Às vésperas de mudanças na equipe de Lula,
PT critica poder do Centrão e 'austericídio' fiscal
A cúpula do PT vai aprovar nesta sexta-feira, 8, uma resolução política
na qual critica a influência "desmedida" do Centrão sobre o governo
Lula e o Legislativo, ataca o chamado "austericídio fiscal" e diz que
temas como segurança pública e papel das Forças Armadas não podem ser tratados
como "tabus". Embora faça uma avaliação positiva do primeiro ano de
governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT prega a alteração, com
urgência, da correlação de forças que domina o cenário político nesse terceiro
mandato.
A proposta de resolução, apresentada pela corrente Construindo um Novo
Brasil (CNB) - majoritária no PT - ainda pode receber emendas e sofrer ajustes
na reunião do Diretório Nacional. O encontro ocorrerá nesta sexta, pouco antes
de Lula, o principal integrante da CNB, abrir a Conferência Eleitoral do
partido.
Com o texto, o PT marca posição no momento em que Lula discute mudanças
nos ministérios. O Centrão selou aliança com o governo em setembro, quando
André Fufuca (PP) substituiu Ana Moser em Esporte e Sílvio Costa Filho
(Republicanos) entrou no lugar de Márcio França (PSB) em Portos e Aeroportos. O
acordo em troca de votos no Congresso foi articulado pelo presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL).
"As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão,
fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime
presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o
Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política
vitoriosa na eleição presidencial", diz a proposta de resolução
apresentada pela tendência CNB e obtida pelo Estadão. "(...) É urgente, no
entanto, nos organizarmos politicamente para alterar esta correlação de forças,
o que só se dará pela conscientização e mobilização daqueles e daquelas que
representamos e defendemos."
Em outro trecho do documento, há alfinetadas na direção do presidente do
Banco Central, Roberto Campos Neto. Ao destacar que o país ainda tem reservas
internacionais de US$ 350 bilhões, o texto do PT diz que não faz sentido, neste
cenário, "a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC,
rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado".
Apesar de não citar a meta de déficit zero estabelecida para as contas
públicas de 2024, a resolução que passará pelo crivo do Diretório Nacional não
deixa dúvidas sobre a discordância em relação à proposta do ministro da
Fazenda, Fernando Haddad.
"O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC
'independente' e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às
necessidades do país", sustenta o documento.
• 'Companheiro Haddad' entra
e sai do texto
A primeira versão do texto da CNB, à qual o Estadão teve acesso, fazia
até um elogio a Haddad. Dizia que "graças à credibilidade de Lula e à
política econômica coordenada pelo companheiro Fernando Haddad, temos inflação
cadente e sob controle, desemprego em queda, rendimento da população em alta e
contas públicas equilibradas".
O início da frase, porém, foi substituído por "Graças à
credibilidade de Lula e apesar do BC de Campos Neto (...)". A última
versão será votada nesta sexta-feira.
A autonomia do Banco Central é ironizada pelos petistas quando o texto
se refere implicitamente à desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB) do
terceiro trimestre.
"O PIB só não foi maior por causa da deletéria política de juros do
Banco Central 'independente'", diz a proposta de resolução. "Indicado
por Jair Bolsonaro e pelo igualmente deletério ex-ministro Paulo Guedes, o
ainda presidente do BC, Roberto Campos Neto, mantém com seus diretores a maior
taxa de juros do planeta, sem que haja nenhuma justificativa plausível para
essa barbaridade."
No diagnóstico do partido, a política de juros "sobrevive como um
prolongamento do governo anterior", sabotando o crescimento da economia.
• Petistas defendem Múcio
fora da Defesa
Ao dar a largada para a pré-campanha de 2024, o PT também assinala que
travará um duro embate com a extrema-direita nas eleições municipais. Afirma
que, a partir dessas disputas, será possível "organizar e consolidar a
base popular necessária para mudar a correlação de forças políticas e mudar o
Brasil".
O documento menciona os atos golpistas de 8 de janeiro e diz que isso
foi a "segunda derrota dos extremistas antidemocráticos", após o
revés nas eleições. "O fato de eles permanecerem mobilizados contra o
país, quase um ano depois, impõe a necessidade de responsabilizar e punir, de
maneira firme e pedagógica, os comandantes políticos do golpismo, civis ou
militares, a começar por Jair Bolsonaro, para que nunca mais voltem a ameaçar a
democracia".
A referência ao ex-presidente, tratado como "um adversário sem
escrúpulos", permeia o texto. Para o PT, Bolsonaro se associou a
"comandantes militares desonrados", com o objetivo de "ameaçar e
contestar" o processo eleitoral.
A certa altura, o partido cita o fato de Lula ter revogado "atos
criminosos de Bolsonaro", que liberavam a venda e a posse de armas. Mais
adiante, diz ser preciso investir em uma "estratégia de comunicação
política" para denunciar fake news.
