terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Francisco Fernandes Ladeira: Bolsonarismo - de efeito colateral do golpe a efeito paralisante da esquerda

Não há dúvidas sobre os efeitos nefastos do bolsonarismo para a sociedade brasileira. Por meio deste movimento de extrema direita, saíram do armário as viúvas da ditadura militar, ressentidos contra a universidade pública, anti-intelectuais, fanáticos religiosos e preconceituosos de todos os tipos.

Com todo fenômeno social, o bolsonarismo não surgiu do nada. É consequência de seu contexto histórico. No caso, se trata do efeito colateral do antipetismo, difundido sobretudo pela grande mídia, de maneira mais contundente durante as jornadas de junho de 2013 e do golpe de Estado de 2016.

Como o discurso antipetista é essencialmente um discurso de ódio, só poderia ter gerado algo similar: o bolsonarismo. Como bem sintetizou o presidente Lula: plantaram Aécio e colheram Bolsonaro. 

Se, como efeito colateral do golpe, o bolsonarismo teve impacto muito negativo para a direita tradicional, pois sequestrou a hegemonia desse espectro ideológico, por outro lado, o bolsonarismo tem cumprido uma função ainda pouco debatida no espaço público.

Além de hegemônico na direita política, o bolsonarismo também conseguiu sequestrar o monopólio da crítica ao status quo, posição histórica da esquerda. Claro que isso é feito de maneira distorcida e delirante.

Diante desse realidade, o receio de soar minimamente como bolsonarista, tem feito grande parte da esquerda renunciar às suas costumeiras críticas às instituições burguesas. O que é pior: passou a defender de forma ferrenha judiciário, mídia hegemônica, indústria farmacêutica e a chamada democracia burguesa.

É fato que, pelo menos desde a queda do Muro de Berlim, a esquerda, em âmbito global, cada vez mais tem abandonado a luta de classes e adotado pautas difusas e identitárias. Assim, comprou ideias falaciosas, como “fim da História”, “pós-moderno” ou “fim da ideologia”.

No entanto, no Brasil, a situação piorou nos últimos anos. Antes do bolsonarismo, de uma forma ou de outra, a esquerda denunciava o golpismo da grande mídia, concebia o STF como aparelho ideológico da dominação burguesa, questionava as Big Pharma e apontava o fascismo como a face mais radicalizada da democracia burguesa. 

Com os discursos bolsonaristas sobre “extrema imprensa”, “ditadura do STF” e “negacionismo”, a esquerda, vergonhosamente, renunciou à sua vocação crítica, passando a estar a reboque da ideologia dominante.

Desse modo, é comum que as forças progressistas saiam em defesa da imprensa hegemônica (o chamado “jornalismo profissional”), terceirizem sua militância para o STF e embarquem na suposta luta da “democracia (burguesa) contra o fascismo”. Está concretizada a paralisia da esquerda.

Ou seja, a simples existência do bolsonarismo, com seu suposto discurso crítico antissistema, já tem sido suficiente para a esquerda ficar totalmente sob controle. Se, à primeira vista, o bolsonarismo causou certo incômodo nos donos do poder, hoje é um aliado estratégico para neutralizar qualquer tipo de oposição mais contundente. Nem a maior distopia teria imaginado tal panorama.

¨      Nikolas Ferreira é o “projeto da extrema-direita” para 2030, diz João Cezar de Castro Rocha

A possível ascensão de novos nomes da direita brasileira tem sido alvo de debates cada vez mais intensos. Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o professor João Cezar de Castro Rocha afirmou que “Nikolas Ferreira é o projeto da extrema-direita para 2030”. Em suas palavras, o parlamentar eleva a discussão sobre o que denomina “extrema-direita 24/7”, em referência ao caráter contínuo de campanha política desempenhado por certos grupos.

Durante a conversa no Boa Noite 247, o professor ressaltou a força de lideranças que, em sua maioria, nasceram na década de 1990. “Isso é bem importante. Eu acho que é uma questão demográfica e essa questão demográfica será decisiva em 2026. Você sabe em que ano nasceu Nikolas Ferreira? 1995. André Fernandes e Bruno Engler nasceram em 1996, Lucas Pavanato em 1997. Há uma questão demográfica”, destacou. Segundo ele, a extrema-direita “triunfa porque viver em campanha é o próprio da extrema-direita. Eles não fazem campanha nos dois ou três meses anteriores a uma eleição majoritária, eles fazem campanha vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, trezentos e sessenta e cinco dias por ano”.

Outro ponto de reflexão foi a atuação das igrejas evangélicas, especialmente na comunicação em Libras (Língua Brasileira de Sinais). O professor lembrou que, na posse do então presidente Jair Bolsonaro, Michelle Bolsonaro “inovou de duas formas. Ela fez discurso e ela fez discurso em libras”. Essa iniciativa, segundo ele, evidencia uma estratégia de mobilização religiosa que vem sendo praticada há pelo menos duas décadas no Brasil: “As igrejas evangélicas no Brasil, de todas as denominações, há pelo menos duas décadas, preparam fiéis que aprendem a falar libras”.

