terça-feira, 11 de julho de 2023

Governo corre para “compensar” herança do desmatamento deixada por Bolsonaro

Após seis anos de alta, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu alcançar uma redução de 33,6% no desmatamento na Amazônia durante o primeiro semestre do ano. O número foi apresentado em coletiva de imprensa, realizada em Brasília na tarde desta quinta-feira (6).

Entre janeiro e junho de 2023, o bioma perdeu 2.649 km² de vegetação, o equivalente a duas vezes a cidade do Rio de Janeiro. Apesar de expressiva, a cifra foi comemorada. Esta é a primeira vez desde 2017 que o número cai.

Segundo o secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco, a queda é resultado dos esforços coletivos do novo governo em enfrentar o problema, negligenciado – e até estimulado – durante a gestão federal anterior.

“Esse número significa dizer que o esforço de reverter a curva de crescimento foi atingido. Isso é um fato, nós revertemos, o desmatamento não está em alta”, comemorou.

De acordo com ele, no entanto, essa tendência de queda ainda precisa mostrar sua força no mês atual. “Esperamos que em julho a gente repita esse êxito”, disse.

A importância dada por Capobianco ao mês de julho justifica-se pelo fato de que a taxa anual de desmatamento na Amazônia é medida sempre de 1º de agosto de um ano até 31 de julho do ano seguinte.

Isto é, os dados que foram registrados em agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2022 representam a “herança” deixada por Bolsonaro. De janeiro a julho eles já serão um reflexo das medidas adotadas pelo atual governo.

“Se nós vamos conseguir uma redução nesse [primeiro] semestre que ‘compense’ a herança do semestre do governo anterior e ter uma taxa [anual] este ano menor do que o ano anterior, nós não sabemos. Mas nós atingimos o primeiro objetivo fundamental que foi reverter a tendência de alta”, disse.

Os números alcançados pelo governo Lula não foram comemorados somente por membros da administração federal. Após a divulgação dos dados, diferentes organizações da sociedade civil se manifestaram.

Para Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, os resultados  são fruto dos esforços implementados.

“Aos poucos, o governo está retomando a fiscalização e a governança na Amazônia. Temos um presidente que fala em proteger a floresta e seus povos. Ou seja, o governo voltou a agir, a aplicar a lei, a proteger essa riqueza única que é a Amazônia. Foi isso que mudou, é isso que está fazendo os números de desmatamento diminuírem”, disse.

Segundo Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace Brasil, a queda na destruição da Amazônia tem, de fato, relação com a postura do novo governo. Mas ele salienta que ainda há muito trabalho pela frente para que a reversão total do desmatamento no bioma seja atingida.

“A mudança de discurso na área ambiental do governo federal, a ampliação das ações de comando e controle com aumento de multas e embargos seja na floresta ou de forma remota, colaboraram para esta queda. Mas o maior desafio vem agora no segundo semestre, com o verão amazônico, que é quando historicamente temos os meses com as maiores áreas de desmatamento, quanto o número de queimadas”, disse.

·         Comando e Controle

Dentre as ações que levaram aos resultados obtidos no primeiro semestre para a Amazônia, o MMA destacou o lançamento da nova fase do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento (PPCDAm), o cancelamento de registros de propriedade em áreas protegidas e o aumento na aplicação de multas, embargos e apreensões.

De fato, o Ibama aumentou em 166% a aplicação de multas no primeiro semestre de 2023, quando comparado com o mesmo período de 2022. Em seis meses, foram aplicados 3.341 autos de infração, totalizando R$ 2,3 bilhões. Também foram aplicados 2.086 embargos (aumento de 111%), 297 termos de destruição de bens (aumento de 260%) e 1.283 termos de apreensão (aumento de 115%).

No total, o órgão apreendeu 3 mil cabeças de gado, 25 aeronaves, 36 toneladas de cassiterita e 30 barcos, entre outros bens. Além disso, foi feito embargo remoto de 206 mil hectares e o bloqueio de 1,6 m³ de créditos virtuais de madeira.

