Especialistas
apontam caminhos para retomar a política nacional de agroecologia
Quando
famílias assentadas pela reforma agrária no Rio Grande do Sul começaram a
plantar arroz sem venenos, em 1999, talvez não imaginassem a fama que o arroz
orgânico do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ganharia nos
anos seguintes. Hoje, a produção é realizada em 22 assentamentos e, segundo o
Instituto Riograndense de Arroz (Irga), é a maior da América Latina.
Porém,
a área plantada caiu drasticamente nos últimos anos. “Nós reduzimos de cinco,
seis mil hectares de arroz orgânico no estado [em 2017] para três mil
hectares”, conta Diego Severo, agricultor de 31 anos que vive e produz arroz no
município de Viamão, no assentamento Filhos de Sepé, o maior do estado. De
acordo com ele, muitas famílias assentadas têm sido forçadas a abandonar esse
cultivo por dois fatores principais: a falta de crédito barato para produzir e
a falta de mercado para escoar o produto.
O
cultivo de arroz é caro e demanda muito investimento. “Todo o processo, desde o
plantio até o empacotamento do arroz, é mecanizado – o preparo do solo, o
plantio, a colheita, a industrialização”, explica Diego. “Os únicos serviços
manuais são o transporte dos insumos e sementes e o manejo da água na lavoura.
Então a cadeia produtiva tem seus custos, né? Custos de investimento, custos de
depreciação, custos de manutenção. Por isso é difícil manter”.
Além
disso, o arroz é uma planta exigente em nutrientes. A adubação aumenta os
custos de produção, já que não há uma oferta suficiente de fertilizantes
orgânicos com preços acessíveis. Diego conta que um dos adubos mais utilizados
nos assentamentos, o folhito, é produzido numa cidade que fica a 150
quilômetros de Viamão. “Contando o frete, a tonelada chega para nós por um
valor de R$ 280. E cada lote familiar, que tem em média 12 hectares, usa até 60
toneladas”, estima. Isso quer dizer que, só para cobrir os custos de um único
bioinsumo, uma família precisa desembolsar mais de R$ 15 mil antes começar o
plantio.
Os
canais de comercialização mais importantes sempre foram as compras
institucionais, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Com o sucateamento de ambos nos últimos
anos, a situação ficou mais difícil. As vendas pelo PAA praticamente acabaram.
O PNAE, apesar dos reveses, segue hoje como o principal meio de escoar a
produção. “Mesmo com o orçamento muito defasado nos últimos anos, a merenda
escolar nunca para, né?”, constata Diego.
A
recuperação desses programas é uma das prioridades dos movimentos sociais do
campo neste primeiro ano do novo governo Lula. Ela começou nos últimos meses,
com o relançamento do PAA e o reajuste no valor dos
repasses federais para o PNAE. No último dia 28,
foi anunciado o aumento de recursos para o Plano Safra da Agricultura Familiar, que vai destinar
R$ 71,6 bilhões ao crédito rural para o setor na safra 2023/2024. Segundo o
governo federal, o valor é 34% superior ao anunciado na safra passada — o maior
da série histórica, porém ainda pequeno se comparado aos R$ 364,22 bilhões destinados à
agricultura empresarial, um volume cinco vezes maior.
Outra
medida importante para produtores familiares é a redução da taxa de juros para
os que produzem alimentos, que passa de 5% para 4%. Para agricultores que
cultivem produtos orgânicos e agroecológicos, a ela é ainda menor: 3% ao ano.
Ainda dentro do Plano Safra da Agricultura Familiar, foi retomado o
programa Mais Alimentos, para facilitar a
aquisição de máquinas e implementos agrícolas. Há previsão de linhas de crédito
diferenciadas para a produção sustentável de alimentos.
ÓRGÃOS
EXTINTOS POR BOLSONARO FORAM REFUNDADOS EM JUNHO
Ter
recursos financeiros para investir nas lavouras e facilidade para escoar os
produtos é fundamental para as famílias de agricultores, mas não é tudo. Elas
também precisam de assistência técnica para melhorar a produtividade. De maior
disponibilidade de insumos para a produção orgânica. De acesso à terra e água
para plantar.
