Segurança e defesa no Brasil e América do
Sul
A venda da
Avibras tem se mostrado uma trama complexa envolvendo interesses de empresas e
nações estrangeiras sobre a base industrial de defesa do Brasil. Somado a isso,
o avanço na modernização das Forças Armadas argentinas, que passam pelo
aprofundamento de laços com os EUA e o agravamento da crise entre o país
norte-americano e a República Popular da China, são temas que merecem atenção.
·
A cooperação em defesa
entre Brasil e Paraguai
No dia 02 de maio o
ministro da defesa, José Múcio, fez uma viagem ao Paraguai para um reunião com
o presidente paraguaio, Santiago Peña, e seu homólogo, para discussão de temas
relativos à cooperação e parcerias no campo da defesa. Neste encontro o Paraguai demonstrou interesse em comprar aeronaves brasileiras, mais especificamente seis caças Embraer A-29 Super Tucano, com
a intenção de utilizá-los em patrulhamento aéreo no combate ao tráfico de armas
e drogas. Este acordo também contou com o presidente da Empresa Brasileira de
Aeronáutica (Embraer), Francisco Gomes Neto, e de representantes do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sendo que este último é
o financiador da compra das aeronaves pelo Paraguai, com o acordo sendo
estimado no valor de US$100 milhões.
Importante destacar
que Brasil e Paraguai tem um longo histórico de cooperação no âmbito da defesa.
Em 1941 há a primeira institucionalização da cooperação militar entre os dois
países com criação de uma Missão Militar com a finalidade de organizar os Cursos
de Cavalaria, Equitação e Educação Física. Entre os anos de 1942 e 1994 esteve
vigente a Missão Militar Brasileira de Instrução no Paraguai (MMBIP), que em
1997 se torna a Cooperação
Militar Brasileira no Paraguai (CMBP) e
tem como foco na cooperação militar nos campos científicos, culturais,
tecnológicos e de aperfeiçoamento profissional.
Ao longo dos últimos
anos, diversos acordos de cooperação no campo da defesa e segurança foram sendo
assinados entre os dois países, cabe aqui destacar dois deles:
- Mecanismo 2+2 de Consulta Política e Avaliação Estratégica: Criação de um foro diplomático envolvendo os ministros da
defesa e relações exteriores dos dois países visando o intercâmbio de
informações e ideias a respeito de defesa e segurança internacional
- Acordo Quadro sobre Cooperação em Matéria de Defesa: Cooperação no campo da defesa com o objetivo de
desenvolver uma visão compartilhada de defesa, intercambiar experiências e
perspectivas em estrutura organizacional e modernização das forças
armadas, identificar enfoques comuns em temas de defesa e segurança
internacional, promover ações conjuntas de treinamento e instrução
militar, manobras militares, entre diversos outros assuntos relativos ao
tema.
Para além desses
acordos podemos citar outras ações que também envolvem cooperação com o país
vizinho em matéria de segurança e defesa. Exemplos são o Programa de Proteção Integrada de Fronteiras (PPIF) que visa o fortalecimento da prevenção, do controle, da
fiscalização e da repressão aos delitos transfronteiriços, tendo como uma de
suas diretrizes a cooperação internacional com os vizinhos, incluindo o
Paraguai. Há também a Comissão Mista Brasil- Paraguai sobre Drogas e Temas Conexo, que visa o combate ao tráfico de drogas, armas, pessoas e ao
crime organizado. Como também a realização de exercícios militares combinados
entre os dois países.
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O Imbróglio da
venda da AVIBRAS
Em contraposição à
situação da Embraer e a venda dos Super Tucanos, a Avibras, empresa estratégica
do setor nacional de defesa, teve sua venda anunciada em
abril deste ano para a australiana DefendTex e, desde o início das negociações,
uma série de problemas foram deflagrados.
