segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Conflito na Ucrânia entra no terceiro ano; G7 se reúne para discutir sanções à Rússia e ajuda a Kiev

A guerra na Ucrânia entrou neste sábado, 24, em seu terceiro ano. Ou como chama o invasor Vladimir Putin, "Operação especial". O G7 organiza uma reunião virtual hoje para discutir novas sanções contra a Rússia, com participação do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.

A premiê italiana, Giorgia Meloni, chegou à capital ucraniana pela manhã para presidir o encontro. A Itália tem a presidência rotativa do G7

O chefe da OTAN, Jens Stoltenberg, em declaração gravada, fez um apelo à Ucrânia e seus aliados no sábado a "não perderem a esperança".

Quando Vladimir Putin anunciou que as tropas russas entrariam em território ucraniano na madrugada de 24 de fevereiro de 2022, o presidente russo acreditou que poderiam tomar Kiev em poucos dias, mas a resistência ucraniana forçou-os a retiradas humilhantes.

Em 2023, foi a Ucrânia quem viveu uma grande desilusão: o fracasso da sua grande contraofensiva.

O G7 decidiu em julho de 2023 assinar contratos bilaterais de segurança com a Ucrânia.

Depois de Londres, em janeiro, Kiev assinou este tipo de acordo na semana passada com a Alemanha e a França, e outros 25 estados aderiram à iniciativa, como a Polônia. A Itália também planeja assinar um documento na mesma linha.

Esses acordos de segurança dizem respeito à concessão de equipamento militar, interoperável com o da OTAN e ao treino das forças ucranianas e ao fortalecimento da indústria de defesa da Ucrânia.

·        Rússia surda

O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia acusou nesta sexta-feira (23) a Rússia de "ignorar a voz" da maioria, durante reunião da Assembleia Geral da ONU, dois anos após o começo da invasão russa à Ucrânia.

 "Infelizmente, a Rússia ignora a vontade da maioria mundial, continua sua agressão e lança cada vez mais pessoas nas chamas da guerra", declarou Dmitro Kuleba.

 "A Rússia não pode ignorar a voz da maioria do mundo se adotarmos uma posição de princípios e agirmos juntos", acrescentou, enquanto apelava a todos os Estados-membros para participarem de uma conferência pela paz que será organizada na Suíça em torno da fórmula da paz de dez pontos do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.

 

Ø  Líderes ocidentais visitam Kiev em solidariedade à Ucrânia

 

Marcando o segundo aniversário da invasão russa, presidente da Comissão Europeia e chefes de governo de Itália, Canadá e Bélgica vão juntos à capital ucraniana e se encontram com Zelenski.A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e os chefes de governo de Itália, Canadá e Bélgica, respectivamente Giorgia Meloni, Justin Trudeau e Alexander De Croo, chegaram a Kiev neste sábado (24/02), dia que marca o segundo aniversário da invasão em grande escala da Ucrânia pela Rússia.

Eles viajaram juntos de trem da Polônia durante a madrugada, de acordo com o governo em Roma.

Em sua chegada à capital ucraniana, von der Leyen escreveu na plataforma X que estava em Kiev para dar o exemplo e “para celebrar a extraordinária resistência do povo ucraniano”.

“Mais do que nunca, estamos firmemente ao lado da Ucrânia. Financeiramente, economicamente, militarmente e moralmente. Até que o país seja finalmente livre”, explicou.

·        “Símbolo dos fracassos de Moscou”

Os líderes visitaram o aeroporto de Hostomel, local de uma feroz batalha feroz no início da invasão, quando a Rússia lançou paraquedistas para tomar a capital, Kiev, a poucos quilômetros de distância.

“Estamos aqui hoje para agradecer a esses homens e mulheres que, em 24 de fevereiro, há dois anos, não fugiram e, em vez disso lutaram”, disse Meloni. “Este lugar é um símbolo dos fracassos de Moscou, um símbolo do orgulho ucraniano”.

