Sem
presença humana, 'sua soberania não vale nada', diz Aldo Rebelo sobre a
Amazônia
Durante
sessão especial na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (2), o ex-ministro da
Defesa brasileiro, Aldo Rebelo, destacou a importância geopolítica e econômica
da Amazônia brasileira, mas criticou a falta de investimento em infraestrutura,
que joga contra a soberania nacional brasileira.
Segundo
ele, a situação da região é "dramática" e o Brasil perde soberania
devido à falta de presença demográfica e atividade econômica. "Se você não
tiver presença humana, a sua soberania não vale nada", declarou.
Para
o ex-ministro, há quatro princípios para a preservação da Amazônia: a soberania
brasileira, o direito ao desenvolvimento, a proteção das populações indígenas
com acesso às conquistas da tecnologia e ciência, e a proteção do meio ambiente
com um inventário sério e bilateral.
"A
Amazônia passou a ocupar o lugar de honra no salão de debates da geopolítica do
mundo", afirma Rebelo, citando a Conferência da Organização das Nações
Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas de 2025 que acontecerá em Belém (PA).
Rebelo
destaca a decisão do Conselho de Segurança da ONU de transformar a questão
climática em um assunto de segurança internacional.
Segundo
ele, há uma visão global da Amazônia como crucial para o equilíbrio do planeta,
o sequestro de carbono e a redução dos riscos climáticos. "A Amazônia é
uma área de disputa geopolítica, e não apenas por razões ambientais."
No
entanto, Rebelo também chama a atenção para o paradoxo da pobreza na região
amazônica. "Na região mais rica do Brasil você tem a população com os
maiores níveis de pobreza", diz, ao criticar a falta de infraestrutura
básica e as políticas que impedem o desenvolvimento econômico.
Ele
menciona a criminalização da atividade agrícola e pecuária, a perseguição aos
produtores locais e a presença predominante de organizações não governamentais
(ONGs) que, segundo ele, têm mais influência do que o próprio Estado brasileiro
na região.
Rebelo
também criticou o bloqueio de projetos de infraestrutura importantes, como a
remoção de pedras na hidrovia Tocantins-Araguaia para tornar o rio navegável.
Ele comparou a situação com a rapidez da China na construção de ferrovias, o
que mostra uma incapacidade do Brasil de avançar em projetos essenciais para o
bioma amazônico.
• Quanto petróleo tem na Margem
Equatorial?
Estudos
da Petrobras relatados pela mídia indicam que o bloco que a estatal tenta
licenciamento ambiental para exploração na Margem Equatorial tem potencial de
5,6 bilhões de barris de óleo, um aumento de 37% na produção brasileira.
Rebelo
aponta a contradição no tratamento de áreas similares em diferentes estados
brasileiros, como a proposta de fazer poços de petróleo na Margem Equatorial do
Amapá, do lado da Guiana.
Segundo
ele, enquanto uma área está sendo explorada, outra enfrenta proibições. O caso
da região em questão, por exemplo, possui críticas contrárias a sua exploração,
por vezes vinculadas direta ou indiretamente a ONGs estrangeiras, que têm
ligação com empresas que já exploram o local.
Segundo
Rebelo, a situação socioeconômica no Amapá é alarmante, com "73% da
população no cadastro de transferência de renda, sem renda própria, dependendo
de renda pública".
Rebelo
critica a criminalização das atividades agrícolas e pecuárias na Amazônia, como
um dos diversos fatores que dificultam a vida dos locais.
Rebelo
também cita o crime organizado na região. "A cada 100 metros você encontra
uma pichação de um grupo do crime organizado — Comando Vermelho, PCC, Família
Norte, disputando território", relata.
Segundo
Rebelo, jovens são "exterminados" nessas disputas enquanto o tráfico
domina os rios. Por outro lado, ele observa que os recursos do Estado, como
helicópteros e viaturas, são usados para perseguir pequenos produtores em vez
de combater o crime organizado.
O
atual secretário municipal de Relações Internacionais de São Paulo (SP) também
enfatizou a falta de oportunidades para os jovens da região, formados em áreas
como mineração, veterinária, e engenharia de petróleo e gás, mas sem
perspectivas de emprego devido às proibições. Desta forma, acabam por buscar
emprego em outros estados brasileiros, como Goiás ou Rio Grande do Sul.