Do silêncio das Forças
Armadas sobre a venda de uma empresa estratégica do setor de defesa
nacional, até a entrada da NORINCO, empresa estatal chinesa, nas
negociações e posterior ameaça de sanção dos Estados Unidos, a venda
da Avibras tem se mostrado uma trama complexa envolvendo interesses de empresas
e nações estrangeiras sobre a base industrial de defesa do Brasil.
O anúncio da venda da
Avibras é a demonstração de mais um capítulo do desmonte nacional do setor de
defesa brasileira, cujo exemplo mais recente foi a venda da Condor e da SIATT
em 2024 para o EDGE Group, uma estatal dos
Emirados Árabes Unidos.
Incapazes de manter
sob território nacional o know-how destas empresas, o governo
brasileiro segue abrindo mão de um mercado lucrativo e com capacidade de gerar
empregos de alto nível e investimentos científicos, precarizando não apenas as
Forças Armadas Brasileira – que ficam à mercê de interesses externos, os quais
em períodos de guerra podem não se mostrar amistosos com as nossas necessidades
– mas também o desenvolvimento tecnológico futuro numa área que possui
capacidade de gerar interfaces e ganhos para outros setores da
economia.
No atual
desenvolvimento das negociações, a DefendTex, que tinha decidido por deixar a
mesa de negociações, voltou atrás quando a chinesa NORINCO demonstrou seu
interesse. O fato dos Estados Unidos terem indicado a possibilidade de sanção à
empresa caso os chineses saíssem vitoriosos é uma indicação de que, mesmo que a
NONRICO adquira a Avibras, podem haver sanções no mercado internacional para
minar a saúde financeira da empresa brasileira.
Uma possibilidade,
caso a NORINCO adquira participação na Avibrás, é que uma eventual sanção
estadunidense poderia fazer com que a empresa viesse a ter maior dependência do
comércio com países fora da órbita da OTAN e da política externa dos EUA. Isso
abriria espaço para uma inserção em mercados como o da América Latina ou do
continente africano.
·
Aproximação Argentina
e EUA: impactos para a o setor de defesa no Brasil
Ainda sobre interesses
estrangeiros e dependência das grandes potências, nos últimos meses a Argentina
tem feito avanços na modernização de suas Forças Armadas, com uma série de
aquisições que passam pelo aprofundando de seus laços com os EUA. Entre as principais notícias estão a potencial aquisição de
veículos blindados 8X8, a compra de aviões
de combate F-16 de 2ª Mão da Dinarmarca, a participação no Grupo de Contato de
Defesa da Ucrânia e a realização de exercícios navais com a Marinha dos Estados
Unidos.
O Exército Argentino
está avançando na aquisição de Veículos Blindados de Combate Sobre
Rodas (VCRB) 8×8, que
são essenciais para melhorar a mobilidade e a capacidade de resposta rápida em
diferentes terrenos. Esta aquisição atinge diretamente as pretensões
brasileiras de vender o blindado 6×6 Guarani, que inclusive tem motor fabricado
no país vizinho.
Em paralelo, o governo argentino aprovou um gasto significativo para a
compra de aviões dos combate usados F-16. Os F-16
são aeronaves multifuncionais, capazes de realizar missões de defesa aérea,
ataque ao solo e reconhecimento, porém longe de ser a versão mais moderna do
vetor. Esta aquisição mina quaisquer das remotas possibilidades de aquisições
de caças Gripen fabricados no Brasil.
Sobre a aquisição dos
caças F-16, vale lembrar que a Dinamarca está interessada na venda dessas
unidades num contexto maior: ela está adquirindo os modernos aviões de combate
F-35, também dos Estados Unidos. A equação, ao final, ficaria da seguinte maneira:
os EUA autorizam e intermediam, politicamente, a venda de jatos usados que eles
mesmo fabricaram e cujas peças de reposição são os maiores fornecedores, e, ao
mesmo tempo, lucram na venda de aviões mais sofisticados ainda para os
dinamarqueses. Eles lucram duplamente e, ainda por cima, reforçam sua posição
geopolítica no continente americano num contexto de competição crescente com a
China.
