Quanto dinheiro EUA
enviaram para Ucrânia e para onde foi tudo?
Os
EUA acabam de elevar a assistência militar total à Ucrânia para mais de US$
35,7 bilhões, ou cerca de 65% dos US$ 55 bilhões em armas enviadas a Kiev pela
OTAN até o momento. Além disso, há dezenas de bilhões de dólares em
"apoio" econômico e ajuda humanitária. Para onde foi todo esse
dinheiro?
"De
acordo com uma delegação de autoridade do presidente Biden, estou autorizando
nossa 37ª retirada de armas e equipamentos dos EUA para a Ucrânia no valor de
US$ 300 milhões [cerca de R$ 1,5 bilhão]", disse Blinken em um comunicado
à imprensa na quarta-feira (3), prometendo que Washington "continuaria ao
lado de nossos parceiros ucranianos".
"A
Rússia pode acabar com sua guerra hoje", brincou Blinken, evocando as
observações de Biden, em fevereiro, de que a crise ucraniana — causada por
décadas de expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), um
golpe apoiado pelo Ocidente em Kiev em 2014 e uma brutal guerra de oito anos em
Donbass – foi de alguma forma a "escolha" do presidente Putin e que
ele "poderia acabar com a guerra com uma palavra". O secretário de
Estado deixou de fora, no entanto, o papel de Washington e Londres ao esmagar
as negociações de paz entre Moscou e Kiev na primavera passada no Hemisfério
Norte.
·
O
que há no novo pacote de ajuda dos EUA à Ucrânia?
O
novo pacote de assistência armamentista dos EUA vai incluir munição para os
sistemas de foguetes de artilharia de alta mobilidade (Himars) da Ucrânia,
artilharia, obuseiros e projéteis de tanques, armas antitanque e foguetes,
armas pequenas, caminhões, reboques e peças sobressalentes. Blinken não
detalhou o preço que os suprimentos adicionais teriam sobre a capacidade de
combate dos EUA, ou as dores de cabeça associadas ao fato de Kiev queimar armas
e munições a taxas consideravelmente mais rápidas do que a capacidade dos
países da OTAN de produzi-las.
·
Quanto
dinheiro total os EUA gastaram na Ucrânia?
A
guerra por procuração Rússia-OTAN na Ucrânia já é um dos dez maiores envolvimentos
militares da história norte-americana. Somente em 2022, o Congresso destinou
mais de US$ 112 bilhões (cerca de R$ 562,3 bilhões) à Ucrânia para assistência
militar, econômica e humanitária. Isso se soma a mais de US$ 2,5 bilhões
(aproximadamente R$ 12,5 bilhões) em ajuda militar dos EUA enviados a Kiev
entre 2014 e 2021, um empréstimo de US$ 1 bilhão (mais de R$ 5 bilhões) em 2014
e mais de US$ 1,1 bilhão (cerca de R$ 5,5 bilhões) em apoio econômico entre
2017 e 2018 e US$ 2,6 bilhões (aproximadamente R$ 13 bilhões) em nova ajuda
militar anunciada no mês passado.
Até
o momento, a Ucrânia custou mais aos EUA (em dólares ajustados pela inflação)
do que a Guerra do Golfo Pérsico de 1991, a Guerra Civil Americana, a Guerra
Hispano-Americana, a Revolução Americana e a Guerra Revolucionária, a Guerra
Mexicano-Americana e a Guerra de 1812. A crise ucraniana fica atrás apenas da
Primeira e Segunda Guerras Mundiais, Coreia, Vietnã, Iraque e Afeganistão,
cujos custos chegaram a centenas de bilhões ou mesmo trilhões de dólares.
Em
seu discurso de abertura em uma reunião de oficiais de defesa da OTAN no mês
passado, o secretário de Defesa Lloyd Austin anunciou que somente Washington
contribuiu com mais de US$ 35 bilhões (cerca de R$ 175,7 bilhões) em ajuda
militar à Ucrânia.