O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, abraçou os líderes ocidentais e fez um discurso televisionado em um cenário de aeronaves destruídas. “Há dois anos, enfrentamos as tropas inimigas aqui com fogo e, dois anos anos depois, estamos encontrando nossos amigos, nossos parceiros, aqui”, disse.

“Qualquer pessoa normal quer que a guerra termine. Mas nenhum de nós permitirá que nossa Ucrânia acabe”, acrescentou. “A palavra 'independente' sempre estará ao lado da palavra 'Ucrânia' na história futura.”

Durante sua visita, a presidente da Comissão Europeia entregou 50 veículos à Polícia Nacional Ucraniana e ao Gabinete do Procurador-Geral. Os automóveis off-road brancos ajudarão as autoridades a “estabilizar as áreas que as Forças Armadas ucranianas libertaram tão corajosamente da ocupação ilegal russa”, disse von der Leyen, de acordo com um comunicado de seu gabinete. “A entrega de hoje segue o recente envio de equipamentos modernos de desminagem da UE para a Ucrânia”.

Como presidente interino do Grupo dos Sete (G7), a chefe de governo da Itália, Meloni, preside uma videoconferência dos chefes de Estado e de governo do G7 em Kiev neste sábado. O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, também participa da reunião.

Esperava-se, ainda, que Meloni e Trudeau assinem pactos de segurança com Zelenski durante a visita, em linha com os acordos recentemente firmados com a França e a Alemanha, no valor de bilhões de dólares.

Stoltenberg elogia a coragem dos ucranianos

Enquanto isso, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, elogiou “a coragem e a determinação” dos ucranianos e, mais uma vez, garantiu ao país um futuro como membro da Otan. “Hoje faz dois anos que os tanques russos entraram na Ucrânia”, disse Stoltenberg em uma mensagem de vídeo. “Isso marcou o início da maior guerra na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.” Ele afirmou também que a situação no campo de batalha “ainda é extremamente grave”.

Stoltenberg enfatizou que não há sinais de paz em um futuro próximo. “Mas não podemos desanimar. A Ucrânia tem demonstrado repetidamente notável habilidade e determinação de luta.”

Scholz quer o retorno à dissuasão

No segundo aniversário do ataque russo, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, pediu o retorno à política de dissuasão. “Com nossos aliados, devemos ser tão fortes que ninguém se atreva a nos atacar”, alertou Scholz em uma mensagem de vídeo.

Mais uma vez, ele admitiu que a Bundeswehr foi “negligenciada por muitos anos”, mas garantiu que isso agora mudou. Ele ressaltou que em 2024 a Alemanha investirá 2% de seu PIB em defesa pela primeira vez em décadas. “Esse continuará sendo o caso nos próximos anos e décadas.”

A chanceler garantiu à Ucrânia mais apoio de Berlim. “Apoiaremos a Ucrânia em sua autodefesa – pelo tempo que for necessário”, acrescentando que, com sua guerra de agressão que viola a lei internacional, a Rússia não está apenas atacando a Ucrânia, “mas destruindo a ordem de paz na Europa”.

Fora de Kiev, a guerra segue seu curso

Drones russos atacaram o porto de Odessa pela segunda noite consecutiva, atingindo um prédio residencial, matando uma pessoa, disse o governador regional. Em Dnipro, um drone russo atingiu um prédio de apartamentos, e uma operação de resgate encontrou dois mortos.

Enquanto isso, uma fonte em Kiev disse que drones ucranianos haviam causado um incêndio em uma siderúrgica russa que uma autoridade russa identificou como sendo em Lipetsk, a cerca de 400 quilômetros da Ucrânia e que é responsável por cerca de 18% da produção russa.

 

Ø  A hora da resiliência na Ucrânia

 

Em 24 de fevereiro de 2022, o inimaginável aconteceu: quase 80 anos após a 2.ª Guerra, a guerra voltou à Europa com a invasão da Ucrânia pela Rússia. Hoje, exatos dois anos depois, a falta de uma perspectiva de grandes viradas de um lado ou de outro reduz as ansiedades. Mas a falta de um fim à vista reduz as esperanças.

