segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

Às vésperas de mudanças na equipe de Lula, PT critica poder do Centrão e 'austericídio' fiscal

A cúpula do PT vai aprovar nesta sexta-feira, 8, uma resolução política na qual critica a influência "desmedida" do Centrão sobre o governo Lula e o Legislativo, ataca o chamado "austericídio fiscal" e diz que temas como segurança pública e papel das Forças Armadas não podem ser tratados como "tabus". Embora faça uma avaliação positiva do primeiro ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT prega a alteração, com urgência, da correlação de forças que domina o cenário político nesse terceiro mandato.

A proposta de resolução, apresentada pela corrente Construindo um Novo Brasil (CNB) - majoritária no PT - ainda pode receber emendas e sofrer ajustes na reunião do Diretório Nacional. O encontro ocorrerá nesta sexta, pouco antes de Lula, o principal integrante da CNB, abrir a Conferência Eleitoral do partido.

Com o texto, o PT marca posição no momento em que Lula discute mudanças nos ministérios. O Centrão selou aliança com o governo em setembro, quando André Fufuca (PP) substituiu Ana Moser em Esporte e Sílvio Costa Filho (Republicanos) entrou no lugar de Márcio França (PSB) em Portos e Aeroportos. O acordo em troca de votos no Congresso foi articulado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

"As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial", diz a proposta de resolução apresentada pela tendência CNB e obtida pelo Estadão. "(...) É urgente, no entanto, nos organizarmos politicamente para alterar esta correlação de forças, o que só se dará pela conscientização e mobilização daqueles e daquelas que representamos e defendemos."

Em outro trecho do documento, há alfinetadas na direção do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ao destacar que o país ainda tem reservas internacionais de US$ 350 bilhões, o texto do PT diz que não faz sentido, neste cenário, "a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC, rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado".

Apesar de não citar a meta de déficit zero estabelecida para as contas públicas de 2024, a resolução que passará pelo crivo do Diretório Nacional não deixa dúvidas sobre a discordância em relação à proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

"O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC 'independente' e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país", sustenta o documento.

•        'Companheiro Haddad' entra e sai do texto

A primeira versão do texto da CNB, à qual o Estadão teve acesso, fazia até um elogio a Haddad. Dizia que "graças à credibilidade de Lula e à política econômica coordenada pelo companheiro Fernando Haddad, temos inflação cadente e sob controle, desemprego em queda, rendimento da população em alta e contas públicas equilibradas".

O início da frase, porém, foi substituído por "Graças à credibilidade de Lula e apesar do BC de Campos Neto (...)". A última versão será votada nesta sexta-feira.

A autonomia do Banco Central é ironizada pelos petistas quando o texto se refere implicitamente à desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre.

"O PIB só não foi maior por causa da deletéria política de juros do Banco Central 'independente'", diz a proposta de resolução. "Indicado por Jair Bolsonaro e pelo igualmente deletério ex-ministro Paulo Guedes, o ainda presidente do BC, Roberto Campos Neto, mantém com seus diretores a maior taxa de juros do planeta, sem que haja nenhuma justificativa plausível para essa barbaridade."

No diagnóstico do partido, a política de juros "sobrevive como um prolongamento do governo anterior", sabotando o crescimento da economia.

•        Petistas defendem Múcio fora da Defesa

Ao dar a largada para a pré-campanha de 2024, o PT também assinala que travará um duro embate com a extrema-direita nas eleições municipais. Afirma que, a partir dessas disputas, será possível "organizar e consolidar a base popular necessária para mudar a correlação de forças políticas e mudar o Brasil".

O documento menciona os atos golpistas de 8 de janeiro e diz que isso foi a "segunda derrota dos extremistas antidemocráticos", após o revés nas eleições. "O fato de eles permanecerem mobilizados contra o país, quase um ano depois, impõe a necessidade de responsabilizar e punir, de maneira firme e pedagógica, os comandantes políticos do golpismo, civis ou militares, a começar por Jair Bolsonaro, para que nunca mais voltem a ameaçar a democracia".

A referência ao ex-presidente, tratado como "um adversário sem escrúpulos", permeia o texto. Para o PT, Bolsonaro se associou a "comandantes militares desonrados", com o objetivo de "ameaçar e contestar" o processo eleitoral.

A certa altura, o partido cita o fato de Lula ter revogado "atos criminosos de Bolsonaro", que liberavam a venda e a posse de armas. Mais adiante, diz ser preciso investir em uma "estratégia de comunicação política" para denunciar fake news.