O tema do futuro de Jair Bolsonaro também foi abordado. “Eu acho muito difícil que o Bolsonaro se torne elegível uma vez mais, e mais difícil ainda que ele consiga escapar da prisão”, afirmou João Cezar de Castro Rocha, referindo-se a processos que tramitam contra o ex-presidente. Segundo o professor, entretanto, a provável ausência de Bolsonaro no cenário eleitoral não deve enfraquecer a extrema-direita, que já estaria “projetando o cenário” com outros nomes e estratégias.

Ele também chamou a atenção para o contexto internacional. “A extrema direita brasileira estará profundamente reenergizada […] a partir do dia 20 de janeiro, com a posse de Donald Trump e com o papel importantíssimo que Elon Musk desempenhará”, afirmou. Para ele, Musk teria o objetivo de desmontar barreiras institucionais, abrindo caminho para projetos autoritários nos Estados Unidos e, por consequência, influenciando outros países, como o Brasil. “É muito claro o projeto agora. Neste instante, enquanto estamos falando, Elon Musk está tentando influenciar a eleição na Inglaterra e na Alemanha. […] Imagine o que acontecerá no Brasil em 2026.”

O professor sublinha que a esquerda deve entender as dinâmicas da extrema-direita se quiser reagir de forma eficiente. “Porque a esquerda perdeu a sua capacidade de militância desse jeito permanente, de estar nas comunidades, de fazer trabalho nas bases…”, disse. No contexto brasileiro, esse fator — somado ao universo digital — indica uma tendência de crescimento de lideranças jovens, como Nikolas Ferreira, André Fernandes, Bruno Engler e Lucas Pavanato.

Para João Cezar de Castro Rocha, a estratégia bolsonarista consiste em manter a “chama acesa” enquanto se busca um espaço de barganha política. Entretanto, ele avalia que o núcleo duro do bolsonarismo, “embora não vá dizê-lo”, já trabalha com a hipótese de Bolsonaro não participar do pleito de 2026. Nesse cenário, novos nomes ganham força como alternativas para a condução do projeto conservador. 

 

¨      Extrema direita termina 2024 com menos força política e na mira da Justiça

O ano de 2024 foi marcado por investigações policiais, escândalos políticos e mobilizações golpistas, envolvendo líderes e apoiadores da extrema-direita no Brasil. As operações da Polícia Federal e decisões do Superior Tribunal Federal (STF) impactaram figuras proeminentes, enquanto a agenda política do setor, atrelada ao bolsonarismo, sofreu derrotas significativas nas eleições municipais.

Já no começo do ano, em 8 de fevereiro, a Polícia Federal deflagrou a Operação Tempus Veritatis, investigando uma tentativa de golpe de Estado atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados como o general Walter Braga Netto e Valdemar Costa Neto, presidente do PL. O objetivo seria reverter os resultados das eleições de 2022.

Na mesma operação, a Polícia Federal prendeu, ainda, dois ex-auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): o ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência Filipe Martins e o ex-ajudante de ordens coronel Marcelo Câmara.

Filipe Martins era considerado um dos mentores do chamado “gabinete do ódio” — grupo que usava as redes sociais para disseminar desinformações e mentiras sobre pautas consideradas importantes para o bolsonarismo e também para atacar inimigos do ex-presidente com notícias falsas.

<><> Matar o presidente

Em julho, surgiram as primeiras denúncias públicas sobre o envolvimento de militares como os coronéis Mario Fernandes e Hélio Ferreira Lima em planos golpistas. As denúncias agravaram a crise institucional e reforçaram o clima de desconfiança entre as Forças Armadas e o governo.

No dia 21 de novembro, ocorreu o episódio que pode marcar para sempre o bolsonarismo. A Polícia Federal apresentou ao STF um relatório detalhado que resultou no indiciamento de 37 pessoas, incluindo Jair Bolsonaro, por crimes de conspiração e tentativa de golpe de Estado. A acusação baseou-se em uma série de evidências reunidas ao longo de dois anos de investigações.

O plano criminoso envolvia um suposto complô para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do STF Alexandre de Moraes. A conspiração teria sido organizada em células secretas formadas por ex-militares e apoiadores radicais ligados ao entorno político de Bolsonaro.

Segundo as investigações, reuniões clandestinas foram realizadas em diferentes estados para planejar os ataques. Além de execuções planejadas, o esquema previa uma ruptura institucional seguida da imposição de um regime autoritário controlado por uma junta militar. Documentos apreendidos detalharam estratégias que incluíam atentados simultâneos em Brasília e São Paulo.