• Até quando esperar para começar as
mudanças? Por João Pedro Stedile
Os
crimes e as tragédias ambientais se repetem no Brasil com frequência cada vez
maior. Secas na Amazônia, enchentes no Maranhão e em Recife, queimadas no
pantanal, desmatamento e rebaixamento do lençol freático no cerrado, a reserva
hídrica das três maiores bacias hidrográficas do país…
A
tragédia no Rio Grande do Sul é apenas a ponta do iceberg de tantas agressões
que atingem milhões de pessoas e obriga a sociedade, e, sobretudo, os governos,
nos três níveis, a refletir sobre a necessidade de mudanças urgentes.
Foi
uma tragédia anunciada. Há muito tempo a comunidade científica vinha alertando
que o monocultivo de grãos e as pastagens levam a um desequilíbrio na
distribuição das chuvas.
As
mudanças no Código Florestal, defendidas e aprovadas pela bancada ruralista na
década de 2000, diminuíram o tamanho das áreas de cobertura vegetal nas margens
dos córregos e rios e desobrigaram a reposição de áreas de desmate. Sem
qualquer fiscalização, foi uma festa.
O
governo gaúcho ainda mudou centenas de artigos da lei estadual ambiental. Tudo
para ajudar o agronegócio, que nem sequer deixa riquezas no estado, porque
exporta commodities agrícolas sem pagar um centavo de ICMS, graças à Lei
Kandir, do governo FHC.
Somam-se
a esse desplante as ações predadoras da mineração, em todos os cantos, desde a
retirada de areia até as grandes mineradores de ferro, além dos crimes dos
garimpeiros.
Por
fim, o uso de agrotóxicos talvez seja a maior agressão à natureza. O Brasil é o
país que mais usa agrotóxicos, inclusive produtos proibidos na Europa, que
eliminam a biodiversidade, alteram o equilíbrio da natureza e contaminam o
lençol freático. Mas quem se importa se isso é controlado por meia dúzia de
empresas transnacionais, que não pagam impostos, mas financiam políticos?
Os
crimes estão aí, escancarados. E os mais afetados são sempre os pobres, que
pagam com suas vidas. São os moradores de locais não adequados, empurrados pela
especulação imobiliária das cidades para encostas; são os ribeirinhos; são os
agricultores familiares.
O
que fazer? Não precisamos mais derrubar nenhuma árvore para plantar ou criar
gado. O desmatamento zero precisa ser estendido da Amazônia aos demais biomas,
como o cerrado, a mata atlântica e o pantanal. Essa política deve ser combinada
com um grande plano nacional de reflorestamento nesses biomas, nas cidades, na
beira das estradas e nas margens de córregos e rios. Empresas estatais deveriam
criar viveiros e distribuir mudas de árvores nativas e frutíferas.
Precisamos
colocar limites ao avanço do agronegócio, ao modelo predador que enriquece
apenas as empresas transnacionais exportadoras e meia dúzia de fazendeiros.
Somente
a agricultura familiar pode “esfriar” o planeta, protegendo a biodiversidade e
combatendo a fome.
Para
isso, devemos estimular a policultura de alimentos saudáveis, com um grande
programa de agroecologia, que distribua insumos necessários aos agricultores
familiares, com uma política de reindustrialização que forneça máquinas
agrícolas adequadas e fertilizantes orgânicos.
A
reforma agrária é uma política fundamental para garantir acesso à terra aos
agricultores que não as têm —muitos expulsos pelo avanço do agronegócio— e para
realocar os atingidos climáticos. Nas cidades, é primordial garantir moradia
digna em locais com segurança e futuro.
Tudo
isso custa muito dinheiro, mas é melhor prevenir e salvar as vidas e a natureza
do que chorar depois. O Rio Grande do Sul vai precisar agora de R$ 60 bilhões
apenas para repor perdas.
Vamos
continuar correndo atrás da reparação ou vamos nos preparar para uma vida
melhor para todos?
• Indígenas do “Levante pela Terra” publicam
Manifesto cobrando demarcações e fim definitivo da lei do marco temporal
MANIFESTO
PELA VIDA, DEMARCAÇÕES E O BEM-VIVER
Nós,
povos indígenas, vivemos em estado de constante ameaça, que exige estarmos em
permanente vigília e mobilização. Neste momento, junho de 2024, em que
iniciativas legislativas, executivas e judiciárias ameaçam nossa sobrevivência
enquanto povos originários, nos vemos obrigados a intensificar nossas lutas e
amplificar nossa voz de protesto para defender nossos direitos mais básicos:
vida, territórios e o bem-viver.
