sábado, 26 de abril de 2025

Entre homenagens e silêncio: a visão dos grupos evangélicos sobre o papa Francisco

"O papa é um hipócrita e envergonha os católicos." No fim de 2023, o pastor Silas Malafaia, líder evangélico da Assembleia de Deus, lançou declarações furiosas contra o papa Francisco depois que o Vaticano permitiu, pela primeira vez, que padres concedessem a bênção a casais homossexuais. "Onde no Cristianismo, em nome do amor, tem licença para pecar ou abençoar práticas pecaminosas? Em lugar nenhum", disse Malafaia naquela época, em um vídeo publicado em suas redes sociais.

Embora a decisão não tenha mudado a doutrina sobre o casamento na igreja, a mudança, aprovada pelo papa Francisco, foi uma das tantas que enfureceram líderes religiosos mais conservadores. E trouxe mais complexidade para o debate sobre a visão dos diferentes grupos evangélicos sobre o papa.

Nesta semana, algumas das lideranças evangélicas mais proeminentes, como o bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, o pastor-presidente da Lagoinha, André Valadão, e o próprio Malafaia silenciaram diante da notícia da morte do papa.

Ao mesmo tempo, outros líderes, como o apóstolo Estevam Hernandes, da igreja Renascer em Cristo, e o pastor Davi Lago, da Primeira Igreja Batista de São Paulo, prestaram suas homenagens ao líder maior da Igreja Católica, que morreu na segunda-feira (21/4). "Independentemente de crença ou denominação, reconhecemos que o papa Francisco foi um grande homem de Deus, cuja vida foi marcada pelo amor ao próximo, pela defesa da justiça, da paz e da dignidade humana", publicou o apóstolo Estevam Hernandes em sua conta no Instagram.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que divergiu do papa quando Francisco publicou um texto em defesa "de uma Amazônia que lute pelo direito dos mais pobres", prestou sua homenagem em uma rede social, assim como a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que é evangélica. "Mais que um líder religioso, o papado representa a continuidade de uma tradição milenar, guardiã de valores espirituais que moldaram civilizações", escreveu o ex-presidente na rede social X.

Bolsonaro é católico, mas estreitou seus laços com a comunidade e lideranças evangélicas em sua campanha à Presidência e seu governo e chegou a ser batizado no rio Jordão, em Israel, pelo pastor Everaldo, da Assembleia de Deus. "Essa é uma oportunidade para notar como esse campo é múltiplo", afirma o antropólogo Juliano Spyer, autor dos livros Crentes Povo de Deus. Spyer diz ser difícil dizer qual a opinião dos evangélicos sobre o papa Francisco, dado que o espectro religioso é vasto. "É um campo muito mais diverso do que a gente está acostumado a achar."

Ainda assim, ao longo do seu papado, Francisco acenou em algumas direções que ajudam a explicar a sua relação com esses distintos grupos evangélicos, que estão em expansão e, juntos, representam quase um terço (31%) da população brasileira, segundo levantamento de 2020 do Datafolha.

Dados do último Censo, de 2010, mostraram que, enquanto a parcela de evangélicos está crescendo, a de católicos vem diminuindo, embora os católicos ainda sejam franca maioria — eram metade dos brasileiros, segundo o Datafolha. Especialistas apontam que um fenômeno está ligado ao outro e que o catolicismo tem perdido fieis para as igrejas evangélicas. A expectativa é que essa tendência tenha se mantido nos últimos anos. Os dados do último Censo sobre o perfil religioso da população brasileira devem ser divulgado em junho.

<><> Papa de esquerda?

Uma característica associada a Francisco antes mesmo de ele se tornar papa é sua identificação com uma corrente da Igreja Católica com forte cunho social. "O papa Francisco representa uma perspectiva teológica vista por uma parte dos evangélicos com muita desconfiança, que é Teologia da Libertação", afirma Kenner Terra, pastor da Igreja Batista de Água Branca, doutor em ciências da religião, e uma das lideranças religiosas que prestaram homenagem ao papa.

