Da 'caça aos marajás' à prisão por corrupção,
os altos e baixos da carreira de Collor na política
A movimentada vida política do ex-presidente
e ex-senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) ganhou nesta sexta-feira (25/3)
um marcante novo capítulo: aos 75 anos, ele foi preso por determinação do
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na decisão, Moraes ressalta que foram
esgotados os recursos no processo no qual o ex-presidente foi condenado a 8
anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, a ser
cumprida inicialmente em regime fechado.
A condenação, de maio de 2023, é relacionada
a um processo derivado da Operação Lava Jato e relativo a crimes envolvendo a
BR Distribuidora.
Collor foi preso em Maceió, capital de seu
Estado-natal, Alagoas, quando se preparava para voar a Brasília para se
entregar.
Ainda nesta sexta, o ministro Gilmar Mendes,
que havia votado pela absolvição de Collor, levou ao plenário físico do STF o
julgamento sobre a prisão.
Até agora, quatro ministros votaram pela
manutenção da prisão pelo sistema virtual da corte, mas a decisão final só será
tomada quando o plenário físico voltar a se reunir, em maio. Enquanto isso,
Collor seguirá preso.
Entre outras acusações, a Procuradoria Geral
da República (PGR) apontou que Collor, com a ajuda de outros dois empresários
condenados na ação, favoreceu a UTC Engenharia em contratos com a BR
Distribuidora, recebendo para isso R$ 20 milhões.
Boa parte das evidências do processo foram
reveladas por delatores da Operação Lava Jato, como o doleiro Alberto Youssef,
um dos primeiros a aderir à delação premiada durante as investigações.
De acordo com a então vice-procuradora geral
da República Lindôra Araújo, além dos relatos dos delatores, teriam sido
colhidas provas como e-mails, extratos bancários e outros documentos que
comprovariam as acusações.
Para o relator do caso no Supremo, ministro
Luiz Edson Fachin, as provas colhidas pelo Ministério Público comprovaram que
Collor exercia influência sobre o controle da BR Distribuidora e teria exercido
seu poder para viabilizar os contratos com a UTC Engenharia.
Para Fachin, ficou também comprovado que
houve lavagem de dinheiro, através de 42 depósitos feitos em contas correntes
do ex-presidente e 65 em contas de empresas por ele controladas, de forma a
ocultar a movimentação de autoridades financeiras.
Gilmar Mendes e Nunes Marques, que votaram
pela absolvição, argumentaram que não foram apresentadas provas suficientes
contra os acusados, apenas depoimentos e documentos trazidos por delatores.
Na época, a defesa do ex-presidente
argumentou que "o processo inteiro é baseado nos depoimentos de delatores
e não há provas que os corroborem".
• Caçador
de marajás, 'impichado' e inocentado
Para além do julgamento no STF, Collor
protagonizou uma carreira política das mais movimentadas e polêmicas desde a
redemocratização do país, na década de 1980.
Ele é oriundo de uma das famílias mais
tradicionais da política de Alagoas, os Collor de Mello. A família tem empresas
e emissoras de rádio e televisão no Estado. Com esse prestígio, foi eleito
governador de Alagoas em 1986.
E então, Collor foi eleito presidente em
1989, nas primeiras eleições diretas à Presidência da República após a ditadura
militar (1964 -1985).
Em sua campanha, fez forte oposição ao então
presidente José Sarney (atualmente no MDB) e defendia o fim de privilégios às
chamadas elites da burocracia brasileira.
Ao longo da disputa, ele ficaria conhecido
como o "caçador de marajás", em alusão a funcionários públicos com
altos salários.
Collor venceu as eleições em um segundo turno
apertado, disputado contra o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Seu governo, no entanto, foi marcado por
diversas turbulências. Na área econômica, sua equipe tentou debelar a
hiperinflação que afetava o país na época, mas não obteve sucesso.
Uma das medidas mais controversas adotadas no
período foi o confisco da poupança de milhões de brasileiros e brasileiras, em
1990. A medida limitou a quantidade de dinheiro que as famílias poderiam sacar
de suas economias e pegou parte da população de surpresa.