Além das aquisições de
equipamentos, a Argentina também está fortalecendo sua aproximação e aliança
com os EUA. A recente decisão de se unir ao Grupo de Contato de Defesa da Ucrânia indica um
posicionamento mais ativo no cenário internacional nessa direção, especialmente em contextos de segurança global e cooperação em
defesa.
Finalmente, a Marinha Argentina está se preparando para o exercício naval
Gringo-Gaucho II, em conjunto com a Marinha dos Estados Unidos. Este exercício visa melhorar a interoperabilidade entre as
duas marinhas, além de proporcionar treinamento em operações conjuntas e
técnicas de combate naval. A participação em exercícios como o Gringo-Gaucho II
é mais uma de uma série de exercícios realizados pelos norte-americanos no
continente ao longo desse ano.
·
Aumento das tensões na
Ásia
O agravamento da crise
entre Estados Unidos, seus aliados asiáticos, a OTAN, de um lado, e a República
Popular da China apresenta novas circunstâncias que podem levar potências
mundiais à guerra.
Ampliando sua
estratégia de contenção e cerco à China, os Estados Unidos tem fortalecido a
posição do Japão como seu principal parceiro e baluarte de seus interesses na
Ásia com o intuito de promover a inclusão do país asiático à AUKUS, aliança
militar tripartite formada pela Austrália, Reino Unido e Estados Unidos. Na
reunião realizada por essa aliança em abril de 2024, a inclusão de novos
membros foi discutida e Washington pressionou pela participação do Japão.
Porém, independente de ser um membro oficial, os japoneses já colaboram com a
AUKUS, pois em maio de 2024 a Força Marítima de Autodefesa do Japão (FMAJ),
comunicou a assinatura de um memorando sobre guerra de informação entre a FMAJ,
a Marinha Real Australiana e a frota do pacífico dos Estados Unidos. Também em
maio, foi realizado no Havaí uma reunião entre os chefes da defesa dos EUA,
Austrália, Japão e Filipinas, onde os mesmos “concordaram em aumentar as
atividades conjuntas, incluindo exercícios militares” por “partilharem a visão
comum de um Indo-Pacífico livre e aberto”.
O cenário de
degradação das relações entre os países asiáticos aliados dos Estados Unidos e
a República Popular da China, é agravado pela pujança da indústria naval
chinesa. Os EUA permanecem sendo a maior potência naval e marítima, mas sua
construção naval foi ultrapassada pela China, Japão e Coréia do Sul. Para lidar
com a rápida expansão da marinha da China, impulsionada por sua posição
dominante no mercado de construção naval, os Estados Unidos buscam o apoio de
seus aliados sul-coreanos e japoneses “para revitalizar seus estaleiros navais
inativos e restaurar sua competividade”. Em março de 2024, o Secretário da
marinha dos Estados Unidos, Carlos Del Toro, visitou os estaleiros das empresas
Mitsubishi Heavy Industries (MHI) no Japão, e HC Hyundai na Coréia do Sul,
“para ajudar a reconstruir a capacidade de construção naval da América”. Del
Toro ainda afirmou que os estaleiros visitados “estabeleceram o padrão global
da indústria, por isso não poderia estar mais entusiasmado com a perspectiva de
estas empresas trazerem os seus conhecimentos, a sua tecnologia e as suas
melhores práticas aos estaleiros localizados nos Estados Unidos”.
