos.
Porém,
é preciso ressaltar que nem tudo depende sempre unicamente de fatores netamente
econômicos. E é neste ponto em que os aspectos militares ganham peso. E,
indubitavelmente, em termos militares, os Estados Unidos continuam sendo, de
longe, a maior potência em todo o planeta. Em outras palavras, por mais
obsoletas que sejam suas estruturas econômicas, o poderio bélico estadunidense
é muitíssimo superior ao de todas as outras nações.
Mas,
seria possível algum país se impor sobre os restantes com base exclusivamente
em sua força militar? Para começar a meditar sobre esta pergunta, é bom trazer
à memória um fato com o qual, quase com certeza, a maioria de nós já se deparou
em nosso tempo de escola primária. Quem não se lembra de algum colega de classe
que, apesar de dar mostras de ser o menos interessado em entender as matérias
de estudo, de nunca tirar boas notas nas avaliações, além de ser incapaz de
ganhar a simpatia da turma por meio de bons argumentos, apelava para a
truculência com o propósito de intimidar os coleguinhas? Assim como neste
exemplo, via de regra, é com o emprego da força bruta que os valentões costumam
fazer prevalecer seus desígnios em detrimento dos demais.
Em
consequência, podemos pensar no papel atual dos Estados Unidos de maneira algo
similar. Para eles, convém que a manutenção de sua hegemonia global e a solução
de suas desavenças com a China se encaminhem pelo lado da força bruta, já que
apenas neste campo eles podem aspirar a ter alguma chance real de se sagrarem
vencedores da contenda.
Como se
sabe, os Estados Unidos contam com mais de 900 bases militares estrategicamente
situadas em pontos-chave de nosso planeta, de modo a lhes facilitarem uma
rápida intervenção de força bruta contra qualquer adversário que demonstre
representar alguma ameaça a seus interesses geoestratégicos. Casos concretos da
utilização prática deste dispositivo de intervenção militar são mais do que
abundantes ao longo das últimas décadas.
Contudo,
se nos enveredamos pelo caminho da ingenuidade, podemos nos perguntar: de onde
provêm os recursos que possibilitam aos Estados Unidos manter este gigantesco
aparato militar de prontidão intervencionista? Esta indagação ganha ainda mais
sentido se nos lembrarmos de que, como pudemos elucidar nas linhas anteriores,
estamos falando de um país que decididamente não tem uma economia das mais
dinâmicas.
Então,
para entender como um país que está longe de contar com pilares econômicos que
lhe deem sustentação para arcar com os incomensuráveis gastos necessários para
instalar e operar tantas bases militares pelo mundo afora, precisamos recorrer
a um tema que já abordamos em várias outras oportunidades: a persistência do
dólar estadunidense no exercício da função de moeda referência para o
intercâmbio comercial a nível internacional. Sem contar com esta dádiva “mais
do que divina”, os Estados Unidos não teriam como bancar os custos para a
manutenção de sua imensa máquina de intervenção bélica, espalhada pelos quatro
cantos do globo.
Para
evitar a repetição de explicações já apresentadas em textos anteriores,
gostaria de recomendar a releitura dos argumentos que expusemos no artigo deste
enlace,
(https://www.brasil247.com/blog/o-encontro-dos-brics-e-a-armadilha-do-dolar) no
qual procurei dar detalhes de como o dólar vem funcionando como um instrumento
imprescindível para a sustentação dos gastos parasitários dos Estados Unidos,
mormente em relação com seu poderio bélico.
O certo
é que, neste ponto crucial da história, quando estamos a um passo de uma nova
virada importante de página, torna-se condição indispensável para todos os que
almejam livrar o mundo das maléficas garras do imperialismo entender os fatores
que ainda sustentam a continuidade dos Estados Unidos em sua posição de força
hegemônica no cenário mundial.
Fonte:
Brasil 247

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