Essas
e outras pautas foram reunidas há mais de dez anos em uma política criada para
integrar todas as ações do governo federal – as novas e as existentes –, de modo
a induzir a transição agroecológica e impulsionar a produção orgânica ou de
base agroecológica.
Trata-se
da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), um nome
pouco familiar para quem não faz parte de organizações ou coletivos ligados à
agroecologia. Mesmo entre agricultores, a PNAPO é pouco conhecida. Na semana
passada, junto com o anúncio do Plano Safra da Agricultura Familiar, o
presidente Lula editou um decreto que retoma
essa política. O desafio, agora, é conseguir sua plena efetivação.
Lançada
em 2012 via decreto pela então presidente Dilma Rousseff, a política
praticamente morreu de inanição no governo Michel Temer, devido à falta de
recursos financeiros para as iniciativas propostas.
A
gestão de Jair Bolsonaro trouxe um problema extra. Logo no início do governo, o
então presidente desmanchou vários colegiados de participação ligados à esfera
federal, o que atingiu os dois instrumentos de gestão da política: a Comissão
Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO) e a Câmara Interministerial
de Agroecologia e Produção Orgânica (CIAPO).
Os
dois grupos atuavam na construção dos Planos Nacionais de Agroecologia e
Produção Orgânica (Planapos). São os planos que estabelecem objetivos e metas
da política para determinado período. Sem os colegiados e, portanto, sem plano,
a política basicamente passou os últimos anos existindo como morta-viva.
A
PNAPO não é uma condição para os ministérios, sozinhos ou isoladamente,
promoverem ações apoiando a agroecologia e agricultura orgânica. Nem o PAA, nem
o PNAE, nem programas de crédito, por exemplo, dependem dessa política para
existir. Mas ela tem a função de articular vários ministérios e órgãos federais
em torno dessas ações – e de também trazer a sociedade civil para a formulação
e avaliação do que é feito.
O
primeiro passo formal para a retomada da política se deu em março deste ano,
quando a Secretaria-Geral da Presidência instituiu um Grupo de Trabalho Técnico
(GTT) para apresentar proposta de
alteração na composição da CNAPO e do CIAPO.
Um decreto recriando
essas instâncias – e restabelecendo a política – foi editado em 28 de junho.
Por meio dele, a participação social na política foi ampliada: a nova CNAPO vai
ser formada por 21 órgãos do governo e 21 entidades da sociedade civil, e antes
eram 14 ministérios e 14 entidades. Os membros serão escolhidos em um processo
de seleção pública. O passo seguinte será elaborar um novo Planapo até o fim do
ano.
Mas
há muito o que se fazer em paralelo a esse processo. O fortalecimento de redes
de agroecologia nos territórios e a aprovação de um programa para reduzir o uso
de agrotóxicos são pautas urgentes.
POLÍTICA
FOI FRUTO DA MOBILIZAÇÃO DE MULHERES DO CAMPO
Apesar
da força econômica e política que o agronegócio tem no Brasil — e o
favorecimento histórico que ele recebe do Estado —, a existência de uma
política voltada para a agroecologia e a agricultura orgânica tem uma
importância enorme.
“O
Brasil foi pioneiro ao criar algo assim”, aponta Paulo Petersen, membro da
Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) que já atuou na CNAPO. “Em outros
países havia programas e políticas isoladas, como políticas ambientais ou de
fortalecimento da agricultura orgânica – mas nunca algo integrado, estruturado,
como se conseguiu aqui”.
Não
à toa, em 2018 a PNAPO foi uma das iniciativas contempladas pelo Prêmio de
Políticas para o Futuro da Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura, a FAO.
A
PNAPO não caiu do céu, nem foi uma proposta do governo Dilma. “Foi a sociedade
civil organizada que pautou a construção e o governo naquele momento acolheu a
pauta”, lembra Leomárcio Araújo da Silva, dirigente do Movimento dos Pequenos
Agricultores (MPA), que foi membro da CNAPO e também integrante do GTT que
discutiu sua recomposição.
Um
grande marco nessa história foi a Marcha das Margaridas de 2011. A marcha é uma
mobilização de organizações de mulheres do campo, da floresta e das águas que
ocorre desde o ano 2000. Em agosto de 2011, 70 mil mulheres foram a Brasília
com um extenso conjunto de pautas. Entre elas,
estava a criação de um programa que promovesse a massificação da transição
agroecológica.
