Vem aí “o maior IVA do mundo”. Qual será a alíquota do novo imposto?
Cerne do projeto de reforma tributária aprovado
pela Câmara dos Deputados no início do mês, o Imposto sobre Valor Agregado
(IVA), cuja alíquota ainda é desconhecida pelos brasileiros, deve ser um dos
mais altos do mundo. A projeção é de economistas, advogados tributaristas e
especialistas em finanças e tributação consultados pelo Metrópoles.
Caso a reforma passe também no Senado, cinco
tributos que incidem sobre bens e serviços serão substituídos por apenas dois:
a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), no lugar de PIS, Cofins e IPI, e o
Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em substituição a ICMS e ISS. É o que se
chama de “IVA dual” – ou seja, dois impostos sobre o valor agregado dos bens e
serviços produzidos no Brasil. O objetivo da reforma é simplificar a cobrança,
diminuindo a incidência sobre o consumo e levando à uniformidade da tributação.
A tendência é que, diante da série de benefícios
concedidos a serviços que pagarão taxas reduzidas ou ficarão isentos, a
alíquota de referência do IVA seja mais alta do que os 25% projetados
inicialmente pelo governo. Esse percentual só será definido após a aprovação
final do texto, por meio de uma lei complementar.
• Alíquota
pode “ assustar”
De acordo com um levantamento do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o IVA brasileiro deve ter uma alíquota de
28,4%, o que faria dele o “maior imposto do mundo”, à frente de Hungria (27%),
Dinamarca, Noruega, Suécia (todos com 25%), Finlândia, Grécia e Islândia (24%).
A alíquota média entre os países da Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE), da qual o Brasil não faz parte, é de 19%.
Hoje, o imposto unificado é adotado por 174 países,
segundo a Tax Foundation. Entre as maiores economias do mundo, a exceção são os
Estados Unidos, que não têm IVA, mas uma taxa cobrada pelos governos regionais
na última etapa da cadeia, a venda ao consumidor.
Há quem acredite, no entanto, que a alíquota de
referência do IVA será ainda maior do que os 28% estimados pelo Ipea. O
economista Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda e Planejamento do estado de
São Paulo, projeta um percentual acima de 30%. Para o Conselho Nacional de
Política Fazendária (Confaz), o IVA pode chegar a 33,24%. O economista Marcos
Cintra, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e ex-secretário da Receita
Federal, fala em uma alíquota de cerca de 34%.
“É uma questão matemática. Quando são oferecidos
benefícios, alguém tem de pagar a conta. Se você oferece benefícios e não
aumenta a alíquota, está travando a arrecadação. O atual governo não quer que
essa reforma reduza a arrecadação do Estado”, diz Eduardo Araújo, CEO da Tax
All Consultoria Tributária e especialista em tributação.
“Como podemos conceber que as principais entidades
afetadas pela reforma, que representam os diversos setores da economia
brasileira, possam calcular algo se elas não sabem os detalhes da legislação?”,
questiona Araújo. “O governo poderia ter apresentado minutas dessa lei
complementar, de forma antecipada. Poderia ter mostrado estudos que indicassem
se haverá impacto ou não e quais setores sofrerão mais. Não houve transparência
nesse assunto. Se tem de aumentar imposto, é melhor ser transparente e dizer
abertamente que se fará isso.”
Para o advogado tributarista Jules Queiroz, doutor
em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo
(USP), é impossível afirmar, categoricamente, qual será a alíquota do IVA, mas
ela deve ficar entre 25% e 30%, acima do percentual cobrado em países
desenvolvidos.
“O IVA terá uma alíquota maior do que a dos países
desenvolvidos, sem a menor dúvida. Mas essa é a nossa realidade, considerando
que ele serve para manter a arrecadação dos entes nacionais”, afirma. “Se
estamos achando a alíquota alta, temos de trabalhar na outra ponta, na
qualidade do gasto público, para permitir uma redução da carga tributária. Não
se pode reduzir a carga a fórceps”, afirma Queiroz.
Benito Salomão, especialista em finanças públicas e
doutor em economia pelo PPGE-UFU, reconhece que a alíquota do IVA à brasileira
“tende a assustar”. “Não sabemos se ela será de 25%, 26%, 28% ou 30%. Mas, de
fato, a alíquota deverá ser maior do que a maior parte dos países e tende a
assustar e impressionar as pessoas“, diz.