Atualmente governada
por Ferdinand Marcos Júnior, filho do ex-ditador Ferdinand Marcos, as Filipinas
deixaram a posição mais independente do governo anterior para voltar a se
constituir em dos mais importantes e próximos aliado dos Estados Unidos contra
a China. Motivada pelos confrontos entre suas unidades navais e a Guarda
Costeira Chinesa no mar do sul da China, o governo filipino voltou a permitir,
após mais de 30 anos, a presença da marinha dos Estados Unidos em Subic
Bay, revivendo a aliança contra a União Soviética. Em fevereiro de 2023, foi
assinado o Acordo de Cooperação de Defesa Aprimorada, que permite que os EUA
façam rodizio de tropas e construam outras instalações para uso de unidades
estadunidenses e filipinas, bem como o acesso a mais quatro bases, sendo uma
delas na borda sudeste do mar da China Meridional, apenas 320 quilômetros ao
sul de Taiwan. Além do desdobramento de unidades aeronavais no território
filipino, os militares norte-americanos estão posicionando sistemas de armas
Typhon na região, que possui a capacidade de lançamento de mísseis de cruzeiro
Tomahawk e misseis antiaéreos SM-6, sendo noticiada também, a transferência de
unidades do Sistema de Foguetes de Artilharia de Alta Mobilidades, o HIMARS.
A Ásia é uma região
conflagrada e diante de qualquer erro de cálculo pode levar o continente e o
mundo a uma guerra de grandes proporções.
¨ Como a relação entre Brasil e China pode revolucionar a Defesa
nacional
As recentes
movimentações em torno da cooperação militar entre Brasil e China podem avançar
significativamente em breve. Pelo menos é o que indicam as últimas visitas
oficiais de militares em ambos os países e manifestações discretas de empresas
de Defesa sobre o tema. Os planos, no entanto, podem ser frustrados pelos
Estados Unidos.
>>>> Entenda:
<><>
Negociações em torno da AVIBRAS e ultimato dos EUA
No dia 11 de junho, o
comandante do Exército brasileiro, general Tomás Paiva, visitou a empresa
chinesa de armamentos Norinco, em Pequim. A viagem ocorreu em meio às
negociações sobre sua participação minoritária na Avibras, a principal
fabricante de produtos de Defesa no Brasil.
Contudo, cerca de um
mês antes, em 13 de junho, o governo brasileiro recebeu uma carta da própria
Norinco, que manifestou de forma oficial a intenção de adquirir 49% da empresa
nacional.
A intenção de assumir
o controle da Avibras, porém, também é negociada com o grupo australiano
DefendTex. Neste limbo, conforme revelou o jornal Folha de S. Paulo, os
Estados Unidos ameaçaram o Brasil com sanções, caso se confirme o negócio com a
empresa chinesa.
<><>
Os rumores
de possível transferência tecnológica chinesa
Cerca de um ano antes
das discussões em torno da Avibras, o Brasil já teria discutido com a China
possibilidades para alavancar a indústria de Defesa nacional.
Segundo notícia da
Revista Veja, publicada em 20 de julho de 2023, o Escritório de Projetos
Especiais do Exército Brasileiro sentou à mesa com Pequim para debater uma
parceria com fabricantes chinesas de material bélico a possível produção de
alguns equipamentos no Brasil, a partir da transferência de tecnologia.
As discussões teriam
acorrido, em meio a uma determinação do ministro da Defesa, José Múcio, para
que o comando do Exército Brasileiro enviasse uma comitiva do Escritório de
Projetos Especiais à China, justamente com o objetivo de tomar conhecimento de
equipamentos que pudessem ser produzidos por empresas brasileiras.
Na mesma época, uma
delegação de 18 militares das Forças Armadas da China visitou o Quartel-General
do Exército, em Brasília, e a Escola Superior de Guerra no Rio de Janeiro. A
visita fez parte da viagem de estudos estratégicos da Universidade de Defesa Nacional
da China.
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Oferta de armas
À época, uma fonte
militar do governo ainda informou ao jornalista Robson Bonin, de Veja, que a
Força Terrestre teria algumas prioridades sobre os tipos de equipamentos a
serem produzidos no Brasil, a partir da parceria com os chineses.
A transferência
tecnológica teria como foco sistemas de artilharia antiaérea, incluindo mísseis
antiaéreos e radares tridimensionais, carros de combate, sistemas de artilharia
de campanha autopropulsada sobre rodas, aeronaves remotamente pilotadas, especialmente
drones kamikaze, e sistemas de rádio de comunicação definidos por software.
Fonte: Jornal GGN
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