quinta-feira, 27 de junho de 2024

Lula pede ao Itamaraty para apurar golpe na Bolívia

O país viveu uma tentativa de golpe de Estado nesta quarta-feira (26), quando parte do Exército tomou a Praça Murillo, em La Paz, onde fica o palácio do governo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já se manifestou sobre a crise no país vizinho e pediu a apuração do Itamaraty.

Após o presidente da Bolívia, Luis Arce, denunciar uma tentativa de golpe em seu país, com militares do Exército que tentaram entrar a força no palácio presidencial, o presidente Lula se manifestou rapidamente sobre a questão. O petista solicitou que a situação seja apurada pelo Ministério das Relações Exteriores.

"Pedi para o ministro Mauro [Vieira, das Relações Exteriores] ligar para a Bolívia, ligar para o presidente, ligar para o embaixador brasileiro para a gente ter certeza e podermos ter posição. Como eu sou um amante da democracia, eu quero que a democracia prevaleça na América Latina; golpe nunca deu certo", declarou nesta tarde durante um anúncio de investimentos para a área de educação.

A chanceler boliviana Celinda Sosa também se pronunciou sobre a situação e pediu o apoio da comunidade internacional frente à tentativa de golpe em curso no país.

"O Estado Plurinacional da Bolívia denuncia perante a comunidade internacional as mobilizações irregulares de algumas unidades do Exército boliviano que ameaçam a democracia, a paz e a segurança do país. Fazemos um apelo à comunidade internacional e à população boliviana para que respeitem os valores democráticos e apoiem o governo do irmão presidente Luis Arce Catacora, constitucionalmente eleito pela vontade soberana do povo boliviano", declarou.

·        Movimentações irregulares do Exército

O presidente da Bolívia, Luis Arce, denunciou nesta quarta-feira (26) movimentações irregulares de militares na Praça Murillo, em La Paz.

A presidente de Honduras, Xiomara Castro, que também é presidente temporária da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) convocou os presidentes dos países do grupo a "condenar o fascismo" que atenta contra a democracia na Bolívia.

"Declaramos greve geral por tempo indeterminado e bloqueio de estradas. Não permitiremos que as Forças Armadas violem a democracia e intimidem o povo", disse.

<><> Presidente da Bolívia denuncia movimentações militares irregulares em La Paz

O presidente da Bolívia, Luis Arce, denunciou nesta quarta-feira (26) movimentações irregulares de militares na Praça Murillo, em La Paz.

O ex-presidente do país também apelou a uma mobilização nacional para defender a democracia contra o que classificou como uma tentativa de "golpe de Estado que se prepara à frente do general Zuñiga".

"Declaramos greve geral por tempo indeterminado e bloqueio de estradas. Não permitiremos que as Forças Armadas violem a democracia e intimidem o povo."

·        Militares ingressam no palácio presidencial

Os militares revoltosos teriam ingressado no Palácio Quemado, sede do governo da Bolívia, segundo imagens das manifestações. "Recuperamos nossa pátria", afirmou o general Juan José Zuñiga ao entrar no palácio.

De acordo com informações, Zuñiga teria sido demitido por Arce na terça-feira (25) ao se opor a uma possível reeleição do ex-presidente Evo Morales. Em transmissão televisionada Zuñiga afirmou que Morales "não pode ser mais presidente do país".

Evo, que atualmente está em um racha político com Arce, condenou a tentativa de golpe em sua conta no X (ex-Twitter). "Convocamos os movimentos sociais do campo e da cidade para defenderem a democracia."

·        Organizações internacionais manifestam apoio a Arce

O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, condenou nesta quarta-feira as mobilizações irregulares do Exército Boliviano e manifestou solidariedade ao governo do país sul-americano diante de um possível colapso da ordem constitucional.

"A Secretaria-Geral da OEA condena da forma mais contundente os acontecimentos na Bolívia. O Exército deve submeter-se ao poder civil legitimamente eleito. Enviamos nossa solidariedade ao Presidente da Bolívia, Luis Arce Catacora, ao seu Governo e a todo o povo boliviano."

"A comunidade internacional, a OEA e a Secretaria-Geral não tolerarão qualquer violação da legítima ordem constitucional na Bolívia ou em qualquer outro lugar", disse a organização.

O Grupo de Puebla, fórum de partidos de esquerda também condenou as mobilizações irregulares. "Condenamos o levante antidemocrático de algumas unidades do Exército Boliviano", disse o grupo.

