quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Doação de óvulos: como funciona procedimento no Brasil e quem pode fazer

Aline Caires, de 28 anos, diz que já perdeu as contas de quantas doações de óvulos realizou.

Ela conta que passa pelo procedimento a cada três meses e só deu uma pausa durante a pandemia de covid-19.

"Inclusive estou me preparando para mais uma doação e, nos próximos dias, farei a coleta", conta.

A criadora de conteúdo diz que começou a fazer isso há cinco anos e que soube do procedimento por meio da irmã, que também é doadora.

Em um relacionamento com outra mulher há dois anos, a moradora de São Paulo afirma que ainda não tem vontade de ser mãe, mas que sabe que, se quiser ter um filho, terá de recorrer à reprodução assistida.

"Eu me sinto com o coração quentinho e abraçado por poder de alguma forma ajudar mulheres a realizarem o sonho da maternidade", diz.

Para fazer a doação, Aline recebe respaldo de uma clínica de fertilização assistida, como a medicação usada, ajuda de custo para o transporte e alimentação no dia da doação.

O pagamento pela doação de óvulos é proibido no Brasil.

O processo para a doação, conta Aline, começa 15 dias antes da doação.

Nesse período, ela faz a aplicação de injeções de hormônios para estimular a produção de óvulos e, na hora de fazer o procedimento, na clínica, é necessária sedação.

"Após a coleta, eu preciso ficar de repouso por algumas horas na própria clínica", explica.

Atividades físicas mais pesadas e intensas também são proibidas por cerca de uma semana após o procedimento.

Aline compartilha sua rotina como doadora de óvulos nas redes sociais, onde tem mais de 347 mil seguidores.

Ela conta que recebe muitas dúvidas sobre o procedimento e sobre a prática de ser doadora. Tudo é respondido com bom humor por ela.

"Muita gente pergunta se não fico com a sensação de que os óvulos são meus filhos", diz.

"Mas, não. Porque são apenas óvulos, não passa disso e com isso não consigo ter afeto algum para considerar filho."

·        Como funciona a doação de óvulos no Brasil

A ovodoação, ou doação de óvulos, é regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) pela resolução 2.320 de 2022.

A doação deve ser sempre voluntária e não pode envolver pagamento, ou seja, ela não pode ter caráter lucrativo ou comercial.

Ela pode ser direta entre parentes de até quarto grau (pais, filhos, avós, irmãos, tios e primos) ou anônima.

Quando a doação é anônima, a doadora não sabe para quem serão destinados os óvulos e não tem contato com a mulher que vai receber o material.

A idade mínima para ser uma doadora é de 18 anos e máxima é de 37 anos.

Essa idade é colocada como limite porque a partir dela as taxas de fertilidade começam a diminuir consideravelmente na mulher e qualidade dos óvulos também é afetada, aumentando as chances de mutações genéticas.

Após coletados os óvulos, as doadoras não têm mais controle sobre eles.

Segundo o CFM, em situações específicas, por motivação de saúde, podem ser fornecidas exclusivamente aos médicos informações sobre as doadoras.

A quantidade de óvulos que uma mulher pode doar depende do número de habitantes da cidade em que a doação é feita.

A regra busca evitar que uma doadora tenha produzido mais de dois nascimentos de crianças de sexos diferentes em uma área de 1 milhão de habitantes.

"A exceção é quando uma mesma família receptora escolher uma mesma doadora que pode, então, contribuir com quantas gestações forem desejadas", explica João Dias, que atende no setor de medicina reprodutiva do Hospital Israelita Albert Eistein e é chefe da Originare, clínica de reprodução assistida.

·        Como ser doadora

A mulher que deseja ser uma doadora voluntária de óvulos precisa procurar uma clínica especializada em reprodução assistida ou hospitais que fazem tratamentos com óvulos doados.

Para passar pelo procedimento, a doadora faz diversos exames de saúde para descartar infecções, problemas ginecológicos ou genéticos.

Também é feita uma investigação do histórico médico familiar.

Além disso, a doadora não pode ter doenças como diabetes e hipertensão, já que essas comorbidades podem ter alguma predisposição genética.

Se estiver apta, a doadora precisa se preparar para a coleta e usar, por um período de 10 a 14 dias, injeções que estimulam a produção dos óvulos.

Nesse intervalo, cinco ultrassons são realizados para acompanhar o processo.

A coleta é feita com dia marcado. A mulher precisa ir até a clínica, e, sob efeito de sedação, os óvulos são coletados.

"Os óvulos podem ficar congelados por tempo indeterminado, não há um prazo de validade", explica Paula Marin, ginecologista colaboradora do Centro de Reprodução Humana do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) e sócia fundadora da Clínica Venvitre Reprodução Assistida.

"Temos gestação de óvulos congelados há mais de uma década, e esse tempo só tende a aumentar, uma vez que o congelamento de óvulos é uma técnica relativamente recente, que foi melhorando ao longo dos anos."

·        Doação pode reduzir custos da fertilização in vitro

A doação de óvulos não pode ter caráter comercial, mas o CFM autoriza que seja feita uma redução de custos de tratamentos reprodutivos para as mulheres que são doadoras e precisarão passar por uma fertilização in vitro.

Nestes caso, em específico, a doação precisa ser compartilhada.

Ou seja, uma mulher que precisa fazer uma fertilização in vitro para ter filhos pode doar alguns de seus óvulos para outra mulher que vai passar pelo mesmo procedimento e não tem óvulos próprios.

A receptora, que recebe os óvulos doados, arca com parte dos custos do tratamento da doadora, que tem assim seu tratamento financeiramente viabilizado, explica Marin.

"As duas partes saem ganhando. De forma geral, pode-se obter desconto de cerca de 40% no valor da feritlização in vitro até abatimento quase total do valor do seu tratamento", diz a ginecologista.

O procedimento de fertilização in vitro custa, em média, R$ 24 mil reais, incluindo as medicações e a primeira anuidade do congelamento, segundo o Sistema Nacional de Produção de Embriões.

O valor da manutenção do congelamento de óvulos e embriões é de R$ 1 mil a R$ 2 mil por ano.

Os procedimentos de fertilização in vitro dobraram no Brasil na última década, segundo os dados do relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio).

Somente em 2022 foram realizados mais de 42 mil ciclos de fertilização, o que representa um aumento de 100% em comparação a 2012, quando foram realizados pouco mais de 21 mil procedimentos.

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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