O
tema — que fazia parte das discussões de movimentos sociais do campo havia
décadas – estava fervilhando naquele momento: quatro meses antes, havia sido
lançada a Campanha Permanente Contra os
Agrotóxicos e Pela Vida.
De
acordo com Iracema Ferreira de Moura, que atuava na Secretaria-Geral da
Presidência na época da formulação da política e acompanhou os debates, dentro
do governo havia atores mobilizados em torno desse assunto, e mesmo no
Ministério da Agricultura havia uma proposta de política específica para a agricultura
orgânica. “Mas isso estava muito disperso, não estava numa agenda
governamental”, relembra.
O
fato é que, na cerimônia de
encerramento da marcha, Dilma se comprometeu com a criação de um grupo de
trabalho para elaborar o programa, e foram as discussões desse GT que
acabaram levando à elaboração da PNAPO, logo no ano seguinte.
Como
já explicamos na primeira reportagem da série Brasil Sem Veneno, “agricultura
orgânica” e “agroecologia” não são sinônimos, embora tenham vários pontos de
contato. Nem todo mundo que produz em bases agroecológicas consegue cumprir as
exigências da legislação orgânica, e nem todo produtor orgânico trabalha nos
princípios da agroecologia. A PNAPO precisou dar conta das duas vertentes.
METAS
DE COMERCIALIZAÇÃO NÃO FORAM ATINGIDAS
Uma
das principais metas no primeiro Planapo (2013-2015)
era a criação de um programa nacional para a redução do uso de agrotóxicos, o
que nunca chegou a ser alcançado. Também se pretendia ampliar o acesso a
crédito adequado à produção orgânica e agroecológica; criar meios para
facilitar o registro de produtos fitossanitários (para o controle de pragas e
doenças) adequados para o manejo orgânico; universalizar a assistência técnica
rural com enfoque agroecológico; e apoiar a comercialização dos produtos
orgânicos e de base agroecológica, especialmente por meio do PAA e do PNAE –
nesse caso, o objetivo era que, até 2015, 5% dos recursos do PNAE e do PAA
estivessem indo para a aquisição desses produtos.
Houve
avanços. O livro “A Política Nacional de Agroecologia e
Produção Orgânica no Brasil”, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) em 2017, aponta que a assistência técnica foi uma das
prioridades: foram lançadas várias chamadas públicas que permitiram o
atendimento a cerca de 153 mil famílias, chegando perto das 177 mil que o plano
havia estabelecido como meta.
Em
relação aos agrotóxicos, se conseguiu a implantação da Vigilância em Saúde de
Populações Expostas aos Agrotóxicos em todos os estados. Também houve progresso
na implementação de tecnologias sociais de acesso à água para a
produção de alimentos, com a instalação de cisternas em unidades de produção
orgânica e agroecológica no sertão nordestino.
Mas
muita coisa ficou para trás. Das 125 iniciativas previstas, apenas 53 tiveram
100% ou mais de execução. Quanto à comercialização, por exemplo, não se chegou
nem perto de ter 5% dos recursos do PNAE e do PAA usados para a compra de
produtos agroecológicos e orgânicos: os percentuais ficaram em torno de 3% e
1,4%, respectivamente.
A
meta de aumentar o acesso ao crédito também não foi atingida: do montante de R$
2,5 bilhões disponibilizados para financiar a produção agroecológica e orgânica
da agricultura familiar no Plano Safra, apenas R$ 63,1 milhões foram executados
– o que corresponde a 2,5% do total.
“Muitos
resultados não foram totalmente alcançados. Mas acho que fizemos alguns ensaios
em laboratórios bem-sucedidos”, analisa Iracema. Leomárcio usa essa mesma
palavra – “ensaio” – para se referir aos primeiros avanços da PNAPO. E todo
mundo que avalia a política parece concordar que um dos ensaios mais exitosos –
que precisa ser replicado, de preferência com mais recursos e de modo perene –
foi o Programa Ecoforte.
