segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Gilberto Maringoni: A Zaninização do governo Lula

OS CINCO PRIMEIROS VOTOS de Cristiano Zanin em sua estreia como ministro do STF  chocaram a esquerda e entusiasmaram a extrema-direita. O espanto no campo progressista não vem do comportamento e das opiniões do rico advogado, que tem o direito de pensar e agir como bem entender. Vem do fato de um tipo assim ter chegado ao Supremo pelas mãos de um presidente tido como progressista.

O ADVOGADO É EXPRESSÃO ACABADA de um conservadorismo-brucutu, apesar de seu jeito refinado, cabelos disciplinados com gel e eterna cara de coroinha fofo. É algo típico da classe média do interior de São Paulo. Sua carreira ganhou súbita turbinada ao ajudar a desmontar a  farsa judiciária contra Lula, no âmbito da Lava-Jato. Ponto.

ZANIN NUNCA FOI JURISTA, nunca se notabilizou por postulados teóricos no âmbito do Direito, por opiniões conhecidas sobre a vida política e social do Brasil ou coisa que o valha. Cristiano Zanin como figura pública existe por ser “o advogado de Lula” e nada mais.

O ILUSTRE CAUSÍDICO poderia seguir adiante em sua exitosa carreira profissional, que ninguém teria nada a ver com sua visão de mundo. O que espanta em Zanin é o fato de ter merecido a estrita confiança do maior líder popular da história do Brasil. Zanin só é Zanin para o grande público porque Zanin é Lula.

ZANIN NÃO FOI ESCOLHIDO POR PRESSÃO DO CENTRÃO, da Faria Lima, das Forças Armadas, da frente governista ou coisa que o valha. Não é um ministro indicado por uma plêiade de partidos fisiológicos para integrar um efêmero ministério. Nomeação para cargo vitalício envolve compromissos de outra natureza. O advogado de Lula ficará na cadeira por 27 anos, a não ser que um cataclismo ocorra no país. Ninguém nomeia ninguém para um posto de tamanho poder e por tanto tempo no âmbito do Estado se não houver comunhão plena de ideias, propósitos e perspectivas.

AVENTAR POSSÍVEIS EQUÍVOCOS na escolha de ministros do STF significa subestimar a capacidade de discernimento de quem ocupa o principal cargo do palácio do Planalto. Não há dedo podre, não há erro: há – por missão ou omissão – a concretização de algum projeto.

O COMPORTAMENTO E OS VOTOS do novo integrante do STF prestam inestimável serviço à percepção das escolhas do atual governo. Zanin levanta véus, desfaz cortinas de fumaça, revela diretrizes e dissolve ilusões. Zanin mostra dureza implacável contra indígenas, contra pobres, contra o avanço de direitos da comunidade LGBTQIA+ e contra algum tipo de política de segurança mais racional. É impossível que quem o indicou não soubesse de quem se tratava.

DE CERTA FORMA, O JEITO ZANIN DE AGIR não se restringe ao personagem, mas multiplica-se pela administração federal. Afinal, o que significa o país se livrar do torniquete de Paulo Guedes na Economia e cair num novo teto de gastos, limpinho e cheiroso, que segue demonizando o investimento público e avaliando que o principal problema do país é um interminável problema fiscal nunca comprovado? O que pensar então de um ministro da Casa Civil que comandou o estado da PM que mais mata pobres no país? Como avaliar um titular da Defesa que passa o pano para generais golpistas e esmera-se como despachante de privilégios fardados? Como encarar uma Secretaria de Comunicação que se desdobra para rechear as organizações Globo de publicidade? Como classificar uma articulação política no Congresso que fecha os olhos para o fato de boa parte da bancada do principal partido da coligação governista conviver com ditames de Artur Lira? Como enxergar um presidente da Petrobrás que segue colocando a satisfação dos acionistas acima de qualquer política de desenvolvimento ao elevar absurdamente os preços dos combustíveis? Como aceitar os discursos pretensamente indignados contra a privatização da Eletrobrás sem que se tome qualquer iniciativa para evitar a venda da Copel, no Paraná? Os exemplos poderiam seguir adiante, num detalhamento mais fino. Mas fiquemos por aqui.