Além
disso, está o apoio econômico e humanitário. De acordo com o Kiel Institute for
the World Economy, os EUA destinaram US$ 27,1 bilhões (aproximadamente R$ 135,5
bilhões) para a chamada ajuda financeira e US$ 4 bilhões (mais de R$ 20 bilhões)
para ajuda humanitária, entre janeiro de 2022 e fevereiro de 2023.
·
Para
onde o dinheiro está indo?
Para
onde vai a ajuda? As autoridades admitiram que "não têm quase
nenhuma" ideia do que acontece com as armas e munições depois que entram
na "névoa da guerra" ucraniana. A administradora da Agência dos
Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em
inglês), Samantha Power, assegurou que Washington não encontrou
"evidências de que a assistência dos EUA está sendo mal utilizada ou mal
gasta". Essas garantias são um pouco de conforto para os contribuintes
norte-americanos em meio a extensas reportagens sobre o envio de armas para a
Ucrânia de alguma forma acabando no mercado negro e nas mãos de gangues
criminosas e grupos de milícias em toda a Europa, África e Oriente Médio.
Também
na frente de toda a ajuda econômica e humanitária, foram relatados alguns
"sustos". O veterano jornalista investigativo dos EUA, Seymour Hersh,
revelou no mês passado que o governo Zelensky havia desviado US$ 400 milhões
(cerca de R$ 2 bilhões) ou mais na compra de óleo diesel em 2022.
·
O
que é a dívida nacional da Ucrânia e a quem ela deve?
Aparentemente
tirando uma página do manual dos EUA sobre como acumular dívidas maciças, Kiev
quase dobrou sua dívida nacional no ano passado, de US$ 57 bilhões (cerca de R$
286,1 bilhões) em fevereiro de 2022 para mais de US$ 106,2 bilhões
(aproximadamente R$ 533,1 bilhões) um ano depois. Outra medição coloca o total
da dívida nacional ucraniana ainda mais alta, em mais de US$ 161,94 bilhões
(mais de R$ 812,9 bilhões).
No
início da crise do ano passado, as autoridades ucranianas apresentaram
cautelosamente uma proposta de anistia da dívida para Kiev, instando
"organizações financeiras internacionais" a "revisar a política
da dívida e zerar as dívidas da Ucrânia".
A
conversa sobre o perdão da dívida foi logo esmagada, no entanto, com Kiev não
apenas acumulando novas dívidas, mas forçada a pagar antigas obrigações com o
Fundo Monetário Internacional (FMI) no valor de mais de US$ 2,7 bilhões (cerca
de R$ 13,5 bilhões), mais US$ 486 milhões (aproximadamente R$ 2,4 bilhões) em
sobretaxas – mais do que gastos com educação, o meio ambiente e outros grandes
programas combinados.
Os
credores ocidentais aproveitaram a oportunidade para tirar proveito da posição
vulnerável da Ucrânia para promover reformas há muito desejadas, que haviam
resistido até mesmo por sucessivos governos golpistas pós-2014, como
flexibilizar as leis de propriedade de terras para permitir que oligarcas e
interesses financeiros estrangeiros expandissem o controle sobre as terras
agrícolas altamente férteis do país em chernozem (literalmente "solo
negro").
Além
disso, o presidente Zelensky deixou bastante claro que seu governo está muito
feliz em acomodar as corporações multinacionais em obter um lucro saudável
enquanto "reconstrói" a Ucrânia.
"É
óbvio que os negócios americanos podem se tornar a locomotiva que mais uma vez
impulsionará o crescimento econômico global. Já conseguimos chamar a atenção e
cooperar com gigantes do mundo financeiro e de investimentos internacionais
como BlackRock, JPMorgan, Golden Sachs [sic], marcas americanas como StarLink
ou Westinghouse já se tornaram parte do nosso jeito ucraniano. [...] Todos
podem se tornar um grande negócio trabalhando com a Ucrânia em todos os
setores, desde armas e defesa até construção, de comunicação a agricultura, de
transporte a TI, de bancos a medicamentos", disse Zelensky em uma reunião
da Câmara de Comércio dos Estados Unidos em janeiro.
O
presidente ucraniano não mencionou que essas "locomotivas" não
trabalham de graça e que, seja no país ou no exterior, seu principal objetivo e
responsabilidade legal é e sempre foi o lucro para seus acionistas.
