quarta-feira, 16 de abril de 2025

Fritz Haarmann: os crimes do "Jack, o Estripador alemão"

Friedel Rohte tinha acabado de fazer 17 anos quando desapareceu em Hanôver, em setembro de 1918. Antes, fora visto num café com um senhor distinto, chamado Fritz Haarmann. Ele era conhecido da polícia, pois trabalhava para ela como informante.

Ao chegar em seu apartamento para interrogá-lo, os agentes o surpreendem na cama com um garoto de 13 anos seminu. Mas não encontraram o desaparecido. "Deviam ter procurado direito, porque o crânio de Friedel Rohte estava num nicho, escondido debaixo de revistas e livros", conta o detetive aposentado Jürgen Veith.

Em seus Mord(s)-Touren (Tours assassinos) Veith percorre com turistas os rastros do chamado "vampiro de Hanôver", que confessou o homicídio de 24 rapazes (ou 27, segundo outras fontes). "Essas foram as mortes de que ele se lembrava. Na verdade, devem ter sido mais de 50", explica Veith, sentenciando: "Haarmann foi, em princípio, o Jack, o Estripador alemão."

Fritz Haarmann nasceu em Hanôver em 25 de outubro de 1879, o caçula de seis irmãos. "Ele teve uma infância terrível. Parece que o pai era dependente do álcool – um beberrão, como se costumava dizer – e também o espancava muito. E Fritz provavelmente sofreu abuso sexual por parte de um irmão mais velho."

Isso, em si, não faz de alguém um maníaco assassino, observa a psicóloga criminal Lydia Benecke: "Claro que a maioria dos que são expostos a fatores tão adversos assim no início da vida não comete crimes graves."

Porém estudos científicos demonstraram que, entre um pequeno grupo, maus tratos do gênero podem desencadear tendências a cometer delitos graves, culminando até em assassinatos em série, na forma mais extrema. "Uma falácia fundamental é achar que se note quando um ser humano comete crimes graves. Na maioria dos casos, não é assim."

A observação se aplica também a Haarmann: no dia a dia, ele parecia confiável, sempre bem-vestido, amigável e discreto. Impressionava positivamente também a polícia, que até o contrataria como alcaguete, para fornecer informações a respeito do bairro de prostituição.

<><> Assassino – talvez vendedor de carne humana e canibal

Seus crimes coincidem com os primeiros anos após o fim da  Primeira Guerra Mundial. Desempregados enchem as ruas, a comida é escassa, tanto o mercado negro quanto a prostituição prosperam. No grande saguão da central ferroviária, Haarmann negocia com roupas masculinas, carne e outros artigos – e espreita suas vítimas.

"Ele tinha um bom faro para rapazes que, na má situação econômica dos anos 1920, vagavam mais ou menos sem destino e desamparados", conta Veith. "'Ah, vem, tu estás certamente com fome. Estás parecendo cansado. Podes dormir na minha casa e também ganhar alguma coisa para comer': era assim que ele provavelmente atraía as suas vítimas."

Os jovens que seguiam Haarmann até a mansarda no bairro pobre de Mitte tinham entre 10 e 22 anos de idade. Muitos haviam fugido de casa e, na confusão do pós-guerra, inicialmente ninguém sentia sua falta. Os vizinhos não se importavam com os barulhos assustadores que vinham do apartamento: Haarmann matava rasgando a garganta das vítimas com os dentes. Como deporia mais tarde, o ato o excitava sexualmente.

No entanto, o transtorno de eliminar os cadáveres lhe era um fardo: "Eu sempre fiz esse trabalho com horror, mas a minha paixão era mais forte do que o horror do esquartejamento."

"Supõe-se que Haarmann vendesse a carne das suas vítimas no então prosperante mercado negro. O comércio ilegal de carne era rotina, então vender podia ser tanto um método pragmático de se livrar dos pedaços do cadáver, e ao mesmo tempo se enriquecer", relata Benecke. "Permanece em aberto se realmente vendia a carne humana, ou se até a comia, ele mesmo."

<><> Confissão arrancada por métodos pouco ortodoxos

Certo está que Haarmann jogou muitos ossos de suas vítimas no rio Leine, e esse método acaba o condenando: brincando nas margens, crianças encontram alguns crânios. No começo se pensa tratar-se dos restos mortais de afogados. Porém o aparecimento de cada vez mais ossos – por fim, cerca de 500 – coloca a polícia em alerta.

