quinta-feira, 25 de julho de 2024

Valéria Guerra Reiter: ‘O imperialismo é um rolo compressor e o identitarismo tem pressa’

Soberania ou biopolítica, eis a questão. Príncipes, reis, soberanos, com pátrio poder do direito romano, o pai tem o direito de vida ou morte sobre os filhos, sobre sua família, sobre seus escravos, já que a base do poder é do pai. 

Do ponto de vista do direito romano, o soberano tem o poder da morte sobre seus comandados e/ou súditos. Isto não está mui longe da nossa contemporaneidade, vide o que ocorre com as guerras estabelecidas, entre o povo faminto e os poderes estabelecidos.

O direito absoluto não existe mais, fora diluído a partir do século XVII. Causar a morte ou deixar viver os seus súditos “já não é mais lícito”, porém atualmente é lícito aos soberanos enviarem seus súditos às guerras; e isto é ter pátrio poder sobre estas pessoas.

Os trechos citados abaixo demonstram um pouco do histórico da futura candidata à presidência estadunidense Kamala Harris. 

“Em 2003, Kamala Harris, de 59 anos, tornou-se a primeira mulher a ser eleita como a principal promotora de San Francisco, depois de ter feito campanha com base em uma promessa de não buscar a pena de morte.

Sua posição foi testada quase que imediatamente, quando o policial Isaac Espinoza foi morto em 2004. Apesar da pressão de vários democratas da Califórnia, incluindo os dois senadores do Estado, para aplicar a pena de morte ao membro da gangue que matou Espinoza, Kamala manteve-se firme e garantiu uma sentença de prisão perpétua sem liberdade condicional”.

“Ela irritou críticos progressistas com outras medidas, incluindo uma política de processar criminalmente os pais de crianças que faltavam à escola e rejeitar um pedido de teste de DNA de um homem negro no corredor da morte que diz ter sido condenado injustamente por assassinato.

 “Por muito tempo, um dos privilégios característicos do poder soberano fora o direito de vida e morte. Sem dúvida, ele derivava formalmente da velha pátria protestas que concedia ao pai de família romano o direito de "dispor" da vida de seus filhos e de seus escravos; podia retirar-lhes a vida, já que a tinha "dado".

“Mas ela atraiu críticas da esquerda por um plano para desencorajar a evasão escolar processando os pais de crianças cronicamente ausentes - embora ninguém tenha ido para a cadeia enquanto ela era promotora distrital, e Kamala disse em 2010 que a evasão escolar no ensino fundamental havia caído 33% nos dois anos anteriores”.

O imperialismo norte-americano traz em seu histórico demanda por capitanear terras e vidas, através de atitudes opressoras:  O Destino Manifesto com sua sede de conquista do oeste eliminou índios, e colonizou suas mentes, a Doutrina Monroe, assim chamada por ter sido criada durante o governo do presidente norte-americano James Monroe, foi anunciada ao Congresso dos Estados Unidos no dia 2 de dezembro de 1823. Teve como objetivo a não interferência dos países europeus nos países americanos e, sob o slogan “América para os Americanos”, pretendia defender as nações recém tornadas independentes de todo o continente americano de uma possível recolonização."

Estamos lidando realmente com um grande big stick, que manda o porrete por sobre a cabeça dos súditos imperiais: “As fronteiras na América do Norte continuaram a sofrer mudanças. Os Estados Unidos, além das terras obtidas junto ao México, compraram e conquistaram ainda outros territórios.

Antes da guerra com os mexicanos, os EUA haviam comprado o Estado da Louisiana da França e adquirido a Flórida da Espanha. As duas aquisições aconteceram em 1803. Em 1867, o território do Alasca foi comprado da Rússia.

Mas a expansão territorial norte-americana não parou por aí. Em 1898, os EUA anexaram o Havaí e entraram em guerra contra a Espanha.

O resultado dessa guerra foi a conquista de Porto Rico, no Caribe, atualmente um Estado-Livre associado, e, no Oceano Pacífico, das ilhas Guam e das Filipinas. Estas adquiriram posteriormente sua independência.

Aqui no Brasil, em 1964, já havia uma operação chamada Brother Sam, preparadíssima para invadir o Brasil, através do Rio de Janeiro, caso o presidente João Goulart não se rendesse diante de um golpe militar que levou o Brasil a um estado sem direito, que durou vinte anos. 

Bem, o que concluímos com este resumo aqui delineado, sob forma de artigo é a pressa que o imperialismo sempre tem em sua sede de conquistar tudo e todos que atravessem seu caminho. Que Deus abençoe a América, e consequentemente o Brasil. Corroborando com Foucault: “que cesse o medo, o julgamento e a destruição".

 

¨      Efeito Kamala sacode o tabuleiro eleitoral e zera o jogo. Por Bepe Damasco

A desistência do presidente Joe Biden de concorrer à reeleição cria um fato político novo com potencial para barrar o crescimento de Trump, jogar os holofotes sobre o Partido Democrata e criar as condições favoráveis à vitória da vice-presidente Kamala Harris, cuja indicação para substituir Biden está praticamente sacramentada. 

Não é exagerada a afirmação de que estamos diante de uma outra campanha. Desde 27 de junho, dia do debate desastroso para Biden, Trump nadava de braçada, saboreando o grande número de lideranças democratas cobrando a desistência de Biden, capitalizando o atentado sofrido por ele e explorando a exposição midiática da convenção do Partido Republicano.

Agora o foco da mídia muda de direção e se volta para as hostes do Partido Democrata.