Surgida na segunda metade do século passado na América Latina, a Teologia da Libertação é baseada na defesa da libertação de grupos sociais oprimidos. No Brasil, um dos seus maiores expoentes é o teólogo Leonardo Boff. Sua afinidade teológica, diz o pastor Kenner, o levou a ser visto como um papa de esquerda por parte dos evangélicos conservadores, que se afastaram de Francisco. Ao mesmo tempo, o pastor acredita que a postura do papa também pode servir de inspiração: "Ele deu uma grande lição de humildade e desprendimento e isso é uma provocação interessante para nós evangélicos, que temos testemunhado alguns excessos que tanto nos envergonham".

Spyer lembra que pesa também nessa discussão o histórico da relação entre católicos e cristãos. "Essa relação entre católicos e protestantes foi forjada durante muitos séculos. Não é só um outro grupo religioso, é um grupo religioso que por muito tempo era visto como opositor, inimigo", diz o antropólogo.

O pastor Samuel Vitalino, líder da Igreja Esperança BPC (Bible Presbyterian Church), em Orlando, afirma que, desde o surgimento das igrejas reformadas, ou seja, quando a Reforma Protestante rompeu com o catolicismo, no século 16, que a figura do papa não é reconhecida por muitos dos reformados. "O nosso problema não é com a pessoa, mas com aquilo que ele representava", afirma o pastor. "Cristo só tem um e nós honramos e adoramos somente essa pessoa que é Cristo." Isso não significa, que a morte de Francisco não tenha sido lamentada, segundo o pastor: "A gente lamenta a morte do papa como um ser humano. Mas não porque ele era o papa".

Talvez por essa diferença histórica, Francisco tenha trabalhado ao longo do seu papado no intuito de estabelecer uma relação com os grupos evangélicos, segundo afirma Syper. "Uma coisa curiosa do Francisco é o quanto ele trabalhou para estabelecer uma relação com alguns grupos evangélicos", diz. "Se alguns evangélicos estão fazendo homenagens para ele agora, isso é reflexo também das ações de Francisco."

De fato, Francisco acenou aos evangélicos ao longo dos últimos anos: realizou um encontro com o pastor italiano Giovani Trentini, e recebeu no Vaticano o bispo Abner Ferreira, filho do pastor Manoel Ferreira, o líder maior da Assembleia de Deus de Madureira. "Foram alguns acenos, principalmente aos pentecostais", diz o pastor Kenner, sobre o ramo do protestantismo do qual fazem parte algumas das maiores igrejas evangélicas hoje, como Universal e Assembleia de Deus, sendo a maioria entre os evangélicos.

<><> Figura 'ambígua'

Mas, ao mesmo tempo que acenava para alguns grupos evangélicos, o papa desagradava outros, tidos com os mais conservadores. "Eu brincava com alguns amigos católicos que o papa Francisco era o melhor papa que eu já vi, porque ele foi tão para a esquerda, que muitos dos meus amigos católicos romanos começaram a colocar uma pulga atrás da orelha com a entidade papal", afirma o pastor Samuel Vitalino. "Eles mesmos começaram a discordar de algumas posturas do papa Francisco."

O pastor Kenner Terra afirma que a "desconfiança" em relação ao papa ocorria entre os mais "radicais". Mas ele lembra, no entanto, que Francisco tinha uma postura "ambígua". "Ele relativiza a questão homossexual, dizendo que a homossexualidade é um pecado [ao mesmo tempo que aprova a benção aos casais homossexuais] e isso atraiu parte dos conservadores evangélicos. Ele produz reações múltiplas."

Embora Francisco fosse tido como um papa progressista, seus acenos não tiveram o poder de promover grandes rupturas na Igreja, como o já mencionado caso das bênçãos aos homossexuais. Em um documento assinado por Francisco em 2024 chamado Dignitas Infinita ("Dignidade Infinita"), o Vaticano reiterou sua oposição à cirurgia de redesignação sexual, à ideologia de gênero, à barriga de aluguel, ao aborto e à eutanásia. No documento, o aborto é definido como uma "crise extremamente perigosa do senso moral", e a barriga de aluguel é uma "violação" tanto para a mulher, como para a criança. O texto destacou também que o sexo atribuído a uma pessoa ao nascer é uma dádiva — e qualquer tentativa de mudá-lo corre o risco de cair "na tentação de se fazer de Deus".

Antes disso, Francisco já havia classificado a prática da barriga de aluguel como "desprezível" e a chamada ideologia de gênero, linha de pensamento que desafia a ideia de que a sexualidade humana é determinada pela biologia, como "uma ideologia feia".

