quinta-feira, 25 de abril de 2024

Desafio do bolsonarismo e o papel da esquerda

O bolsonarismo realizou um novo ato público neste domingo (21), em Copacabana, no qual houve uma quase repetição das falas e do conteúdo mostrado em outro evento, o da Paulista, em 25 de fevereiro. Mas também chamou atenção, desta vez, uma atenção mais pronunciada para as eleições municipais.

Não que o assunto tenha passado batido no ato da Paulista. Na ocasião, Michelle Bolsonaro buscou legitimar a união entre religião e política e seu marido falou que “[em] 2024 temos eleições municipais. Vamos caprichar no voto, em especial, para vereadores.” Ali a fala do ex-presidente evidenciava uma das prioridades táticas da extrema direita e do campo conservador: eleger o máximo possível de candidatos à Câmara Municipal neste ano.

O objetivo, por meio da eleição de vereadores, é fazer das Câmaras municipais um lugar para ecoar as mensagens de cunho moralista que agradam suas bases e preparar um salto para 2026. Daqui a dois anos, além das eleições para as assembleias estaduais e Câmara dos Deputados, haverá duas vagas para o Senado na disputa de cada estado. E é nesta casa que o bolsonarismo sonha com uma ampliação da sua presença, até para possibilitar a instauração de eventuais processos de impeachment para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Uma mostra dessa disposição foi um fato incomum para um evento realizado no Rio de Janeiro: uma pré-candidata a vereadora de São Paulo ter sido apresentada por Bolsonaro. A cubana Zoe Martínez, ex-comentarista da rádio Jovem Pan, é tida como possível puxadora de votos para o PL chegar a uma bancada de dez vereadores na capital paulista, meta ousada que tornaria a legenda possivelmente a maior bancada da casa.

Mas além disso, o ato do Rio deu a vez aos pré-candidatos a prefeito. Sete deles puderam associar diretamente sua imagem à de Bolsonaro, em um ambiente festivo, que será explorado nos próximos dias nas redes sociais do segmento. Alguns, como Alexandre Ramagem (PL-RJ), Bruno Engler (PL-MG), Gustavo Gayer (PL-GO) e Éder Mauro (PL-PA), são parlamentares que, mesmo se forem derrotados no processo eleitoral, voltam a seus mandatos de deputado federal com mais projeção e já despontariam como possíveis candidatos a cargos maiores (no próprio Senado, por exemplo) em 2026.

  • 2024 não é 2020

A mobilização foi menor do que se esperava, com pico de aproximadamente 33 mil pessoas, segundo grupo de estudos da USP que estimou a presença de 185 mil na Paulista em fevereiro. Ainda assim, é importante não cometer o erro de subestimar a capacidade de mobilização do extremismo brasileiro. Atos presenciais criam um vínculo mais forte e ajudam a impulsionar as ações no meio digital.

Foi uma manifestação política com um forte viés eleitoral, pelos pré-candidatos que estavam ali e pelo reforço das pautas que são caras ao bolsonarismo. Isso mostra um cuidado e uma organização em relação às eleições municipais que não houve em 2020. À época, Bolsonaro se via com a popularidade em xeque por conta da condução do combate à pandemia e manifestações e reuniões públicas – um ativo do grupo desde que a direita deu as caras nas ruas – não eram possíveis. Isso fez com que o resultado nas urnas não correspondesse ao sucesso de 2018. Agora, a história pode ser outra.

Não só existe uma atenção maior ao pleito como os temas cultivados pelo bolsonarismo têm encontrado ressonância e destaque no Legislativo, em especial na Câmara dos Deputados onde a hostilidade do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), em relação ao governo Lula abre espaço para que tais parlamentares ganhem voz.

A tradição política aponta que as eleições municipais têm um caráter distinto das gerais. Nelas, em condições normais, os problemas do dia a dia, de interesse local, têm uma influência muito maior do que os vieses ideológicos poderiam indicar. As conexões com lideranças de bairro também contam muito na escolha de um candidato. Mas o Brasil viu nos últimos anos um movimento grande de “invasão” de pautas de cunho moralista, muitas imaginárias como a questão da “ideologia de gênero” nas escolas, ganharem corpo. E são questões que podem passar a ter importância local.

Além disso, como Michelle Bolsonaro fez questão de mostrar em seus dois discursos na Paulista e em Copacabana, denominações neoptencostais terão ainda menos pudores para tentar vincular voto e religião.