No ICMBio, a aplicação de multas cresceu 348%, totalizando 1.141 autos de infração no primeiro semestre, que resultaram em R$ 125 milhões. Também foram feitos 99 embargos (aumento de 94%), 452 termos de destruição de equipamentos (aumento de 138%) e 568 termos de apreensão (aumento de 95%).

Nos seis primeiros meses do ano, o órgão retirou 3.200 cabeças de gado de dentro de unidades de conservação.

“Em seis meses, nós já temos um resultado que é fruto de duas coisas muito importantes: recursos tangíveis e recursos intangíveis. Recursos tangíveis vocês sabem: equipe, orçamento, capacidade de implementação das decisões tomadas.  Mas tem uma coisa que a gente não considera, que são os recursos intangíveis. É a decisão do presidente Lula de assumir como uma política de governo a continuidade da ideia de que a política ambiental brasileira será uma política transversal. A decisão política de fazer o enfrentamento da mudança do clima e o combate ao desmatamento. Isso é intangível, mas altamente potente”, disse a ministra Marina Silva. 

·         Raio X do desmatamento na Amazônia

No primeiro semestre do ano, o Mato Grosso ficou na liderança do ranking de maiores desmatadores, com 34% do total (905 km²), seguido pelo Pará, com 28% (746 km²), Amazonas, com 21% (553 km²), Rondônia, com 9,5% (252 km²), Roraima, com 5% (122 km²), Acre, com 1,5% (38 km²), Maranhão, com 1% (24 km²), Amapá, com 0,2% (6 km²) e Tocantins, com 0,1% do total registrado no período (2 km²).

Apenas 20 municípios de quatro estados – Mato Grosso, Pará, Amazonas e Rondônia – concentraram 50% do desmatamento registrado. 

“Nós começamos um trabalho com os municípios da Amazônia na perspectiva de trabalhar o que estamos chamando de um Pacto Federativo de Desmatamento Ilegal, costurando ações de governança com esses municípios para que eles possam participar de uma rede de ação, de operação, de monitoramento e controle”, explicou o Secretário Extraordinário de Controle de Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial no MMA, André Lima.

Da área total desmatada, 45,3% estava registrada como propriedade privada e 23,6%, dentro de assentamentos. 

O restante do desmate ocorreu em áreas em que a prática é proibida ou onde não há informação sobre a situação fundiária: 15,3% em florestas públicas ainda não destinadas, 8,5% em áreas não definidas, 2,7 % em unidades de conservação e 1,4% em Terras Indígenas. 

·         Para conter alta no desmatamento, governo dará início ao embargo remoto no Cerrado

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática (MMA) anunciou nesta quinta-feira (6) que vai começar a embargar remotamente áreas desmatadas ilegalmente no Cerrado, como uma das medidas para conter a alta no desmatamento no bioma. 

A análise de imagens de satélite para realização de embargo foi adotada entre 2016 e 2018, mas interrompida durante o governo Bolsonaro. Com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva no poder, a ferramenta voltou a ser utilizada, mas, até então, com prioridade para a Amazônia.

Em coletiva, o Secretário Extraordinário de Controle de Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial no MMA, André Lima, informou que serão embargadas desta maneira áreas com desmatamento ilegal acima de 0,5 km² (50 hectares). A média para o bioma é de 5 km² (500 hectares). 

Além do embargo remoto, estão previstas ações de fiscalização em campo em áreas críticas, a revisão dos processos de autorização de desmatamento e a elaboração de um relatório detalhado sobre o problema, para elaboração de medidas futuras. 

As ações serão executadas em parceria com os estados, por meio da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) e dos governos estaduais.

Segundo Lima, a revisão nas autorizações de desmate terá destaque entre as medidas adotadas. De acordo com ele, todos os estados que compõem o bioma já se mostraram abertos a revisar seus procedimentos.