·
Quanto
dinheiro os países da OTAN estão dando à Ucrânia?
O
Pentágono estima que a ajuda militar ocidental total à Ucrânia chegue a US$ 55
bilhões (cerca de R$ 276,2 bilhões), enquanto os compromissos de ajuda
econômica e humanitária fora dos EUA atualmente chegam a US$ 60 bilhões
(aproximadamente R$ 301,3 bilhões).
·
Por
que os EUA estão 'ajudando' a Ucrânia?
Washington
e seus aliados ofereceram uma série de razões grandiosas para apoiar a guerra
por procuração na Ucrânia, desde "defender a democracia" até impedir
o Kremlin de seu suposto impulso de recriar "um Império Russo".
Mas
ler nas entrelinhas e monitorar as observações feitas por funcionários e
especialistas em think tanks de Washington revela o propósito verdadeiro e
muito mais cínico da política dos EUA: "enfraquecer a Rússia" (de
acordo com Austin) e, se possível, mudança de regime em Moscou (de acordo com
Biden, embora a Casa Branca tenha retirado essas observações).
O
ex-operador do Conselho de Segurança Nacional da era Reagan, Oliver North, pode
ter colocado isso melhor em um "momento de silêncio em voz alta" no
final do ano passado.
"É
um dinheiro bem gasto e, na minha humilde opinião, é muito parecido com o que
Ronald Reagan fez nos anos 1980", disse North em entrevista à televisão em
novembro passado. "[Reagan] acreditava em apoiar os combatentes da
liberdade. Ele fez isso na América Latina, fez isso em Angola, Guiné-Bissau,
Moçambique. Ele fez isso no Afeganistão. Essas pessoas estavam dispostas, como
o povo ucraniano, a usar seu sangue e nossas balas", apontou.
Naturalmente,
North não detalhou os tipos de forças odiosas que seu chefe estava disposto a
apoiar financiando esses "combatentes da liberdade", nem o custo
humano da política dos EUA ("seu sangue"), tanto na Ucrânia quanto em
todo o mundo.
Ø
'A
questão dos grãos': para onde vai realmente a maior parte dos grãos ucranianos?
O
prazo do acordo de grãos termina no dia 18 de maio. A Embaixada dos EUA em
Ancara esclareceu que 29 milhões de toneladas de cereais da Ucrânia chegaram a
países com extrema necessidade de alimentos. A Sputnik, com base nos dados da
ONU, descobriu para onde a maior parte dos grãos é realmente entregue.
No
próximo dia 18 de maio termina o prazo do pacto alimentar que foi assinado para
desbloquear a exportação de grãos e fertilizantes da Ucrânia em meio ao
conflito no país. Na terça-feira (2), o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov,
declarou que os termos do acordo não foram cumpridos na parte que diz respeito
ao setor agrícola russo.
Em
paralelo, o ministro da Defesa turco, Hulusi Akar, disse que uma reunião
preparatória entre os vice-ministros da Defesa da Turquia, Ucrânia e Rússia vai
ser realizada em Istambul na próxima sexta-feira (5) para discutir a
possibilidade de uma nova extensão da Iniciativa de Grãos do Mar Negro. Uma das
questões mais polêmicas na implementação do acordo é o destino final dos grãos
exportados dos portos ucranianos.
Segundo
informações da ONU, 29.424.000 toneladas de grãos saíram dos portos da Ucrânia,
mas apenas 2,58% da quantidade total — 758.500 toneladas — foi exportada para
os países mais pobres da África subsaariana.
A
maior parte da carga, especificamente 50,2% (14.718.000 toneladas), foi
recebida por países europeus. Até agora, apenas 1.058 navios com cargas de
trigo, milho, outros grãos, farelo de girassol e óleo de girassol deixaram os
portos ucranianos.
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A seguir estão as regiões como:
Ásia-Pacífico
com 26,5% (7.794.000 toneladas)
Oriente
Médio e Norte da África com 15% (4.427.000 toneladas)
Sul
da Ásia com 5,8% (1.726.000 toneladas)
No
dia 17 de novembro de 2022, o acordo foi prorrogado por mais 120 dias, até 18
de março de 2023. No dia 14 de março, a Rússia anunciou que aceitava a
prorrogação do pacto por mais 60 dias, o que foi descrito pelo Kremlin como um
gesto de boa vontade.