  • E a esquerda?

Se em 2022 foi possível (e necessária) uma frente ampla para derrotar o bolsonarismo, que não economizou meios e recursos para vencer as eleições presidenciais, já se sabia que a repetição disso nas eleições municipais seria impossível. O conflito de interesses locais divide alguns partidos internamente e entre legendas distintas isso se torna ainda mais relevante.

Do outro lado, como os atos bolsonaristas mostram, existe uma concertação em torno de nomes e de pautas que mobilizam o segmento. Já a esquerda, além de contar com poucas articulações em nível local que sejam suprapartidárias (como ocorre em São Paulo, por exemplo), tem hoje dificuldades em unificar bandeiras que agreguem e tenham poder de estimular a participação.

Em seus primórdios, uma estratégia do PT para marcar território e ganhar projeção como partido era lançar candidaturas em todas as capitais, mesmo sem chances de vitória, estratégia que foi reproduzida em parte pelo PSOL em sua origem. Isso reforçou a identidade da legenda e criou uma marca, projetando nomes que, mesmo derrotados, lançaram-se em voos mais altos adiante.

Hoje o contexto é diferente, o PT tem o governo federal e uma relação complicada com o Legislativo nacional. Parece às vezes sem rumo. Além disso, a amplitude ideológica das alianças dá as caras em parte das disputas pelas prefeituras – o que amarra, nestes casos, a atuação da legenda. Mas isso não precisa levar os partidos de esquerda a se apresentarem sem horizonte político, como se coubesse aos prefeitos, em meio à crise civilizatória, apenas administrar burocraticamente a máquina dos municípios. É possível apresentar visões nítidas sobre as mudanças necessárias no espaço urbano e no país. Mesmo em cenários nos quais os candidatos não são favoritos (e talvez principalmente aí), vale pautar temas caros à esquerda, ainda que enfrentem barreiras do ponto de vista eleitoral, mas que possam dar norte à militância e impulsionar a eleição de vereadores. E, assim como faz o bolsonarismo, a esquerda deveria dar dimensão nacional ao debate destes temas.

Desde 2022 a extrema direita consegue ter o poder de agenda pública mesmo sem estar no poder federal. Não fazer o enfrentamento é cavar um buraco que vai erodir nas eleições de 2026. É possível fazer esse embate de forma estratégica, de acordo com o lugar e o cenário. Mas é preciso articular diferentes forças do campo e planejar. Os extremistas já colocaram seu bloco na rua.

 

Ø  “Governo Lula é de centro-direita”, diz José Dirceu: “Exigência do momento”

 

O ex-deputado federal José Dirceu, que presidiu o Partido dos Trabalhadores (PT) entre 1995 e 2002, declarou que o governo atual de Lula é de centro-direita, atribuindo essa classificação à presença de partidos dessa orientação na base de apoio. Dirceu mencionou Republicanos, Progressistas e parte do PL como apoiadores do presidente.

“Não vou poder defender o ministro Fernando Haddad. Todos sabem que eu estou na linha de frente da defesa dele, mas eu queria dizer que o Lula, não só foi eleito nessas condições, como montou um governo que não é de centro-esquerda não”, iniciou Dirceu durante o “Brasil Hoje 2024”, evento organizado pela Esfera Brasil na Zona Sul de São Paulo.

“Lula montou um governo de centro-direita. Falo isso, e ficam indignados no PT. Mas é exigência do momento histórico e político que vivemos”, explicou. “O PP e o PL, de certa forma, estão na base do governo”, afirmou.

Mais tarde, a assessoria do petista divulgou nota afirmando que, apesar da declaração, Dirceu considera o terceiro mandato de Lula como “um governo de centro-esquerda, apoiado por partidos de direita”.

Afirmou ainda que a fala se deu sob o contexto da polarização política, entendendo que a atual administração “se pauta pelo diálogo, com o ingresso de partidos como PP e Republicanos”. A assessoria concluiu dizendo que o político já havia externado essa avaliação em entrevistas à imprensa.

Durante sua fala ao público, o ex-presidente do PT também criticou o que chamou de “fundamentalismo religioso com ataque à democracia” presente no bolsonarismo.

