sábado, 28 de outubro de 2023

A manutenção do discurso pró-Israel pela grande mídia brasileira é conivente com o massacre palestino

No discurso da grande mídia brasileira, da TV aos rádios e imprensa escrita, as notícias sobre o conflito entre Israel e Palestina tem sempre seu próprio peso e medida. O tom da voz empostada ou dos fatos com F maiúsculo e ponto final falseiam a suposta neutralidade jornalística, mas os próprios termos utilizados denunciam a hegemônica posição pró-Israel nos maiores veículos de comunicação do país.

De um lado, os “terroristas do Hamas”; do outro, “Israel e seus altos valores compartilhados com a democracia dos EUA”. Entre um e outro, o povo palestino e o povo judeu só ganham espaço como álibis morais, desde a grotesca animalização dos palestinos naturalizada pela ofensiva de Israel, até a confusão deliberada em acusar os contrários ao sionismo por promover antissemitismo contra os judeus. Tudo temperado com a associação superficial do conflito político a uma guerra religiosa de fundamentos imbatíveis e impossíveis de conciliação entre os povos.

Obviamente não é do mínimo bom senso compactuar com a estratégia do Hamas para defender o direito à resistência e autodeterminação palestina contra o Apartheid mantido por Israel. Entretanto, é chamativa a constante divulgação da grande mídia dos métodos abusivos de Hamas contra civis israelenses, com relatos minuciosos sobre os sequestros e assassinatos promovidos por este grupo teocrático e patriarcal, em desproporção aos 75 anos de ofensiva imperialista de Israel contra o território palestino e os atuais crimes na guerra declarada à Faixa de Gaza.

Não é a mesma atenção que a grande mídia oferece aos detalhes horripilantes do cerco total de Gaza, declarado pelo ministro da Defesa israelense Yoav Gallant, com a suspensão dos serviços básicos de água, eletricidade, comida e gás para 2 milhões de pessoas presas a céu aberto. Nem o uso de fósforo branco como arma química banida internacionalmente, mas usada pelas forças israelenses em Al Karama. Aliás, atenção esta que jamais foi oferecida nas últimas décadas de opressão ao povo palestino em que estes e outros crimes de Israel se repetiram.

O mais recente e absurdo malabarismo da grande mídia vem do bombardeio ao Hospital Batista Al-Ahli Al-Arabi, na região de Al-Zaytoun, que assassinou mais de 500 palestinos, incluindo crianças, civis que buscaram o local como refúgio dos ataques israelenses, e trabalhadores da saúde que se desdobram para dar conta da grave crise humanitária causada pela limpeza étnica levada adiante pelo Estado de Israel. Frente ao repúdio generalizado a um crime desta natureza, o Ministério da Defesa israelense prontamente recorreu à famigerada tentativa de culpar os próprios palestinos por sua desgraça, publicando um vídeo que dizia comprovar a autoria do atentado à Jihad Islâmica.

Enquanto o veículo de mídia Al Jazeera e vários jornalistas pelo mundo, incluindo Aric Toler da equipe de investigações visuais do New York Times, alertavam que o horário do vídeo nas contas oficiais israelenses aparecia como 40 minutos após a explosão do hospital, o que levou inclusive a que fosse excluído pelo próprio Estado de Israel, toda a grande mídia brasileira, Globo, Estadão, Folha de São Paulo, entre outros, reverberavam as declarações israelenses e o apoio de Biden a elas.

Em todas as capas dos grandes jornais desta quarta (18) se estampou a declaração de Biden ao chegar em Tel Aviv: “Com base no que eu vi, parece que foi causada pelo outro lado”, se referindo à explosão do hospital. Ora, quem são os jornalistas especializados em investigações visuais perto da aguçada visão de Joe Biden, não é mesmo? Quase remete ao “Não tenho provas, mas tenho convicção” a la Lava Jato, que aliás esta mesma mídia também apoiou com mérito para se alinhar aos interesses do golpe institucional de 2016 no Brasil. Não seria uma coincidência, de fato, perceber como a construção de narrativa da imprensa burguesa brasileira em diversas circunstâncias é atravessada pelo laço que possui com o imperialismo estadunidense.

