segunda-feira, 14 de abril de 2025

Leonardo Attuch: O laranjão amarelou

O laranjão, também conhecido como Donald Trump, não conseguiu sustentar sua guerra comercial nem mesmo por uma semana. Na linguagem popular, o laranjão instalado na Casa Branca amarelou. Arregou, miou, perdeu.

Depois de anunciar tarifas de 125% sobre produtos chineses, com pompa e fúria nacionalista, Trump voltou atrás e isentou exatamente os itens mais relevantes da lista: celulares, laptops, chips e componentes eletrônicos — ou seja, tudo o que move a economia digital dos Estados Unidos. A medida escancarou o fracasso da estratégia trumpista e revelou, mais uma vez, a distância entre o discurso do valentão e a prática de governo.

O recuo, feito de forma envergonhada durante a madrugada por meio de um comunicado da alfândega americana, foi um alívio para gigantes como Apple, Dell e Nvidia. Mas também foi um vexame político. Como explicar ao eleitorado que a “mão firme” contra a China virou um afago nos interesses do Vale do Silício? Que a prometida reconstrução industrial sucumbiu à realidade do consumo e da inflação?

Trump tentou posar de estadista que colocaria a América em primeiro lugar, mas o que entregou foi um festival de improvisações e retrocessos. Suas idas e vindas tornaram-se rotina, e seu estilo errático transforma qualquer tentativa de política consistente em um jogo de cena. Não é à toa que, com menos de 90 dias de mandato, Trump já é visto por muitos como um pato manco — um presidente esvaziado, sem rumo e sem autoridade real para conduzir os destinos da ainda maior potência do planeta, embora haja controvérsias.

O vexame se amplia quando se observa a reação firme chinesa: tarifa retaliatória de 125%, instabilidade nos mercados e um sinal claro de que o mundo não está disposto a se curvar ao ego inflado do inquilino da Casa Branca. O ouro disparou, os juros longos subiram e o dólar derreteu – uma combinação que reflete a crescente desconfiança dos agentes econômicos diante de um governo que mais parece uma roleta russa.

Em vez de liderar os Estados Unidos rumo a uma nova era de protagonismo industrial, Trump os empurra para o isolamento, a instabilidade e a irrelevância estratégica. O laranjão pode ter gritado, ameaçado e batido no peito. Mas, como sempre, quando percebeu o tamanho do estrago, deu meia-volta e fugiu – aliás, como costumam fazer seus imitadores no Brasil e na América Latina. O fato incontestável é que Trump amarelou e ainda não recebeu uma ligação de Xi Jinping.

¨      A teoria do valentão. Por Washington Araújo

Intimidação para dominar os mais frágeis, explorando suas vantagens físicas e psicológicas para consolidar poder. Esse comportamento, embora geralmente associado à infância, transcende os limites do pátio escolar e ecoa em dinâmicas políticas e econômicas globais. A Teoria do Valentão, que tento formular neste artigo, explica como a intimidação e o abuso de poder se perpetuam de forma insidiosa, tanto em relações interpessoais quanto no cenário internacional.

<><> Minha experiência com o bullying 

Esse tema encontra eco em minha experiência pessoal. Nos anos de adolescência, no Colégio Nossa Senhora das Vitórias, em Açu, enfrentei os desafios que muitos fragilizados enfrentam. Magro e franzino, frequentemente era o alvo nos jogos de voleibol. Os saques mais fortes e as pancadas mais agressivas vinham diretamente a mim, vindos de um colega substancialmente maior, cujas dimensões físicas triplicavam as minhas e cuja altura me superava em cerca de 20 centímetros.

Diante disso, tive de escolher: enfrentar ou abandonar. Escolhi permanecer, resistindo às humilhações e me colocando como contraponto à dinâmica do valentão. Essa vivência revelou muito sobre como o poder é exercido e como a resistência silenciosa pode moldar dignidade.

<><> Psique do valentão: um olhar psicanalítico 

Sigmund Freud definiu que o valentão opera sob o domínio do id, a parte impulsiva e primitiva da mente, buscando satisfação imediata. Além disso, a incapacidade de equilíbrio entre o ego (a racionalidade) e o superego (as normas sociais) transforma essas inclinações em comportamentos destrutivos.

Lacan complementa afirmando que o valentão projeta suas inseguranças no outro, utilizando a violência como reflexo de suas deficiências internas. Já Carl Jung conecta o comportamento do agressor à "sombra", o arquétipo que armazena os aspectos rejeitados da psique. O medo de encarar suas próprias vulnerabilidades faz com que o valentão intensifique suas ações opressoras como um mecanismo de fuga emocional.

<><> Um valentão no jogo de poder global 

No âmbito internacional, os Estados Unidos, particularmente sob o governo de Donald Trump, incorporaram esse papel de valentão global. Por meio de políticas protecionistas, tarifas exorbitantes e sanções econômicas, o governo americano impôs sua vontade sobre outros países, muitas vezes desconsiderando os impactos globais. A guerra comercial com a China é um exemplo claro dessa dinâmica.

