sábado, 1 de junho de 2024

Bahia e mais onze governos estaduais ignoram educação infantil em orçamentos

Doze governos estaduais não mencionam termos ligados à educação infantil em suas leis orçamentárias. Creches e pré-escolas são de responsabilidade de municípios, mas a legislação prevê aos estados suporte financeiro às prefeituras --sobretudo diante da realidade de dificuldades financeiras e técnicas da maioria dos municípios.

Sete dos 12 estados são das regiões Norte e Nordeste, com maiores desafios. Apenas 2 estados, Mato Grosso e Piauí, preveem recursos para etapa em todas as fases dos orçamentos, o que indica preocupação orçamentária a curto e longo prazo.

As informações estão em um levantamento do Instituto Articule, obtido pela Folha de S.Paulo, em que se analisa as três fases do orçamento: a LDO (Leis de Diretrizes Orçamentárias), a LOA (Lei Orçamentária Anual), ambas de 2024, e o PPA (Plano Plurianual).

A LDO aponta as prioridades do governo para o ano seguinte, enquanto a LOA estabelece valores de despesas e receitas. Já o PPA define metas e previsão de recursos para um período de quatro anos --foram analisados os planos com vigência de 2024 a 2027.

O Articule analisou a menção a termos como creche, pré-escola, educação infantil e primeira infância nos documentos orçamentários. Nenhuma dessas expressões são citadas nas três leis dos seguintes estados: Acre, Amapá, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins.

A falta de vagas em creche é um dos principais gargalos da educação brasileira. O país tem 2,3 milhões de crianças de até 3 anos fora das escolas por alguma dificuldade de acesso ao serviço, segundo levantamento de 2023 do Movimento do Todos pela Educação.

Os maiores índices de exclusão de crianças de creches estão nas regiões Norte e Nordeste, como Acre (48%), que não prevê a educação infantil em seus orçamentos, Roraima (38%), Pará (35%) e Piauí (33%)

São dez os estados que mencionam os termos da educação infantil na LOA 2024. No PPA, de 2024 a 2027, o número cai para 9 e na LDO, para 4. No estado de São Paulo, por exemplo, o tema aparece na LOA, mas é ignorado no PPA.

"Temos no país um percentual de crianças, sobretudo aquelas que mais precisam, sem acesso à creche. E os municípios têm muitas dificuldades financeiras para dar vazão sozinhos a essa missão, a esse direito", diz a advogada Alessandra Gotti, presidente executiva do Instituto Articule.

"Há uma divisão de tarefas previstas, mas é fato também que a nossa Constituição prevê que as crianças têm prioridade absoluta na garantia dos seus direitos, dentre esses, à educação", afirma.

O levantamento foi feito diretamente nos textos disponibilizados pelas Assembleias Legislativas e nos Diários Oficiais.

O professor Rubens Barbosa, da Associação Nacional de Pesquisadores em Financiamento da Educação, diz que é preciso mudar a cultura política para que os estados cumpram com a colaboração.

Os governos estaduais só foram obrigados a contribuir com os municípios na educação a partir de uma emenda constitucional de 1996, que previu a redistribuição dos recursos fiscais dos estados e municípios destinados ao ensino fundamental.

"Os estados têm que fazer leis sobre como distribuir o ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços] obrigatoriamente para a melhoria de índices educacionais. Como a maior parte dos municípios cuida da educação infantil, a maior parte vai para a educação infantil", diz Barbosa.

Questionado, o Consed (conselho que representa as secretarias de educação estaduais) diz estimular que as gestões apliquem a legislação e entende que a alfabetização das crianças requer um esforço conjunto.

"Isso facilita a condição de conhecimento e aprendizagem que os alunos chegam no ensino fundamental e no ensino médio", diz Roberta Barreto, do Conselho.

A presidente do Articule ressalva que os investimentos para a educação infantil podem, em alguns casos, estar incluídos e misturados em outros orçamentos. O que não é considerado adequado.

"Se é para construção de creche, precisa estar na rubrica da educação, porque é a primeira etapa da educação básica", diz Gotti. "Creche é um serviço a ser prestado para as crianças na garantia do direito à educação, não como uma assistência social".

Procurado, o MEC (Ministério da Educação) diz que os estados estão inclusos no pacto federativo, que prevê a oferta pública de educação infantil como responsabilidade dos municípios em parceria com os estados e a União.

Da mesma forma, o ministério é obrigado a colaborar. O governo Lula (PT) prometeu ano passado destravar obras de educação paradas, mas até agora nenhuma foi retomada, como a Folha de S.Paulo revelou. São 1.317 obras de creches e pré-escolas paradas, o equivalente a 35% do total.

