quinta-feira, 4 de maio de 2023

As relações do narcotráfico com o garimpo ilegal em Terras Indígenas

A resiliência do garimpo ilegal na Terra Yanomami, que viveu uma escalada de violência nos últimos dias, com um indígena assassinado e outros dois feridos, pode estar sendo patrocinada pelo crime organizado. Essa linha de investigação entrou no radar das ações de inteligência do governo federal na região, com a informação de que um dos quatro garimpeiros mortos em confronto com agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no domingo (30/4) era integrante de uma facção criminosa com atuação em todo o país.

A informação foi dada na 2ª feira (1/5) pelo presidente do IBAMA, Rodrigo Agostinho, em coletiva de imprensa após a visita de uma comissão interministerial à TI Yanomami por causa do ataque no fim de semana. Agostinho disse não ter mais detalhes sobre as investigações, mas, segundo a Agência Brasil, o garimpeiro sob suspeita, embora fosse do Amapá, seria integrante do PCC, que tem origem em São Paulo, mas atua em todo o Brasil. A informação foi reforçada pelo Diário de Pernambuco.

“A gente tem percebido que essas atividades passaram a exercer uma atração de facções criminosas. Elas servem, ao mesmo tempo, como forma de lavagem de dinheiro, por meio do garimpo ilegal, por exemplo, mas também como fonte de capitalização desses grupos, já que o tráfico internacional de drogas demanda grande investimento de operação”, explicou o presidente do IBAMA.

No local onde os garimpeiros foram mortos, a PRF disse ter encontrado um arsenal de armas. Segundo a corporação, foram identificados assentamentos de garimpeiros nas Terras Maikohipi e Palimiú – criados para tentar impedir o trabalho das autoridades – e que, nestas localidades, também ocorreram investidas criminosas contra equipes enviadas para combater a extração ilegal de minérios, detalha o Correio Braziliense.

Integrante da comitiva que esteve em Roraima, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, contou que o monitoramento feito por satélites identifica atividades de garimpo ilegal na TI Yanomami. Contudo, a ministra garantiu que eles serão desativados, reforça a Agência Brasil.

No podcast “O Assunto”, do g1, o jornalista Rubens Valente, da Agência Pública, que passou mais de 20 dias na TI Yanomami no auge da crise humanitária, endossa as denúncias de lideranças indígenas sobre a presença de garimpeiros em grande escala dentro do território. Segundo Valente, eles estão se preparando para novos ataques. “Isso demonstra a força armada desses garimpeiros.”

O geógrafo Aiala Colares Couto, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e professor da Universidade do Estado do Pará (UEPA), apontou que a atuação de facções que controlam o tráfico de drogas na Amazônia estava aumentando os crimes ambientais na região, como desmatamento, grilagem, garimpo em Terras Indígenas e extração ilegal de madeira. O especialista nomeou essa conexão entre tráfico e devastação como narcoecologia.

Em tempo: 

Uma operação da Polícia Federal de Piracicaba (SP) contra a extração e o comércio ilegal de pedras preciosas chegou a garimpos ilegais de diamantes em Terras Indígenas e Áreas de Proteção Ambiental em três estados – Rondônia, Mato Grosso e Minas Gerais. As pedras eram extraídas e levadas para São Paulo e Paraná em voos domésticos, detalha o g1, sendo depois enviadas para países como Turquia, Bélgica, Estados Unidos e Coreia do Sul. A PF apreendeu carros de luxo, diamante bruto, joias, relógios, armas e dinheiro e prendeu seis pessoas, cinco delas no Brasil e uma nos EUA. Ao menos 35 integrantes e sete empresas envolvidas no esquema já foram identificados.

 

Ø  STF suspende presunção de boa-fé no mercado de ouro; decisão é obstáculo para garimpo ilegal

 

Em decisão unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu suspender o instituto da presunção de boa-fé no comércio do ouro, que permitia o comércio apenas com base nas informações dadas por vendedores do produto. Em termos práticos, a decisão é mais um empecilho para as atividades do garimpo ilegal, que terá mais dificuldade para escoar o material extraído ilegalmente.

De acordo com a regra que foi suspensa, empresas que compravam o ouro para beneficiamento não precisavam questionar o vendedor sobre a origem do material vendido. Segundo especialistas, isso fez com que crescessem os casos de extração ilegal em locais como terras indígenas e reservas ambientais.

O plenário do Supremo, em votação virtual, seguiu decisão individual do ministro Gilmar Mendes, que tinha suspendido o uso da boa-fé no início de abril. Na decisão, Gilmar afirmou que a medida, que era válida desde 2013, facilitava a vida do comprador ao tirar dele a responsabilidade sobre a origem do ouro, “o que incentivou o mercado ilegal, levando ao crescimento da degradação ambiental e ao aumento da violência”.

O ministro determinou, ainda, que o governo adote, em até 90 dias, uma nova série de normas para fiscalizar o comércio do ouro. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já trabalhava nos bastidores para revogar a legislação anterior.