O problema é que não se trata apenas de narrativas em farsa, mas de posições que se materializam em tragédia. É preciso encarar a questão como ela é: o discurso pró-Israel da grande mídia brasileira é conivente com o massacre palestino. Bem como também é a falsa neutralidade de Lula, cuja defesa abstrata da “paz e das crianças” - aliada a concretamente pouquíssimo responsabilizar Israel no conflito - já foi rechaçada pelos EUA na ONU. Enquanto o governo brasileiro não romper todas as relações diplomáticas e militares com Israel terá também suas mãos sujas pelo massacre ao povo palestino, televisionado e naturalizado pela mídia.

 

Ø  A história irá julgar-nos a todos se não houver cessar-fogo em Gaza. por Philippe Lazzarini, no The Guardian

 

Há mais de duas semanas, imagens insuportáveis ​​de tragédia humana saíram de Gaza. Mulheres, crianças e idosos estão a ser mortos, hospitais e escolas têm sido bombardeados – ninguém é poupado. No momento em que escrevo isto, a UNRWA , a agência das Nações Unidas para os refugiados palestinos, já perdeu, tragicamente, 35 dos seus funcionários , muitos deles mortos enquanto estavam em suas casas com as suas famílias.

Bairros inteiros estão a ser arrasados ​​sobre as cabeças dos civis num dos locais mais sobrelotados do planeta. As FDI têm alertado os palestinos em Gaza para se deslocarem para a parte sul da faixa enquanto bombardeiam o norte; mas as greves também continuam no sul. Não há lugar seguro em Gaza.

Quase 600 mil pessoas estão abrigadas em 150 escolas e outros edifícios da UNRWA, vivendo em condições insalubres, com água potável limitada, pouca comida e medicamentos. As mães não sabem como podem limpar os filhos. As mulheres grávidas rezam para que não enfrentem complicações durante o parto porque os hospitais não têm capacidade para recebê-las. Famílias inteiras vivem agora nos nossos edifícios porque não têm para onde ir. Mas as nossas instalações não são seguras – 40 edifícios da UNRWA, incluindo escolas e armazéns, foram danificados pelos ataques. Muitos civis abrigados dentro deles foram, tragicamente, mortos.

Gaza tem sido descrita nos últimos 15 anos como uma grande prisão a céu aberto , com um bloqueio aéreo, marítimo e terrestre que asfixia 2,2 milhões de pessoas num raio de 365 quilómetros quadrados. A maioria dos jovens nunca saiu de Gaza. Hoje, esta prisão está a tornar-se o cemitério de uma população presa entre a guerra, o cerco e a privação.

Nos últimos dias, negociações intensas ao mais alto nível permitiram finalmente a entrada de fornecimentos humanitários muito limitados na faixa. Embora o avanço seja bem-vindo, estes caminhões são mais um fluxo de ajuda do que a situação humanitária desta magnitude exige. Vinte caminhões com alimentos e medicamentos são uma gota no oceano para as necessidades de mais de 2 milhões de civis. O combustível, porém, foi firmemente negado a Gaza. Sem ela, não haverá resposta humanitária, nem ajuda chegará às pessoas necessitadas, nem energia para os hospitais, nem água, nem pão.

Antes de 7 de Outubro, Gaza recebia cerca de 500 caminhões de alimentos e outros fornecimentos todos os dias, incluindo 45 caminhões de combustível para alimentar os carros da faixa, as fábricas de dessalinização de água e as padarias. Hoje, Gaza está a ser estrangulada e os poucos comboios que agora entram não irão atenuar o sentimento da população civil de que foram abandonados e sacrificados pelo mundo.

No dia 7 de Outubro, o Hamas cometeu massacres indescritíveis de civis israelitas que podem constituir crimes de guerra. A ONU condenou este ato horrível nos termos mais veementes. Mas que não haja sombra de dúvida – isto não justifica os crimes em curso contra a população civil de Gaza, incluindo o seu 1 milhão de crianças .

A Carta da ONU e os nossos compromissos são um compromisso com a nossa humanidade partilhada. Os civis – onde quer que estejam – devem ser protegidos de forma igual. Os civis de Gaza não escolheram esta guerra. As atrocidades não devem ser seguidas de mais atrocidades. A resposta aos crimes de guerra não é mais crimes de guerra. O quadro do direito internacional é muito claro e bem estabelecido a este respeito.