Um ano atrás, a Rússia estava em posição ofensiva. Mas havia grandes preparativos, impaciência e expectativas em uma contraofensiva. As “pombas” vislumbravam uma janela de oportunidades: se os ucranianos empurrassem as linhas russas, Kiev poderia forçar Moscou a abdicar de seus objetivos maximalistas e entrar com mão forte em negociações de paz. Os “falcões” sonhavam em restabelecer as fronteiras anteriores à atual invasão e eventualmente as fronteiras anteriores à invasão russa da Crimeia, em 2014. E sonhavam até com a queda de Putin.

Mas a contraofensiva malogrou. As linhas estão engessadas. No Ocidente, disputas domésticas disfarçadas de doutrinas geopolíticas frustram o apoio à Ucrânia. A Europa aprovou um pacote de 50 bilhões de euros e está aumentando seus gastos em defesa, mas a hesitação em admitir que o dividendo da paz acabou traz dúvidas sobre se esse caminho será trilhado com a velocidade e a determinação necessárias. Nos EUA, um pacote de US$ 60 bilhões aprovado no Senado segue incerto na Câmara. Falta aos aliados da Ucrânia uma teoria da vitória adaptada à nova situação.

Mas o contraste entre o ceticismo de hoje e o otimismo de um ano atrás não deve ser exagerado. Basta pensar em dois anos atrás. Havia temor e mesmo pânico ante o risco de uma conflagração regional e mesmo de uma terceira guerra – possivelmente nuclear. Putin chegou às portas de Kiev e de sua meta: decapitar o governo ucraniano e instalar um regime fantoche. Essa meta foi frustrada e inviabilizada definitivamente. O mito do poderoso Exército russo herdado da União Soviética desmoronou. Não há o risco de a Ucrânia se tornar um satélite russo. Nem Moscou tem a capacidade militar de impor esse domínio nem os ucranianos o tolerarão. A questão é se a Ucrânia completará sua jornada rumo ao fortalecimento de sua nacionalidade, a consolidação de sua democracia e seu alinhamento com o Ocidente ou se sua frágil democracia se degenerará em um Estado autoritário e corrupto. Isso já seria uma vitória de Putin, ao menos no campo dos valores.

No campo de batalha, não há perspectiva de triunfo de um lado ou de outro. Mas isso não autoriza a complacência por parte dos aliados. Sem uma teoria da vitória coerente e convincente, aumentará a pressão sobre a Ucrânia para ceder seus territórios, assinar um tratado de paz e pôr um fim à guerra. Mas isso não seria um fim. Só um intervalo antes da próxima agressão de Putin.

Outra alternativa é um congelamento de facto do conflito, com a luta contida no palco atual, mas prolongando-se indefinidamente. Uma alternativa intermediária seria o armistício, com um fim das hostilidades, mas sem uma definição política formal, como é entre a Coreia do Sul e a do Norte até hoje.

Em todo caso, o objetivo num futuro próximo deveria ser criar um espaço defensivo estratégico para que a Ucrânia possa reconstruir sua economia. Apesar do impasse por terra, o país recuperou seu canal de escoamento no Mar Negro. Mesmo que a inclusão na Otan seja inviável em meio ao conflito, é possível acelerar o passo rumo à integração na União Europeia, incentivando as instituições democráticas no país. Nada disso será possível se a Ucrânia não receber as armas de que precisa para resistir à Rússia neste ano. Com treinamento, defesas aéreas, artilharia e drones, a Ucrânia poderia, no futuro, voltar a empurrar as linhas russas longe o suficiente para iniciar negociações numa situação favorável.

Crucial agora é resgatar o moral das populações da Ucrânia e de seus aliados. Para isso, mesmo sob uma montanha de incertezas, seus líderes têm ao alcance da mão uma verdade cristalina e adamantina: uma vitória de Putin não seria uma mera derrota da Ucrânia, mas de todo o mundo livre. Seja lá como se desdobre a guerra, essa clareza moral não será obscurecida. Mas essa luz será inútil se não for convertida em energia.

 

Fonte: RFI/IstoÉ/Agencia Estado

 

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