Mas, em 2023, além da permissão para as bençãos a casais do mesmo sexo, Francisco também disse que as pessoas trans poderiam ser batizadas na Igreja Católica, desde que isso não causasse escândalo ou "confusão". "Ele só podia ir até onde a janela de honra permitia que ele fosse. Ele acenava, mas não podia mudar a estrutura da igreja", diz o pastor Samuel Vitalino.

Para o pastor, muitos dos ideais de Francisco não tinham respaldo na Bíblia: "Ele tinha adoração pelas pessoas, sem dúvida alguma. Mas muito daquilo que era bom, sob o ponto de vista do coração dele, não tinha necessariamente um aparato bíblico. E a Bíblia é a palavra de Deus".

A pluralidade de opiniões sobre o papa entre os diferentes grupos evangélicos também se reflete na expectativa — ou não — sobre quem será o próximo chefe do Vaticano. "Esperamos que o próximo papa dê continuidade a algumas conquistas que o papa Francisco trouxe", afirma o pastor Kenner. Já para o pastor Samuel Vitalino, "não faz diferença" quem será o próximo papa. "Sei que os mais conservadores e os mais liberais querem espaço. Mas a gente confia na soberania de Deus."

¨      Como influência de Francisco foi além do catolicismo

Em um dos vídeos emocionantes que agora estão marcados na história do seu pontificado, o papa Francisco consola um menino de 12 anos angustiado ao pensar sobre a vida pós-morte de seu pai, um homem ateu. "Deus tem o coração de um pai. E diante de um pai, não crente, que foi capaz de batizar seus filhos e dar essa bravura aos seus filhos, vocês acham que Deus seria capaz de deixá-lo longe?", disse então Francisco, morto na segunda-feira (21/4).

O episódio em 2018 seria apenas um dos vários em que o papa deu mostras de que encarava o ateísmo (ou a negação da existência de um Deus) com certa naturalidade — ou ao menos longe de uma visão mais condenatória da Igreja em relação aos não crentes. O caminho traçado por Francisco foi bem diferente daquele criado por seu antecessor, o papa Bento 16, que chegou a associar ateus aos nazistas.

Numa missa na Escócia em 2010, ao relembrar a Segunda Guerra Mundial, o então papa disse que a tirania nazista foi um "extremismo ateísta do século 20", ressaltando que a falta da crença em Deus leva "em última instância a uma visão truncada do homem e da sociedade". Naquele mesmo ano de 2010, Francisco, ainda como Jorge Mario Bergoglio, arcebispo de Buenos Aires, dizia no recém-lançado livro Sobre o Céu e a Terra que ele não perguntava se uma pessoa acreditava ou não em Deus.

O importante, dizia, era saber se seu interlocutor "fazia algo pelos demais" — uma ideia que ganharia manchetes pelo mundo anos mais tarde quando sugeriu em declarações que era melhor uma pessoa ser ateia do que ser uma católica que ia à missa, mas nutria ódio pelos outros. A visão distinta de Francisco, que propôs uma Igreja mais aberta e em diálogo com vários setores da sociedade, fez o papa ser visto ao longo dos anos positivamente pelos não católicos, segundo pesquisas feita principalmente nos Estados Unidos.

Na última pesquisa publicada pelo centro de pesquisas americano Pew Research Center, que acompanhou ao longo dos anos a popularidade de Francisco nos EUA, 56% das pessoas sem afiliação religiosa tinham uma visão favorável do papa, uma aprovação maior, inclusive, do que entre os protestantes (51%). Esse grupo inclui ateus, agnósticos (aqueles que acreditam não ser possível determinar a existência ou inexistência de Deus) e os que não se incluíam nesses grupos, mas se consideravam sem fé.

Assim que o papa assumiu o Vaticano, em 2013, a visão positiva entre essa parcela era apenas de 39% — e o máximo da popularidade dele foi em 2017, quando 71% dos sem filiação religiosa responderam que tinham uma visão favorável de Francisco, segundo o Pew. Numa pesquisa global de 2015, da WIN/Gallup International, 51% dos ateus e agnósticos enxergavam o papa de forma positiva.