“Tem estados, como a Bahia, que delegaram para os municípios autorizarem [o desmatamento]. Mais de 300 municípios da Bahia estão emitindo autorização. E daí o controle de tudo isso, quando você dilui, sem o sistema integrado, fica praticamente impossível de se ter, então queremos estabelecer uma regra nacional”, explicou.

Pelos altos números de desmatamento registrados na Bahia, o campeão entre os estados (leia mais abaixo), o MMA anunciou que criará um grupo de trabalho com o governo local para suspensão dos Cadastros Ambientais Rurais (CAR) com desmatamento ilegal.

Durante a coletiva, o governo também anunciou que está previsto para outubro o lançamento do novo Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas do Cerrado, o PPCerrado. O grupo que vai trabalhar no novo plano já foi formado e, em setembro próximo, o documento deve ser aberto para consulta pública e recebimento de sugestões.

·         Raio-X do desmatamento

De acordo com números apresentados pelo governo durante a coletiva, entre janeiro e junho de 2023, o Cerrado perdeu 4.407 km² de vegetação nativa, área equivalente à cidade de Cuiabá, a oitava maior capital do país em termos territoriais. 

O número é o maior da série histórica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), iniciada em 2019 para o bioma. Ele também representa uma alta de 21% em relação ao mesmo período do ano anterior. ((o))eco já havia adiantado a alta na última terça-feira (4).

“A gente voltou a ter transparência, ninguém fica brigando com os dados do satélite, escondendo o satélite, querendo demitir o presidente do INPE, o que estamos fazendo é mostrar com transparência o que está acontecendo no território, trabalhando com parceiros, buscando acertar as políticas em tempo real”, disse a ministra Marina Silva.

Ainda segundo dados do INPE, 81% do desmatamento no Cerrado no primeiro semestre aconteceu nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, conhecido pelo acrônimo Matopiba.

A Bahia foi responsável por 28% do total desmatado, seguido pelo Maranhão (23%), Tocantins (18%) e Piauí (12%). A maior parte do desmatamento – 76,6 % – desse desmatamento aconteceu em áreas registradas como particulares, 16,2% em áreas indefinidas, 4,1% em Áreas de Proteção Ambiental (APA), 1,7% em assentamentos, 0,5% em unidades de conservação e 0,9% em florestas públicas e terras indígenas.

Apenas 26 municípios desses quatro estados concentram 50% do total desmatado entre janeiro e junho de 2023. “Estamos falando de um Pacto Federativo pelo desmatamento Ilegal Zero. Dá para pôr nesta sala todos os prefeitos e secretários de meio ambiente desses municípios pra gente combinar uma estratégia de ação articulada”, explicou André Lima.

·         Comando e controle 

O aumento no desmatamento no Cerrado aconteceu mesmo com a implementação de mais ações de fiscalização e medidas de comando e controle no bioma.

Segundo Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama, no primeiro semestre de 2023 foram aplicadas 417 multas a infratores no bioma, totalizando R$ 113,8 milhões. O número de autos de infração lavrados representa um aumento de 22% em comparação com o mesmo período do ano anterior.

Entre janeiro e junho deste ano, o Ibama também realizou 247 embargos (aumento de 36%), lavrou 327 termos de apreensão (aumento de 46%) e 90 termos de destruição de equipamentos (aumento de 243% em relação ao mesmo periodo de 2022).

Já o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) aplicou 56 multas a infratores com ilegalidades dentro de áreas protegidas, totalizando R$ 13,4 milhões em multas. O número de autos lavrados é 8% maior que o mesmo período de 2022.

Além disso, o órgão também fez 30 embargos (aumento de 25%) e lavrou 36 termos de apreensão (aumento de 80%).

“São dois trilhos, o trilho estruturante e o trilho emergencial. No caso do Cerrado, estamos no trilho emergencial e trabalhando o PPCerrado. Mas não dá para esperar o PPCerrado, então que bom que tem uma excelente articulação com os governos para trabalharmos juntos”, disse Marina Silva. 