"É tarefa do PT, de nossos dirigentes e militantes, seguir
incidindo sobre a elaboração e implantação de políticas públicas em todos os
setores, inclusive sobre temas como Segurança Pública e o papel das Forças
Armadas, que não devemos tratar como tabus", afirma o texto.
Em conversas reservadas, dirigentes do PT avaliam que o ministro da
Defesa, José Múcio Monteiro, atua como um "braço dos militares contra o
poder civil" e defendem a mudança do currículo adotado nas escolas de
formação de oficiais, considerado "pró-ditadura". A opinião consta de
uma texto divulgado como contribuição ao debate do Diretório Nacional por
Valter Pomar, da Articulação de Esquerda, e tem o apoio da maior parte da
cúpula do PT, que defende a saída de Múcio.
A criação do Ministério da Segurança Pública, área que hoje está
subordinado à Justiça, consta do programa de governo de Lula desde 2002. Quando
Dino foi escolhido para comandar a Justiça, no entanto, convenceu o presidente
eleito de que essa divisão seria ruim porque o ministro perderia força e
ficaria como uma espécie de "rainha da Inglaterra", se não pudesse
comandar a Polícia Federal.
Ø Briga envolve o valor do fundo eleitoral de
2024: R$ 2,5 bilhões ou R$ 5 bilhões
Uma das maiores preocupações dos partidos políticos e parlamentares em
relação a 2024 tem nome e sobrenome: fundo eleitoral. O Congresso ainda não
decidiu o valor do financiamento das eleições municipais do próximo ano e o
aumento do chamado "fundão" pode deixar deputados e senadores com
menos emendas para enviar aos seus redutos políticos.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva propôs um fundo
eleitoral de R$ 939,3 milhões para 2024, um valor considerado insuficiente por
dirigentes partidários para bancar a eleição de todos os candidatos a prefeito
e vereador. O próprio PT, partido de Lula, defende o aumento da verba.
A Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso aprovou, no início de
novembro, uma proposta que abre caminho para um "fundão" de R$ 5
bilhões em 2024 (R$ 4,962 bilhões, em valores exatos). Nesta quinta-feira, 7, o
relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputado Danilo Forte
(União-CE), apresentou um parecer estipulando esse valor como o teto máximo do
fundo no ano que vem.
Para aumentar o valor, no entanto, os parlamentares precisam tirar a
diferença de algum lugar e o dinheiro sairá das emendas de bancada, recursos
indicados pelo conjunto de deputados e senadores de cada Estado e do Distrito
Federal. São verbas de forte interesse dos parlamentares e dos governadores,
pois bancam obras e serviços públicos nos redutos eleitorais dos políticos.
Para cada um centavo de aumento do "fundão" eleitoral, haverá
diminuição do mesmo valor das emendas de bancada, que estão somadas em R$ 12,6
bilhões. Os parlamentares estão diante de um impasse: vale a pena aumentar o
valor destinado às campanhas eleitorais para beneficiar os candidatos — muitos
deles os próprios deputados — e perder recursos de emendas?
O aumento do fundo eleitoral pode tirar dinheiro da educação, da saúde e
da construção de estradas, que normalmente são beneficiadas com os recursos das
emendas. Um meio-termo proposto no Congresso é aprovar o mesmo valor de 2020,
último ano de eleições municipais, com correção da inflação, o que daria
aproximadamente R$ 2,5 bilhões.
"A gente tem que aprender a fazer campanha mais barata porque,
quando o cobertor é curto, temos que cumprir o papel de alocar nas
necessidades", disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), defendendo a
proposta de R$ 2,5 bilhões.
O valor de R$ 5 bilhões, pedido pelos partidos, é referente à mesma
quantia gasta nas eleições presidenciais de 2022. "Nós temos que preservar
essa prática, os países democráticos do mundo têm fundo público para as
eleições", afirmou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que representa o
governo Lula na Comissão do Orçamento no Congresso, defendo a quantia máxima.
Por enquanto, dirigentes partidários e parlamentares batem cabeça. Quem
comanda os partidos e quem é candidato em 2024 defende o aumento do
"fundão" porque quer mais dinheiro para pagar cabos eleitorais,
gravar programas de TV e imprimir santinhos. Mas quem coordena as bancadas no
Congresso e os governadores, que são beneficiados pelas emendas, não querem
abrir mão desse recurso no próximo ano, que também acaba beneficiando aliados
políticos em período eleitoral.
O impasse só deve ser resolvido na penúltima semana de dezembro, quando
deputados e senadores se reunirão para votar o Orçamento de 2024 e definir o
valor do fundo eleitoral.
Fonte: Agencia Estado/Terra
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