Resta saber como o eleitorado dos EUA reagirá à candidatura de uma mulher negra à presidência da República. A minha expectativa é que essa aposta na diversidade de gênero (nunca uma mulher presidiu os EUA) e na representatividade da população negra e imigrante chacoalhe o tabuleiro político de uma forma tal que leve à derrota do fascismo. 

Misógino de carteirinha, com histórico alentado de declarações públicas ofensivas às mulheres, Trump certamente dará vazão ao seu machismo quando debater com Kamala, o que lhe trará desgastes e prejuízos eleitorais.

Vejo como equivocada a posição de parte da esquerda brasileira, para quem "tanto faz" quem ocupe a Casa Branca nos próximos quatro anos. É "óbvio ululante", tomando emprestada uma expressão de Nelson Rodrigues, que o Estado norte-americano, independentemente de quem o governe, é imperialista.

Também está no DNA do establishment político e econômico estadunidense o apoio ao sionismo e a consequente cumplicidade com a atrocidades cometidas por Israel contra o povo palestino ao longo de sete décadas.

Contudo, o que está em jogo na eleição de 5 de novembro nos EUA é a defesa da democracia global, seriamente ameaçada se Trump for eleito. Neste caso, a luta contra o avanço da extrema-direita em escala mundial, com inevitáveis reflexos no Brasil, sofreria forte abalo. 

São muitas as nuances, contradições e complexidades presentes na sociedade e na política dos EUA. O Partido Democrata, por exemplo, apoia a sanha militarista e expansionista do império ao redor do mundo, mas abriga em suas fileiras importantes segmentos progressistas formados por negros, mulheres, hispânicos, defensores da causa LGBTQIA+, intelectuais, sindicalistas e artistas. 

A relação entre países se dá sobre uma rede intrincada de interesses, nem sempre de fácil compreensão. As diplomacias do Brasil e dos EUA travam embates frequentes  nos organismos internacionais. Mas Biden foi o primeiro líder mundial a se congratular com Lula por ter derrotado a tentativa de golpe no Brasil, em 8 de janeiro de 2023.

Imaginar a maior potência econômica, militar e nuclear do planeta sendo governada, mais uma vez, por um lunático fascista como Trump é alarmante. Ah, mas ele já governou por quatro anos e "latiu mais do que mordeu", dirão alguns.

A estes recomendo não esquecer que o negacionismo de Trump fez dos EUA o país recordista mundial em mortes por covid-19. Além disso, boa parte de sua obra de destruição civilizatória estava prevista para um segundo mandato que não aconteceu.

Ele não pode ter outra chance. 

 

¨      A promotora Kamala enfrenta o criminoso Trump. Por Moisés Mendes

Há vozes nas esquerdas brasileiras, algumas poderosas, alertando para que ninguém se engane com Kamala Harris, não acene muito para a democrata e não corra o risco de aparecer em festas em que ela esteja, mesmo que isso seja improvável.

Saiam de perto de Kamala, porque ela é mulher, negra, descendente de uma indiana e de um jamaicano e até já ergueu o dedo para Trump, só não é o que vocês pensam, diz o alerta.

Mas o jornalista Jonathan Alter, colunista do The New York Times, socorre os que, diante da gritaria dos alarmistas, estiverem vacilantes ou assustados com as armadilhas dos sentimentos despertados pela substituta de Biden.

Alter encerrou seu artigo nessa segunda-feira no NYT com essas duas frases, depois de divagar sobre qual será agora a reação dos republicanos: “A promotora contra o criminoso. Gosto desse confronto”.

É o que pode bastar, antes do aprofundamento de questões políticas mais complexas, ideologias, índoles e diferenças e semelhanças entre os protagonistas do que vem aí a partir da saída de cena do presidente com déficit cognitivo.

O confronto visto por Alter pode nos servir por enquanto com o clichê de uma mocinha contra o bandidão. Temos alguém que já foi agente da lei de um lado, com todas as suas contradições, e temos um bandido do outro.

Um bandido inquestionável, absoluto. Com a mesma síntese, o NYT de Jonathan Alter publicou em editorial: "Trump é um criminoso que desrespeita a lei e a Constituição, um mentiroso inveterado que não se dedica a nenhuma causa maior do que o seu interesse próprio”.

O colunista escreveu que o sujeito é um criminoso, repetindo o que o seu jornal havia dito um dia antes como opinião do grupo: ele é mesmo um criminoso. Algo que Folha, Estadão e Globo nunca escreveriam sobre Bolsonaro, seu equivalente brasileiro.

Por covardia, nunca escreverão. Mesmo que Trump e Bolsonaro tenham cometido crimes semelhantes, principalmente como golpistas. Então, diante dos alertas de parte das esquerdas de que Kamala também é belicista e imperialista e que apoiou a guerra do Vietnã quando criança, nos serve a síntese de que teremos uma promotora diante de um gângster.

Até porque ninguém enxerga Kamala como de esquerda ou muito fora do padrão do que seja um democrata. Nem que vá questionar a Otan, ficar amiga do Irã e interromper, logo depois da posse, o genocídio em Gaza.

Mas é possível pensar que Kamala seja alguém capaz de mudar o tom das relações com os criminosos do governo israelense e de vislumbrar novos diálogos com o mundo, em todas as áreas, das guerras ao ambientalismo.

Se não for bem assim, já nos basta agora que derrote Trump e a ameaça de permanência da extrema direita, não durante quatro anos, mas por décadas no poder. Que Kamala nos salve do que vem dos Estados Unidos como ajuda na ressurreição do bolsonarismo.

Enquanto isso, por aqui vamos dando um jeito na turma mais depressiva, que só estará satisfeita quando puder ver um democrata com o perfil de Guilherme Boulos enfrentando quem suceder Trump como criminoso fascista.

 

Fonte: Brasil 247

 

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