Os cidadãos da cidade na Baixa Saxônia têm medo: quem é o assassino em meio a eles? O "Carniceiro", "Lobisomem", o "Vampiro de Hanôver" faz manchetes pelo mundo. Pouco a pouco, os indícios levam até Fritz Haarmann, que em junho de 1924 é preso.

Devido aos bons serviços como informante, até então a polícia fizera vista grossa por seus pequenos delitos. Mas, assassino em série? Os agentes estão céticos. Até que, numa revista em seu apartamento, encontram marcas de sangue e peças de roupa ensanguentadas.

Como de início ele se recusa a depor, a polícia apela para o que Veith denomina "métodos escusos", colocando, num canto da cela do suspeito, caveiras iluminadas, com as órbitas cobertas de papel vermelho, ou um saco cheio de ossos humanos.

A mensagem era que, se não confessasse, os mortos viriam em busca dele. E ele acaba confessando: seus "garotinhos de brinquedo" tinham sido sempre tão carinhosos com ele, gostaram de participar. Ele os matara num "delírio sexual".

O processo é um evento midiático sensacionalista. Haarmann ganha até uma paródia de uma canção da moda: Warte, warte noch ein Weilchen (Espera, espera mais um pouquinho – que a felicidade vem para ti) vira "Espera, espera mais um pouquinho, que o Haarmann logo vem com o cutelinho e faz patê de ti".

<><> "Meu monumento vai ser atração daqui a mil anos"

O julgamento começa em dezembro de 1924. "Nos dias de hoje, um processo tão gigantesco não seria concluído em prazo tão curto", comenta Veith. Já na época, houve quem questionasse sua legitimidade legal: "Poucas vezes um processo tão significativo foi realizado de modo tão incompetente, mesquinho e equivocado", argumentava o jornalista Theodor Lessing: a sanidade mental de Haarmann, por exemplo, sequer fora devidamente examinada.

Ainda assim, o assassino é condenado à morte e executado em 15 de abril de 1925, com o uso de uma guilhotina, metódo usado à época. Antes, desejara que se erigisse um monumento em sua homenagem: "Vai ser uma atração turística, mesmo daqui a mil anos. Todo mundo vai vir para admirar", afirmou ao psiquiatra que o examinou na prisão.

A história do maníaco homicida foi levada várias vezes aos palcos e às telas. Haarmann, junto com outros serial killers alemães do período, acabou servindo de ispiração para o filme M, o Vampiro de Düsseldorf (1931), de Fritz Lang. Mais diretamente biográfico é O assassino (1995), de Romuald Karmakar, indicado para o Oscar.

Peças de radioteatro, um musical, vários livros, uma história em quadrinhos, até mesmo um – bastante polêmico – jogo de tabuleiro assassino, se inspiraram do "Carniceiro de Hanôver". A ele foram também dedicadas canções, como Most evil, de 2023, pela banda japonesa Church of Misery, de doom metal.

O escultor vienense Alfred Hrdlicka (1928-2009) dedicou-lhe até mesmo mais de uma estátua – como o assassino desejara. Enfim: Fritz Haarmann queria fama – e conseguiu.

<><> Mentes perigosas: os piores assassinos em série da Alemanha

Enfermeiros assassinos, canibais, matadores de prostitutas e crianças. Conheça alguns dos mais violentos assassinos em série da história da Alemanha.

>>> Canibal de Münsterberg

Karle Denke matou e canibalizou ao menos 42 pessoas entre 1903 e 1924 em Münsterberg, na antiga Prússia (foto). Acredita-se até que ele tenha vendido a carne de suas vítimas no mercado de Breslau (hoje Wroclaw, Polônia) como carne de porco. Uma vítima conseguiu escapar. Mais tarde a polícia encontrou carne humana curada na casa do acusado. Denke enforcou-se em sua cela dois dias depois

>>> Horror de Hannover

Acredita-se que Fritz Haarmann tenha abusado sexualmente, matado, mutilado e seccionado ao menos 24 meninos e homens jovens entre 1918 e 1924. A extensão total de seus crimes foi revelada após moradores de Hannover preocupados com o desaparecimento de crianças encontrarem 500 pedaços de ossos humanos, alguns com marcas de faca. Haarmann, que já fora informante da polícia, foi decapitado em 1925.

>>> Carniceiro de Berlim

Karl Grossmann matou suas vítimas e vendeu sua carne no mercado negro e em sua banca de lanches. Depois que os vizinhos ouviram gritos, a polícia invadiu sua casa e encontrou uma jovem morta em sua cama. Não está claro quantas pessoas Grossmann matou, mas ele foi suspeito de cortar em pedaços 23 mulheres e de estar envolvido em até 100 casos de desaparecimentos em Berlim. Ele se enforcou em 1922.

