quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

Por que Milei fará demissão em massa de funcionários públicos na Argentina

O novo presidente argentino, Javier Milei, publicou na madrugada desta terça-feira (26/12) um decreto que proíbe a renovação dos contratos de servidores públicos contratados há menos de um ano.

Na prática, isso levará à demissão de milhares de funcionários públicos cujos contratos vencem em dezembro.

O número total de trabalhadores e serviços atingidos não foi divulgado pela Casa Rosada, mas os jornais argentinos Clarín e La Nation estimam cerca de 7 mil demissões, com base em fontes do governo.

Além disso, outros 45 mil funcionários públicos contratados há mais tempo foram colocados sob "observação" por 90 dias — o que significa que poderão ser demitidos ao final desse período.

A medida já havia sido anunciada pelo ministro da Economia, Luis Caputo, e faz parte de um grande pacote de medidas que ficou conhecido como "decretaço".

O pacote prevê uma série de mudanças radicais e polêmicas em diversos setores da economia da Argentina.

Segundo o governo, o objetivo das medidas (incluindo as demissões) é enxugar a máquina estatal e reduzir o déficit fiscal.

Ainda conforme o governo, as mudanças eliminarão burocracias e obstáculos que dificultam a vida dos argentinos e ajudarão a impulsionar setores econômicos atualmente negligenciados, modernizando o Estado.

Para os críticos, no entanto, a desregulamentação da economia beneficiará os empresários e deixará os argentinos comuns desamparados – num momento em que cerca de 50% da população do país vive na pobreza.

O governo não divulgou quais faixas salariais serão mais atingidas, nem quanto espera economizar com as demissões.

Também não há detalhes sobre a auditoria que será feita, segundo informações do governo à imprensa argentina, para avaliar a manutenção ou demissão dos 45 mil servidores "sob observação" por 90 dias.

A Argentina tem hoje cerca de 338 mil servidores na administração federal, segundo o Indec (instituto de estatística argentino, equivalente ao IBGE).

As demissões vão afetar funcionários do Poder Executivo, de empresas públicas ou de maioria estatal e de entidades governamentais autônomas — que incluem agências reguladoras e administrações de hospitais e institutos de pesquisa.

Trabalhadores que cumpram as cotas de pessoas trans e com deficiência não estão incluídos na medida.

Pelo que prevê o decreto, as demissões acontecerão em massa, ou seja, sem uma análise individual dos casos.

Não está claro como a medida vai afetar o funcionamento dos serviços públicos atingidos, mas o governo diz que é possível que os responsáveis por cada área peçam exceções para manter contratações e justifiquem o pedido.

Essa é a segunda medida do novo governo no que diz respeito aos funcionários públicos – a primeira foi a determinação de trabalho presencial para todo o serviço público.

O governo diz que pretende tomar medidas envolvendo o "alto escalão" do funcionalismo, que incluiriam congelamento de salários e reduções de até 15% dos vencimentos. Não há previsão de cortes de cargos para esse grupo, nem de quando o decreto será publicado.

·        Protestos e briga judicial

Não há garantia de quais mudanças promovidas por Milei se tornarão permanentes.

Há uma ação na Justiça argentina que questiona a legalidade do "decretaço" e o Congresso argentino já deu sinais de que pode barrar algumas das medidas.

As mudanças foram feitas por Milei através de um instrumento legal chamado Decreto de Necessidade e Urgência (DNU).

De acordo com a Constituição, o DNU só pode ser utilizado em "circunstâncias excepcionais" em que o Congresso não consiga seguir os "procedimentos ordinários" para a promulgação de leis.

Pouco depois da assinatura do DNU, na semana passada, o "decretaço" enfrentou inúmeros protestos – incluindo os famosos panelaços, quando os argentinos fazem barulho (usando panelas) para mostrar seu descontentamento.

Milei argumenta que a regulação estatal ao longo dos últimos governos kirchneristas estagnaram a economia e afastaram investimentos.

