'Eu
a encontrei por 30 segundos — e ela me perseguiu depois por 4 anos'
O
encontro entre o palestrante motivacional Brad Burton e Sam Wall durou menos de
um minuto. Ela posou para uma foto com ele depois de participar de um de seus
workshops e, mais tarde, deixou um depoimento bastante elogioso em vídeo.
Não foi
nada extraordinário, diz Burton. "Apenas uma das milhares de pessoas que
eu devo ter conhecido ao longo dos anos."
Dois
anos depois, ela começou a atacá-lo online.
Em
centenas de postagens, Wall o descreveu como manipulador, psicopata e abusador
sociopata. Dia após dia, ela o acusou de fazer ameaças de morte, quebrar suas
janelas e matar seu gato — todas alegações falsas.
"Ela
colocou isso nas redes sociais, em todas as
plataformas. Ela estava pintando uma imagem de que, em algum momento, eu havia
feito todas essas coisas, e estava tentando encobri-las", contou Burton ao
programa Panorama, da BBC.
Wall,
uma consultora de rede social de 55 anos, se declarou culpada das acusações
de stalking (perseguição) e envio de mensagens falsas no
Tribunal de Magistrados de Manchester em novembro do ano passado.
O
anúncio da sentença dela foi adiado pela segunda vez na semana passada, mas o
juiz disse a ela para esperar uma pena de prisão.
A
equipe jurídica de Wall informou que um laudo psiquiátrico mostrou que ela tem
transtorno delirante crônico.
A
condenação dela foi em relação a duas vítimas — Burton e a empresária Naomi
Timperley —, que foram alvos de mensagens abusivas nos últimos quatro anos.
"Foi
simplesmente horrível, realmente horrível, e não sei por que isso
aconteceu", diz Timperley. "Ainda me sinto muito ansiosa, às vezes
fico muito triste."
O
programa Panorama, da BBC, conversou com outras vítimas que dizem ter sido
perseguidas por Wall em um período de mais de 10 anos.
Algumas
nunca haviam se encontrado com Wall, enquanto outras a conheciam apenas de
vista.
Na
época em que Wall atacou Burton, ele administrava uma rede que apoiava centenas
de pequenas empresas em todo o Reino Unido.
Muitas
de suas postagens abusivas eram detalhadas — uma delas tinha 20 mil palavras.
Algumas foram compartilhadas no LinkedIn, onde ela tinha 30 mil seguidores —, a
mesma plataforma que Burton usava para promover seu trabalho.
Embora
a pandemia de covid-19 tenha sido um
duro golpe, ele diz que ela ajudou a afundar seu negócio.
Wall
também alegou falsamente que Burton a assediava havia 10 anos — e que ele havia
sido preso.
Burton
postou fotos dele online para provar que não estava na prisão. Wall
respondeu alegando que seu gêmeo psicopata estava tirando as fotos, e
aparecendo em eventos para encobrir o fato de que ele havia sido preso.
Alan
Price, amigo de Burton, sabia que Wall estava mentindo sobre a alegação de 10
anos, porque ele os havia apresentado no workshop dois anos antes.
"Ela
está dizendo a todo mundo que Brad Burton está na prisão, mas eu estava em
Burnham-on-Sea, em Somerset, comendo curry com ele", conta Price.
Em uma
tentativa de detê-la, Burton procurou um advogado que o aconselhou a enviar uma
carta de cease and desist ("cessar e desistir", um
pedido para cessar uma atividade sob pena de ação judicial). Wall então
respondeu publicando a carta online, e dizendo que ele poderia processá-la —
mas que ela não tinha dinheiro.
Timperley
só conhecia Wall de vista — ela a seguia no Twitter, e elas estavam conectadas
no LinkedIn. Ela também foi alvo de centenas de mensagens, acusada de danos
criminais, de destruir o negócio de Wall e de se unir a outras pessoas para
realizar gang stalking (perseguição conduzida por um grupo).
Wall
também alegou falsamente que Timperley havia sido presa por assédio.