Ainda na área econômica, Collor deu início a
um processo de abertura do país a produtos importados, especialmente em áreas
como a indústria automobilística.
Foi na área política, contudo, que o governo
de Collor sofreu os maiores reveses.
Nos primeiros meses de sua gestão, surgiram
os primeiros rumores sobre a atuação do tesoureiro de sua campanha à
Presidência, o empresário Paulo César Farias, conhecido como PC Farias. À
época, os rumores eram de que o empresário teria pedido propina a empresários
em troca de vantagens em contratos com o governo federal.
Em 1992, seu irmão, Pedro Collor de Mello,
concede uma entrevista à Revista Veja e diz que PC Farias era, na verdade, uma
espécie de "testa de ferro" de Collor. As suspeitas eram de que
despesas pessoais de Collor eram pagas com recursos de sobras da campanha de
1989. O então presidente negou as acusações.
As declarações deflagram uma crise política
que resulta em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as
relações entre o presidente e o seu ex-tesoureiro.
A crise se agravou e, em setembro de 1992,
foi instaurado um processo de impeachment contra Collor. No dia 29 daquele mês,
ele foi afastado temporariamente do cargo.
O caso foi então à votação no Senado. Diante
da possibilidade de ter seu afastamento comprovado e ter seus direitos
políticos cassados por oito anos, ele renuncia no dia 29 de dezembro. Apesar
disso, o Senado aprova o impeachment e cassa seus direitos políticos.
Em 1994, apesar do impeachment, Collor foi
absolvido em um processo criminal no STF em que foi acusado de ter tido suas
contas pagas por corruptores. Na época, os ministros da Corte alegaram não
terem encontrado provas suficientes sobre as acusações.
• Volta
à política
Em 2002, Collor retornou à cena política.
Disputou e perdeu as eleições para o governo de Alagoas.
Quatro anos depois, em 2006, foi eleito
senador, cargo para o qual foi reeleito em 2014.
Foi justamente a partir de 2014 que ele,
assim como outros políticos do país, passaram a ser alvos da Operação Lava
Jato. Ele foi alvo de mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia
Federal no âmbito das investigações conduzidas pela operação.
A partir de 2018, Collor se aproximou e se
tornou um grande apoiador do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PL).
Em 2022, já no fim de seu mandato como
senador, Collor disputou a eleição para o governo de Alagoas, mas perdeu para
Renan Filho (MDB), filho do senador Renan Calheiros — que chegou a ser ministro
da Justiça do governo de Collor, nos anos 1990.
Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil no
início do julgamento, em 2023, avaliaram que o processo teria pouco impacto
sobre seu legado.
"Apesar de ter sido o primeiro
presidente da República após a redemocratização, o fato de ele ter sido alvo de
um impeachment corroeu muito do capital político que ele poderia ter. Além
disso, nos últimos anos, ele não se firmou como uma liderança regional
representativa", disse então o professor de Relações Internacionais da
Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) Fabio Andrade, que também
coordena o Legislab, uma entidade que pesquisa o funcionamento do Poder
Legislativo no Brasil.
Collor foi condenado - e a agora preso - em
desdobramentos da operação Lava Jato, que é alvo de grandes controvérsias desde
2019, quando foram divulgados os conteúdos de conversas supostamente mantidas
entre procuradores da República que atuava na operação e então juiz federal
(atual senador) Sergio Moro. Vazamentos esses que ficaram conhecidos como Vaza
Jato.
Lideranças do PT e de outros partidos de
esquerda alegaram que as conversas revelavam uma espécie de conluio entre os
procuradores e o então juiz. Tanto os procuradores da Lava Jato quanto Moro
negaram qualquer irregularidade.
Nos últimos anos, porém, uma série de
decisões reverteram condenações originadas em processos da operação. A mais
conhecida delas foi a decisão do STF de anular as condenações contra o
presidente Lula após a avaliação de que ele deveria ter sido julgado por outras
varas que não a vara federal de Curitiba, onde Moro atuou.
Fonte: BBC
News Brasil

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