Os pedidos de análise do instruimento legal foram feitos por três partidos políticos: PSB e Rede (que entraram com ações em 2022) e Partido Verde (que acionou o STF neste ano).

 

Ø  Quase 1.700 fazendas no país ocupam áreas de Terras Indígenas

 

Um levantamento do observatório De Olho nos Ruralistas identificou mais de 1,6 mil propriedades rurais sobrepostas a Terras Indígenas em todo o Brasil, somando uma área de 1,18 milhão de hectares, o equivalente ao território do Líbano. A esmagadora maioria (95,5%) das sobreposições entre território indígena e fazenda acontece em terras com demarcação ainda pendente.

No total, 18,6% do território indígena ocupado por fazendas estão sendo utilizados para a produção agropecuária, dos quais 55,6% servem de pasto e outros 34,6% para o cultivo de soja. A análise também identificou o desmatamento de 46,9 mil hectares de floresta no período de 2008 a 2021, considerando apenas as áreas de incidência em TI.

O relatório “Os Invasores” destaca também os interesses econômicos por trás da ocupação de territórios indígenas. Gigantes do agro, como Amaggi, Bunge e Cosan figuram entre os proprietários de terras nesta condição. Da mesma forma, o levantamento também destrinchou as conexões financeiras que viabilizam a incidência de fazendas em TI, com a atuação de grandes bancos como Bradesco e Itaú, além de fundos e gestores de investimento como XP, Gávea Investimentos, IFC e Mubadala.

A ocupação de território indígena por fazendeiros e empresas também está relacionada à escalada da violência contra os Povos Tradicionais. O relatório apontou para uma correlação direta entre as sobreposições e os dados de conflitos e mortes de indígenas, em especial nos territórios dos Povos Kanela/Timbira, no Maranhão; Guarani Kaiowá e Terena, no Mato Grosso do Sul; e Pataxó, na Bahia.

“É o capital nacional e internacional, legal ou ilegal, que assina a violência. O planeta que olha para o Brasil a cobrar a preservação da Amazônia é o mesmo planeta que precisa conhecer melhor quem financia as destruições”, comentou o diretor do observatório, Alceu Luís Castilho. Agência Brasil e Brasil de Fato repercutiram esses dados.

Em tempo:

Depois de anos de omissão, o governo federal começa a cumprir uma determinação judicial que pede a retirada de invasores da Terra Indígena Alto Rio Guamá, no Pará. De acordo com Rubens Valente na Agência Pública, as autoridades federais deram até o próximo dia 1º de junho para que os invasores deixem o território voluntariamente. A partir de julho, os agentes do IBAMA e de outros órgãos governamentais deverão fazer um “pente fino” no território, destruindo acessos e instalações ilegais.

 

Ø  Seca causada por mudanças climáticas pode exterminar árvores do oeste e do sul da Amazônia

 

Um estudo internacional que envolveu 80 pesquisadores da América do Sul e da Europa analisou os efeitos do aquecimento global sobre a Floresta Amazônica, enfocando principalmente como o clima mais seco pode comprometer a capacidade de regeneração natural do bioma. A conclusão é preocupante: os impactos da mudança do clima podem ser ainda piores do que o estimado até agora.

De acordo com a análise, as regiões oeste e sul da Amazônia podem sofrer os impactos mais significativos, com um risco maior de colapso em função da escassez de chuvas e da temperatura média mais alta. Alguns desses efeitos já estão sendo sentidos na floresta: no sul amazônico, há evidências de que a estação seca se tornou mais longa e as temperaturas nessa região aumentaram mais do que em outras partes da Amazônia.

Curiosamente, o sul da Amazônia também foi a região em que os autores encontraram a maior capacidade de adaptação climática das árvores. No entanto, além do clima mais quente e seco, o desmatamento intensivo contribui para a vulnerabilidade ambiental dessa área.

Isso também tem efeitos sobre a capacidade de armazenamento de carbono: em toda a Amazônia, o estudo estimou que a floresta armazena entre 10% e 15% do carbono armazenado globalmente por vegetação. No entanto, na porção sudeste amazônica, a junção de seca com desmatamento está comprometendo essa capacidade, e as árvores desta região já não conseguem mais armazenar carbono na mesma escala.

“Muitas pessoas pensam na Amazônia como uma grande floresta. Mas não é. Ela é formada por inúmeras regiões florestais que abrangem diferentes zonas climáticas, desde locais que já são muito secos até aqueles que são extremamente úmidos”, explicou a pesquisadora Julia Tavares, da Universidade de Uppsala (Suécia). “Queríamos ver como esses diferentes ecossistemas florestais estão lidando para que pudéssemos começar a identificar regiões que estão em risco particular de seca e condições mais secas”.

O estudo foi publicado pela revista NatureCorreio Braziliense e Science Daily deram mais informações.

 

Fonte: ClimaInfo/Brasil de Fato

 

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