Em 2018, Trump iniciou com tarifas de 25% sobre produtos chineses. Essa percentagem evoluiu ao longo dos anos, alcançando 145% em 2025, uma das taxas mais agressivas na história recente. A resposta da China veio rapidamente: Pequim aumentou suas tarifas sobre produtos americanos para 125%, além de impor restrições a produtos estratégicos como sorgo, baterias de lítio e carne de frango. Xi Jinping, presidente chinês, condenou essa postura como "bullying comercial" e afirmou que a China possui ferramentas prontas para resistir até o fim.

Essa batalha tarifária ocorre entre dois colossos econômicos e militares. Os Estados Unidos, com um PIB superior a US$ 27 trilhões e o maior orçamento militar do mundo, de US$ 900 bilhões, enfrentam uma China economicamente menor, com PIB de US$ 18,4 trilhões, mas altamente resiliente e equipada com o segundo maior exército do mundo e crescente sofisticação tecnológica.

<><> Mexer com pequenos e oposição com iguais 

Enquanto os EUA impõem severidade diante do Vietnã — com sua economia de apenas US$ 470 bilhões e uma renda per capita de US$ 4 mil —, as dinâmicas contra a China são mais equilibradas. Pequenas economias, como o Vietnã, têm pouca margem para retaliar contra uma potência econômica como os EUA. Já a China demonstra sua capacidade de resistir ao bullying comercial, abrindo novos mercados e fortalecendo iniciativas internas.

Outros países também sofrem. O México, com um PIB de US$ 1,3 trilhão e cujo comércio com os EUA compõe cerca de 75% de suas exportações, foi severamente afetado por tarifas impostas sobre commodities como aço. O Canadá, por sua vez, com um PIB de US$ 2,5 trilhões, viu sua relação comercial histórica com os EUA estremecer após medidas unilaterais que buscavam restringir sua venda de matérias-primas centrais como alumínio.

<><> Groenlândia, Panamá e… a Europa 

A ambição imperialista, disfarçada de estratégia comercial, ficou evidente em ações como a tentativa de Trump de adquirir a Groenlândia, rica em minerais e com relevância geopolítica crescente no Ártico. Já o interesse pelo controle estratégico do Canal do Panamá ilustra outra faceta do bullying americano, onde as infraestruturas globais são vistas como extensões de sua influência unilateral.

A União Europeia também foi alvo das políticas agressivas de Trump. Como principal parceiro histórico dos EUA, a Europa viu tarifas prejudiciais serem implementadas, colocando em risco setores estratégicos como a indústria automotiva alemã. Líderes europeus, como Ursula von der Leyen, criticaram veementemente a postura protecionista, reforçando que o unilateralismo americano estava minando as estruturas de governança global. Bruxelas, em alinhamento com Pequim, começou a reorganizar políticas comerciais para resistir às ações americanas, amparada por seu PIB conjunto de cerca de US$ 16 trilhões.

<><> Bullying comercial e riscos globais 

A recorrência do termo bullying nas críticas globais reflete o simbolismo das práticas americanas. Xi Jinping reafirmou recentemente que "ameaças nunca funcionarão com a China". O bullying comercial, afirmou ele, prejudica não apenas seus alvos diretos, mas também desestabiliza cadeias globais de suprimento, em um momento crítico de recuperação econômica pós-pandemia.

Assim como as forças físicas dependem do equilíbrio e da resistência, as economias globais respondem ao poder opressor criando contraforças. Países frequentemente alvos de bullying comercial, como o México e a China, diversificam suas parcerias comerciais e fortalecem suas lideranças internas. A dependência mútua é evidente, destacando que a força unilateral não é sustentável no mundo atual.

<><> O verdadeiro significado do poder 

Minha vivência no Colégio Nossa Senhora das Vitórias reflete, em microescala, a lógica do valentão: há uma força destrutiva na imposição de poder, mas sua vitória é temporária diante da determinação e resiliência. Esta incipiente Teoria do Valentão exemplifica as consequências de práticas agressivas, como as tarifas e sanções dos EUA, cujos impactos reverberam globalmente.

Só por meio do diálogo, da consulta e da cooperação será possível criar um sistema onde a justiça prevaleça sobre o domínio — isto porque tudo o que aflige a parte, aflige o todo.

O futuro global exige que abandonemos práticas que reforçam desigualdades e insegurança. Ao contrário da força bruta, líderes que constroem pontes e promovem o diálogo serão essenciais para o desenvolvimento de um equilíbrio estável em um mundo interdependente. Não custa nada visitar os livros de história para vermos que os valentões entram neles pelas portas dos fundos, quase sempre mencionados em notas de rodapé — enquanto os líderes servidores e solidários emergem no palco da história.

¨      Para o imperialismo trumpista, só resta a força bruta. Por Jair de Souza

Nos últimos dias, o mundo entrou em polvorosa em razão da guerra tarifária deflagrada pelo presidente de extrema direita dos Estados Unidos, Donald Trump, contra todas as demais nações do planeta, mas que, no final, acabou sendo mesmo uma agressão aberta e direta contra a China.

