terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Ato pró-Bolsonaro: ex-presidente usa imagens para se contrapor a números, diz pesquisador

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) usa imagens de multidões de apoiadores para tentar contradizer resultados da eleição ou de institutos de pesquisa, diz o professor de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP) Pablo Ortellado.

Durante ato em São Paulo no domingo (25/2), Bolsonaro disse: "Essa fotografia vai rodar o mundo, tenho certeza disso".

Depois, compartilhou em rede social imagens aéreas de seus apoiadores, vestidos principalmente de amarelo, na avenida Paulista.

"Bolsonaro usa as imagens de multidão para se contrapor aos números — seja da eleição, seja dos institutos de pesquisa —, porque a tese dele é de que as eleições foram fraudadas, e ele não tem evidência nenhuma de fraude", diz Ortellado à BBC News Brasil.

"A evidência que ele tem é o que ele chama de 'Datapovo', falando 'eu levo multidões para as ruas'. Ele leva multidões às ruas, só que essas multidões não são numerosas o suficiente para contradizer os números das urnas ou os números levantados pelos institutos de pesquisas de opinião sobre voto", afirma.

"Por exemplo, 185 mil pessoas (presentes no domingo), ainda que fossem todas da Grande São Paulo, não dá 2% dos eleitores (a cidade de São Paulo tem mais de 9,3 milhões de eleitores). Não prova que ele teria vencido as eleições."

O Monitor do Debate Político Digital da USP, grupo de pesquisa que Ortellado coordena, apontou a presença de 185 mil pessoas em ato na Avenida Paulista.

O levantamento foi feito com imagens aéreas do local, analisadas por meio de um programa que identifica cabeças e estima a quantidade de pessoas. A margem de erro é de 12% para mais ou para menos.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo diz que estimou público de "aproximadamente" 600 mil pessoas na Avenida Paulista e 750 mil pessoas "quando levado em conta o público presente nas ruas adjacentes".

O protesto convocado por Bolsonaro reuniu políticos e milhares de manifestantes em meio ao avanço das investigações da Polícia Federal sobre um suposto plano de golpe de Estado depois da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Como comparação, a mesma metodologia utilizada pelo grupo de pesquisa da USP apontou a presença de 5,6 mil pessoas em ato contra indicação de Flávio Dino ao STF, em dezembro de 2023.

No ato de 7 de setembro de 2022, na Praia de Copacabana, no Rio, foram 64,6 mil pessoas.

Ortellado considera que "serviu de mobilização" para o ato mais recente o fato de apoiadores do ex-presidente estarem "se sentindo perseguidos politicamente", além de a manifestação ter sido convocada pelo próprio Bolsonaro — e não apenas por apoiadores dele, como ocorreu em outros eventos.

Outro fator que explica o nível de presença no domingo, segundo Ortellado, é que o ato foi concentrado na cidade de São Paulo — em vez de ocorrer em diversas cidades ao mesmo tempo.

Play video, "Protesto de Bolsonaro na avenida Paulista: manifestantes citam suas motivações", Duration 11,18

·        'Custo político'

Para Ortellado, "o objetivo dessa manifestação é aumentar o custo político da prisão" de Bolsonaro.

O professor da USP considera que "essa manifestação é bastante análoga ao ato que o presidente Lula convocou em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo (SP), no ABC, um pouco antes da prisão" em 2018.

Ortellado ressalva que "guardadas todas as diferenças de contexto e das acusações, acho que elas tiveram o mesmo propósito político".

"Tem custo político a justiça decretar a prisão de um presidente muito popular, mobiliza muita gente. E do mesmo jeito que o Lula fez aquela foto, o Bolsonaro fez a foto dele — com várias diferenças de contexto, do que significava a prisão do Lula."

No início de fevereiro, o ex-presidente Bolsonaro — além de militares de alta patente, ex-ministros e ex-assessores do governo dele — foram alvo de operação da Polícia Federal que investiga "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito" nos períodos que antecederam e se seguiram às eleições presidenciais de 2022, em uma tentativa de garantir a "manutenção do então presidente da República (Jair Bolsonaro) no poder".

No domingo, do alto de um trio elétrico, Bolsonaro negou que tenha havido uma tentativa de golpe de Estado e defendeu que agiu dentro dos limites da Constituição.

"Continuam me acusando de um golpe, porque tem uma minuta de um decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha santa paciência", disse Bolsonaro em seu discurso, que durou 22 minutos.

De acordo com investigações da PF, Bolsonaro teria se envolvido na confecção de uma minuta de decreto com medidas que impediriam a posse de Lula para mantê-lo no poder.

 

Ø  Ataque de Malafaia ao STF incomoda aliados moderados de Bolsonaro, dizem fontes

 

Os ataques do pastor evangélico Silas Malafaia ao Supremo Tribunal Federal (STF) desagradaram os aliados mais moderados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

“É preciso deixar claro, bem claro, absolutamente claro, que o povo foi à Paulista para ver e ouvir o presidente Bolsonaro. Qualquer outra palavra na grande festa da democracia que não seja dele, são palavras, mas não dele. Bolsonaro só um”, escreveu nas redes sociais o senador Ciro Nogueira (PP-PI).

Ex-ministro de Bolsonaro e atual presidente do PP, Nogueira não se refere diretamente a Malafaia, mas, conforme apurou a CNN, o recado era para ele. A avaliação desse entorno moderado é que a fala de Malafaia foi desnecessária e fora de contexto.

De todos os que discursaram, Malafaia foi o único que atacou o STF. Ele acusou, por exemplo, o ministro Alexandre de Moraes de “esconder” vídeos do 8/1 que supostamente demonstrariam que o governo Lula sabia dos ataques.

