O truque simples para fazer as pessoas
mudarem de opinião
"O aumento do conhecimento depende
totalmente da discordância", dizia o filósofo britânico Karl Popper
(1902-1994).
Ele se referia aos perigos dos dogmas na
ciência. Mas suas palavras também podem ser aplicadas à visão de mundo de
qualquer pessoa.
Se você quiser que uma discordância termine
por mudar a mente de alguém, é preciso agir da forma correta.
No meu recente livro sobre conexões sociais,
descobri que as novas pesquisas psicológicas podem nos ajudar a ter conversas
mais construtivas sobre questões controversas. E algumas das estratégias me
surpreenderam.
Alguns usuários de redes sociais gostam de
nos lembrar que "os fatos não ligam para os seus sentimentos". Mas
estudos indicam que as pessoas ficam muito mais dispostas a ouvir nossos
argumentos quando falamos sobre nossas experiências pessoais em relação às
questões em discussão.
• Seja
curioso
Um dos principais motivos que levam a
divergências sérias entre as pessoas ficou evidente no recente Estudo sobre a
Amizade – um questionário que idealizei com o psicólogo Ian MacRae e foi
oferecido aos leitores do portal BBC.com, nos meses de julho e agosto do ano
passado.
Em uma das seções, solicitamos aos
participantes que imaginassem uma discussão com alguém com quem eles
discordassem sobre certas questões políticas ou sociais.
Em seguida, questionamos os participantes
sobre suas intenções – se eles pretendiam convencer a outra pessoa, aprender ou
discutir com ela – e sua impressão sobre as intenções do seu interlocutor.
De forma geral, os 1.912 participantes da
pesquisa da BBC superestimaram o quanto as outras pessoas queriam convencê-los
sobre o seu ponto de vista e o quanto eles procuravam discutir.
Paralelamente, eles subestimaram o quanto a
outra pessoa queria aprender e compreender as diferentes opiniões.
É importante relembrar este ponto sempre que
nos encontrarmos em meio a um conflito. A outra pessoa pode estar mais aberta a
uma discussão de boa-fé do que pensamos, e devemos tratá-la com o respeito que
ela merece.
Considerando que o nosso interlocutor também
pode subestimar nossa curiosidade sobre suas opiniões, deveríamos nos esforçar
mais para expressar o nosso interesse pelas convicções dele.
Demonstrando nossa boa intenção de aprender e
compreender, iremos incentivá-lo a baixar a guarda e ficar mais aberto a uma
honesta troca de ideias.
Muitas vezes, a questão é simplesmente de
fazer a pergunta certa.
No final dos anos 2000, Frances Chen e seus
colegas da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, convidaram os
estudantes a entrar em um debate online para discutir se a universidade deveria
introduzir um novo conjunto de exames. É claro que muitos estudantes eram
totalmente contra aquela ideia.
Basicamente, eles pensavam que iriam
conversar com seus colegas, mas seus parceiros de debate, na verdade, eram os
próprios pesquisadores. Eles seguiam roteiros muito rígidos, que só variavam
conforme o participante estivesse no grupo experimental ou de controle.
No meio da conversa, os pesquisadores pediam
aos estudantes que detalhassem suas opiniões.
Eles poderiam ouvir o argumento de um
estudante e responder, por exemplo: "Fiquei interessado pelo que você está
dizendo. Poderia me contar mais por que você pensa desta forma?"
Nos outros testes, a conversa não incluiu
nenhum pedido de maiores informações sobre as convicções dos participantes.
A mudança do roteiro era minúscula, mas
acrescentar aquela única questão mudou todo o tom do debate, provocando uma
reação muito mais aberta dos participantes. Eles ficaram mais dispostos, por
exemplo, a continuar a conversa e receber mais informações sobre os argumentos
da outra pessoa.
Podemos ficar um tanto céticos sobre os
resultados de um único experimento. Mas Guy Itzchakov, da Universidade de
Haifa, em Israel, e seus colegas chegaram a conclusões muito parecidas em uma
série de estudos, que envolveram centenas de participantes.
Fazer ativamente perguntas sobre as
convicções das pessoas e os motivos por que elas mantêm suas opiniões as leva a
baixar a sua guarda. Elas passam a ser muito mais receptivas a opiniões
alternativas.
Depois deste tipo de conversa, os
participantes ficaram muito mais dispostos a concordar com declarações como
"acho que, agora, eu deveria reavaliar o evento, depois da conversa".
Isso indica que eles começaram a pensar mais sobre as questões que haviam
discutido.