Serão necessários esforços genuínos e corajosos para regressar às raízes deste impasse mortal e oferecer opções políticas que sejam viáveis ​​e possam permitir um ambiente de paz, estabilidade e segurança. Até lá, temos de garantir que as regras do direito humanitário internacional são respeitadas e que os civis são poupados e protegidos. Deve ser promulgado um cessar-fogo humanitário imediato para permitir o acesso seguro, contínuo e irrestrito a combustível, medicamentos, água e alimentos na Faixa de Gaza.

Dag Hammarskjöld, o segundo secretário-geral da ONU, disse certa vez: “A ONU não foi criada para nos levar ao céu, mas para nos salvar do inferno”. A realidade hoje em Gaza é que já não resta muita humanidade e o inferno está a instalar-se.

As gerações futuras saberão que assistimos ao desenrolar desta tragédia humana nas redes sociais e nos canais de notícias. Não poderemos dizer que não sabíamos. A história perguntará por que o mundo não teve a coragem de agir de forma decisiva e acabar com este inferno na Terra.

 

Ø  Armas de Israel que destroem Gaza também matam a juventude negra no Brasil

 

Os bombardeios de Israel já custaram a vida de mais de 1.524 crianças e mais de 600 ainda estão sob os escombros. Muitos morreram durante o ataque ao hospital de Gaza na última terça-feira (17), no qual um total de 500 palestinos perderam a vida. Para compreender a magnitude do massacre: são 117 crianças assassinadas por dia ou uma criança palestina assassinada a cada 12 minutos. Em meio a essa barbárie contra o povo palestino promovida pela política do Estado terrorista de Israel, a Câmara dos Deputados aprovou um acordo de cooperação em “segurança” entre Brasil e Israel nesta quarta-feira (18).

Segundo o novo acordo, podem ser campos de cooperação: investigação e inteligência policial; segurança no uso da tecnologia da informação e comunicações; práticas de governança em situações de crise e emergência; indústria, tecnologias e serviços aplicados à segurança pública; análises criminais e forenses, entre outras, segundo a Agência Câmara. Ou seja, uma política para aprofundar a repressão do povo negro no Brasil e do povo Palestino na Faixa de Gaza, Cisjordânia e no interior de Israel.

É neste contexto que o militarismo israelense tem se vinculado cada vez mais com as universidades israelenses e brasileiras (estas através das cooperações estabelecidas). Esses chamados centros de excelência cumprem o papel nefasto de serem desenvolvedores da alta tecnologia bélica que é testada contra os palestinos, ao mesmo tempo que fornecem novos produtos de exportação. Essas novas tecnologias - além de servirem para manter o apartheid e a imposição da ocupação israelense com cada vez menos soldados - são também fornecidas para exportação a partir da indústria de segurança de Israel. Inclusive o Brasil se configura entre um dos maiores compradores desses produtos táticos e militares.

A principal empresa de armamentos israelenses é a Elbit Systems Ltda. A Elbit é dona de três empresas de armas brasileiras (AEL, Ares Aeroespacial e a Defesa SA), essas que possuem fábricas no Brasil, sendo responsável pela produção de armamentos, como os 28 veículos blindados guarani APC construídos no Brasil e vendidos para a Filipinas reprimir neste país. São diversas as compras feitas pelo Estado Brasileiro de armamentos desta empresa, de drones a sistemas de inteligência. As relações entre Brasil e Israel têm como um de seus pilares a exportação de armas. Bolsonaro, em 2019, enquanto cumpria seu mandato, realizou uma viagem para Israel, viagem que rendeu em um decreto legislativo aprovado em 2022 que ‘prova o acordo de cooperação na área de defesa assinado entre o Brasil e Israel em 2019’. Esse decreto segue em vigor no governo Lula-Alckmin, mesmo em meio ao massacre do povo palestino que Israel promove.