Segundo a imprensa argentina, líderes sindicais já estão se mobilizando para uma greve geral contra as demissões e diversas das medidas econômicas.

No entanto, eles podem encontrar dificuldades, já que a defesa da desregulamentação por parte do novo governo não se reflete em sua política com relação aos protestos e à liberdade de manifestação.

Na primeira semana de governo, Milei lançou um polêmico protocolo "para garantir a ordem pública" que gerou fortes críticas.

Entre outros pontos, ele ameaça prender em flagrante quem fizer piquetes que impeçam a circulação total ou parcial da população; prevê que, em caso de protestos, as autoridades atuarão até todas as ruas e pontes bloqueadas serem liberadas; e determina que as organizações sociais responsáveis deverão arcar com os custos das operações de segurança.

Representantes de movimentos sociais e estudiosos manifestam preocupação com a medida, por considerarem que ela pode restringir o direito ao protesto no país.

 

Ø  Governo Milei pressiona Congresso a aprovar 'decretaço'

 

O governo de Javier Milei, novo presidente da Argentina, pressionou o Congresso nesta terça-feira (26) a tentar aprovar o "decretaço" proposto na semana passada. Além do texto, os parlamentares discutirão um pacote de leis promovido pelo Executivo em sessões extraordinárias previstas para os próximos dias.

“Os deputados e senadores terão que escolher entre apoiar o que o povo votou, a mudança, esta Argentina que queremos para o povo de bem e sem o peso do Estado, ou continuar a obstruir esta mudança e [impedir o que] a maioria do povo quer”, disse Manuel Adorni, porta-voz do governo, em comunicado divulgado nas redes sociais.

O partido de Milei, o Liberdade Avança, é minoria no Congresso: tem 39 dos 257 deputados e 7 dos 72 senadores.

Na última quarta-feira (20), Milei anunciou o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), que viabiliza a desregulação econômica do país. O texto modifica ou revoga mais de 350 normas e, embora já tenha entrado em vigor, ainda pode ser barrado pelo Congresso.

Entre outros pontos, o decreto desregulamenta o serviço de internet via satélite e a medicina privada, flexibiliza o mercado de trabalho e revoga uma série de leis nacionais. As medidas incluem também a conversão de diversas empresas estatais em sociedades anônimas, facilitando o processo de privatização dessas instituições.

Após uma semana com diversos protestos contra as reformas, o presidente convocou o parlamento para sessões extraordinárias entre os dias 26 de dezembro e 31 de janeiro. O Congresso poderá provar ou rejeitar o texto integralmente, sem a possibilidade de debater os detalhes de seu conteúdo.

Na pauta das sessões extraordinárias, Milei incluiu ainda propostas para a restituição de impostos sobre os salários, modificações na lei eleitoral e reformas do Estado.

“Apelamos à boa vontade e que estejam à altura da situação no contexto de urgência em que todos os argentinos estão imersos", disse Adorni.

·        Ação coletiva

No sábado (23), a Justiça federal admitiu uma ação coletiva de organizações civis para declarar o texto inconstitucional.

As organizações e as centrais sindicais convocaram uma manifestação na próxima quarta-feira (27) diante dos tribunais. O intuito é entregar à Justiça o pedido de contestação do decreto, e uma ação para suspender todos os seus efeitos.

O Ministério Público Federal terá que responder às contestações em um processo que pode chegar até a Suprema Corte da Argentina.

·        Crise

A Argentina vive uma das piores crises econômicas de sua história recente, com 40% da população vivendo na pobreza e a inflação ultrapassado os 140% anuais. Milei tem dito que o corte dos gastos públicos será equivalente a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

 

Ø  Decisões do novo governo argentino impactam inflação

 

Na Argentina, o fim do controle de preços e a desvalorização da a moeda em relação ao dólar tiveram um impacto na inflação.