CRISTIANO ZANIN NÃO É ponto fora da curva. O novo ministro presta um favor à opinião pública ao mostrar como funciona a articulação entre palavra e gesto numa gestão que veio supostamente para mudar comportamentos políticos. Há uma espécie de zaninização das principais esferas do governo. Parece até que vivemos tempos normais, como se o bafo do fascismo não representasse ameaça cotidiana à democracia.

A indicação de Zanin ao STF representa algo que o falecido cientista político Wanderley Guilherme dos Santos classificou de abuso de confiança da parte do eleito sobre seus eleitores.

OITO MESES DEPOIS DA POSSE, Lula segue com aprovação popular crescente. Seu governo precisa de apoio decidido, pois não há alternativa visível e viável contra o fascismo. Ao mesmo tempo, sabemos que a atual maré está longe da estabilidade. Não há nenhuma perspectiva – e nem projeto – para um surto de desenvolvimento consistente que retire o país da rota da mediocridade, após quase 13 anos de ininterrupto juste fiscal.

O governo precisa de apoio. E de crítica e pressão também.

 

       Lula queimou a língua. Por Alex Solnik

 

Em março deste ano, o presidente Lula disse à Globonews:

“Hoje, se eu indicasse o Zanin todo mundo compreenderia que ele merecia ser indicado. Tecnicamente ele cresceu de forma extraordinária. É meu amigo, meu companheiro, como outros são meus companheiros”.

Em outra entrevista, também em março, afirmou:

“Eu não vou indicar um ministro por ser meu amigo. Eu não quero indicar  um ministro para fazer coisa para mim. Eu quero indicar um ministro da Suprema Corte que seja uma figura competente do ponto de vista jurídico e que esse cidadão existe lá para que a Constituição da República seja respeitada. É isso”.

No dia 29 de maio, mais uma vez questionado sobre quem escolheria no lugar de Ricardo Lewandowski, respondeu:

 “Isso é uma coisa tão minha que eu não quero repartir com ninguém”.

 No dia 1o. de junho, ao confirmar a indicação de Zanin, Lula declarou:

“Vocês já esperavam que eu ia indicar o Zanin, todo mundo esperava, não só pelo papel que ele teve na minha defesa, mas simplesmente porque ele se transformará em um grande ministro da Suprema Corte. Conheço as qualidades dele como advogado, como chefe de família e a formação de Zanin. Ele será um excepcional ministro se aprovado pelo Senado. E acredito que será. E acho que o Brasil vai se orgulhar de ter o Zanin como ministro da Suprema Corte”.

No dia 13 de julho, voltou ao assunto em entrevista à TV Record:

“Ele não era meu amigo, ele era meu advogado. É uma pessoa extremamente capaz. O Zanin foi escolhido porque o Zanin é um homem do presente e um homem do futuro. Ele é muito estudioso, ele é muito competente, muito dedicado e muito sério. Essas foram as razões pelas quais foi escolhido. E eu acho que ele vai ser um extraordinário ministro da Suprema Corte”.

Essas declarações mostram que Lula teve que justificar várias vezes a indicação de Zanin ao STF. Não me lembro de outra ocasião, em governos anteriores, em que ele teve de defender o seu indicado com tanta ênfase, com tantas unhas e dentes.

Teve de fazer isso porque ninguém conhecia Zanin tão bem quanto ele, ninguém conviveu tanto tempo com ele, ninguém sabia tão bem como ele pensava. É impossível imaginar que numa convivência de muitos anos alguém consiga esconder suas ideias e seus valores a um amigo, advogado e companheiro.

As declarações também mostram que Lula apostou todas as fichas em Zanin. Garantiu que seria “um grande ministro”, que “o Brasil vai se orgulhar dele”, que “é um homem do presente e do futuro”.

Foi uma aposta arriscada. Se sua previsão se confirmasse, Lula ganharia palmas. Mas, se queimasse a língua, levaria a culpa.

A única pessoa que não pode alegar surpresa com os primeiros votos de Zanin é Lula.   