Para o padre Luís Corrêa Lima, professor de Teologia da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica), Francisco conquistou os não católicos e não crentes por ter se mostrado desde o princípio que era um tipo de papa dialogante, e não divisivo. "Não era do tipo que dizia só eu tenho a verdade e a salvação. Ele sabia prezar o que o outro tinha de bom", reflete o padre, presidente das Faculdades Católicas, instituição mantenedora da PUC-Rio. Entre essas demonstrações, segundo o padre, estão a encíclica Laudato si, publicada em 2015, em que papa Francisco chamou a Terra de "Casa Comum" (ou seja, o planeta de todos, e não apenas de poucos), além do documento em favor da paz assinado junto ao líder muçulmano dos Emirados Árabes.

O antropólogo e historiador Diego Omar da Silveira, autor de artigos sobre ateísmo no Brasil, avalia que essa aprovação ocorre porque os ateus formam um grupo em geral progressista, que não é preso a ideias da tradição. "A Igreja estava num momento complicado, saindo papado de Bento 16 que retornou à tradição, à ideia de exclusivismo da igreja enquanto centro de referência moral", diz Silveira, que é coordenador do curso de Ciências da Religião na Universidade do Estado do Amazonas. O papa Francisco veio, segundo o pesquisador, com a missão de se "relacionar melhor com sociedade civil, se colocando no mundo com outras referências que não só a Igreja. Isso foi visto com bons olhos pelo público não religioso".

À frente do Vaticano por 12 anos, Francisco tornou o catolicismo mais aberto, por exemplo, aos homossexuais, ao autorizar que casais do mesmo sexo recebam a benção de padres, a divorciados, e adotou posicionamentos firmes em questões globais, como o repúdio à concentração de riqueza e à exclusão de imigrantes. "Embora não tenha encaminhado essas mudanças de dogmas de fato, pelo menos ele pautou as discussões e as tratou com certa leveza", avalia Silveira. Não só como líder espiritual do mundo católico, Francisco, enquanto papa, também teve papel diplomático e de chefe de Estado do Vaticano, que tem relações plenas com 184 países e com a União Europeia. Além disso, foi um participante formal dos assuntos internacionais, como em questões sobre imigração e direitos humanos, num mundo que caminhou nos últimos anos em direção a políticos da direita radical, normalmente contra essas pautas. Recentemente, por exemplo, o papa reagiu publicamente e chamou de "desgraça" os planos de Trump de deportar imigrantes.

A Santa Sé também tem status de Observador Permanente nas Nações Unidas (ONU), o que lhe garante assento em uma das mesas de decisão mais influentes do planeta.

Papa Francisco foi crucial, por exemplo, na mediação do acordo que reestabeleceu relações diplomáticas entre os EUA e Cuba, em 2014 — um processo que seria desfeito por Trump. O então presidente cubano, Raúl Castro, ele próprio um ateu, chegou a dizer: "Se o papa continuar falando assim, mais cedo ou mais tarde, voltarei a rezar e retornarei à Igreja Católica". Francisco também costurou um papel importante no processo de paz entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), além de falar com frequência contra guerras como a da Ucrânia e em Gaza.

·        Ateu, mas com homenagem ao papa

Ateu há 10 anos, o gaúcho Léo Kaufmann, de 39 anos, diz que todas essas sinalizações o fizeram admirar o papa, mesmo sem acreditar em Deus ou concordar com ensinamentos da Igreja Católica.

Kaufmann, um homem gay, casado, que trabalha organizando eventos corporativos de recursos humanos, fez questão de fazer um post nas suas redes sociais após a morte de Francisco, ressaltando a defesa do papa de que "caráter não tem religião".

"O papa foi alguém disposto a acolher e não a usar as escritas como forma de separar as pessoas", diz Kaufmann, para quem o papa enfrentou os dogmas e seguiu mais estritamente os ensinamentos creditados a Jesus Cristo, como a humildade, do que seus antecessores.

Para ele, o enfrentamento do papa Francisco em relação ao tradicionalismo da igreja em temas como acolhimento a pessoas LGBTQIA+, imigrantes, divorciados ou mulheres de certa forma cria uma afinidade com o que os ateus defendem.

Dentro do catolicismo, o papa Francisco sinalizou uma mudança de tom em relação a diversas questões sociais. "Todos são convidados à Igreja, inclusive pessoas divorciadas, pessoas homossexuais, pessoas transgênero", escreveu ele em sua autobiografia. "Isso torna ele mais próximo das pessoas comuns da sociedade", diz Kaufmann.