• Quanto
mais exceções, maior a alíquota
Ao contrário do que é adotado como padrão no mundo
desenvolvido, no qual a lista de setores beneficiados com redução da carga ou
isenção tributária costuma se restringir ao tripé formado por saúde, educação e
alimentos, os deputados incluíram diversos grupos no pacote de benesses, como
produtos agrícolas, agropecuários, pesqueiros e florestais, produções
artísticas, culturais e esportivas (que serão contemplados por uma taxa
reduzida do IVA), entre outros. No Senado, não se sabe se a quantidade de
exceções vai se manter ou aumentar. Dificilmente, o número de beneficiados
diminuirá.
“A conta é muito simples e precisa fechar. A
alíquota definida pelo Congresso precisa cobrir as despesas do Estado. Se você
começa a tirar cestas de produtos da alíquota, naturalmente alguns setores
terão de pagar mais. Cada exceção aprovada na reforma tributária torna essa
conta a ser paga um pouco mais alta”, afirma Salomão.
Segundo Jules Queiroz, trata-se de uma “realidade
matemática”. “A alíquota referencial tem o objetivo de manter a arrecadação da
União, dos estados e dos municípios. Sempre que se dá um benefício a um setor,
outro setor é tributado”, diz. “Essas exceções são os custos políticos da
aprovação de uma reforma dessa magnitude. É a maior reforma do sistema
tributário nos últimos 50 anos. Do ponto de vista técnico, é evidente que o
ideal seria ter uma alíquota única.”
Gabriel Neder de Donato, especialista em Direito
Tributário do Peixoto & Cury Advogados, afirma que a definição da alíquota
do IVA dependerá, principalmente, da fase de transição entre o atual e o novo
regime tributário, com início previsto para 2026 e término em 2032, além das
exceções previstas na reforma.
“A questão não é exatamente a definição de qual
será a alíquota, mas a efetiva carga tributária e os impactos sobre
determinados setores, que poderão se sujeitar a um aumento significativo de
carga”, avalia Donato. Os segmentos que mais têm restrições à reforma são o de
serviços, o comércio e o agronegócio, de importância crucial para a economia
brasileira, que hoje pagam alíquotas mais baixas.
“Alíquota só é alta porque o Estado é grande”
Jules Queiroz, por sua vez, observa que, para além
da discussão sobre a questão tributária, o país deveria se debruçar sobre uma
reforma administrativa, que modifique a estrutura e a organização de todos os
Poderes da República, da União, dos estados e dos municípios, diminuindo o
tamanho da máquina estatal e aumentando sua eficiência.
“Há vários pontos da legislação administrativa do
Brasil que merecem um aumento de eficiência. Não temos como pensar em uma
tributação menor se não tivermos um custo adequado do Estado. O que é
importante nessa reforma administrativa é garantir que ela incida sobre as distorções.
O problema não é a alíquota do IVA, mas o tamanho do Estado que ela tem de
financiar”, afirma.
Segundo Benito Salomão, a alíquota do IVA “só será
alta porque o nosso Estado é grande”. “As pessoas não tinham a exata noção do
tamanho do governo do Brasil. Essa arrecadação estava diluída na cobrança de
cinco impostos diferentes. Quando você fragmenta essa arrecadação, a sociedade
perde a referência sobre o tamanho do Estado. É o que chamamos de ilusão
fiscal”, diz.
“A alíquota acabará sendo alta porque os nossos
impostos diretos são relativamente baixos e porque os nossos gastos públicos
são altos em relação ao PIB. Não tem mágica. Esse é o tamanho real do Estado
brasileiro.”
Mario
Sabino: Márcio Pochmann no IBGE é garantia de abobrinha barata e pepino caro
Lula escolheu o economista Márcio Pochmann para
comandar o IBGE. Formado pela trincheira da resistência ao neoliberalismo, a
Unicamp, Márcio Pochmann é petista até o último ene do nome dele — e, como tal,
foi um soldado do partido na presidência do IPEA, entre 2007 e 2012,
descartando técnicos que pensavam demais. O IBGE é o instituto que, além de
fazer censo demográfico, mede a inflação oficial. Sob Márcio Pochmann, a inflação
oficial estará controlada, não se preocupe. É um economista de sorte.