Adesivos com números brancos sobre os antigos preços que estavam em preto. O quadro de giz também é uma solução para uma Argentina que viu a inflação disparar em dezembro.

"Os preços estão descontrolados", afirma um argentino.

Lorena diz que é uma loucura, que os aumentos são diários, que um dia está um preço e no outro já mudou: "Continuamente. Passa a manhã e o preço já aumentou. Passa o outro dia, é outro".

Consultorias apontam que os preços subiram em média de 25 a 30% em dezembro. Em novembro, a alta havia sido de 12,8%. No discurso de posse, o presidente Javier Milei havia dito que as primeiras medidas que o governo tomaria fariam que a inflação aumentasse ainda mais.

O novo governo decidiu que não iria mais represar ou controlar os preços da economia. Colocou fim ao tabelamento de itens básicos nos supermercados. Também desvalorizou o peso em 54% para que se aproximasse da cotação das ruas.

Uma argentina entrevistada diz que está tudo muito caro. O macarrão, arroz, leite... Isso que ela foi num supermercado que, em teoria, é barato, mas que ela se surpreendeu com os preços.

O macarrão, por exemplo, subiu de 350 pesos a 1000 em um mês.

O preço da massa para pizza mais do que dobrou desde o fim de novembroO óleo de girassol subiu 400%, agora custa 4.105, equivalente a 25 reais; e a embalagem de café solúvel, 57%.

Maximiliano, que trabalha num açougue, disse que percebeu que houve queda no consumo de carne. Deu para notar bastante que as pessoas buscaram cortes mais econômicos.

O economista Hernán Letcher explica que, no caso da carne, a desregulação da economia faz com que preço local passe a ser o mesmo do preço internacional, já que os produtores podem vender para o mercado local ou exportar. E que isso teve muito efeito sobre os preços nos últimos dias.

Economistas afirmam que ao longo dos últimos anos, a Argentina passou por diferentes programas de controle de preços e congelamentos que, no máximo, impediram uma inflação ainda maior.

O novo governo diz que quer acabar com essas distorções na economia e cortar gastos públicos para combater a inflação.

O economista Hernan Letcher pondera que essa desregulação da economia, somada à desvalorização e a política de cortes públicos, irá pesar nos bolsos dos assalariados argentinos e que os aumentos de salário não conseguem acompanhar. A perda de poder aquisitivo impacta de uma forma maior nas pessoas que ganham menos.

O mega decreto de desregulação da economia tem 366 artigos e entrará em vigor na sexta-feira (29). O decreto se manterá vigente enquanto o Congresso analisa o texto. Os parlamentares não podem sugerir mudanças, ou é aprovado na íntegra, ou rechaçado.

Ao menos 10 ações de inconstitucionalidade já foram apresentadas à Justiça para barrar o decreto.

Durante a tarde desta sexta, o presidente argentino publicou um novo decreto, demitindo 7 mil funcionários públicos que foram contratados em 2023.

 

Ø  Em menos de um mês de governo, Milei já é rejeitado por 63% dos argentinos

 

Pesquisa conduzida pela consultoria Javier Miglino y Asociados (JMyA) focou no desempenho do novo presidente argentino, o ultraliberal de extrema direita Javier Milei. 

O estudo, que incluiu entrevistas com 5150 pessoas entre 10 e 23 de dezembro, revelou uma acentuada queda na aprovação de Milei, com apenas 37% dos entrevistados aprovando sua gestão.

Javier Miglino, diretor da JMyA, citou fatores como a insatisfação da população argentina com as "mentiras" e "bravatas" de Milei"Por mais que os 4 meios de comunicação e seus satélites provincianos digam que tudo vai bem, as pessoas estão tristes e pela primeira vez desde 1810 não tivemos Natal. A mentira e a bravata na campanha são toleráveis. A mentira e a bravata como forma de governo, não", disse ele, segundo o portal Infopaís

 

Fonte: BBC News Mundo/g1

 

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