Resta saber se concorda com eles ou não.

 

       Zanin está sendo comparado a bolsonaristas do STF

 

Alvo de ataques de políticos e personalidades de esquerda por causa do voto contrário à descriminalização das drogas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin passou a também ser criticado por outro posicionamento considerado conservador. Ele foi contra uma ação que relata violência da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul contra indígenas da etnia Guarani Kaiowá.

A ação protocolada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pede que o STF determine ao estado medidas de proteção às comunidades indígenas. Alega que a análise dos diversos casos no Mato Grosso do Sul mostra que autoridades locais têm promovido violentas ações de desocupação forçada contra comunidades. “A Polícia Militar de Mato Grosso do Sul tem histórico de atuar sem ordem judicial e sem observar as determinações legais, como verdadeira milícia privada dos fazendeiros da região”, argumenta.

Zanin foi voto vencido. O placar final do julgamento, realizado em plenário virtual, terminou 7 a 4 contra uma decisão do ministro Gilmar Mendes que negou o prosseguimento da ação com a justificativa de que ela não apresentava elementos mínimos.

O influenciador Felipe Neto, que apoiou Lula na eleição do ano passado, comparou Zanin aos ministros André Mendonça e Kássio Nunes Marques, indicados para o STF pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. “É isso aí. O Lula colocou um ministro que pensa igual ao André Mendonça e Kássio Nunes para ficar quase três décadas no STF. Mais um voto abominável que foi derrotado pela maioria. Só ele, Mendonça e Marques votaram contra os indígenas. É inacreditável”, postou no X, ex-Twitter, o influenciador. Gilmar Mendes, que era o relator, também votou contra o recurso para dar prosseguimento à ação junto com Zanin, Mendonça e Nunes Marques.

Eloísa Machado, professora da FGV-Direito que pesquisa o Supremo, também criticou o voto do novo ministro: “Ah, mais uma. Zanin votou pelo não conhecimento de ação sobre violações dos direitos dos povos indígenas Guarani e Kaiowá. Perdeu, mas deixou ali o registro. Com essa, dá pra falar que gabaritou votos contra vulneráveis”, postou.

O voto do primeiro ministro do Supremo escolhido por Lula em seu terceiro mandato no caso acendeu o sinal de alerta para qual posição ele adotará no julgamento do marco temporal das terras indígenas, previsto para ser retomado na quarta-feira. O marco temporal estabelece que os indígenas teriam direito apenas a reivindicar a demarcação de terras que estivessem ocupando na data da promulgação da constituição de 1988. O julgamento foi suspenso por causa de um pedido de vista do ministro André Mendonça. O placar está 2 x 1 pela derrubada do marco temporal.

Zanin já vinha sendo criticado por aliados de Lula por ter votado contra a descriminalização da maconha para uso pessoal e contra a equiparação de ofensas à população LGBTQIA+ ao crime de injúria racial. O descontentamento com as posições do ex-advogado do petista aumentou a pressão para que o presidente escolha um nome progressista para a vaga da ministra Rosa Weber, que vai se aposentar em outubro.

•        Janja reage a meme que compara Zanin a Mendonça: “Tantinho trágico”

A primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, comentou nas redes sociais neste domingo (27/8) sobre um meme que compara o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ao ministro André Mendonça, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Na publicação, a primeira dama diz que “o meme é engraçado mas também tem um tantinho de trágico”. A resposta foi dada a um vídeo que exibe Janja limpando as lentes dos óculos ao ver uma imagem embaçada de Zanin. Após ter limpado as lentes, a imagem que aparece é a do ministro André Mendonça.

Na última semana, Zanin se manifestou contrário às pautas defendidas por Lula. Entre elas, a descriminalização do porte pessoal da maconha e à equiparação da homotransfobia como injúria racial. Desde então, sido alvo da críticas por aliados da base petista e venerado por conservadores.

Esta foi a primeira vez que Janja se manifestou sobre a atuação do novo ministro no STF.

Cristiano Zanin assumiu a vaga deixada por Enrique Ricardo Lewandowski, que se aposentou em abril deste ano.