Vídeos do evento na Paulista também mostram o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos), incomodado durante a fala de Malafaia, conversando com Bolsonaro. Em sua intervenção, Tarcisio afirmou que a manifestação era “a favor do Estado Democrático de Direito”.

Procurado pela CNN, Malafaia afirmou que “protegeu” o STF no início da sua fala e que só citou “fatos”.

“Só frouxo para não gostar do que eu falei. Eu não ataquei o STF, só falei fatos. Qual foi a acusação mentirosa que eu fiz? Conversa!”, afirmou o pastor.

O ato foi convocado após Bolsonaro se tornar alvo das investigações da Polícia Federal por uma suposta trama de golpe de Estado.

 

Ø  Para fontes do governo, investigações da PF não perdem força após ato pró-Bolsonaro

 

Auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avaliam que o ato na Paulista não deve tirar forças das investigações da Polícia Federal (PF) sobre a suposta tentativa de golpe de Estado.

Eles reconhecem que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) mostrou sua capacidade de mobilização política, mas reforçam que a PF já mostrou ter evidências da existência de uma trama golpista.

Fontes no Judiciário afirmam que as suspeitas sobre Bolsonaro evoluíram de apenas uma “imputação ideológica”, que inspirasse o 8/1, para um “envolvimento material” depois do surgimento da minuta do golpe, de reuniões com os chefes militares e da de mensagens de auxiliares.

Também existe uma avaliação no Planalto de que falta ao movimento do ato propostas concretas ao país, e que o único interesse é defender Bolsonaro.

 

Ø  Flávio Bolsonaro revela que manifestação foi feita para livrar seu pai da cadeia

 

O ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou neste domingo ser vítima de "abuso da parte de alguns" e rejeitou envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado, ao discursar para multidão de apoiadores em um ato que lotou a Avenida Paulista e foi apontado por ele como uma "fotografia para o mundo" em sua defesa.

Em fala de cerca de 25 minutos a milhares de apoiadores, Bolsonaro negou participação na suposta trama golpista sob investigação do Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Polícia Federal, alegando que a derrubada de um governo se faz com tanques e armas e que não se toma esse tipo de atitude extrema usando a Constituição – que ele alega jamais ter descumprido.

"O que é golpe? É tanque na rua, é arma, é conspiração, é trazer classes empresariais para seu lado, nada disso foi feito no Brasil. Nada disso eu fiz, e continuam me acusando por golpe", disse.

"Golpe usando a Constituição? Deixo claro que Estado de Sítio começa com o presidente da República convocando os Conselhos da República e da Defesa. Apesar de não ser golpe o Estado de Sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da república e da defesa", emendou ele, usando uma argumentação legalista.

A PF investiga Bolsonaro por supostamente articular, mesmo antes de perder a disputa presidencial em 2022, medidas para impedir a posse do eleito Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo ou derrubá-lo do poder posteriormente, com os ataques às sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro.

Em seu discurso, Bolsonaro disse que "sempre" foi perseguido mesmo antes de chegar à Presidência e, embora não tenha citado o STF, afirmou que não tem havido respeito ao Estado Democrático de Direito.

"É lamentável o que vem acontecendo o abuso por parte de alguns que traz insegurança para todos nós", disse.

Bolsonaro aproveitou a fala para exaltar sua passagem pela Presidência, em busca de demonstrar força política em meio ao avanço das investigações contra ele.

"Estou muito orgulhoso e grato por terem aceito esse convite. Para termos uma fotografia para o Brasil e para o mundo, do que é garra, a determinação do povo brasileiro", disse.

"Mostramos, com essa fotografia, que nós até podemos ver um time de futebol sem torcida ser campeão, mas não conseguimos entender como existe um presidente sem o povo ao seu lado."

Antes dele, o organizador do evento, o pastor Silas Malafaia, criticou o ministro do STF Alexandre de Moraes, responsável pelas principais investigações contra o ex-presidente, e disse que há em curso uma "engenharia do mal" para prender Bolsonaro.

"Se eles te prenderem, não vai ser para a sua destruição, será para a destruição deles", disse Malafaia, chamando o ex-presidente de o maior perseguido político da história brasileira.

TARCÍSIO DE SURPRESA

Outra surpresa no evento foi o discurso do governador paulista e ex-ministro de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (Republicanos), em desagravo ao ex-presidente. Bolsonaro hospedou-se no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo estadual, antes de participar do ato.

"Você não é mais uma pessoa, um CPF, você representa um movimento", disse ele, que não estava previsto para falar.

Com Bolsonaro inelegível até 2030, Tarcísio é apontado como um potencial candidato à sucessão em 2026, assim como a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que fez um discurso em defesa do marido com forte tom religioso.

ANISTIA

À multidão que lotou a Paulista, Bolsonaro disse que quer buscar a pacificação, passar uma "borracha no passado" para buscar uma maneira para viver em paz. Ele defendeu a concessão de uma anistia pelo Congresso Nacional a quem chamou de "pobres coitados" que estão presos por envolvimento nos ataques do 8 de janeiro e considerou exageradas as punições aos já condenados pelos atos.

O Supremo já condenou 86 pessoas pelos ataques por crimes como golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, com penas que chegaram a 17 anos de prisão.

"Quem por ventura depredou patrimônio e nós não concordamos com isso, que pague, mas essas penas fogem ao mínimo da razoabilidade", queixou-se.

Embora tenha defendido a anistia a outros, Bolsonaro, também poderia eventualmente se beneficiar de um projeto de lei de anistia aprovado pelo Congresso. Parlamentares bolsonaristas já chegaram a apresentar uma proposta nesse sentido em favor dele.

 

Fonte: BBC News Brasil/CNN Brasil/Brasil 247

 

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