Com
o Levante pela Terra em sua segunda edição, nós indígenas do Sul do Brasil,
Mato Grosso do Sul e São Paulo, dos povos Kaingang, Xokleng, Guarani e Kaiowá,
Guarani Nhandeva, Guarani Mbya, Huni Kuin e Tukano estivemos em Brasília (DF),
de 24 à 28 de junho. Voltamos a ocupar os gramados da capital federal, como um
marco de lutas do movimento indígena pela vida dos nossos territórios, por
nossas vidas, por nossos direitos.
Nos
mobilizamos em defesa dos nossos direitos, principalmente pela demarcação dos
nossos territórios e pela declaração da inconstitucionalidade da Lei
14.701/2023, que fixa tanto o marco temporal como outras normas de impedimento
à demarcação de terras indígenas. Ao mesmo tempo denunciamos o favorecimento do
agronegócio, que destrói, invade e explora nossos territórios, em detrimento às
demarcações por parte do governo de Luis Inácio Lula da Silva.
Trazemos
a público, neste manifesto, nossas preocupações, denúncias e reivindicações, na
expectativa e confiança de sermos ouvidos, respeitados e atendidos em nossas
demandas.
A
primeira edição do Levante pela Terra, em 2021, teve importância histórica para
a derrubada da tese do marco temporal. Hoje, convocamos toda a sociedade
brasileira e a comunidade internacional a repercutirem essa mensagem urgente, e
a somarem forças nas nossas lutas. O futuro da humanidade e a subsistência de
nosso planeta passam por nós, povos originários. Cumprimos um dever ancestral
de manter viva nossa cultura, defender nossas terras, e com elas, nossas
florestas, os seres que as coabitam, nossas fontes de água. Sem isso – sem nós
-, não há alimento, não há vida, não há futuro para ninguém.
Reafirmamos
nossas bandeiras de luta e decretamos nosso ESTADO PERMANENTE DE MOBILIZAÇÃO:
1º
Pela retomada imediata da demarcação, desintrusão e proteção das terras
indígenas, com recursos financeiros e pessoal suficiente junto aos órgãos
públicos para essa finalidade.
2º
Pela declaração pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com urgência, da
inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023, conhecida como a lei do marco
temporal, permitindo que os processos de demarcação sigam em frente. É
incompreensível que uma lei inconstitucional continue vigente e sendo usada
como arma contra nossos direitos fundamentais.
3°
Para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) cumpra o seu dever
constitucional de defesa dos direitos indígenas e manifeste-se com urgência no
RE 1017365 e na ADI 7582 pela inconstitucionalidade da Lei 14.701/23.
4º
Pela interrupção imediata de qualquer medida anti-indígena no Congresso
Nacional.
A
não adoção destas medidas são as principais responsáveis por aumentar a
violência contra povos indígenas, e os conflitos em nossos territórios.
LANÇAMOS:
Protocolo Indígena de Prevenção, Preparação, Resposta e Recuperação em
Situações de Risco e Desastre para orientar o Estado Brasileiro na atuação
junto a povos indígenas em situações de catástrofes ambientais, a exemplo da
ocorrida no Rio Grande do Sul no mês de maio de 2024.
REAFIRMAMOS:
demarcar nossas terras é um direito originário. Nossos direitos não são
negociáveis e nem podem ser ameaçados, extintos, reduzidos ou usados como moeda
de troca;
DECRETAMOS:
todos os anos, na segunda semana do mês de junho, o Levante pela Terra
retornará à capital federal, até que todos os territórios indígenas estejam
demarcados, regularizados e livres de invasores; o segundo semestre de 2024,
como período de mobilização em nossas regiões e territórios para denunciar o
valor destinado o agronegócio por meio do Plano Safra 2024/2025 – mais de 500
bilhões de reais – enquanto valores ínfimos são destinados à demarcação de
terras indígenas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva;
Diga
ao povo que avance!
Avançaremos!
Brasília
– DF, 28 de junho de 2024
# Levante
pela Terra
Fonte:
Sputnik Brasil/MST/Cimi
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