terça-feira, 6 de agosto de 2024

Como pensar como um atleta olímpico e ter um cérebro de campeão?

Os atletas olímpicos treinaram suas vidas inteiras para alcançar o objetivo de subir ao pódio dos vencedores. Além de tonificar seus corpos, eles também refinam suas mentes e trabalham a saúde mental.

“Ter um cérebro vencedor não é sobre uma solução rápida. Você tem que nutrir seu cérebro e cuidar dele”, diz o psicólogo Jeff Brown, professor clínico assistente da Harvard Medical School e coautor de “The Winner’s Brain: 8 Strategies Great Minds Use to Achieve Success” (“O Cérebro Vencedor: 8 Estratégias que Grandes Mentes Usam para Alcançar o Sucesso”, em tradução livre).

“Você precisa alimentá-lo com boas gorduras, como ômega-3. Seu cérebro tem um peso de 1,3 kg que você não quer perder”, afirma Brown, que é psicólogo esportivo da Maratona de Boston.

“Você precisa movê-lo — a função cerebral melhora se você estiver em movimento. Isso é uma das melhores coisas que você pode fazer pelo seu cérebro”, diz o especialista. “Você precisa dormir — o sono é crítico para a consolidação da memória e aprendizado.”

Força mental, foco e resiliência não vêm sem esforço, mesmo para os melhores atletas do mundo. Pesquisadores estudam os olímpicos há décadas e descobriram que eles compartilham alguns traços, hábitos e qualidades comuns que você também pode usar para desenvolver uma mentalidade vencedora.

·        Veja o estresse como positivo

Muitos atletas olímpicos, especialmente os extremamente bem-sucedidos, veem o estresse como um desafio em vez de algo que eles deveriam temer, diz o psicólogo esportivo Dan Gould, ex-diretor do Instituto para o Estudo dos Esportes Juvenis e professor emérito de cinesiologia na Michigan State University.

“Chamamos isso de mentalidade de estresse, ou sua visão de mundo sobre o estresse”, afirma Gould, que já foi consultor do Comitê Olímpico dos Estados Unidos e da Associação de Tênis dos Estados Unidos. Ele estuda os atletas olímpicos há décadas.

“Pesquisas com nadadores de alto nível na Inglaterra, todos capazes, mostraram que os nadadores que tiveram o melhor desempenho viam o estresse como mais facilitador do que debilitante”, diz o especialista.

“Qualquer atleta de elite sabe que haverá pressão, e os principais atletas aprenderam a vê-la como um desafio, seja por tentativa e erro ou trabalhando em treinamentos mentais, como permanecer no presente. Isso tem muitas implicações para todos”, afirma.

Um experimento famoso publicado em um relatório de janeiro de 1998 analisou como as pessoas viam o estresse e descobriu que o risco de morte prematura aumentou em 43% para aqueles que viam o estresse de forma negativa. Aqueles que viam o estresse como positivo tinham o menor risco de morte de todos no estudo, até menor do que pessoas que relatavam muito pouco estresse.

“Os pesquisadores concluíram que não era o estresse que estava matando as pessoas. Era a combinação de estresse e a crença de que o estresse é prejudicial”, diz a psicóloga Kelly McGonigal em uma entrevista anterior à CNN internacional.

“Os pesquisadores estimaram que, ao longo dos oito anos em que conduziram seu estudo, 182.000 americanos podem ter morrido prematuramente porque acreditavam que o estresse estava prejudicando sua saúde”, diz McGonigal, que discutiu o estudo em seu livro “The Upside of Stress: Why Stress Is Good for You, and How to Get Good at It” (“O lado positivo do estresse: por que o estresse é bom para você e como se tornar bom em lidar com ele”, em tradução livre do inglês).

·        Aprenda a se recuperar

Muitos dos atletas mentalmente mais fortes e resilientes têm um histórico de superação de adversidades em seu passado, diz Gould. Pode ser uma dificuldade, doença ou até mesmo a morte de um ente querido.

“É realmente difícil construir resiliência a menos que você tenha sido desafiado”, afirma Gould. “Se eu o protegesse durante toda a sua vida e nunca o deixasse resolver as coisas por conta própria, você certamente ficaria estressado quando enfrentasse um obstáculo.”

Simone Biles é um bom exemplo de uma atleta que enfrentou adversidades muito públicas e se recuperou, aponta Brown. Ela se retirou das finais por equipes nos Jogos de Tóquio 2020 devido aos “twisties”, quando seu cérebro e corpo pararam de se comunicar perfeitamente, como haviam feito em incontáveis rotinas quase perfeitas nos treinos.

“Qualquer pessoa pode se sentir sobrecarregada”, afirma Brown. “A resiliência é a parte de nós que nos permite levantar toda vez que somos derrubados. Acho que Simone mostrou que realmente lida bem com o estresse e é muito mais resiliente do que pessoas que nunca enfrentaram essa barreira.”

A conexão entre adversidade e desempenho mental máximo é tão forte, de fato, que os atuais treinadores esportivos usam “treinamento sob pressão” para ajudar seus atletas a se prepararem para a competição, segundo Gould.