>>> Terror do Lago Falkenhagen

O serralheiro Friedrich Schumann violou, matou e roubou entre 1918 e 1920. Após um confronto com um guarda florestal - em quem atirou - Schumann foi preso e acusado do assassinato de seis pessoas e da tentativa de assassinato de outras 11. Ele foi condenado à morte seis vezes. Na véspera da sua execução, aos 28 anos, ele admitiu ter matado 25 pessoas, incluindo um de seus primos.

>>> O assassino do metrô

Paul Ogorzow foi condenado por 31 agressões sexuais, assassinato de oito mulheres e tentativa de homicídio de seis outras em Berlim entre 1940 e 1941. Ogorzow trabalhava para o sistema ferroviário alemão e jofou vária de suas vítimas de trens em movimento. Ele foi condenado à morte e decapitado.

>>> O coiote assassino

Em 1946 e 1947, Rudolf Pleil trabalhou como guarda de fronteira e paralelamente atuava como coiote, ajudando pessoas a atravessar a dvisa entre o leste e o oeste da Alemanha. Por um tempo, ele teve dois cúmplices que o ajudaram a atrair vítimas. Pleil foi condenado por matar um vendedor e nove mulheres, mas alegou ter matado 25 pessoas. Condenado à prisão perpétua em 1950, cometeu suicídio em 1958

>>> O canibal de Duisburg

Joachim Gero Kroll foi um assassino em série, estuprador, molestador de crianças e canibal. Entre 1955 e 1976, ele matou pelo menos 14 pessoas, a maioria mulheres. Quando foi preso em 1976, ele estava cozinhando braços e mãos de uma menina de 4 anos que ele havia acabado de assassinar. Condenado à prisão perpétua em 1982, Krol morreu de ataque cardíaco em 1991.

>>> Incêndio revelador

Fritz Honka ficou conhecido por ter matado ao menos 4 mulheres entre 1970 e 1975. Ele estrangulou e seccionou prostitutas em seu apartamento. Bombeiros encontraram partes de corpos escondidos ao debelarem um incêndio em sua moradia. Honka foi condenado a 15 anos de prisão em uma instituição psiquiátrica. Após sua libertação em 1993, ele viveu em uma casa de repouso até sua morte cinco anos depois.

>>> O assassino de St. Pauli

Werner Pinzner foi um assassino de cafetões no distrito da luz vermelha de Hamburgo. Acredita-se que ele tenha matado entre 7 e 10 pessoas. Ele ganhou notoriedade em 1986, quando foi levado a uma delegacia em Hamburgo para prestar depoimento com a esposa e a advogada. De repente, ele sacou de uma arma e matou o promotor, a esposa e a si mesmo.

>>> A enfermeira assassina

Marianne Nölle, uma enfermeira em Colônia, costumava matar pacientes sob seus cuidados, envenenando-os com um medicamento antipsicótico. A polícia acredita que ela tenha matado 17 pessoas entre 1984 e 1992 e tentado matar outras 18; Ela foi condenada pela morte de sete pessoas. Ela nunca confessou nenhum dos crimes. Desde 1993, Nölle cumpre sentença de prisão perpétua.

>>> O assassino da autobahn

O caminhoneiro Volker Eckert matou pelo menos 9 mulheres, a maioria entre 2001 e 2006. De acordo com a polícia, provavelmente matou outras quatro. Sua primeira vítima foi uma colega de classe que ele estrangulou aos 15 anos de idade. A maioria das vítimas eram prostitutas. Ele costumava guardava tufos de cabelo das vítimas. Eckert se enforcou na cela durante seu julgamento em 2007.

>>> Anjo da morte

Stephan Letter, um ex-enfermeiro, foi responsável pela morte de pelo menos 29 pacientes por injeção letal em um hospital da Baviera entre 2003 e 2004. Ele confessou algumas das mortes, insistindo que tentou aliviar o sofrimento dos pacientes. Letter cumpre prisão perpétua e até recentemente seus atos foram descritos como a pior onda de assassinatos na Alemanha desde a 2ª Guerra.

>>> O enfermeiro que injetava drogas

A fim de impressionar os colegas com sua capacidade de salvar vidas, Niels Högel injetou medicamentos cardiovasculares em pacientes para induzir insuficiência cardíaca ou colapso circulatório. Ele foi condenado à prisão perpétua em 2015 pela morte de duas pessoas. Mas acredita-se que ele tenha sido responsável por mais 100 mortes.

 

Fonte: DW Brasil

 

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