Jornalistas econômicos (não nas palavras)
advertiram para a intervenção política no IBGE, com Márcio Pochmann como
presidente do instituto. A ministra do Planejamento, Simone Tebet, até tentou
demover Lula da ideia de nomear Márcio Pochmann. Mas é escolha pessoal do
presidente da República e ponto final. A frente ampla é intransigente.
Os petistas assumidos e os petistas enrustidos, os
defensores da democracia, reagiram com indignação a insinuações de que Márcio
Pochmann, poderia manipular a inflação medida pelo IBGE com o seu
“terraplanismo econômico”.
Os primeiros disseram que Márcio Pochmann sofreu
“ataque rasteiro”. Os democratas petistas, por meio da Associação Brasileira de
Economistas pela Democracia (aparentemente, não há uma Associação Brasileira de
Economistas pela Ditadura), divulgaram nota de repúdio ao “ataque orquestrado
contra Márcio Pochmann, contra a Unicamp e contra as linhas de pensamento
econômico críticas ao neoliberalismo”.
De acordo com a linha de pensamento econômico
crítica ao neoliberalismo de Márcio Pochman, o sucesso é ruim e o insucesso é
bom. O PIX, por exemplo, “além de fortalecer o curso do processo neocolonial,
aprofunda a lógica da financeirização rentista que não se preocupa com a
produção, mas com a circulação do dinheiro”. Ou seja, o cheque era libertador.
Já a Argentina, “na decadência do padrão monetário
ouro-libra esterlina dos anos de 1930, ficou carregando o caixão da Inglaterra
por mais tempo e perdeu o rumo do desenvolvimento, ao contrário do Brasil.
Agora, a Argentina avançou para yuan chinês”. A Argentina não tem mais dólares
nem para comprar perfuminho em loja duty free, mas há males que vêm para o bem
da linha de pensamento econômico crítica ao neoliberalismo.
Márcio Pochmann no IBGE é garantia de abobrinha
barata e pepino caro.
Simone
Tebet e o pingo d’água que nada tem a ver com vendaval
Em momentos de dificuldades, para acalmar seus
assessores mais nervosos, Pedro Pedrossian, uma vez governador do Mato Grosso,
e duas do Mato Grosso do Sul, pelo qual foi também senador, gostava de repetir
sorrindo e aparentando tranquilidade:
“Não se deixe afogar em um pingo d’água”.
Eu o ouvi dizendo isso nas eleições de 1990 para o
governo do Mato Grosso do Sul. As pesquisas de intenção de voto mostravam que
ele se elegeria com folga, e no primeiro turno. Seus adversários imaginavam
detê-lo apelando para a pancadaria na TV.
Para desespero dos que o cercavam, Pedrossian foi
descansar na sua fazenda faltando duas semanas para o dia da eleição. Informou
aos jornalistas que viajaria a São Paulo para contatos, mas não era verdade.
Elegeu-se no primeiro turno, como previsto.
Morreu em 2017 com 89 anos, quando Simone Tebet
(MDB), sua conterrânea, já era senadora pelo Mato Grosso do Sul. Não sei dizer
se Simone ouviu falar do conselho que Pedrossian dava ao seu séquito, mas ela o
tem seguido à risca e com afinco.
Não se deixou afogar em um pingo d’água quando Lula
demorou a convidá-la para o governo. Nem se deixou afogar por ter sido nomeada
para o Ministério do Planejamento, cargo que não queria, e que muitos diziam
estar aquém de sua importância.
De novo, Simone não se deixou afogar ao saber que
Lula, ontem à tarde, sem tê-la consultado, decidiu que o economista Marcio
Pochmann, filiado ao PT, será o próximo presidente do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
Pochmann é tido como de esquerda demais, defensor
de soluções heterodoxas para os problemas da economia, e o IBGE é um órgão
estratégico do ministério comandado por Simone. Os economistas liberais
detestaram a escolha e começaram a chiar.
Simone, não. Ela entende que não há risco de
ingerência política no IBGE porque o órgão é técnico e “caminha sozinho”, como
comentou com algumas pessoas. Se era desejo de Lula indicar Pochmann para o
cargo de presidente, ela não seria empecilho.
Parte da imprensa extremista não vê na nomeação de
Pochmann um pingo d’agua, mas um vendaval que deveria levar Simone a pedir as
contas e passar a se opor ao governo. A ministra resiste à pressão, e Fernando
Haddad (PT), ministro da Fazenda, a apoia.