“Com a permissão do atleta, o treinador aumenta a pressão, quase como se estivesse dando a você a doença do medo e depois deixando seus anticorpos se fortalecerem psicologicamente”, explica Gould. “O treinador então coloca o atleta em situações cada vez mais desafiadoras, onde ele precisa acionar esses anticorpos.”

O objetivo desse método é praticar todas as formas pelas quais uma performance mental ou física pode dar errado e depois corrigi-las, segundo Brown.

“Errar de propósito desenvolve uma voz interior que pode imediatamente dizer ‘Ok, já cometi esse erro antes. Aqui está como consertá-lo.’ Em atletas altamente funcionais, a capacidade de se recuperar tem que ser tão boa quanto a capacidade de performar”, diz.

·        Eliminar a dúvida

Não há espaço para dúvidas na mente dos atletas olímpicos, de acordo com Gould. “Eles têm que acreditar que são capazes de performar bem ou já deram vantagem à competição”, afirma. “Eles têm que entrar no evento com total confiança.”

Os atletas olímpicos geralmente se sentem extremamente confiantes porque passaram centenas ou até milhares de horas praticando suas performances e aprendendo com os fracassos ao longo do caminho.

“É isso que o cérebro exige para funcionar bem, porque você está criando esses caminhos neurais que permitem que você seja preciso. É como uma memória muscular para o cérebro”, explica Brown.

Existem várias ferramentas que os atletas — e seus treinadores — podem usar para desenvolver resiliência mental, como autoafirmações, imagens, visualizações e atenção plena, segundo os especialistas.

“Os atletas olímpicos fazem treinamento de atenção plena, onde tentam não julgar ou se preocupar, mas apenas permanecer no momento presente”, afirma Gould. “Eles podem ter certas frases de autoafirmação, como ‘Confie no seu treinamento’, ou ‘Já estive nessas situações difíceis antes, siga o plano.'”

Outra ferramenta é a visualização, segundo Gould. Esquiadores olímpicos percorrem o curso, planejando seus movimentos, depois refinam isso até a perfeição nos treinos antes de visualizar essa performance impecável pouco antes do evento.

“Você ensina a si mesmo a acreditar que, devido à repetição e sempre melhorando dentro de si mesmo — não contra a competição, mas dentro de si mesmo”, afirma.

·        Regule suas emoções

A regulação emocional é tão importante quanto a preparação física ou mental, segundo Gould. “Todos nós temos um conjunto de emoções que sentimos ser importantes para que desempenhemos o nosso melhor: Estou confiante, mas não excessivamente confiante. Estou ansioso, mas é uma ansiedade boa. Talvez eu esteja um pouco com medo, mas não é algo esmagador”, afirma.

“Existe uma mistura ideal dessas emoções que permite que você atinja seu pico de performance, mas você precisa de um termostato — uma maneira de ajustar essas emoções para cima ou para baixo quando necessário”, completa o especialista.

Uma técnica comprovada para acalmar a si mesmo é focada na respiração profunda, segundo Gould, mas há outras táticas que podem ser igualmente eficazes. Alguns atletas colocam um elástico no pulso e o estalam quando querem se recentrar, o que é uma forma de grounding.

O especialista relembra de ter estudado uma das equipes olímpicas femininas de futebol, em que as jogadoras inventaram “palavras-código” para ajudar umas às outras a regular suas emoções.

“A equipe criou as palavras fogo e gelo”, explica Gould. “As jogadoras gritavam ‘Fogo!’ para outras jogadoras se achassem que a equipe precisava ficar mais emocionalmente carregada. Quando uma jogadora estava em perigo de receber um cartão, gritavam ‘Gelo!’ para acalmá-la.”

·        Pratique até que seja rotina

Não apenas os atletas de alto nível praticam até que a habilidade física se torne quase uma resposta física inata, mas eles geralmente têm rituais específicos que fazem antes de cada evento, dizem os especialistas.

“Rotinas são realmente importantes”, afirma Gould. “Eles podem aquecer da mesma forma, sempre imaginar-se executando o evento perfeitamente, alguns até contam piadas até 60 segundos antes do evento.

“Atletas que performam bem, especialmente sob pressão, seguem sua rotina. Atletas que não performam bem, por algum motivo, se desviam dessa rotina”, afirma.

Não é apenas a prontidão física que precisa de uma rotina, acrescenta Gould. Os treinadores, muitas vezes, ajudam os atletas a se prepararem para quaisquer emergências ou atrasos que possam ocorrer antes de uma apresentação.

“Qual é a sua rotina de aquecimento? Em outras palavras, se houver um atraso por causa do clima, como você mantém o foco ou volta a ele? Qual é a sua rotina de encurtamento? Se houve um engarrafamento e você chegou atrasado ao local, por exemplo, como você se prepararia em um período de tempo mais curto?”, exemplifica.

“Nesse caso, o atleta pode se alongar no ônibus. Se ele normalmente faz sete exercícios, aqui estão os três que preciso fazer com certeza”, explica Gould. “E então eles farão coisas para se acalmar, como respiração profunda e certas frases de autoafirmação.”