"É tarefa do PT, de nossos dirigentes e militantes, seguir incidindo sobre a elaboração e implantação de políticas públicas em todos os setores, inclusive sobre temas como Segurança Pública e o papel das Forças Armadas, que não devemos tratar como tabus", afirma o texto.

Em conversas reservadas, dirigentes do PT avaliam que o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, atua como um "braço dos militares contra o poder civil" e defendem a mudança do currículo adotado nas escolas de formação de oficiais, considerado "pró-ditadura". A opinião consta de uma texto divulgado como contribuição ao debate do Diretório Nacional por Valter Pomar, da Articulação de Esquerda, e tem o apoio da maior parte da cúpula do PT, que defende a saída de Múcio.

A criação do Ministério da Segurança Pública, área que hoje está subordinado à Justiça, consta do programa de governo de Lula desde 2002. Quando Dino foi escolhido para comandar a Justiça, no entanto, convenceu o presidente eleito de que essa divisão seria ruim porque o ministro perderia força e ficaria como uma espécie de "rainha da Inglaterra", se não pudesse comandar a Polícia Federal.

 

Ø  Briga envolve o valor do fundo eleitoral de 2024: R$ 2,5 bilhões ou R$ 5 bilhões

 

Uma das maiores preocupações dos partidos políticos e parlamentares em relação a 2024 tem nome e sobrenome: fundo eleitoral. O Congresso ainda não decidiu o valor do financiamento das eleições municipais do próximo ano e o aumento do chamado "fundão" pode deixar deputados e senadores com menos emendas para enviar aos seus redutos políticos.

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva propôs um fundo eleitoral de R$ 939,3 milhões para 2024, um valor considerado insuficiente por dirigentes partidários para bancar a eleição de todos os candidatos a prefeito e vereador. O próprio PT, partido de Lula, defende o aumento da verba.

A Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso aprovou, no início de novembro, uma proposta que abre caminho para um "fundão" de R$ 5 bilhões em 2024 (R$ 4,962 bilhões, em valores exatos). Nesta quinta-feira, 7, o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputado Danilo Forte (União-CE), apresentou um parecer estipulando esse valor como o teto máximo do fundo no ano que vem.

Para aumentar o valor, no entanto, os parlamentares precisam tirar a diferença de algum lugar e o dinheiro sairá das emendas de bancada, recursos indicados pelo conjunto de deputados e senadores de cada Estado e do Distrito Federal. São verbas de forte interesse dos parlamentares e dos governadores, pois bancam obras e serviços públicos nos redutos eleitorais dos políticos.

Para cada um centavo de aumento do "fundão" eleitoral, haverá diminuição do mesmo valor das emendas de bancada, que estão somadas em R$ 12,6 bilhões. Os parlamentares estão diante de um impasse: vale a pena aumentar o valor destinado às campanhas eleitorais para beneficiar os candidatos — muitos deles os próprios deputados — e perder recursos de emendas?

O aumento do fundo eleitoral pode tirar dinheiro da educação, da saúde e da construção de estradas, que normalmente são beneficiadas com os recursos das emendas. Um meio-termo proposto no Congresso é aprovar o mesmo valor de 2020, último ano de eleições municipais, com correção da inflação, o que daria aproximadamente R$ 2,5 bilhões.

"A gente tem que aprender a fazer campanha mais barata porque, quando o cobertor é curto, temos que cumprir o papel de alocar nas necessidades", disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), defendendo a proposta de R$ 2,5 bilhões.

O valor de R$ 5 bilhões, pedido pelos partidos, é referente à mesma quantia gasta nas eleições presidenciais de 2022. "Nós temos que preservar essa prática, os países democráticos do mundo têm fundo público para as eleições", afirmou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que representa o governo Lula na Comissão do Orçamento no Congresso, defendo a quantia máxima.

Por enquanto, dirigentes partidários e parlamentares batem cabeça. Quem comanda os partidos e quem é candidato em 2024 defende o aumento do "fundão" porque quer mais dinheiro para pagar cabos eleitorais, gravar programas de TV e imprimir santinhos. Mas quem coordena as bancadas no Congresso e os governadores, que são beneficiados pelas emendas, não querem abrir mão desse recurso no próximo ano, que também acaba beneficiando aliados políticos em período eleitoral.

O impasse só deve ser resolvido na penúltima semana de dezembro, quando deputados e senadores se reunirão para votar o Orçamento de 2024 e definir o valor do fundo eleitoral.

 

Fonte: Agencia Estado/Terra

 

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