PROGRAMA-MODELO
FICOU SEM ORÇAMENTO APÓS GOLPE DE 2016
O
Ecoforte é apontado como uma das experiências mais inovadoras desenvolvidas no
bojo da PNAPO. O programa, que fez parte de uma das metas no primeiro Planapo,
foi criado em 2013 para apoiar redes e cooperativas voltadas à agroecologia e à
produção orgânica. Os recursos vinham do Fundo Amazônia, do Fundo Social do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Fundação
Banco do Brasil (FBB). Esta última também lançava os editais para a seleção de
projetos, com duração de dois anos.
Como
o programa se baseava no apoio a redes, ele acabou induzindo atores dos
territórios a se articularem para apresentar propostas, como explica Paulo
Petersen. “Era o Estado estimulando a conformação de redes. Em vários territórios
elas não existiam, foram formadas para apresentar projetos e, em muitos casos,
depois que o projeto acabou a rede continuou lá”, aponta. Essa lógica – de
apoiar projetos numa perspectiva territorial, e não individual – é, na opinião
dele, o ponto alto do Ecoforte.
Foi
um programa barato e efetivo, já que os dois editais, ambos de 2014,
permitiram apoiar 38 redes com menos de R$ 40 milhões. A ANA sistematizou a experiência das
25 iniciativas contempladas no primeiro edital, e o resultado mostra que 488
organizações e 23.206 pessoas foram beneficiadas diretamente.
Depois
veio o Planapo II (2016-2019),
construído em 2015, às vésperas do golpe que destituiu Dilma Rousseff. No
papel, foram apresentadas novidades, como a incorporação de um eixo sobre terra
e território, centrado em metas e objetivos para a reforma agrária. No geral,
esse plano era mais abrangente que o primeiro. Foram 194 iniciativas previstas,
contra 125 do Planapo I.
“Era
óbvio que deveria haver uma ampliação dos recursos aportados para essa
política”, aponta Leomárcio. Mas isso não aconteceu, e o projeto ficou na
gaveta.
“O
governo Temer manteve formalmente os espaços de gestão da PNAPO [a CNAPO e o
CIAPO], mas esvaziou a política ao retirar orçamento”, explica Petersen.
Bolsonaro jogou a pá de cal ao acabar com as instâncias de gestão em 2019.
PRONARA
E ECOFORTE: DEMANDAS IMEDIATAS
Como
o primeiro Planapo previa um programa nacional para a redução do uso de
agrotóxicos, foi criado um grupo de trabalho sobre o tema com membros da
sociedade civil e de ministérios. Uma proposta para a criação desse
programa, o Pronara,
foi finalizada pela CNAPO em 2014. A ideia era desencadear a criação de
mecanismos de restrição ao uso, produção e comercialização de agrotóxicos,
principalmente aqueles com alto grau de toxicidade. Também se pretendia
incentivar a redução do uso de venenos pela conversão para sistemas de produção
orgânicos e de base agroecológica, além de promover ações educativas a respeito
dos agrotóxicos.
Na
avaliação de Petersen, a proposta não era tão radical. “Não se propunha
eliminar os agrotóxicos. Era uma redução – uma proposta, que sabemos ser
perfeitamente possível, de baixar o consumo de agrotóxicos sem afetar a
produtividade, sem afetar a balança comercial, usando um conjunto de princípios
ecológicos que podem ser aplicados mesmo em grandes propriedades”, considera.
Mas
o texto mexia com os interesses do agronegócio. Uma das iniciativas propostas,
por exemplo, era a retirada da isenção dos impostos sobre a produção e
comercialização de agrotóxicos. Em 2020, pesquisadores da Associação Brasileira
de Saúde Coletiva (Abrasco) estimaram que esses benefícios fiscais
somam R$ 10 bilhões anuais – ou
250 vezes o que custou o Programa Ecoforte em dois anos.
O
Pronara nunca vingou. Quando o texto foi encaminhado para a avaliação dos
ministérios, na CIAPO, foi barrado pela pasta da Agricultura, na época
comandada por Kátia Abreu. No segundo
Planapo, o programa apareceu como meta outra vez, mas não saiu do papel. Em
2016, a proposta foi levada ao Congresso, como Projeto de Lei, para instituir
uma Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA). Está tramitando desde
então.