Segundo Dirceu, a movimentação de Bolsonaro pelo país nos últimos meses e a presença de pré-candidatos em várias cidades indicam que o ex-presidente está em campanha eleitoral. O petista elogiou as medidas contra Bolsonaro adotadas pelo STF e outras instâncias.

Sobre sua própria candidatura em 2026, Dirceu não a descartou, afirmando que decidirá sobre o assunto no segundo semestre de 2025. Ele lamentou seu afastamento da Câmara dos Deputados em 2005 e suas prisões em 2015 e 2018, no contexto das denúncias do mensalão e da Lava Jato, respectivamente.

O seminário, que reuniu lideranças políticas e econômicas, contou com a presença de Dirceu, Aldo Rebelo (PDT), Juliano Medeiros (PSOL) e Felipe Carreras (PSB). O debate, intitulado “Unindo ideias, moldando futuros”, promoveu discussões sobre os rumos do país e suas perspectivas.

¨      Dirceu esclarece declaração em que afirma ser o governo Lula de "centro-direita"

A assessoria de imprensa de José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil e quadro histórico do Partido dos Trabalhadores (PT), divulgou uma nota, nesta segunda-feira (22), em que presta esclarecimentos sobre uma declaração que gerou controvérsia durante "Brasil Hoje – Diálogos para pensar o país de agora”, realizado pela Esfera Brasil em São Paulo (SP). 

Ao responder a um questionamento feito pelo advogado Luiz Gustavo Bichara, que mediou a mesa de debate, sobre o campo político com o qual dialoga o governo Lula, Dirceu afirmou que o atual presidente da República montou uma administração de "centro-direita".

"Quando eu falo isso, todo mundo fica indignado dentro do PT. Porque, realmente, parte do PL e do PP de certa forma estão na base do governo. Essa é a exigência do momento histórico e político que vivemos", havia declarado o ex-ministro. 

Horas depois, entretanto, a assessoria de imprensa de Dirceu afirmou que o petista, na verdade, considera o governo Lula como de "centro-esquerda" no campo político. 

"A assessoria de imprensa do ex-ministro José Dirceu (PT) esclarece que ele avalia o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como 'um governo de centro-esquerda, apoiado por partidos de direita', e não um governo de centro-direita, como acabou afirmando durante o Seminário Brasil Hoje, promovido pela Esfera Brasil.  Sua fala se deu no contexto de análise da atual polarização política, reforçando a ideia de que o governo se pauta pelo diálogo, com o ingresso de partidos como PP e Republicanos - 'uma exigência do momento histórico em que vivemos'", diz o comunicado. 

"A ideia de um governo de centro-esquerda, apoiado por forças de direita para consolidar uma maioria no Congresso e conquistar uma base social mais ampla, já foi externada inclusive em entrevistas do ex-ministro à imprensa", prossegue. 

  • Zé Dirceu de volta ao Congresso 

Em entrevista ao programa Fórum Onze e Meia no dia 20 de março, o jurista Kakay deu detalhes sobre a recente festa de aniversário do ex-ministro-chefe da Casa Civil Zé Dirceu (PT) e afirmou que ele deve ser candidato à deputado federal.

Vítima de perseguição judicial nos casos do Mensalão e da Lava Jato, o político petista teria confirmado sua intenção de candidatar-se como deputado federal nas próximas eleições de 2024.

Dirceu é uma figura histórica do PT, e, apesar da persecução midiática, ainda goza de respeito e admiração por grande parte da militância do partido.

Em 2002, Dirceu obteve mais de 556.563 votos para seu mandato como deputado federal. Segundo Kakay, que é amigo próximo de Dirceu há décadas, ele está voltando ao cenário político.

Contando sobre o evento de aniversário do petista, ocorrido no último dia 16, Kakay relatou: "O Silvio Costa provocou assim, você tem que ser candidato para ter 500 mil votos. E ele simplesmente aceitou, entendeu? Então, acho que foi muito importante, importante para ele, importante para o PT, importante para o trabalho que ele faz", disse.

Questionado por Renato Rovai se de fato Dirceu será candidato, o jurista respondeu: "Eu acredito que sim, eu acredito que sim. Eu acho que se tudo estiver dentro da normalidade, para ele é importante. Aos 78 anos de idade, voltar da Câmara depois de tudo que ele passou com o Zé, ele sintetizava o que era de bom no PT", afirmou.

 

Fonte: Por Glauco Faria, em Outras Palavras/DCM

 

 

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