 

       Insatisfação com Zanin gera pressão por perfil mais progressista na próxima indicação

 

Segundo o blog da Malu Gaspar, do GLOBO, a insatisfação dentro dos grupos dos movimentos sociais e apoiadores de Lula em relação às recentes decisões de Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), nomeado em junho pelo chefe de Estado, provocou uma reação de mobilização por parte da ala progressista, visando exercer pressão no âmbito político a fim de influenciar a nomeação do próximo membro do tribunal e evitar a seleção de um novo perfil considerado “conservador”.

Lula deverá indicar um novo membro para o STF com o objetivo de suceder a ministra Rosa Weber, que se aposentará no final de setembro.

Segundo informações obtidas por assessores próximos a Lula, o foco principal dessas iniciativas é a primeira-dama, Janja, uma ativista feminista que mantém laços com círculos de mulheres e influenciadores.

Existe uma significativa pressão sobre Janja para persuadir Lula a evitar a repetição de erros passados.

Há meses, a primeira-dama tem se empenhado em promover a indicação de uma mulher para a posição, porém até o momento não conseguiu persuadir o presidente a escolher nenhuma das juristas que se candidataram.

Ainda de acordo com aliados, esses indivíduos afirmavam na sexta-feira passada que, apesar das manifestações de descontentamento na ala política progressista, o presidente não tem a intenção de ceder.

Nos últimos dias, algumas das posturas adotadas por Zanin têm gerado consternação no espectro político de esquerda. Dentre essas atitudes, destaca-se o seu voto contrário à equiparação das agressões direcionadas à comunidade LGBTQIA+ com a categoria de injúria racial. Além disso, também chamou a atenção o seu posicionamento contrário à despenalização do uso pessoal da maconha.

Dentro de círculos compostos por juristas, advogados e parlamentares vinculados ao PT, Zanin tem recebido a alcunha de “carinha conservador” e é abordado como um “branco da elite paulista”, sendo descrito como desprovido de empatia e sensibilidade social.

Lula tem insinuado a intenção de nomear a advogada Daniela Teixeira para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), considerando que ela foi incluída na lista de três candidatos formada pelo próprio tribunal, a partir da qual o presidente selecionará um ministro na cota destinada à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Essa decisão tem o propósito de demonstrar que ele não possui objeções em relação à presença de mulheres nos níveis mais elevados do sistema judiciário.

Contudo, essa dinâmica difere quando se trata do STF. Um dos motivos citados por seus apoiadores para justificar a não escolha de uma mulher é que o presidente não possui vínculos pessoais com nenhuma das candidatas em disputa para essa posição.

As postulantes mais proeminentes incluem a desembargadora do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) Simone Schreiber, a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Regina Helena Costa, a promotora do Pará Ana Claudia Pinho, bem como as advogadas Dora Cavalcanti e Flávia Rahal.

No entanto, nenhuma dessas candidatas mantém vínculo pessoal ou a confiança direta de Lula, o que tem sido interpretado como um fator decisivo pelos assessores próximos a ele no Palácio do Planalto.

“Nenhuma delas conseguiu construir essa proximidade nos últimos tempos, e Lula não vai escolher alguém com quem tenha cerimônia”, informa um amigo ao jornal.

No caso de Zanin, a proximidade desempenhou um papel crucial. A circunstância de ser o advogado pessoal de Lula foi o critério primordial de seleção, uma vez que o presidente reiterou aos seus colaboradores desde o início que não tinha a intenção de reiterar no atual mandato o que ele percebia como falhas de administrações anteriores.

Um dos equívocos apontados seria precisamente a seleção de candidatos que simbolizassem movimentos ou questões, mas que não compartilhassem um compromisso direto com Lula.

Apesar de ocasionalmente ressurgir em discussões internas do governo a noção de que Lula poderia estar mais receptivo e inclinado a indicar uma mulher, na verdade, o que de fato prevalece é a determinação do presidente de ter um ministro que esteja unicamente alinhado a ele e a mais ninguém. E, de acordo com esse critério, nenhuma mulher se encaixa.

 

Fonte: Fórum/O Globo/Metrópoles/O Cafezinho

 

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