As relações entre o governo brasileiro e Israel não começaram no mandato de Bolsonaro. Em 2003, no primeiro ano de governo Lula, as forças armadas brasileiras abriram um escritório em Tel Aviv e já em 2010, no último ano do segundo mandato do atual presidente, o governo brasileiro assinou um acordo de cooperação de segurança com Israel no final de novembro de 2010 para facilitar a cooperação e os contratos militares. Essa sequência de ações, que iniciaram a aproximação entre Brasil e Israel durante os governos Lula, mostram uma profunda demagogia do governo, que aprofundava as relações com Israel, ao mesmo tempo sustentava um discurso supostamente democrático em defesa do povo árabe. Devido a esses acordos militares com o Estado sionista, as armas que miram no povo palestino miram também na juventude negra reprimida diariamente pela polícia brasileira.

Com a iminência da Copa do Mundo e das Olimpíadas, que ocorreram no Brasil respectivamente nos anos de 2014 e 2016, o Brasil buscou cada vez mais as relações com Israel (o muro construído na cidade do Rio de Janeiro, muito similar aos de Gaza, que separava as favelas da Maré, foi realizado com a ISDS no país).

Segundo a ativista palestina Sahar Vardi, em relato ao jornal Brasil de Fato, no ano de 2013, quando a juventude brasileira tomou as ruas do país questionando a precarização dos transportes e demais serviços públicos e colocando todo o regime político em crise, o governo brasileiro investiu 1,13% do PIB para a modernização das Forças Armadas com equipamentos israelenses. A partir desses eventos esportivos, a empresa israelense International Security, Defence Systems (ISDS), com o aval do Ministério de Defesa de Israel, foi encarregada do treinamento do Batalhão de Operações Policiais Especiais do Rio de Janeiro (BOPE) e do Batalhão de Ferguson, responsáveis pelo assassinato de Michael Brown, caso que gerou grande comoção nos Estados Unidos e deu origem ao Black Lives Matter.

No estado de São Paulo, em 2015, durante o governo de Alckmin, o estado adquiriu de Israel 6 blindados no valor de 30 milhões de reais. Os veículos foram recebidos em um evento no qual Alckmin entregou as chaves dos blindados para o secretário de segurança Alexandre de Moraes. Outra dado que chama atenção é o uso das metralhadoras leves “Negev” (armamentos de guerra, de calibre restrito para uso em campo aberto, disparam mais de 700 balas por minuto), compradas pela PM paulista em 2020, ainda sob gestão Doria, mas foram apresentadas como novas aquisições nesta segunda (16); são as armas usadas em apartheid palestino compradas para serem utilizadas nas favelas do Brasil.

Esse histórico de colaboração com a indústria bélica israelense é parte do que explica a política que Lula levou à frente como presidente temporário do Conselho de Segurança da ONU. O Brasil falou de cessar-fogo, de “paz” e da “defesa das crianças”, e diz isso repudiando quase que em pé de igualdade a ação do Hamas e as ações militares que o exército de Israel leva à frente, bombardeando indiscriminadamente casas de civis, hospitais, escolas e até abrigos de refugiados da ONU, apoiado pelo imperialismo norte-americano e europeu, matando crianças e mulheres palestinas como parte de seu "castigo coletivo" pelas ações do Hamas.

O exército de Israel está bombardeando as crianças e a população palestina, inclusive usando bombas de fósforo branco, atirando mísseis em palestinos que se deslocam pela Faixa de Gaza. Também não compartilhamos a estratégia do Hamas, mas é preciso dizer que nesse cenário a política e o discurso do governo Lula avalizam as atrocidades cometidas por Israel. Além disso, mantém as relações diplomáticas com esse país, bem como segue com a colaboração que aprofunda os meios de repressão do povo palestino e brasileiro.

Por isso é preciso a mais ampla solidariedade internacional com o povo palestino. Abaixo os bombardeios e a intervenção militar israelense legitimados pelo imperialismo americano e europeu! O povo palestino tem o direito de se defender! Palestina livre do rio ao mar! Que o Brasil rompa todas as relações técnico-militares, diplomáticas e comerciais com Israel! Não ao envio de armas para Israel!

Abaixo o Estado sionista de Israel! Por uma Palestina livre, operária e socialista, onde convivam democraticamente palestinos, judeus e todas as etnias presentes no território.

 

Fonte: Esquerda Diário/Jornal GGN/Ponte Jornalismo

 

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