O gaúcho conta que chegou a frequentar um seminário católico para fugir da ideia de se casar e, assim, se tornar um "orgulho para a família". Ele ainda buscou refúgio em igrejas evangélicas, centros espíritas e terreiros de umbanda, mas se encontrou enquanto ateu ao perceber que estava sempre procurando "onde está a falha" nas religiões, sem conseguir acreditar ou ser tocado pela fé.

Mesmo distante da igreja, Kaufmann seguiu reconhecendo a figura do papa como importante. "Para muita gente ainda, por mais que eu não acredite nisso, o que o papa fala ainda é a baliza moral e de comportamento. Quando ele fala, o mundo olha", explica, "E ele me mostrou que é possível a Igreja Católica mudar. Grandes maldades já foram feitas em nome de Deus, mas também muitas coisas boas foram feitas."

Uma pesquisa do Instituto Ipsos de 2023 apontou que 89% dos brasileiros dizem acreditar em Deus, o maior índice entre 26 países pesquisados. Por outro lado, o segmento populacional de ateus, agnósticos e sem religião é o que mais tem crescido nos últimos anos no Brasil, segundo pesquisas do instituto Datafolha.

Além dos ateus, o papa também manteve um tom amistoso em relação a outras fés, mantendo encontros com líderes de diversas religiões e pedindo respeito aos que pensavam diferente. Numa das imagens marcantes de seu papado, na primavera de 2016, ele visitou um centro para requerentes de asilo nos arredores de Roma e lavou e beijou os pés de refugiados, entre os quais havia muçulmanos, hindus e cristãos coptas, da Igreja Ortodoxa no Egito.

O padre Luís Corrêa Lima, da PUC-Rio, explica que desde os anos 1960, com o Concílio Vaticano 2º, a Igreja Católica tem enxergado "verdade e santidade em segmentos não católicos", algo que foi seguido por Francisco "O mais importante não é que se aumente o número de católicos. O importante é que haja uma fidelidade ao evangelho e aos valores essenciais", defende Lima.

·        Ateus x Igreja

A maioria das histórias sobre o ateísmo costuma apontar uma origem nos filósofos gregos e romanos Epicuro, Demócrito e Lucrécio, ao defenderem ideias como a noção de que não há vida após a morte e que a religião era uma atividade humana.

Mas a ideia do que é ser ateu mudou ao longo dos séculos.

O historiador Diego Omar da Silveira explica que os próprios cristãos já foram considerados "ateus" no Império Romano, já que não cultuavam os mesmos deuses que os romanos. Na Idade Moderna, explica Silveira, a Igreja tratou ateus com grande repressão, inclusive com a inquisição perseguindo aqueles "com traços de ateísmo — ou seja, aqueles que desconfiassem de estruturas religiosas".

 tempos, o poder da igreja estava sempre atrelado ao Estado e efetivamente conseguia reprimir qualquer pessoa que fosse de encontro às suas ideias.

No seculo 19, a relação muda um pouco, segundo o pesquisador, já que igreja passa a ter um poder mais simbólico do que repressivo, pois começa a se dissociar do poder estatal. "Surge uma filosofia laica, senão ateia, que vai contestar aquilo que a igreja considerava verdade, baseada na ciência", diz o historiador.

Em meados do século 20, há mais diálogos entre religião e muitos pensadores ateus, continua Silveira. Um exemplo é o marxismo, que reconhecia afinidade com ensinamentos cristãos da antiguidade, como um movimento comunitário e igualitário, pregando partilha de bens e cuidado com os pobres.

Qual caminho a Igreja vai tomar a partir do papa que irá assumir no lugar de Francisco após a realização do conclave ainda é incerto. Para o padre Luís Correa Lima, a marca de Francisco na Igreja Católica foi muito grande, incluindo a indicação de dois terços dos cardeais que escolherão o novo papa. Por isso, ele aposta numa continuação de seu legado. Já o historiador Diego Omar da Silveira avalia que não há um caminho claro para o sucessor. Ou seja, o escolhido pode levar adiante a ideia de diálogo com os que pensam diferente ou voltar a fechar mais igreja, "pautado na ideia de que a única fonte de verdade é a cristã".


Fonte: BBC News Brasil

 

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