A presidente de Honduras, Xiomara Castro, que também é presidente temporária da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) convocou os presidentes dos países do grupo a "condenar o fascismo" que atenta contra a democracia na Bolivia.

<><> General do Exército acusado de tentativa de golpe na Bolívia se reúne com presidente Arce

O general Juan José Zúñiga, acusado de liderar um golpe de Estado na Bolívia, teve um encontro com o presidente Luis Arce, informou nesta quarta-feira (26) o portal de notícias Erbol, na porta do palácio do governo, onde as tropas estavam mobilizadas.

A mídia local relatou a presença de militares na Praça Murillo, espaço central da cidade onde estão localizados os prédios do governo. Arce apelou ao respeito pela democracia e o ex-presidente Evo Morales denunciou uma tentativa de golpe liderada pelo general do exército Zúñiga.

Após a reunião com Arce, o general Zúñiga e os militares deixaram o prédio do governo, enquanto o ministro do Governo da Bolívia, Carlos Eduardo del Castillo, junto com outras autoridades, ficaram a porta, conforme relatado pelo portal de notícias.

Acusado de planejar a tentativa de golpe, o general Juan José Zuniga disse anteriormente que o objetivo da ação ilegal era "recuperar a nossa pátria".

 

¨      Brasil deve decidir o que Forças Armadas querem antes de pensar em reformar 'aposentadoria'

Encarada na mídia como um dos maiores drenos de recurso do governo, o regime especial de "aposentadoria" dos militares é tema de revisão no governo federal. Para analistas ouvidos pela Sputnik Brasil, o problema orçamentário da Forças Armadas tem origens diferentes das debatidas na grande mídia.

Um novo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que o gasto com militares da reserva aumentou 84,6% nos últimos dez anos, de R$ 31,85 bilhões em 2014 para R$ 58,8 bilhões em 2023, aumentando o déficit orçamentário causado pelo pessoal inativo.

Um trabalhador do setor privado, assegurado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), gera ao governo um déficit per capita de R$ 9,42 mil, criado pela diferença de quanto é arrecadado por impostos em sua folha de pagamento e quanto é pago aos atuais aposentados e pensionistas. Já um servidor público federal, que conta com seu próprio sistema, apresenta um déficit de R$ 68,79 mil por cada assegurado.

Em comparação, os militares da reserva causam um rombo de R$ 158,8 mil por pessoa na reserva, cerca de 16 vezes mais do que um aposentado pelo INSS.

Por conta dessa enorme diferença, o Sistema de Proteção dos Militares das Forças Armadas (SPMFA) entrou na mira de ministros que buscam um melhor ajuste das contas públicas, como a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Instituído em 1980, durante a Ditadura Militar, "a ideia era 'recompensar' os militares por todo o empenho em defesa da pátria e em decorrência da falta de benefícios na remuneração enquanto estão na ativa", afirma Nayhara A. Cardoso Queiroz, head de direito tributário na RGL Advogados, em entrevista à Sputnik Brasil.

Esse regime, por sua vez, foi revisto em 2019, quando a contribuição da folha de pagamento aumentou de 7,5% para 10,5% e aumentou o tempo mínimo de serviço para que o militar possa entrar na inatividade de 30 para 35 anos.

·        Militares não se aposentam

Hoje um membro das Forças Armadas, quando entra na reserva, tem direito a receber seu último salário de forma integral, chegando a R$ 37 mil para o último escalão, enquanto um civil é limitado ao teto previdenciário de R$ 7.786,02.

Os reservistas podem receber ainda uma ajuda de custo equivalente a oito salários, com um máximo de R$ 300 mil para generais, almirantes e tenentes-brigadeiros, além de poderem deixar pensão para cônjuges e filhos, até que cumpram um máximo de 24 anos.

Como explica Queiroz, os militares não estão vinculados aos tradicionais regimes de previdência social dos trabalhadores privados e públicos. Pelo contrário, o SPMFA é regido diretamente pelo Ministério da Defesa por meio de seus respectivos comandos.

"Esses órgãos são responsáveis por administrar as pensões e aposentadorias dos militares, diferente do regime geral da Previdência Social, que é administrado pelo INSS", afirma.

Pedro Amorim de Souza, advogado e coordenador da área consultiva do Martins Cardozo Advogados Associados, explica ainda que segundo a Lei nº 6.880, o Estatuto dos Militares, a remuneração dos militares fica a cargo do Tesouro Nacional.