Agora,
existe uma expectativa grande em relação à retomada dessa pauta, assim como a
do programa Ecoforte. De acordo com Petersen, a luta é para que essas agendas
avancem mesmo antes da elaboração do próprio Planapo. “Não dá para esperar, até
por conta do tempo político. Se a gente perder a janela que a gente tem agora,
por ser ainda o início de um novo governo, depois vai ficar mais difícil, vai
ter mais reação.”
Ele
acredita que o Pronara seria “politicamente importante” para o governo Lula.
“Para fazer um contraponto ao governo Bolsonaro e colocar um freio a essa
loucura [a aprovação recorde de agrotóxicos]”, destaca, observando que o
programa poderia ser criado via portaria interministerial.
ESPECIALISTAS
PROPÕEM UMA POLÍTICA CENTRADA NOS TERRITÓRIOS
Na
avaliação de organizações como a ANA, a PNAPO precisa não apenas apenas ser
restabelecida, como também passar por uma mudança na sua forma de gestão
– ou seja, no planejamento, monitoramento e avaliação das ações.
Isso
porque esse processo é muito “desenraizado”, nas palavras de Petersen. “Uma das
coisas que constatamos na primeira versão da PNAPO é que ela era muito pouco
conhecida. A gente precisa fazer com que a PNAPO tenha enraizamento, vá lá nos
territórios”, aponta.
Para
isso, uma das reivindicações é que a própria CNAPO tenha capilaridade. “Não
pode ser um grupo que se reúna em Brasília para discutir políticas isoladas. O
que nos interessa é ver como a PNAPO está de fato interferindo nos sistemas
alimentares, gerando benefícios, gerando renda, gerando conservação de
biodiversidade nos diferentes territórios. Então precisamos de um sistema que
chame as redes territoriais para o diálogo”, explica. Uma das demandas é ter o
BNDES e a FBB, que apoiaram o programa Ecoforte, sustentando financeiramente
essa gestão descentralizada.
No
geral, existe um clima de otimismo cauteloso no que diz respeito à
reestruturação da PNAPO. Petersen avalia que os movimentos de agroecologia têm
hoje uma força política maior e mais capilarizada pelo Brasil, e que, com as
mudanças climáticas em destaque na agenda internacional, é possível pautar a
agroecologia como estratégia para mitigação dessa crise. Dentro do governo, ele
acha que também há mais espaço para atender às demandas. “Nos debates que temos
no MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar], por
exemplo, vemos que há uma abertura muito maior do que no passado”, aponta.
Vivian
Libório, diretora do Departamento de Inovação para a Produção Familiar e
Transição Agroecológica do MDA, diz que a pasta quer cimentar essa relação, e
que já começou a estimular a formulação do próximo Planapo. De acordo com ela,
também é importante conseguir que o tema apareça com força no próximo Plano
Plurianual (PPA), que vai ser encaminhado pelo
Executivo ao Congresso em agosto. “Isso vai ser fundamental para dar
vazão a algumas demandas da PNAPO”, afirma.
Além
da questão orçamentária, há outros desafios no interior do governo. No tema da
agroecologia, existe um histórico de tensão entre o Ministério do
Desenvolvimento Agrário e o Ministério da Agricultura. O fato de o segundo
nunca ter referendado o PRONARA é um exemplo disso. Segundo Libório, a
relação entre as duas pastas até agora tem sido boa, e há “muitas afinidades
sendo construídas e lapidadas” – porém, não em relação ao crucial programa de
redução de agrotóxicos.
Embora
satisfeito com os canais de diálogo entre governo federal e sociedade civil
neste momento, Petersen reconhece que isso ainda é muito pouco:“A gente sabe
que não vai dar um ‘cavalo de pau’, e que a pressão do agronegócio é muito
pesada, mesmo dentro do governo. Não temos essa força em todos os ministérios.
Precisamos fazer aliança com os gestores que apostam nessa agenda [da
agroecologia], e que muitas vezes também não têm muito espaço. Mas se a gente
não conseguir articular a força política, não vamos fazer essa agenda avançar.
Porque os desafios são imensos”.
Fonte:
Por Raquel Torres, especial para O Joio e O Trigo e De Olho nos Ruralistas
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