·        Foque no processo

Os melhores atletas não podem se dar ao luxo de se distrair quando é hora do grande evento. Novamente, é importante identificar quaisquer gatilhos que você possa enfrentar e experimentá-los durante o treino até que desapareçam em segundo plano.

“Os atletas precisam estar preparados para distrações, como o barulho da multidão, alguém rindo, até mesmo uma piada contada por perto”, diz Gould. “Introduzimos distrações durante o treino, como ruídos muito altos nos alto-falantes, para permitir que eles pratiquem manter o foco e a regulação emocional.”

Algumas pessoas chamam isso de “entrar na zona”, onde tudo, exceto a tarefa em questão, desaparece.

“Quando você está enfrentando um dos eventos mais importantes da sua vida, os melhores atletas não se concentram no resultado, eles se concentram no processo necessário para alcançar seu objetivo”, explica Gould.

Por exemplo, um nadador olímpico se concentraria nas técnicas necessárias para terminar com um tempo recorde mundial, como o número de braçadas e a posição dos braços na água.

“Não estou dizendo que eles não são competitivos, mas quando o estresse está batendo, eles se concentram no que podem controlar, que é o processo que precisam realizar para alcançar esse objetivo”, finaliza.

 

¨      Em qual idade atletas olímpicos atingem o auge? Estudo responde

Muitos fatores estão envolvidos na conquista da medalha de ouro por um atleta olímpico. Além de anos de treinamento e disciplina, o desempenho físico e a idade também influenciam nesse resultado. Um novo estudo, conduzido por estudantes da Universidade de Waterloo, no Canadá, usou dados estatísticos para descobrir quando um atleta olímpico atinge seu auge de desempenho.

Para isso, o estudo, publicado na edição de julho do Significance Journal da Royal Statistical Society, analisou estatísticas relacionadas ao atletismo, uma modalidade olímpica que abrange corrida, salto, arremesso e provas combinadas.

Segundo o trabalho, atletas de atletismo atingiram o auge do desempenho físico aos 27 anos, em média. Depois dessa idade, há apenas 44% de probabilidade que o pico de um atleta ainda esteja por vir, com o desempenho físico caindo a cada ano subsequente, segundo o estudo.

Para chegar a essa conclusão — que, os pesquisadores enfatizam, é apenas teórica — eles selecionaram um conjunto de dados de desempenho de carreira ano a ano de cada atleta de atletismo que competiu individualmente em uma Olimpíada desde os Jogos de 1996, em Atlanta. Esses dados continham fatores como gênero, nacionalidade, tipo de prova, há quanto tempo o atleta estava treinando em um nível de elite e se era ou não um ano olímpico.

Segundo os autores do estudo, as progressões de desempenho na carreira da maioria dos atletas podem ser visualizadas como uma “curva de sino” — ou seja, um gráfico em que a linha possui uma forma de sino, tendo um ponto mais alto que representa um evento mais provável em uma série de dados, e outras ocorrências distribuídas igualmente em torno desse evento, criando linhas inclinadas para baixo.

Em outras palavras, isso significa que os atletas treinam ao longo de vários anos para atingir seu melhor desempenho, representado por esse ponto mais alto em um gráfico, em uma determinada idade. Depois disso, o desempenho declina gradualmente com o passar dos anos.

“Ao contrário de outros esportes olímpicos, como futebol e tênis, que têm suas próprias competições de alto nível fora dos Jogos; as Olimpíadas são o maior palco no qual atletas de atletismo competem”, explica David Awosoga, mestrando em ciência de dados e principal autor da pesquisa, em comunicado à imprensa.

“Como as Olimpíadas ocorrem apenas uma vez a cada quatro anos, os atletas de atletismo devem considerar cuidadosamente quando e como devem treinar para maximizar sua probabilidade de se classificar para as Olimpíadas enquanto estão em seu auge pessoal”, acrescenta.

<><> A consciência de estar em um ano de Olimpíadas pode ajudar no desempenho

Segundo Matthew Chow, estudante de graduação em economia e coautor da pesquisa, outra descoberta interessante do estudo é que, ao saber que um atleta está em ano olímpico, é possível prever o seu desempenho no esporte.

“Nossa principal lição é que estabelecemos uma lista de variáveis ​​que ajudam a prever quando será o auge [do atleta], afirma Awosoga. Você não pode mudar o ano das Olimpíadas, sua genética ou sua nacionalidade, mas pode modificar seus regimes de treinamento para melhor se alinhar a esses fatores biológicos e externos, completa.

Os pesquisadores enfatizam que a análise é apenas teórica, mas esperam que as descobertas possam ser úteis tanto para os atletas, quanto para os fãs e torcedores. “Quando assistimos atletas de atletismo competindo, estamos testemunhando uma anomalia estatística: alguém que está no auge de seu desempenho físico e, ao mesmo tempo, se beneficia de um momento extremamente de difícil previsão”, afirma Chow.

 

Fonte: CNN Brasil

 

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