<><> Militares presos

Peça-chave para a derrocada da extrema-direita em 2024, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, foi preso no dia 22 de março deste ano, no contexto da Operação Venire da Polícia Federal, que investigava fraudes em cartões de vacinação contra a covid-19. Nesta oportunidade, o militar teve seus celulares apreendidos.

Cid foi apontado como operador estratégico de uma rede clandestina que articulava atos antidemocráticos e ações de desestabilização das instituições brasileiras. A ordem de prisão foi emitida após meses de monitoramento de suas comunicações, que revelaram seu papel ativo no planejamento de ataques a autoridades públicas e na promoção de desinformação.

As investigações indicaram que ele era responsável pela gestão de uma rede de comunicação segura usada para coordenar atividades ilegais, incluindo o planejamento de atentados contra líderes políticos como Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin e o ministro do STF, Alexandre de Moraes.

O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro foi solto no dia 3 de maio e, em 19 de novembro de 2024, foi convocado para prestar novos depoimentos à Polícia Federal e ao STF para esclarecer contradições e omissões em suas declarações anteriores, especialmente relacionadas a um suposto plano golpista que incluía o assassinato de autoridades.

As revelações feitas por Mauro Cid levaram à histórica prisão do general Walter Braga Netto, no dia 14 de dezembro deste ano. O militar oi ministro da Defesa em 2019 e, também, candidato a vice na chapa liderada por Jair Bolsonaro, que concorreu à presidência da República, em 2022.

Durante seus depoimentos, Cid detalhou reuniões secretas realizadas entre membros do alto escalão das Forças Armadas e líderes políticos alinhados à extrema-direita, nas quais Braga Netto teria desempenhado um papel central na articulação de uma suposta tentativa de golpe de Estado para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

O general enfrenta acusações graves relacionadas a uma suposta conspiração para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva após as eleições de 2022. As investigações conduzidas pela Polícia Federal indicam que ele teria desempenhado um papel central na organização e financiamento do plano golpista que envolvia o assassinato de Lula, Alckmin e Moraes.

Além disso, Braga Netto é acusado de obstrução de justiça por supostamente interferir nas investigações em curso sobre a tentativa de golpe. Relatórios indicam que ele teria buscado informações sobre acordos de colaboração premiada de outros envolvidos, visando dificultar a obtenção de provas pelas autoridades.

<><> Eleições

As urnas mostraram que a extrema-direita brasileira sofreu rejeição da população durante as eleições municipais de 2024. O resultado eleitoral escancarou um desempenho aquém do esperado, especialmente nas capitais do país.

O Partido Liberal (PL), do ex-presidente Jair Bolsonaro, governará apenas quatro capitais: Rio Branco (AC), Cuiabá (MT), Maceió (AL) e Aracaju (SE). Legenda com o maior número de candidatos nas capitais, os direitistas sofreram derrotas importantes e chamou a atenção a queda significativa na popularidade de nomes históricos ligados ao bolsonarismo, muitos dos quais já ocuparam posições de destaque no governo federal.

Em Belo Horizonte, o candidato Bruno Engler (PL) foi derrotado por Fuad Noman (PSD) na disputa pela prefeitura. Engler, que contou com a presença de Jair Bolsonaro em atos de campanha, alcançou pouco mais de 46% dos votos válidos, não conseguindo reverter a vantagem do adversário no segundo turno.

Em Goiânia, o ex-presidente também apoiou enfaticamente Fred Rodrigues (PL), que foi derrotado por Sandro Mabel (União). Rodrigues obteve 44,47% dos votos válidos, encerrando sua campanha sem conseguir atrair apoio suficiente para superar a ampla coligação formada pelo candidato vitorioso.

Evandro Leitão (PT) venceu uma disputa acirrada em Fortaleza, derrotando André Fernandes (PL) por uma margem inferior a 15 mil votos. Leitão terminou com 50,38% dos votos válidos, enquanto Fernandes, apoiado pela extrema-direita, obteve 49,62%, protagonizando uma das eleições mais apertadas deste ciclo eleitoral.

A derrota mais significativa para o PL ocorreu em João Pessoa, onde o ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, Marcelo Queiroga (PL), alcançou apenas 36,09% dos votos válidos, sendo amplamente superado pelo candidato da oposição, que contou com uma campanha estruturada e forte apoio de lideranças locais.

Outras derrotas importantes ocorreram em Manaus, onde Capitão Alberto Neto (PL) ficou com 45,41% dos votos válidos; em Belém, onde Delegado Eder Mauro (PL) obteve 43,64%, e em Palmas, onde Janad Valcari (PL) encerrou a disputa com 46,97% dos votos. Essas derrotas evidenciaram uma queda de popularidade da extrema-direita nas capitais brasileiras, marcando um ciclo eleitoral desfavorável ao bolsonarismo.

 

Fonte: Jornal GGN/Brasil 247/Brasil de Fato

 

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