 

Ø  Banco esconde os nomes de desmatadores com empréstimos

 

Será cada vez mais difícil para quem desmata a Amazônia e outros biomas conseguir créditos e fazer negócios nos mercados brasileiro e internacional.

A fiscalização ambiental foi retomada, imóveis sobrepostos a terras públicas não receberão empréstimos, cadastros ambientais rurais (CAR) em áreas protegidas serão suspensos pelo governo, mercados internacionais se fecham a produtos sujos por desmate e outros impactos socioambientais.

Na mesma linha, desde fevereiro o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) bloqueia repasses a fazendas com desmatamento ilegal. Mas parece faltar transparência à medida.

Pedidos da Don’t LAI to Me – Fiquem Sabendo sobre nomes de empresas e pessoas bloqueadas são negados pelo banco público. O BNDES alega que tudo está protegido “pelo sigilo empresarial” e pela Lei Geral de Proteção de Dados.

A plataforma recorreu da negativa e afirma que a lei não tem “a função de proteger empresas”.

 

Ø  MP investigará autorizações para desmatamento no Mato Grosso do Sul

 

O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) vai investigar o sistema do Imasul (Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) que licencia e concede autorização ambiental de desmatamento no estado. Tornado público nesta sexta-feira (7), o inquérito civil foi instaurado em meio a denúncias de desmatamento desenfreado no Pantanal. 

No último quadriênio (2019-2022), o estado respondeu por mais de 90% da área desmatada do bioma, que, neste ano, ainda teve os cinco primeiros meses mais desmatados do quinquênio (2019-2023) no estado. 

Conforme consta em publicação no Diário Oficial do MPMS, a investigação partiu de requerimento do Instituto SOS Pantanal, e quer “apurar eventual desconformidade do sistema do IMASUL”, afirma o documento. 

·         Legislativo também está de olho 

Na última semana, a Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALMS) também instituiu um grupo para investigar o tema. “Os assessores parlamentares dos deputados que compõem a comissão vão buscar, através de convocação de instituições de controle e de depoimentos com pessoas que tem envolvimento em determinados casos, conhecer com profundidade as denúncias”, explica a ((o))eco o deputado Renato Câmara (MDB-MS), que é presidente da comissão. 

Segundo Câmara, em sua grande maioria, as denúncias são pertinentes ao Imasul. “É o órgão que concede autorizações de empreendimentos, de expansão da agricultura, de desmatamento, de limpeza, entre outros”, explica. 

Por este motivo, o órgão ambiental será a primeira instituição que o grupo instituído pela comissão deve ouvir nos próximos dias – outras serão procuradas durante os trabalhos da comissão. “A informação que nós temos que buscar é se aquele que teve alguma concessão, se ele está cumprindo as normas que foram autorizadas ou estão indo além do que ele tem autorização”, explica o deputado. 

A expectativa, diz Câmara, é que resultados surjam com o desfecho das denúncias. “A maioria das denúncias, que chegaram até nós tem muito poucos elementos informativos, tem alguns indícios, e diante disso nós iremos em busca de ampliar e aprofundar essas afirmativas”, completa o presidente da comissão. 

·         O líder do desmate no Pantanal

No ano passado, mais de 80% da área desmatada no Pantanal foi registrada em Mato Grosso do Sul, segundo dados da plataforma MapBiomas Alerta. Entre 2019 e 2022, 104,3 mil ha foram desmatados em todo o bioma, mas o estado respondeu sozinho por 94 mil ha, ou 90,1% do total. 

Nos cinco primeiros meses deste ano, 16,8 mil ha já foram desmatados no Pantanal sul-mato-grossense, o que configura o maior índice para o período desde 2019 – a partir de quando os dados da plataforma do MapBiomas são disponibilizados. 

 

Fonte: ((o))eco

 

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