"Fui
atacada pessoalmente no Instagram, Twitter, LinkedIn e Facebook, e acusada de
coisas realmente vis", ela relata.
Wall
continuou seus ataques online mesmo depois de ter sido acusada de stalking.
A
empresária Justine Wright, de Manchester, foi alvo por mais de uma década. Ela
contratou Wall por alguns meses e, quando ela foi embora, a perseguição online
começou.
Wright
é consultora de marketing, e Wall atacava repetidamente seus clientes — grandes
empresas — com alegações falsas. Justine não conhecia Brad Burton, mas Wall a
acusou de conspirar com ele para envenenar seu gato.
As
pessoas podem ficar surpresas com o número de vítimas, e com o fato de Wall não
ter disfarçado sua identidade, afirma Rory Innes, CEO da Cyber Helpline,
instituição beneficente que ajuda vítimas de crimes online.
Mas ele
diz que isso é comum.
"É
um caso terrível, e vai causar danos a muitas pessoas, e mudar suas vidas. Mas
isso está acontecendo com centenas de milhares de pessoas todos os anos."
O
programa Panorama conversou com outras vítimas que não querem ser
identificadas. Uma delas conta que foi perseguida por mais de uma década,
durante a qual Wall enviou milhares de mensagens de texto, além de e-mails de
10 mil palavras para seus amigos e contatos profissionais.
Wall
também aparecia no trabalho dele fingindo ser sua esposa, diz ele, e acusando-o
de abuso doméstico.
Todas
as vítimas reclamaram com as empresas de rede social sobre as postagens de
Wall, mas elas não foram retiradas do ar.
O
advogado especializado em redes sociais Paul Tweed disse ao programa Panorama
que não ficou surpreso com a falta de ajuda das empresas.
"Elas
decidem o que deve ser retirado, quando deve ser retirado e como deve ser
retirado. E elas vão dizer, quando você perguntar a elas, que cumprem a
lei", ele acrescenta.
O
LinkedIn diz que não pode comentar sobre usuários individuais, mas não permite
bullying ou assédio, e vai tomar medidas contra qualquer coisa que viole suas
políticas. Instagram, Facebook e X (antigo Twitter) não responderam ao pedido
de comentário do Panorama.
Nenhuma
das empresas retirou do ar as mensagens abusivas de Wall, apesar de o programa
Panorama ter informado a elas sobre a condenação dela há dois meses.
Na
semana passada, ela postou outra mensagem abusiva sobre Burton.
A
organização beneficente Cyber Helpline estima que 600 mil pessoas denunciam
perseguição online à polícia todos os anos. Outra instituição de caridade, a
Suzy Lamplugh Trust, afirma que menos de 2% das denúncias de stalking e
assédio terminam em condenação.
No ano
passado, uma grande análise feita por órgãos policiais constatou que existe uma
falta de compreensão sobre a perseguição online, e evidências de que a polícia
não a leva a sério.
O
conselho para as vítimas de stalking online é básico: não se
envolva, mantenha registros e denuncie à polícia. Mas as pessoas com quem o
programa Panorama conversou fizeram isso, e o abuso continuou.
Burton
e Timperley ficaram insatisfeitos com a resposta que receberam da polícia da
Grande Manchester (GMP, na sigla em inglês).
Os
resultados para as vítimas são realmente precários, diz Roy Innes, da Cyber
Helpline.
"Pouquíssimos
destes casos realmente acabam sendo investigados", ele afirma. "E
quando uma investigação acontece, o elemento tecnológico pode significar que
leva anos para chegar ao ponto em que as evidências estão sendo
analisadas."
Um
porta-voz da GMP diz que os atrasos no sistema de Justiça criminal mais amplo
afetaram o caso de Wall, e que a polícia obteve resultados positivos para mais
de 3 mil vítimas desse tipo de crime no ano passado.
Entramos
em contato com Wall para comentar, mas ela não respondeu.
Enquanto
isso, Burton diz que a perdoa. "Espero que ela receba a ajuda de que
precisa, e encontre paz em sua própria vida", diz ele.
Fonte:
BBC News

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