Dos estados que não declararam a educação infantil em nenhuma das três leis, o Rio de Janeiro informou dar apoio financeiro à educação dos municípios em casos de necessidades específicas. A Bahia disse ter elaborado, no Plano Plurianual 2024-2027, programa de apoio às redes municipais de ensino com assessoramento técnico-pedagógico e financeiro.

O Tocantins disse firmar parcerias para o desenvolvimento da educação infantil. Minas Gerais informou que a colaboração com os municípios está detalhada nos textos de programas e projetos previstos na Lei Orçamentária Anual de 2024.

Acre, Amazonas e Paraná alegaram apenas que a responsabilidade da educação básica cabe aos municípios e que, por isso, termos vinculados à área não foram encontrados em seus orçamentos.

São Paulo informou trabalhar em cooperação com os municípios e firmou programa de alfabetização junto a esferas municipais com foco em crianças até 7 anos. No programa, o estado arca com material didático e formação de professores.

Pará, Rio Grande do Sul e Maranhão informaram que as prioridades e destinações à educação infantil constam no PPA. Nele, estão apoios a construções de creches, programas de alfabetização, capacitação de professores e gestores, entre outros.

O Ceará disse investir na área por meio de um programa dos ensinos infantil e fundamental, que inclui desde concessão de bolsas até construção e aquisição de equipamentos de centros de educação infantil.

Todos os estados foram procurados. Alagoas, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e Sergipe não responderam.

 

•        O papel da Educação Infantil e sua importância no desenvolvimento da criança

Embora não seja algo novo na educação brasileira, é comum ainda que haja dúvidas sobre o que é Educação Infantil e qual o seu papel na formação da criança.

“A Educação Infantil é a primeira etapa escolar da criança. É onde ela sai do seu núcleo familiar. Ela sai daquele entorno com o pai, a mãe e os familiares e passa por um convívio dentro da escola. Por isso é tão importante”, explica Fernanda.

A especialista ainda completa sobre quais as principais preocupações que os(as) profissionais da pedagogia têm neste momento. Fernanda afirma que “proporcionar para as crianças vivências nas quais elas não apenas interagem, mas de fato vivenciam situações dentro da escola”, deve ser uma das prioridades na Educação Infantil.

Embora seja essencial em todas as suas etapas, no Brasil, o ensino Infantil é obrigatório a partir dos 4 anos de idade. Nesse sentido, o Censo Escolar aponta que, durante a pandemia da Covid-19, houve uma queda no número de matriculados(as) na Educação Infantil, em que cerca de 653.499 alunos(as) deixaram de frequentar a escola.

Porém, em 2022, esse número já voltou a subir, quando foi registrado um aumento de 8,9% na rede pública e de 29,9% na rede privada, em comparação ao ano anterior.

•        BNCC: uma nova forma de enxergar a Educação Infantil

O que diz a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sobre a Educação Infantil? Desde 2018, temos homologadas as diretrizes para este segmento. As escolas de todo o Brasil precisam se espelhar nelas para realizar as atividades e aplicar os conteúdos durante o período letivo.

Fernanda dos Santos explica que, na Educação Infantil, as crianças desenvolvem habilidades cognitivas, motoras e sociais. E destaca como a BNCC veio para denotar que as crianças são “conhecedoras e cheias de habilidades”.

“A gente vem percebendo que a Educação Infantil é cada vez mais importante para o desenvolvimento da criança no Ensino Fundamental Anos Iniciais. Ela faz muita diferença na forma como essa criança avança nesse segmento e percebeu-se então que era ali uma janela, uma oportunidade de aprendizado que não poderia se perder. A BNCC vem para reforçar esse conceito, de que a criança conhece e explora o mundo também na Educação Infantil e com uma estreita relação com as famílias”.

•        Brincar e cuidar são parte da Educação Infantil

Na primeira infância, a criança não possui autonomia para realizar as diversas tarefas básicas de autocuidado. E por isso, nessa etapa da Educação Básica, ela depende dos pais, mães, professores(as) e demais responsáveis para auxiliá-la e ensiná-la a realizar estas tarefas.

Dessa forma, o cuidado está entrelaçado com a educação, sobretudo neste primeiro momento do ensino dos(as) pequenos(as), onde esse cuidado é inerente às experiências de ensino. Segundo a BNCC, a criança vai aprendendo conforme observa, vivencia e é estimulada dentro desses cuidados.

Nesse sentido, Fernanda dos Santos ressalta: ”Porque cuidar e educar? Cuidar é educar! E eu diria mais: cuidar é proporcionar essas vivências, proporcionar brincadeiras. E é na Educação Infantil e na escola que a criança vai ter contato com suas potencialidades. E também, obviamente, ali no contato contínuo com a família”.