Se, num primeiro momento, parecia que o extremista de direita que está no comando da Casa Branca estava atirando a esmo, visando alvejar a todos os demais países, independentemente de que fizessem ou não parte do grupo subordinado às diretrizes estadunidenses, agora, o panorama vai se mostrando de modo mais cristalino. Já está mais do que evidente que o propósito prioritário do ataque era e é, especificamente, encurralar e inviabilizar o funcionamento normal da economia do país que demonstrou haver aprendido melhor do que quaisquer outros a nadar nas águas da globalização, pensada e gestada por representantes de Washington com o objetivo primordial de ajudar os Estados Unidos a manterem sua absoluta hegemonia internacional.

Entretanto, hoje em dia, está evidente que a agilidade e a eficiência da economia chinesa levaram o país asiático a superar por ampla margem sua contraparte estadunidense. Assim, se nossa análise se circunscrevesse à realidade estritamente econômica, ninguém vacilaria em afirmar que, a despeito de todos os golpes tarifários desfechados pelo governo de Donald Trump, no final do processo, a China sairia ainda mais fortalecida, e os Estados Unidos em condições piores que as que se encontravam antes da deflagração de seu belicismo tarifário.

Portanto, nossa convicção neste caso se ampara no conhecimento da gritante superioridade das estruturas econômicas da República Popular da China em comparação com o que prevalece atualmente na potência norte-americana. Diante da pujança da economia chinesa, os Estados Unidos se assemelham a um país atrasado e incapaz de sequer imaginar que possam competir com alguma possibilidade de se saírem vitoriosos.

Porém, é preciso ressaltar que nem tudo depende sempre unicamente de fatores netamente econômicos. E é neste ponto em que os aspectos militares ganham peso. E, indubitavelmente, em termos militares, os Estados Unidos continuam sendo, de longe, a maior potência em todo o planeta. Em outras palavras, por mais obsoletas que sejam suas estruturas econômicas, o poderio bélico estadunidense é muitíssimo superior ao de todas as outras nações.

Mas, seria possível algum país se impor sobre os restantes com base exclusivamente em sua força militar? Para começar a meditar sobre esta pergunta, é bom trazer à memória um fato com o qual, quase com certeza, a maioria de nós já se deparou em nosso tempo de escola primária. Quem não se lembra de algum colega de classe que, apesar de dar mostras de ser o menos interessado em entender as matérias de estudo, de nunca tirar boas notas nas avaliações, além de ser incapaz de ganhar a simpatia da turma por meio de bons argumentos, apelava para a truculência com o propósito de intimidar os coleguinhas? Assim como neste exemplo, via de regra, é com o emprego da força bruta que os valentões costumam fazer prevalecer seus desígnios em detrimento dos demais.

Em consequência, podemos pensar no papel atual dos Estados Unidos de maneira algo similar. Para eles, convém que a manutenção de sua hegemonia global e a solução de suas desavenças com a China se encaminhem pelo lado da força bruta, já que apenas neste campo eles podem aspirar a ter alguma chance real de se sagrarem vencedores da contenda.

Como se sabe, os Estados Unidos contam com mais de 900 bases militares estrategicamente situadas em pontos-chave de nosso planeta, de modo a lhes facilitarem uma rápida intervenção de força bruta contra qualquer adversário que demonstre representar alguma ameaça a seus interesses geoestratégicos. Casos concretos da utilização prática deste dispositivo de intervenção militar são mais do que abundantes ao longo das últimas décadas.

Contudo, se nos enveredamos pelo caminho da ingenuidade, podemos nos perguntar: de onde provêm os recursos que possibilitam aos Estados Unidos manter este gigantesco aparato militar de prontidão intervencionista? Esta indagação ganha ainda mais sentido se nos lembrarmos de que, como pudemos elucidar nas linhas anteriores, estamos falando de um país que decididamente não tem uma economia das mais dinâmicas.

Então, para entender como um país que está longe de contar com pilares econômicos que lhe deem sustentação para arcar com os incomensuráveis gastos necessários para instalar e operar tantas bases militares pelo mundo afora, precisamos recorrer a um tema que já abordamos em várias outras oportunidades: a persistência do dólar estadunidense no exercício da função de moeda referência para o intercâmbio comercial a nível internacional. Sem contar com esta dádiva “mais do que divina”, os Estados Unidos não teriam como bancar os custos para a manutenção de sua imensa máquina de intervenção bélica, espalhada pelos quatro cantos do globo.

Para evitar a repetição de explicações já apresentadas em textos anteriores, gostaria de recomendar a releitura dos argumentos que expusemos no artigo deste enlace, (https://www.brasil247.com/blog/o-encontro-dos-brics-e-a-armadilha-do-dolar) no qual procurei dar detalhes de como o dólar vem funcionando como um instrumento imprescindível para a sustentação dos gastos parasitários dos Estados Unidos, mormente em relação com seu poderio bélico.

O certo é que, neste ponto crucial da história, quando estamos a um passo de uma nova virada importante de página, torna-se condição indispensável para todos os que almejam livrar o mundo das maléficas garras do imperialismo entender os fatores que ainda sustentam a continuidade dos Estados Unidos em sua posição de força hegemônica no cenário mundial.

 

Fonte: Brasil 247

 

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