Atualmente,
a Rússia pede para aproveitar o tempo restante até 18 de maio e cumprir as
condições do pacto alimentar para prorrogá-lo novamente.
O
embaixador da Rússia na ONU, Vasily Nebenzya, observou que as sanções
unilaterais dos EUA e da UE continuaram a obstruir o envio de alimentos e
fertilizantes russos para países terceiros.
Ø
Como
a máquina de guerra americana ficou sem combustível? Colunista opina
O
arsenal militar dos Estados Unidos foi drenado pelo apoio militar à Ucrânia e
por décadas de escolhas falhas em política de defesa, diz o pesquisador de
política externa dos EUA Hal Brands em seu artigo para a Bloomberg.
Em
seu artigo, o colunista exorta Washington a abandonar a estratégia que visa a
primazia na economia de alta tecnologia e voltar à primazia na produção de
armas.
O
arsenal dos EUA está em um estado lamentável, assim como a capacidade da
América de sustentar – ou melhor ainda, dissuadir – uma guerra entre grandes
potências, escreve Brands no seu artigo.
Brands
vê o apoio militar em larga escala dos EUA à Ucrânia e décadas de escolhas
políticas falhas como a razão disso. De acordo com o autor do artigo, no mundo
pós-Guerra Fria, que foi determinado pelo domínio americano, as decisões
políticas errôneas do establishment americano não importavam muito.
No
entanto, devido ao conflito na Ucrânia, é provável que essas decisões políticas
custem caro a Washington nos próximos anos.
Como
explica o autor do artigo, os EUA já tiveram uma base industrial e de defesa
insuperável. No final da Primeira Guerra Mundial, o país estava construindo
mais navios do que o resto do mundo junto. E no meio da Segunda Guerra Mundial
os Estados Unidos estavam quatro vezes mais industrializados que a Alemanha.
Mas
a mudança na estrutura da economia dos EUA levou à difícil situação atual, em
que o país precisará de anos para substituir a quantidade de armas que a
Ucrânia gastou em semanas.
Apesar
de a liderança econômica americana se manter, agora ela é baseada na primazia
da economia de alta tecnologia, e não na primazia industrial. Segundo Brands,
isso permitiu que o país desenvolvesse as armas mais sofisticadas do mundo, mas
ao mesmo tempo dificultou sua produção em larga escala.
A
situação foi agravada pelo declínio nos gastos com defesa após o fim da Guerra
Fria. No final da década de 1990, eles caíram para cerca de 3% do PIB dos 6% em
meados da década de 1980. Ainda hoje, os gastos com defesa são inferiores a 4%
do PIB do país.
A
estratégia dos EUA de aumentar a qualidade dos armamentos em detrimento da
quantidade parecia ser muito racional ao longo da maior parte do período
pós-Guerra Fria. Naquela época, os Estados Unidos tinham conflitos longos, mas
de baixa intensidade.
"As
guerras dos Estados Unidos eram contra oponentes inferiores, como a Sérvia, ou
eram conflitos longos, mas de baixa intensidade – no Iraque e no Afeganistão,
por exemplo – que não consumiam um grande número de munições de alta qualidade
ou infligiam um atrito pesado em tanques, navios e aviões dos EUA."
A
assistência militar americana à Ucrânia demonstra o quanto é difícil para os
EUA substituir as reservas esgotadas por causa de déficits acumulados há muito
tempo, como a falta de mão de obra treinada e engarrafamentos criados pela
dependência de fornecedores individuais de motores de foguetes ou componentes
de projéteis de artilharia.
Ao
mesmo tempo, Brands adverte que o problema, que vem crescendo há anos, não pode
ser resolvido da noite para o dia. O autor do artigo insiste que deve ser
aumentado o orçamento de defesa dos EUA e deve se convencer as empresas de
defesa da necessidade de expandir a produção.
Fonte:
Sputnik Brasil
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