• Fale
de forma pessoal
Ao trocar opiniões, você não deve ter medo de
oferecer sua experiência pessoal sobre o tema em questão. Na verdade, ela pode
simplesmente fortalecer os seus argumentos. E este fato parece não ser muito
reconhecido.
Emily Kubin, da Universidade da Carolina do
Norte, nos Estados Unidos, e seus colegas pediram a 251 participantes de um
estudo que descrevessem as melhores formas de apresentar suas opiniões sobre
temas como o aborto ou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. E 56% deles
preferiram apresentar fatos e evidências, enquanto apenas 21% selecionaram a
expressão da experiência pessoal.
Observamos padrões similares no Estudo da
Amizade da BBC. Quando pedimos às pessoas que avaliassem sete estratégias de
persuasão, "civilidade" foi a primeira, seguida por "razão e
lógica". E "experiência pessoal" veio em quinto lugar.
Mas os experimentos de Kubin indicam que esta
pode ser uma potente ferramenta de persuasão.
Sua equipe pediu a 177 participantes que
lessem as opiniões de três pessoas sobre temas como cobrança de impostos,
mineração de carvão ou controle de armas. Em seguida, eles deveriam avaliar seu
respeito por cada pessoa e a racionalidade de cada uma delas.
Independentemente da sua posição inicial, os
participantes avaliaram as pessoas de forma consideravelmente mais positiva
quando sabiam que elas tinham experiência pessoal sobre o tema em questão.
Ler textos curtos online pode parecer algo
muito diferente de manter encontros presenciais na vida real. Mas Kubin também
testou o mesmo princípio em diálogos frente a frente sobre o controle de armas,
usando outra amostra de 153 pessoas que moravam perto da universidade.
E, também neste caso, as pessoas que faziam
uso da sua experiência pessoal para retratar suas opiniões despertavam mais
respeito do seu interlocutor e eram consideradas mais racionais nas suas
opiniões.
É claro que existem boas razões para
desconfiar de relatos puramente subjetivos, se não forem acompanhados de
estatísticas. E o excesso de confiança no apelo emocional pode levantar
suspeitas da outra pessoa.
Mas estas técnicas não precisam ser
mutuamente exclusivas. E o seu ponto de vista pode ser melhor recebido se você
combinar as duas.
Um recente exame das eleições americanas de
meio de mandato, em 2018, demonstrou um ponto interessante.
O estudo avaliou o progresso de 230 cabos
eleitorais, conversando sobre uma série de questões políticas com 6.869
eleitores de sete locais nos Estados Unidos.
Os pesquisadores pediram a alguns deles que
defendessem sua posição usando argumentos puramente estatísticos – sobre temas
como o medo comum de que a imigração aumenta a criminalidade. E pediram a
outros que trocassem histórias pessoais, além de apresentar evidências
factuais.
Todos os eleitores participaram de pesquisas
de opinião antes e depois do encontro com os cabos eleitorais. E os
pesquisadores concluíram que a troca de experiências com respeito mútuo
apresentou maior probabilidade de mudar opiniões do que as conversas mais
concentradas em fatos e estatísticas impessoais.
Os efeitos gerais foram pequenos. Eles
resultaram, por exemplo, em mudança das opiniões sobre imigração em cinco
pontos percentuais. Mas é preciso considerar este resultado dentro do seu
contexto.
Afinal, as conversas duraram em média apenas
11 minutos e, ainda assim, uma quantidade significativa de pessoas começou a
rever suas opiniões, antes defendidas com plena convicção.
• Ouvir
e aprender
Durante as nossas conversas, precisamos
manter um nível básico de civilidade – não só com o nosso parceiro de
discussão, mas também quando falamos sobre qualquer pessoa que possa estar
envolvida no debate, incluindo figuras públicas.
Uma pesquisa realizada por Jeremy Frimer, da
Universidade de Winnipeg, no Canadá, e Linda Skitka, da Universidade de
Illinois em Chicago, nos Estados Unidos, demonstrou que o comportamento
grosseiro é muito mais propenso a alienar a pessoa que você deseja convencer do
que mudar sua opinião. E pode até desmobilizar alguém que você já estivesse
trazendo para o seu ponto de vista.
Eles descrevem este fenômeno como o Princípio
de Montagu. O nome vem da aristocrata inglesa do século 18 Lady Mary Wortley
Montagu (1689-1762). Ela declarou que "a civilidade não custa nada e
compra tudo".
Demonstrando verdadeira curiosidade,
compartilhando suas experiências pessoais e mantendo um comportamento
civilizado, você poderá se surpreender com seu potencial de fazer conexões – e
ainda construir uma visão de mundo mais sensata com isso.
Fonte: BBC Future

Nenhum comentário:
Postar um comentário