Quem é
Marcio Pochmann, economista anunciado para presidir o IBGE
O economista Marcio Pochmann será o novo presidente
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), segundo anúncio do
ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta. Filiado ao Partido dos
Trabalhadores (PT) desde 2011, o professor voluntário da Unicamp foi duas vezes
candidato a prefeito de Campinas (SP), mas não se elegeu. Conheça, abaixo, a
trajetória.
Em outubro de 2020, o economista postou uma crítica
ao PIX, programa de transferências online que foi lançado um mês depois.
Segundo ele, o PIX seria mais um "passo na via neocolonial a qual o Brasil
já se encontra ao continuar seguindo o receituário neoliberal".
"Na sequência vem a abertura financeira
escancarada com o real digital e a sua conversibilidade ao dólar. Condição
perfeita ao protetorado dos EUA", completou Pochmann, no Twitter.
• Atuação
acadêmica
Pochmann é formado em ciências econômicas pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e, em 1993, tornou-se doutor
pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Em 2000, virou professor livre docente pela Unicamp
e, em 2014, assumiu como titular da universidade. O político, que tem 61 anos,
se aposentou na Unicamp em 2020, mas seguiu como professor colaborador.
Segundo o Instituto de Economia, Pochmann seguia,
até o semestre passado, dando aulas como colaborador. O próprio instituto
informou, no entanto, que ele deve ser desligado pelo tempo que permanecer na
presidência do IBGE.
O indicado pelo governo para o IBGE também publicou
mais de 60 livros ligados à economia. Em 2002, venceu o prêmio Jabuti na
categoria Economia, Administração, Negócios e Direito, com o livro A Década dos
Mitos.
• Vida
política
Pochmann tem intensa atuação política,
especialmente em Campinas - quando foi derrotado em duas eleições para
prefeito. O economista também tentou vaga como deputado federal em 2018, quando
ficou na suplência.
Em nota, o PT de Campinas defendeu a decisão do
governo de indicá-lo para presidência do IBGE. "A vida acadêmica e
profissional de Márcio demonstra que será um grande acerto do Governo
Lula", comunicou em nota.
• Eleições
de 2012
Candidato pelo PT, Pochmann iniciou a campanha com
pouca intenção de voto nas primeiras pesquisas, mas cresceu e alcançou o
segundo turno - quando foi derrotado por Jonas Donizette (PSB), atualmente
deputado federal.
Naquele segundo turno, o economista foi escolhido
por 42,31% dos eleitores, ou 231.420 votos. Jonas venceu com 57,69%, ou seja,
315.488 votos.
• Eleições
de 2016
Ao contrário do crescimento que teve na campanha
anterior, Pochmann não obteve votos suficientes para chegar ao segundo turno em
2016.
Jonas Donizette buscava a reeleição e Pochmann
realizou a campanha em meio às dificuldades enfrentadas pelo PT por conta das
denúncias da Lava Jato. Com isso, o economista ficou em terceiro, com 74.334
votos (15,04%). Jonas foi reeleito no primeiro turno.
• Eleições
de 2018 e mais
Dois anos depois, o economista tentou vaga como
deputado federal e obteve 53.261 votos, o que garantiu apenas vaga como
suplente.
Antes das eleições, Pochmann foi Secretaria
Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade durante governo de Marta
Suplicy (PT), em São Paulo.
Também presidiu, entre 2012 e 2020, a Fundação
Perseu Abramo, associação ligada ao Partido dos Trabalhadores para
"desenvolvimento de atividades como as de reflexão política e ideológica,
de promoção de debates, estudos".
Pochmann foi presidente do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) entre 2007 e 2012 e participou da transição do
governo após a eleição de Lula.
• Mudança
no IBGE
O diretor de pesquisa Cimar Azeredo está
temporariamente à frente da presidência do órgão. A data da posse ainda não foi
definida.
"Marcio Pochmann que vai para o IBGE e não
teve nenhum ruído sobre isso. Vai ser o presidente, vai assumir o IBGE",
anunciou Pimenta após se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ministro afirmou também que a opção de colocar o
economista na presidência do instituto não teve nenhuma espécie de veto dentro
do governo.
Fonte: Metrópoles/g1
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