"Então, para você ver que, na verdade, as coisas são bem diferentes mesmo, a ponto de não vir nem do mesmo lugar", frisa ele também em declarações à reportagem.

Esses fatos dão gás à argumentação da pasta de Defesa, de que o SPMFA não se trata de uma aposentadoria, uma vez que os militares da reserva podem ser convocados de volta para a ativa em caso de conflito, além de também contribuírem com uma parcela desses pagamentos para o próprio SPMFA.

José Mucio Monteiro, ministro da pasta, argumenta também que o regime distinto visa corrigir desvantagens econômicas da categoria, como não ter recolhimento de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e não receberem adicional noturno, de periculosidade, hora extra e outros, e sociais, como a impossibilidade de se candidatar a cargo eleitoral sem ir para a reserva.

Dessa forma, a falta desses direitos geraria uma economia de R$ 30 bilhões nas despesas com pessoal, o que de certa forma compensaria o valor gasto com os militares na reserva.

Segundo Souza, essa matemática é extremamente complexa de se afirmar, uma vez que seria preciso analisar precisamente diferentes situações variáveis, como "quantos oficiais fazem hora extra ou quantos oficiais estão disponíveis durante o domingo".

"Mas é preciso colocar em perspectiva que a diferença é uma diferença superlativa."

"Mesmo que haja diferença entre civis e militares, em termos previdenciários, essa diferença seria justificável até algum ponto", diz Souza, "mas provavelmente não a esse ponto de ser 15 vezes maior uma em relação à outra".

Problema 'é a própria estrutura de Defesa do país'

Para Vagner Camilo Alves, professor do Instituto de Estudos Estratégicos (Inest) da Universidade Federal Fluminense (UFF), a argumentação dos militares é, "em linhas gerais, correta".

Segundo o analista, os membros das forças não recebem grandes salários quando comparados a outras funções federais, como é o caso dos membros da casta jurídica brasileira, "mas mais do que os professores universitários, certamente", brinca.

De fato, diz Alves à Sputnik Brasil, as funções da vida militar são muito específicas, fazendo com que seja necessário um sistema diferente de "aposentadoria".

"As pessoas que se dedicam a isso têm uma vida muito diferente da minha e da sua, mudam de lugar o tempo todo, e essa questão da hierarquia e disciplina é uma profissão que sai com ele."

Ainda assim, essas questões orçamentárias precisam ser revistas, declara o especialista. Atualmente, o gasto com pessoal, seja da ativa, da reserva ou de pensionistas, engole 78% do orçamento de Defesa brasileiro.

"Essa questão se insere numa outra muito maior, né? Eu diria que é o tipo de Forças Armadas que nós queremos, que nós precisamos."

Na opinião dele, o contingente militar brasileiro é muito grande e, em sua maioria, "com um valor militar baixíssimo". "O tamanho das forças e essa disparidade brasileira da Marinha e da Força Aérea Brasileira [FAB] em relação ao Exército é histórico e até compreensível, mas não mais."

"Porque para a estatura que o Brasil busca no sistema internacional, ele precisa de forças mais tecnológicas."

De acordo com Alves, a diminuição do número de pessoal abriria recursos para mais investimentos, inclusive em projetos de longo prazo "que o Brasil precisa mais", como é o caso do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub) da Marinha e do Programa Espacial Brasileiro, da FAB.

Até porque, crava Alves, "esse tipo de tecnologia não será fornecida ao país" por outra potência.

Segundo o professor da UFF, esse é um problema "da própria estrutura de Defesa do país", sendo necessária "uma discussão de que Forças Armadas queremos, porque dá para diminuir a quantidade de militares".

Por motivos de inércia histórica e burocrática, aponta o analista, o eixo Sul-Sudeste possui uma "quantidade excessiva de quartéis" que hoje não faz mais sentido. Alguns, lembra Alves, com razão foram transferidos para a Região Amazônica. "Que, de fato, é uma região onde a presença é importante."

"A estrutura de Defesa brasileira deveria sofrer uma alteração direcionada a uma força armada mais vinculada ao desenvolvimento tecnológico. Isso demandaria uma discussão nacional no Congresso, que eu acho que é o foro adequado, com a participação dos militares."

Nesse sentido, afirma Alves, uma reforma no SPMFA deve ser feita com essas questões em mente, de abrir mais espaço para investimentos em tecnologia nas Forças Armadas, e não somente para cortar gastos para o governo "pagar juros".

"Cortar por cortar, aí prefiro deixar como está", sintetiza.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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