Além disso, o brincar vem como uma ferramenta lúdica e de representação, onde a criança experimenta o mundo e sua realidade por meio de jogos e brincadeiras. E deve ser um dos eixos estruturantes das práticas pedagógicas, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI).

Dessa forma, a BNCC também coloca o brincar como um dos seis direitos básicos da criança dentro da Educação Infantil, junto com: conviver, participar, explorar, expressar e conhecer-se. Reforçando, assim, o brincar como direito da criança e dever das famílias e educadores(as).

•        Os 5 campos de experiência da criança

Ainda sobre os aspectos básicos que a criança necessita desenvolver, estão os campos de experiência, onde a criança adquire diversas habilidades tendo como ponto de partida um campo de vivência.

A BNCC elenca 5 campos de experiência, que citamos abaixo. E com eles, a criança desenvolve aspectos básicos do desenvolvimento, mas de forma organizada e direcionada. Embora sem uma cobrança de aprendizado formal, e sim com um teor lúdico e dinâmico.

•        O eu, o outro e o nós;

•        Corpo, gestos e movimentos;

•        Traços, sons, cores e formas;

•        Escuta, fala, pensamento e imaginação;

•        Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações.

>>> Benefícios da Educação Infantil no aprendizado

Com todos esses campos de experiência, a criança ganha inúmeros benefícios ao longo da sua jornada na Educação Infantil. Aqui, elencamos alguns de destaque:

•        Contato com a sociedade e seus pares (colegas da mesma idade);

•        Desenvolvimento de habilidades motoras essenciais;

•        Acompanhamento pedagógico direcionado e embasado por leis e diretrizes;

•        Identificação de dificuldades e atipias e melhor aprendizado a partir das particularidades de cada criança;

•        Preparo para o letramento e a alfabetização.

>>>> Os principais desafios da Educação Infantil

Sabemos que construir uma educação positiva e que oferece múltiplas possibilidades às crianças é uma tarefa e tanto. Portanto, quando se fala em desafios da Educação Infantil, é preciso antes levar em conta alguns fatores importantes.

Segundo Fernanda dos Santos, os desafios se apresentam de diferentes formas, de acordo com a faixa etária da criança. Do zero aos três anos, há o desenvolvimento das funções motoras, se reconhecendo no mundo, bem como a oralidade e as questões físicas.

Na medida em que a criança desenvolve tais habilidades, se abre um caminho para aprimorar o convívio social e a aproximação com as letras. Sendo assim, por meio de atividades que estimulam esse tipo de resposta, é possível fazer com que os(as) alunos(as) se desenvolvam de maneira plena em todos estes aspectos. Ademais, vale destacar que cada indivíduo tem seu tempo de desenvolvimento, em especial as crianças atípicas. Desse modo, para além de estabelecer metas, o principal desafio é “estimular as potencialidades de cada criança, conhecer cada aluno(a) que está na Educação Infantil na nossa turma, na nossa classe, e estimular para que ele(a), cada vez mais, avance, e vá realmente se desenvolvendo plenamente”, conclui a especialista.

•        Família e escola juntas na jornada de aprendizado da criança

Como já mencionado, a criança na fase da Educação Infantil necessita de cuidados básicos, já que está começando a desenvolver a sua autonomia. E, por isso, a relação família e escola é vital para que se tenha um acompanhamento de via dupla sobre o(a) estudante.

Sem contar, que, como salientou Fernanda dos Santos, “são olhares distintos, é um olhar da criança no núcleo familiar e é um olhar da criança dentro da escola”, e, por isso, o diálogo entre as partes qualifica a aprendizagem global da criança.

•        Como pais, mães e responsáveis podem contribuir na Educação Infantil?

Para que essa parceria entre famílias e escola possa ocorrer da melhor forma, a principal maneira de contribuição de pais, mães e responsáveis é o diálogo aberto e contínuo com o colégio. É importante que as coordenações e os(as) professores(as) possam ter um retorno sobre o desenvolvimento da criança em casa, e que as famílias saibam como seus(suas) filhos(as) estão na sua aprendizagem no ambiente de ensino.

“Hoje nós temos alguns mecanismos de compartilhamento de informações, como WhatsApp ou outros aplicativos de comunicação que a própria escola disponibiliza: documentação pedagógica que possa acompanhar este(a) estudante e que as famílias tenham acesso” ressalta Fernanda dos Santos.Também é importante que a família acompanhe a jornada da criança na escola, perguntando sobre seu dia a dia e auxiliando nas tarefas. Além disso, colher o feedback da escola, com o intuito de seguir contribuindo para que o aprendizado possa ser mais direcionado para a criança.

 

Fonte: FolhaPress/Geekie

 

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